Este homem é um palhaço
Roberto Freire*
* Revista Realidade, outubro 1966.
Os ônibus param na porta do Teatro João Caetano, em São
Paulo. As crianças de uniforme vão descendo, às
dezenas, e formando filas. Há um brilho de impaciência
nos olhos de cada uma. As professoras do orfanato têm algum trabalho
para encaminhá-las em ordem para o interior do teatro. Mas existe
uma ansiedade tranqüila enquanto se espera o iníco do espetáculo.
Três senhores, vestindo grossos casacos - é uma tarde gelada,
escura e triste - saltam de um carro e dirigem-se rapidamente para a
entrada dos artistas, no fundo do etatro. São parentes. Pertencem
à família Seyssel. O mais velho, Waldemar, pelo jeito
de falar, elegância e porte, maneira polida e educação,
parece um diplomata. Eles sobem as escadas que levam aos camarins. Meia
hora depois, aparecem no palco três palhaços dos mais famosos
e queridos do Brasil: Arrelia, Pimentinha e Henrique.
A criançada aplaude, ri e grita. Depois, em coro, repete junto
com Arrelia e Pimentinha o tradicional cumprimento entre os dois palhaços,
ao ritmo do Zé Pereira:
- Como vai, como vai, como vai; como vai, como vai, vai, vai?
- Eu vou bem!
- Então, muito bem, muito bem, muito bem; muito bem, muito bem,
bem bem!
Sempre participando, batendo palmas, rindo as crianças - chegado
o final do espetáculo - respondem aos acenos dos palhaços.
Mas nessa tarde ainda tem mais: eles descem para a platéia e
vão de fila em fila, cadeira em cadeira, criança em criança,
apertos de mão, abraços, beijos, carinho. Uma menina beija
a ponta arrebitada e de cera do nariz de Arrelia. Nenhuma fica sem um
gesto de amor engraçado e no meio daquela alegria aparece o calor
da amizade verdadeira, muito terna e antiga, da infância por seu
ídolo de sempre: o palhaço.
O senhor Waldemar Seyssel deixa o teatro e entra em seu carro. Antes
que o chofer dê a partida, um dos diretores do orfanato traz um
garoto para junto da janela:
- Obrigado, senhor Waldemar.
O menino também quer agradecer, em nome de seus amiguinhos.
Waldemar Seyssel olha a criança e quase não consegue conter
a emoção. Uma lágrima ameaça escapulir de
seus olhos. Com indisfarcável timidez aperta a mão do
menino. Este estranha-o e não consegue falar. O carro parte.
Depois de um longo silêncio, Waldemar vira-se para Henrique:
- Viu? O Waldemar tem dificuldades para lidar com as crianças.
Se estivesse como Arrelia naquele momento, daria uma cambalhota na calçada
e ficaria rindo junto com o garoto. Não haveria necessidade nenhuma
de agradecimento e ninguém sofreria por precisar de ajuda e querer
ajudar.
Embora vivendo na mesma pessoa, Waldemar Seyssel e Arrelia são
dois homens bastante diferentes. Admiram-se, respeitam-se.
Há muita gratidão de um para outro. Às vezes surgem
problemas nessa amizade de 40 anos, mas não é nada grave
e os dois vão tocando para a frente uma vida inteira dedicada
à alegria de algumas gerações de crianças
brasileiras.
Quem convive com ambos, espanta-se com essas diferenças. E apenas
Waldemar gosta de falar nelas. Arrelia prefere rir de tudo.
- Ele é assim mesmo - explica Waldemar - por isso gosto dele,
e as crianças também. Um palhaço que se preza não
complica as coisas. Ao contrário, reduz tudo à maior simplicidade,
e o que é sério vira brincadeira, o que é triste
se transforma na maior alegria.
E procura estabelecer as diferenças de personalidade entre os
dois. Bem no fundo, acredita ser Waldemar a matéria e Arrelia
o espírito de sua pessoa. Nem todo mundo consegue, quando quer,
a felicidade de ver claramente o próprio espírito e conviver
com ele. Os palhaços conseguem sempre.
