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Dissertação de Mestrado - Texto Completo |
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INTRODUÇÃO “Enquanto Freud explica, o Diabo dá os toque” – Raul Seixas O estudioso espanhol Manuel Castells afirma que ingressamos agora num novo mundo de comunicação, a “Galáxia da Internet”. O francês Pierre Lévy[1] expõe que o consumidor não apenas se torna coprodutor da informação que consome, mas é também produtor cooperativo dos “mundos virtuais” nos quais evolui dentro desta Galáxia. Já o seu compatriota Jean Baudrillard adverte que o cyberespaço determina a desertificação sem precedentes do espaço real e de tudo o que nos cerca. Por fim, o canadense Marshall McLuhan filosofa sobre o novo transformando o seu predecessor em forma de arte. No meio de todas essas colocações, um ingrediente da sociedade contemporânea vagueia de um lado para o outro, o Jornalismo. Conforme anunciou o espanhol, evoluímos da Galáxia de Gutenberg (de McLuhan) para a Galáxia da Internet. Estamos na era da informação e, nessa nova era, uma tradicional instituição está em xeque, o jornalismo, como mencionado. Soberano em sua atuação na sociedade desde os idos da prensa gráfica de Gutenberg, hoje o jornalismo sofre rupturas em suas fundações seculares. A era da informação altera velhos paradigmas em que essa instituição se alicerçou, subvertendo, através da Internet, o papel que antes era praticamente exclusivo dessa habilitação comunicacional. Assim demonstram alguns estudos dos nomes citados no parágrafo anterior, e não só, são questões que vários estudiosos estão analisando e que são usadas para fundamentar a pesquisa dissertativa que segue. Nessa nova era da informação, onde a Internet é o mais novo meio atuando na grande cena midiática do mundo globalizado, o jornalismo também ganha novos horizontes e busca o seu espaço através da grande rede e, assim, apresenta a sua nova metamorfósica evolução, o webjornalismo, ou jornalismo digital, como muitos a ele se referem. Dentro dos novos paradigmas do mundo conectado pela “rede das redes”, o jornalismo também nela se conecta e, dessa forma, neste trabalho também se analisa como é essa nova prática jornalística, como se dá essa nova mutação do jornalismo sob a forma do webjornalismo, o que ele agrega ao tradicional, no que ele inova. São perguntas necessárias quando se busca entender o contexto onde o novo é coator do tradicional dentro dessa nova era de informação incontrolável e abundante que nos traz a Internet, pois agora “tudo está interligado”, como nos diz a especialista em mídia digital Beth Saad. Sim, tudo está interligado, inclusive o jornalismo. Nesse novo paradigma do webjornalismo, algumas palavras-chave a ele associadas – não linearidade, fisiologia, instantaneidade, dirigibilidade, qualificação, custos de produção e de veiculação, interatividade, pessoalidade, acessibilidade, receptor ativo, usabilidade e inovação – são guias que nos levam aos fundamentos do jornalismo na Internet e que permeiam diversos estudos, dentre os quais os do comunicólogo J. B. Pinho, do jornalista Mike Ward e da ex-diretora da unidade de Internet da Editora Globo e diretora de conteúdo do Portal iG, Pollyana Ferrari, que levamos em conta neste trabalho. Dentre essas novas relações propiciadas pelo incipiente ambiente digital, este estudo procura ir além e saber como elas estão alterando a construção do espaço público, já que, no atual momento, o cidadão estaria mais próximo da informação e suas fontes, como afirma o professor de ética jornalística Eugênio Bucci. Assim, com toda essa informação disponibilizada, a Internet estaria criando um novo “espaço público conectado”, conforme termo utilizado pelo “guru” norte-americano da Internet Yochai Benkler, que concerne à instituição jornalística como um todo, seja na web, seja na TV ou no jornal (e na relação conjuntural dessas mídias). Como essa nova esfera estaria se constituindo é algo que este estudo também busca analisar. Nessa esteira, interessa averiguar como se dá a relação do público com o jornalismo dentro desse novo paradigma e vice-versa. Também se busca elucidar como o leitor/usuário é “coprodutor” dentro desse novo espaço digital da notícia, conforme apontado por Lévy no parágrafo inicial desta Introdução. Sobre as mudanças na relação entre o público e a notícia, um estudo do professor e