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INTRODUÇÃO |
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“Enquanto
Freud explica, o Diabo dá os toque” – Raul Seixas
O estudioso espanhol Manuel Castells afirma que ingressamos agora num novo mundo de comunicação, a “Galáxia da Internet”. O francês Pierre Lévy[1] expõe que o consumidor não apenas se torna coprodutor da informação que consome, mas é também produtor cooperativo dos “mundos virtuais” nos quais evolui dentro desta Galáxia. Já o seu compatriota Jean Baudrillard adverte que o cyberespaço determina a desertificação sem precedentes do espaço real e de tudo o que nos cerca. Por fim, o canadense Marshall McLuhan filosofa sobre o novo transformando o seu predecessor em forma de arte. No meio de todas essas colocações, um ingrediente da sociedade contemporânea vagueia de um lado para o outro, o Jornalismo. Conforme anunciou o espanhol, evoluímos da Galáxia de Gutenberg (de McLuhan) para a Galáxia da Internet. Estamos na era da informação e, nessa nova era, uma tradicional instituição está em xeque, o jornalismo, como mencionado. Soberano em sua atuação na sociedade desde os idos da prensa gráfica de Gutenberg, hoje o jornalismo sofre rupturas em suas fundações seculares. A era da informação altera velhos paradigmas em que essa instituição se alicerçou, subvertendo, através da Internet, o papel que antes era praticamente exclusivo dessa habilitação comunicacional. Assim demonstram alguns estudos dos nomes citados no parágrafo anterior, e não só, são questões que vários estudiosos estão analisando e que são usadas para fundamentar a pesquisa dissertativa que segue. Nessa nova era da informação, onde a Internet é o mais novo meio atuando na grande cena midiática do mundo globalizado, o jornalismo também ganha novos horizontes e busca o seu espaço através da grande rede e, assim, apresenta a sua nova metamorfósica evolução, o webjornalismo, ou jornalismo digital, como muitos a ele se referem. Dentro dos novos paradigmas do mundo conectado pela “rede das redes”, o jornalismo também nela se conecta e, dessa forma, neste trabalho também se analisa como é essa nova prática jornalística, como se dá essa nova mutação do jornalismo sob a forma do webjornalismo, o que ele agrega ao tradicional, no que ele inova. São perguntas necessárias quando se busca entender o contexto onde o novo é coator do tradicional dentro dessa nova era de informação incontrolável e abundante que nos traz a Internet, pois agora “tudo está interligado”, como nos diz a especialista em mídia digital Beth Saad. Sim, tudo está interligado, inclusive o jornalismo. Nesse novo paradigma do webjornalismo, algumas palavras-chave a ele associadas – não linearidade, fisiologia, instantaneidade, dirigibilidade, qualificação, custos de produção e de veiculação, interatividade, pessoalidade, acessibilidade, receptor ativo, usabilidade e inovação – são guias que nos levam aos fundamentos do jornalismo na Internet e que permeiam diversos estudos, dentre os quais os do comunicólogo J. B. Pinho, do jornalista Mike Ward e da ex-diretora da unidade de Internet da Editora Globo e diretora de conteúdo do Portal iG, Pollyana Ferrari, que levamos em conta neste trabalho. Dentre essas novas relações propiciadas pelo incipiente ambiente digital, este estudo procura ir além e saber como elas estão alterando a construção do espaço público, já que, no atual momento, o cidadão estaria mais próximo da informação e suas fontes, como afirma o professor de ética jornalística Eugênio Bucci. Assim, com toda essa informação disponibilizada, a Internet estaria criando um novo “espaço público conectado”, conforme termo utilizado pelo “guru” norte-americano da Internet Yochai Benkler, que concerne à instituição jornalística como um todo, seja na web, seja na TV ou no jornal (e na relação conjuntural dessas mídias). Como essa nova esfera estaria se constituindo é algo que este estudo também busca analisar. Nessa esteira, interessa averiguar como se dá a relação do público com o jornalismo dentro desse novo paradigma e vice-versa. Também se busca elucidar como o leitor/usuário é “coprodutor” dentro desse novo espaço digital da notícia, conforme apontado por Lévy no parágrafo inicial desta Introdução. Sobre as mudanças na relação entre o público e a notícia, um estudo do professor e jornalista Rosental Calmon Alves traz