Até hoje, Waldemar acha estranha a forma como se transforma em
Arrelia. Pode já estar pintado, vestido, pronto, mas o palhaço
só surge mesmo quando corre a cortina, e ele vê e sente
o público.
- Então - diz Waldemar - é como se o palhaço fosse
um boneco de borrachia vazio que o riso e a alegria repentinamente enchem
de vida. E nunca, por qualquer razão, Arrelia deu lugar a Waldemar
diante do público.
Um famoso poema de Henrich Heine - Dor de Palhaço - conta a história
de um palhaço que não pôde chorar pela morte da
mãe porque a notícia chegou na hora em que ele devia entrar
em cena. Arrelia viveu o mesmo drama. Estava participando de um show
em Petrópolis e fazia uma pantomima aquática. Quando chegava
o momento de se apresentar, soube que sua mãe havia morrido em
Barra do Piraí, não muito longe dali, no Estado do Rio
mesmo. Arrelia fez o espetáculo, e o público - comentaram
depois seus colegas - riu como nunca havia rido com aquelas cenas.
É espantoso - diz Waldemar - como não consegui me lembrar
no dia seguinte e, mesmo até hoje, do que fiz naqueles momentos.
Talvez seja resultado do esforço desesperado para impedir que
o Arrelia soubesse do acontecido.
Waldemar reconhece que às vezes é egoísta. Mas
Arrelia nunca foi, nem se queixa do fato de ter sido sempre explorado
por ele. Tudo o que Waldemar tem de melhor na vida veio do palhaço:
dinheiro, conforto, amigos, fama, as grandes alegrias humanas e profissionais.
- E eu só o faço trabalhar para mim, queira ele ou não,
como um empresário exigente, implacável - confessa Waldemar,
com um sorriso meio encabulado.
Porém, talvez para se aliviar de um sentimento de culpa, faz
uma ressalva:
Em compensação, só eu vivo com as preocupações
e os problemas do empresário; certamente por isso o Arrelia me
perdoa o egoísmo.
Waldemar sente também um certo complexo de inferioridade em relação
ao palhaço que inventou, pois ninguém o julga capaz de
fazer qualquer coisa bem feita de cara limpa. E Arrelia é espertíssimo,
em tudo, muito malicioso, rápido, sabe mágicas, faz acrobacias,
doma bichos, tapeia quem quer tapeá-lo e sai sempre por cima
em qualquer situação. Já Waldemar é péssimo
para negócios, muito tímido, atrapalha-se diante dos outros
e, acima de tudo, não tem graça nenhuma. Quanto às
suas dificuldades para realizar acrobacias de circo na vida de todos
os dias encontra uma desculpa:
- Eu tenho 60 e ele só 40 anos ...
Há um único momento em que consegue identificar-se com
a sua outra metade - é quando escreve ou inventa quadros, cenas
ou piadas para o palhaço. Mas, mesmo assim, a identificação
é apenas parcial, pois o Arrelia muda tudo no picadeiro, em função
do público. Por exemplo, se vê alguém triste ou
sério na platéia, o palhaço só trabalha
e faz graça para esse alguém; até fazê-lo
rir. E Waldemar, no escritório, diante da máquina de escrever,
não pode prever isso.
Como quase todo mundo, Waldemar Seyssel precisa e gosta de dinheiro.
Não gasta muito e arrisca pouco. Arrelia, ao contrário,
é famoso apostador, mesmo sem ter com o que pagar. À menor
dúvida em relação a qualquer de suas afirmações,
entra logo com a pergunta:
- Quer apostar?
No amor também são opostos. Em 1967 Waldemar completa
25 anos de casado. Tem quatro filhos e sete netos. Foi muito feliz neste
casamento, gosta de ficar em casa e é bom marido. Só viaja
acompanhado da mulher, com quem conheceu todo o Brasil, boa parte da
Europa e dos Estados Unidos.
Arrelia é solteiro, malandro, sempre às voltas com mil
mulheres; quando apaixonado é romântico, amoroso. Confiante
ao extremo, quase sempre sai mal em suas paixões. Mas não
desiste e não se corrige. É um sonhador, e jamais saiu
do Brasil.
