Entre pesquisas e experiências
Falante e sem papas na língua, a professora de moda Maria Claudia
Bonadio revela sua história, recheada de fatos inusitados, com
muito bom humor
Do alto dos seus 1,54m de altura, com uma fivelinha
de flor prendendo a franja de seus cabelos curtos e um par de
óculos modernos, a pesquisadora e professora universitária
Maria Cláudia Bonadio, de 32 anos, morou na cidade de Sorocaba,
onde nasceu, até as vésperas de sua ida à
faculdade, a Unicamp, em Campinas.
Lá cursou História. |
Marcia Claudia Bonadio |
Prestou vestibular também para Jornalismo, pensando em seguir
os passos do pai, Geraldo Bonadio, conhecido jornalista de Sorocaba,
com mais de 30 anos de profissão. Não passou, para felicidade
do pai, que, desencantado com o ofício, não encorajou
a filha a se aventurar pelo mesmo caminho.
No primeiro ano de graduação em História pensou
até em desistir. “Foi terrível, os professores eram
duros, humilhavam mesmo”. Quando surgiram as matérias optativas,
descobriu que a História poderia ajudá-la a resolver questões
de sua própria vida, e se apaixonou pela idéia.
Questões essas que trazem recordações dolorosas.
A mãe, Odete, revelou ser homossexual quando Maria Claudia tinha
cerca de cinco anos de idade. “A imagem que eu tinha da minha
mãe era de uma mulher linda, loira, de cabelo longo e vestido,
superfeminina. De repente, ela chega em casa igual ao Roberto Carlos,
de calça masculina e cabelos curtos”, recorda Claudia,
sem perder o humor.
Em 1977, com a lei que aprova o divórcio, veio a separação,
o segundo casamento do pai e várias mudanças radicais
em sua vida.“Fui discriminada por ter uma mãe tão
fora dos padrões, ainda mais em uma cidade do interior”.
Mães de suas amigas exigiam que se afastassem de Claudia, temendo
talvez que ela fosse vir a ter a mesma orientação sexual
de sua mãe, ou mesmo para evitar falatórios. Nessa época,
Maria Claudia perdeu muitos amigos e bastante de sua auto-estima.
Seu talento como oradora já era conhecido desde a infância,
quando aos sete anos, estudando em colégio de freiras, fez sucesso
contando a história religiosa de São Bento e Santa Escolástica
às irmãs na clausura. Virou a “Irmã Claudinha”,
uma celebridade no colégio. “Era o maior poder!”,
ela recorda sorrindo.
Em meio a altos e baixos, sua adolescência também foi uma
fase difícil. Era uma menina brava e sem amigos, que nem se dava
ao trabalho de cumprimentar as pessoas. Aos 14 anos fez terapia e ficou
mais sociável, voltou a ser paquerada e popular na escola. Porém,
com 21 anos e já na faculdade, teve síndrome do pânico
e depressão. Voltou à terapia, oferecida gratuitamente
aos alunos da Unicamp. “Foi essencial para mim”, conta.
Hoje, Maria Claudia acredita ter superado as más fases, e demonstra
ser uma profissional dedicada. Terminando a tese de Doutorado na Unicamp,
que pretende defender no final deste ano, ela relembra sua trajetória
como bolsista de diversas instituições ao longo de sua
carreira como pesquisadora.
Logo no segundo ano da graduação, fez iniciação
científica e conseguiu uma bolsa pelo CNPq. Desde então,
não parou mais. De 1993 até 2005, foi bolsista da Capes,
Fapesp, CNPq, “e todas as que você puder imaginar”.
Somente agora, em 2005, teve sua carteira profissional assinada pela
primeira vez, como professora do curso de Moda no Senac, onde dá
aulas das disciplinas História da Moda e História da Indumentária
no Brasil.
Maria Cláudia diz que gosta de dar aulas, não se intimida
com alunos difíceis e procura sempre fazer rir e descontrair
a classe. “Se tivesse terminado a graduação em licenciatura
e começado a lecionar em colégio particular, já
estaria ganhando dinheiro há muito tempo. Mas na vida tudo é
escolha, eu optei pela carreira acadêmica, por fazer pesquisa,
então sobrevivia com as bolsas”.
Filhos, por exemplo, são planos para um futuro meio distante,
já que ela não teme “ser uma mãe quase quarentona”.
O namorado de dois anos, Fabiano, apóia a decisão. Ela
se declara uma mulher feliz e realizada, pois está trabalhando
para alcançar seu objetivo de vida, que é se estabelecer
e ser respeitada no meio acadêmico. “Sou a mais jovem professora
do corpo docente”, ela completa, orgulhosa.
Depois que tiver alcançado seu objetivo, pensa em, quem sabe,
até adotar uma criança. “Acho bacana e como minha
história de vida mostra que família a gente constrói,
imagino que seria muito prazeroso adotar um filho”, finaliza.
* Perfil realizado por Maria Eugenia Camargo, Marília Levy e
Fernanda Brandão, alunas do período diurno da disciplina
de Jornalismo Literário ministrada no campus Morumbi no primeiro
semestre de 2005.
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