à tona dados relevantes, que demonstram como o usuário da Internet, êle, é em grande parte o responsável pela ruptura que está pondo abaixo os pilares da mídia. A consulta a esse estudo e outros semelhantes, para entender a questão das novas mídias[2], é parte de como esta pesquisa analisa a convergência que acontece em relação aos meios comunicacionais e sua binarização/conexão junto à Internet (com foco na questão jornalística), que não é um fator tão somente tecnológico mas, também, comportamental, do público em relação às novas mídias. Dentro dessa convergência, novas iniciativas aparecem, novas tecnologias que vão sendo utilizadas tanto pelos jornalistas e suas tradicionais instituições noticiosas quanto pelo público como, por exemplo, o fenômeno da blogosfera. Nesta questão dos blogs, uma pesquisa inglesa comissionada pela emissora Sky[3] aponta que um em cada dez jovens tem o hábito de escrever para um diário oficial, enquanto 47% deles escrevem em blogs (dados referentes ao público inglês). A pesquisa apontou ainda que esses jovens gastam cerca de 4,5 horas semanais entre blogs ou sites de distribuição de conteúdo online, tais como Youtube, Myspace e similares. Cerca de 22% desse público têm o hábito de escrever em seus blogs, ou “diários virtuais”, cerca de cinco dias por semana. Esses dados são relevantes e demonstram parte do escopo desta pesquisa, que analisa não somente a questão dos blogs como nova expressão da convergência do público sobre o mundo da notícia, mas também diversos outros recursos e tecnologias – novas soluções –, como as exemplificadas nessa pesquisa da Sky e outras, que vão se amoldando em torno do jornalismo e modificando a relação deste com o público e a postura deste último frente ao mundo da informação. Entretanto, está na afirmação de McLuhan uma das grandes questões que pairam sobre o jornalismo na era da informação. Na medida em que a Internet traz um novo paradigma para o jornalismo, ela transforma velhas práticas dessa instituição em arte, o que parece muito romântico. Porém, nesse caminho ao “estado da arte jornalística”, pode estar a explicação para a crise vivida pelos jornais impressos na atualidade, atônitos, em busca de sua vocação artística, já que a informativa, a sua função fundamental até então, está sendo solapada pela Internet. Será? Este é outro fator que este estudo procura desvendar. Dentro das práticas jornalísticas afetadas pela nova mídia, o tradicional jornal impresso, especialmente seus grandes e mais antigos veículos, estaria em vias de extinção dada a introdução da Internet no mundo da informação. Essa profecia apocalíptica é alvo de um estudo do professor e pesquisador da University of North Carolinia, além de jornalista e experiente estatístico, Philip Meyer, que foi debatido pela revista inglesa The Economist, em matéria que causou frisson no mundo profissional e acadêmico do jornalismo. A edição de agosto de 2006 da revista estampou em sua capa: “Who Killed the Newspaper?” (Quem matou o jornal?). No corpo da revista, um parágrafo profetiza:
Se o jornal impresso tende a desaparecer ou ser relevado a um segundo plano em relação à Internet, a análise dessa questão é algo que o presente estudo busca levar em conta, tentando verificar até onde vai a sua veracidade, pretendendo entender até que ponto a Internet influi na crise dos jornais impressos, se ela pode mesmo ser responsabilizada pelo “iminente assassínio do jornal impresso”. Estudos do professor de ética jornalística e ex-diretor fundador do portal UOL Caio Túlio Costa, demonstram a dificuldade das empresas tradicionais de comunicação lidarem com essa nova emergência midiática, em especial a Internet. O professor enfatiza que, apesar das várias opções de jornais digitais de que dispomos hoje na rede, especialmente os brasileiros e ligados às instituições tradicionais, nenhum deles ainda compreendeu os mecanismos de interatividade disponíveis pelas tecnologias de informação da Internet e, por isso, tendem a perder terreno para as empresas que se utilizam desses mecanismos e os desenvolvem cada vez mais. Essas afirmações são contundentes, e levam a duas questões que se colocam por trás da relação entre a Internet e as velhas mídias, onde se situam os tradicionais jornais impressos. Em primeiro lugar, a sinergia dos conglomerados globais de mídia e dos grupos nacionais em suas transações com