Waldemar nunca fumou. Arrelia é grande fumador de cigarros, cachimbo
e charutos. Waldemar é um bom garfo, mas Arrelia é um
comilão terrível não pode ver uma banana na mão
de alguém que já quer um pedaço e, se bobearem,
ele come tudo. Numa coisa estão de acordo: nenhum dos dois gosta
de falar de politica.
Waldemar, antes de entrar para o circo, estudou até o último
ano de Direito na Faculdade do Largo de São Francisco, em São
Paulo. Leu bastante e em sua biblioteca misturam-se os clássicos
e os autores brasileiros contemporâneos. Procurando inspiração
para suas famosas comedinhas, lê histórias infantis de
todos os tempos e contos policiais e ficção científica.
Há pouco adaptou César e Cleópatra, de Bernard
Shaw. E, com um sorriso, diz que obrigou o palhaço a fazer o
papel dos dois personagens.
O sorriso de Waldemar se transforma numa boa risada quando ele lembra
uma situação embaraçosa em que colocou o palhaço.
Só que desta vez foi sem querer: no dia da primeira apresentação
pública da televisão em São Paulo, Arrelia fazia
parte do show que era apresentado de hora em hora para um único
aparelho receptor instalado no Clube de Engenharia, na rua Líbero
Badaró. O povo fazia fila, e a cada hora um grupo tinha a oportunidade
de ver o que era a televisão. As transmissões eram feitas
do Hospital das Clínicas. Durante um dos intervalos, de cara
pintada, Arrelia debruçou-se no terraço do primeiro andar
do hospital para espiar a rua, distraído. Nisso ia passando um
casal de velhos, de braços dados. A mulher olhou para cima e
na mesma hora cutucou o marido:
- Olha só, Tonho! Que doença feia a do coitado daquele
moço!
Waldemar Seyssel pertence à terceira geração de
uma ilustre família circense da França.
Augusto, o avô de Waldemar, que iniciou essa tradição,
era de origem burguesa. Seus pais, gente muito rica e importante, deserderam-no
quando - tornando realidade uma expressão muito usada - fugiu
com a bailarina de um circo que passou por sua cidade. E fêz-se
palhaço. Os Seyssel vieram para o Brasil em 1886, numa excursão
do então famoso Circo Fernandez.
Depois de algum tempo, resolveram criar seu próprio circo.
Fernando, pai de Waldemar, logo tornou-se chefe do clã. Era palhaço
também. Usava o nome de Pinga-Pulha e trabalhava em dupla com
Puxa-Puxa, seu irmão. Daí surgiria um circo que ia ficar
célebre: Irmãos Seyssel.
O aprendizado da arte e técnica circense sempre passou de pai
para filho. Com os Seyssel não foi diferente. E o treinamento
era diário, puxado. Como a vida do circo era estar um dia numa
cidade, no dia seguinte em outra - sempre viajando - da companhia fazia
parte um professor, contratado para alfabetização e ensino
de Humanidades às crianças. Todo ano elas prestavam exames
nas escolas oficiais, recebendo certificados no fim dos cursos. As viagens
acrescentaram outro detalhe à família de Fernando: seus
dez filhos nasceram cada um num Estado. Waldemar nasceu no Paraná
e era o mais tímido e sem jeito para o circo.
Aprendera as técnicas e fora iniciado nas artes, porém
- como não mostrasse interesse ou pendor especial algum - conseguia
escapar das excursões. Então ficava em Campinas, estudando
e fazendo companhia à sua mãe doente. Encontrava-se com
o resto da família apenas quando o circo voltava a Campinas ou
parava em São Paulo.
Em 1927, Fernando também adoeceu: o circo estava sem o palhaço
principal. Foram feitas várias tentativas com outros membros
da família, mas ninguém correspondia ao que Fernando esperava
de uma atração máxima.
Foi quando ele pensou em Waldemar. De comum acordo com os irmãos,
filhos e sobrinhos, resolveu fazer uma experiência com o rapaz.
Mas, conhecendo a falta de interesse e a provável recusa do filho,
traçou um plano. A família toda aprovou-o. No dia marcado,
Waldemar foi convidado para assistir aos espetáculo por detrás
da cortina. No meio do show, o plano entrou em execução:
Waldemar foi agarrado à força e, enquanto esperneava e
gritava, empoaram-lhe o rosto, vestiram-lhe roupas largas e coloridas
e atiraram-no no meio do picadeiro. Foi um tremendo tombo, de mau jeito.
Apavorado e com o corpo dolorido, ele se viu cercado por todos os palhaços
que riam, faziam micagens e davam-lhe pontapés e tapas. Só
com a queda espetacular e extra-programa, o público já
havia caído na gargalhada. Cheio de raiva, Waldemar levantou-se,
foi em cima de um dos palhaços, agarrou-o pela roupa e deu-lhe
violento bofetão. Novas gargalhadas. Mas o palhaço não
gostou do tapa e avançou furioso. O jeito era fugir. Desorientado,
em lugar de sair pelo fundo, Waldemar, perseguido, saltou para o meio
do público, que ria sem parar. Quando conseguiu chegar ao camarim,
exausto e com o corpo todo tremendo, ouviu estrepitosa salva de palmas.
O pai foi buscá-lo e os aplausos só iam parar depois que
ele reaparecesse no picadeiro. O sucesso foi tão grande que seu
primo - o palhaço que levou o bofetão - de cara inchada,
foi abraçá-lo, comovido. Acabava de nascer um grande palhaço
naquela tarde de 1927, no Largo do Cambuci, em São Paulo.
- Até hoje sinto a dor daquele tombo, o medo do palhaço
que agredi, minhas primeiras risadas e meus primeiros aplausos.
Mas foi mais para cumprir seu dever com a família do que pelo
sucesso dolorido da primeira aparição pública que
Waldemar resolveu aceitar o desafio: seria um palhaço, sim, porém
também alguma coisa diferente e nova.
No outro dia, como era impossível lembrar a máscara que
lhe haviam feito às pressas e aos trancos, Waldemar resolveu
estudar outra. Começou pela cabeleira. Não recordar como
era a original, mas escolheu os desenhos e cores para rosto em função
dela.
O nariz começou enorme e ele foi diminuindo-o sempre, até
chegar à atual ponta vermelha arrebitada. Depois vinha a boca.
Estudando sua própria fisionomia, notara a necessidade de um
ponto móvel no rosto que servisse de atração imediata
para o público. Seu lábio superior é longo. Falando
diante do espelho, percebeu que movimentava-o exageradamente. Então
era por ali - se bem valorizado pela pintura - que forçaria o
público a prestar atenção à sua figura cômica.
Aumentou o beiço com tinta branca. Com um pouco de cor roxa,
alargou o lábio inferior também. Os olhos são pequenos.
Para destacá-los, precisava levantar as sobrancelhas. Inventou
uma, curta, loira, com os pelos eriçados, aplicados no meio da
testa. Duas manchas laterais vermelhas na face, unindo os olhos, orelhas
e quase chegando ao beiço branco e estava pronta a cara.
No começo, usou colarinho grande, luvas enormes, e grossa bengala.
Mas tudo isso o incomodava, prejudicando o tipo de graça que
se sentia capaz de fazer e que pedia muito pouco desses acessórios
tradicionais. Entretanto, o pai gostava deles e Waldemar não
o queria ferir. A solução foi ir perdendo essas coisas,
uma a uma. Também as roupas, que eram especiais e largas, ele
foi substituindo por menores e, finalmente, passou a usar ternos comuns.
A bengala foi trocada por uma de tamanho normal. Ficou somente a gravata
de boêmio do século passado, porque Waldemar sente na personagem
do Arrelia uma ingênua vaidade fora do tempo.
Os gestos, curtos, rápidos, acompanham a mímica facial
- Arrelia está em constante movimento, como os meninos inquietos
e levados. É na maneira de falar, entretanto, que mais se caractertiza.
Desde o começo achou necessário encontrar alguma forma
de dizer qualquer coisa banal e fazer rir também. Descobriu-a
em Piraçununga, em 1930. Andava por uma rua quando passou sobre
a cidade, em vôo baixo, um teco-teco. Uma mulher saiu correndo
para a calçada e começou a gritar:
- Vem Veulta! Vem ver o orolplauno! Vem Veulta! Noulssa Senhoulra, pareulce
um urubulzão!