o mundo da tecnologia da informação e das novas redes comunicacionais, e a questão dos jornais brasileiros nessa relação com as novas mídias. A análise destas questões leva aos bastidores da crise midiática que envolve as empresas jornalísticas, onde para tal, além de analisar como grandes grupos internacionais estão desenvolvendo novas tecnologias para o jornalismo, tais como a Google, talvez a maior empresa do ciberespaço na atualidade, busca-se entender como eles se relacionam com os grupos locais de informação e com os novos públicos da era digital. Assim, em segundo lugar, cumpre analisar como esses grupos locais de mídia estão interagindo dentro dessa sinergia onde, por esse caminho, chega-se ao objeto empírico deste estudo: como tudo isso se dá no contexto das empresas brasileiras de mídia. Uma notícia recente do Jornal da Tarde informa[4]: “Só percebe qualquer alteração cultural quem a observa muito de perto, como faz desde julho o jornal MetaNews, mantido pelo Grupo Estado exclusivamente no mundo virtual”. É a presença do velho jornal O Estado de S. Paulo dentro da Internet e dentro do mundo virtual conhecido por Second Life[5]. Já na TV, a propaganda anuncia: “Clique ÃO!”. Por outro lado, o da concorrência, um videocast na web irradia: “Folha OnLine, a credibilidade da Folha na Internet”. Essas informações, que perambulam por todas as mídias, direcionam aos alvos previamente mirados pelo presente estudo, demonstram de forma prática a questão das novas tecnologias e da convergência midiática mencionadas acima, e expõem o estudo empírico levado em conta nesta dissertação. Assim, pesquisa-se como os dois maiores jornais paulistanos, O Estado de S. Paulo e a Folha de S.Paulo, estão sobrevivendo e se adaptando no novo mundo digital binário da Internet, o que, obviamente, leva em conta a análise dos seus respectivos websites, o Estadao.com.br e o Folha Online, onde observam-se as novas práticas desses jornais frente e através do novo meio. É por meio desses dois tradicionais jornais de São Paulo, ou melhor, através dessas duas megacorporações do mundo da notícia nacional, que se tenta entender como a Internet está alterando o mundo da notícia no cenário brasileiro, de forma que se possa analisar tendências para esses veículos dentro desse cenário midiático digital, que se mostra cada vez mais abrangente. Com a junção de todos esses fatores, as análises bibliográficas, os diversos estudos e pesquisas acadêmicas, e somando-se o estudo de caso sobre os dois grandes jornais paulistanos, além das entrevistas com especialistas em Internet e jornalismo, busca-se uma soma cujo extrato aponte tendências para o mundo do jornalismo e sua inserção na “Galáxia da Internet”, inclusive tentando verificar de algum modo se o jornal impresso irá de fato sucumbir diante do novo meio e, enfim, se se pode entender como clarividêntica a afirmação de Baudrillard no parágrafo primeiro desta introdução: irá o ‘cyberespaço’ desertificar o mundo do jornalismo? Na resposta a esta pergunta jaz a nossa hipótese para este estudo: o ‘cyberespaço’ tanto não desertificará o mundo do jornalismo, quanto não relevará à inexistência os tradicionais meios impressos. Para elucidarmos a hipótese acima, esse estudo se estruturará da seguinte forma: Capítulo I – Aborda quais os fatores que fazem a Internet alterar o paradigma comunicacional e como o jornalismo se encaixa nesse novo cenário. Questões como a do espaço público; da crise do jornalismo impresso, que apresenta queda nas tiragens em todo mundo; dos conglomerados internacionais e nacionais de mídia; da convergência e da crise ética são estudadas neste capítulo. Capítulo II – Mostra as novidades do jornalismo através da Internet, conceituando o webjornalismo. Analisa-se o blog como nova ferramenta de veiculação da notícia e como ele se relaciona com o paradigma estudado no capítulo anterior. Também busca-se entender o papel do indivíduo perante as novas mídias. Capítulo III – Analisa-se o jornalismo na atualidade observando-se as novas iniciativas que surgem dentro do ciberespaço, incluindo uma análise da empresa Google, diversos blogs, websites noticiosos e dois grupos midiáticos brasileiros – Estadão e Folha – e seus respectivos sites jornalísticos na web, com entrevistas em profundidade com especialistas nas questões relacionadas.
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