Waldemar achou tão gozado e riu tanto do jeito da mulher falar
que tratou logo de travar amizade, só para ouvi-la. E conseguiu,
mas era dificil disfarçar o riso ouvindo-a contar caulsos.
A forma de falar marcou o palhaço definitivamente. Certa vez,
recebendo homenagem na Escola Normal de Campinas, ele foi saudado por
uma moça num longo discurso. Começava assim:
- Noulsso queriuldo Arreulia!
Na criação de seu palhaço, Waldemar só
não planejou um detalhe cômico que nasceu naturalmente:
é aquele em que Arrelia interrompe subitamente sua própria
fala e sorve o ar intensamente, de boca aberta. Sua entrada repentina
para o circo não lhe havia dado tempo para estudar dicção.
Assim, não respirava corretamente, sendo obrigado a buscar fôlego
no meio das frases. Até que um dia resolveu treinar respiração
para as falas. Mas quando começou a caprichar, um admirador e
amigo procurou-o após o espetáculo:
-Ah, Arrelia, por que você não faz mais aquelas engolidas
de ar tão engraçadas no meio das palavras?
Deixou a dicção de vez.
Waldemar Seyssel abandonou o circo em 1952, quando o seu pegou fogo.
Estavam no Vale do Anhangabaú. Ele já vinha fazendo show
em rádio e teatro, com enorme sucesso, enquanto a situação
financeira dos circos em geral era péssima. Waldemar acha que
essa decadência da arte circense começou com a introdução
dos dramalhões e a utilização do palco sobre o
picadeiro. Isso desvirtuava o verdadeiro sentido do circo, mas com o
passar do tempo era inevitável, principalmente pelo alto custo
da produção de um bom espetáculo.
Hoje, por menos de 100 milhões de cruzeiros não se monta
um circo razoável. A folha de pagamento semanal de uma companhia
completa chega a cinco milhões. E os ingressos, por se tratar
de espetáculo eminentemente popular, não podem custar
mais de quinhentos cruzeiros nas gerais e mil nas cadeiras. Como as
possibilidades de lucro comprensador passaram a ser mínimas,
famílias inteiras de gente de circo foram deixando o Brasil,
enquanto artistas famosos se transferiram para o musicado, para o cinema
e para a televisão: o próprio Waldemar, Oscarito, Walter
Stuart, Ankito, Walter D´Avila, Colé.
Começando na Televisão Paulista e passando depois para
a Record - onde está há 14 anos, aos domingos - o Circo
do Arrelia sempre fez enorme sucesso.
Nos seus dias de folga, Waldemar Seyssel apresenta-se de graça
com os seus companheiros inseparáveis Pimentinha e Henrique -
em favor de obras e campanhas dedicadas às crianças pobres
e doentes. Ele ainda tem esperança no futuro do circo no Brasil,
mas apenas se for aprovado um projeto de lei que um dia entregou a um
deputado e que parece esquecido. Sua idéia é a de criação
de uma escola para a formação do profissional circense,
na qual todos os grandes artistas e homens de circo transmitiriam seu
conhecimento e experiência. Surgiriam então as novas gerações
de equilibristas, mágicos, malabaristas, trapezistas, palhaços,
tudo. As crianças dos asilos e orfanatos, aparentemente sem futuro,
poderiam se transformar em grandes artistas, ou pelo menos, ter uma
profissão.
Com novos profissionais e uma equipe de artistas bons e bem formados,
poderiam surgir os circos oficiais que os utilizariam como é
feito em outros países. Para Waldemar, o Circo de Moscou é
um exemplo da vitalidade universal dessa arte quando corretamente protegida:
é o último sonho do Arrelia e a esperança do Waldemar.
- Estou envelhecendo e gostaria de deixar o Arrelia como herança
para um desses garotos de orfanato que a gente faz rir em espetáculos
beneficientes ou para qualquer um daqueles que o Waldemar encontra à
noite dormindo nas calçadas. Mas apenas com a Escola isso seria
possível.
Só quando pensa essas coisas, Waldemar é Arrelia, mas
não parece um palhaço.
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