jornalista Rosental Calmon Alves traz à tona dados relevantes, que demonstram como o usuário da Internet, êle, é em grande parte o responsável pela ruptura que está pondo abaixo os pilares da mídia. A consulta a esse estudo e outros semelhantes, para entender a questão das novas mídias[2], é parte de como esta pesquisa analisa a convergência que acontece em relação aos meios comunicacionais e sua binarização/conexão junto à Internet (com foco na questão jornalística), que não é um fator tão somente tecnológico mas, também, comportamental, do público em relação às novas mídias. Dentro dessa convergência, novas iniciativas aparecem, novas tecnologias que vão sendo utilizadas tanto pelos jornalistas e suas tradicionais instituições noticiosas quanto pelo público como, por exemplo, o fenômeno da blogosfera. Nesta questão dos blogs, uma pesquisa inglesa comissionada pela emissora Sky[3] aponta que um em cada dez jovens tem o hábito de escrever para um diário oficial, enquanto 47% deles escrevem em blogs (dados referentes ao público inglês). A pesquisa apontou ainda que esses jovens gastam cerca de 4,5 horas semanais entre blogs ou sites de distribuição de conteúdo online, tais como Youtube, Myspace e similares. Cerca de 22% desse público têm o hábito de escrever em seus blogs, ou “diários virtuais”, cerca de cinco dias por semana. Esses dados são relevantes e demonstram parte do escopo desta pesquisa, que analisa não somente a questão dos blogs como nova expressão da convergência do público sobre o mundo da notícia, mas também diversos outros recursos e tecnologias – novas soluções –, como as exemplificadas nessa pesquisa da Sky e outras, que vão se amoldando em torno do jornalismo e modificando a relação deste com o público e a postura deste último frente ao mundo da informação. Entretanto, está na afirmação de McLuhan uma das grandes questões que pairam sobre o jornalismo na era da informação. Na medida em que a Internet traz um novo paradigma para o jornalismo, ela transforma velhas práticas dessa instituição em arte, o que parece muito romântico. Porém, nesse caminho ao “estado da arte jornalística”, pode estar a explicação para a crise vivida pelos jornais impressos na atualidade, atônitos, em busca de sua vocação artística, já que a informativa, a sua função fundamental até então, está sendo solapada pela Internet. Será? Este é outro fator que este estudo procura desvendar. Dentro das práticas jornalísticas afetadas pela nova mídia, o tradicional jornal impresso, especialmente seus grandes e mais antigos veículos, estaria em vias de extinção dada a introdução da Internet no mundo da informação. Essa profecia apocalíptica é alvo de um estudo do professor e pesquisador da University of North Carolinia, além de jornalista e experiente estatístico, Philip Meyer, que foi debatido pela revista inglesa The Economist, em matéria que causou frisson no mundo profissional e acadêmico do jornalismo. A edição de agosto de 2006 da revista estampou em sua capa: “Who Killed the Newspaper?” (Quem matou o jornal?). No corpo da revista, um parágrafo profetiza:
Se o jornal impresso tende a desaparecer ou ser relevado a um segundo plano em relação à Internet, a análise dessa questão é algo que o presente estudo busca levar em conta, tentando verificar até onde vai a sua veracidade, pretendendo entender até que ponto a Internet influi na crise dos jornais impressos, se ela pode mesmo ser responsabilizada pelo “iminente assassínio do jornal impresso”. Estudos do professor de ética jornalística e ex-diretor fundador do portal UOL Caio Túlio Costa, demonstram a dificuldade das empresas tradicionais de comunicação lidarem com essa nova emergência midiática, em especial a Internet. O professor enfatiza que, apesar das várias opções de jornais digitais de que dispomos hoje na rede, especialmente os brasileiros e ligados às instituições tradicionais, nenhum deles ainda compreendeu os mecanismos de interatividade disponíveis pelas tecnologias de informação da Internet e, por isso, tendem a perder terreno para as empresas que se utilizam desses mecanismos e os desenvolvem cada vez mais. Essas afirmações são contundentes, e levam a duas questões que se colocam por trás da relação entre a Internet e as velhas mídias, onde se situam os tradicionais jornais impressos. Em primeiro lugar, a sinergia dos conglomerados globais de mídia e dos grupos nacionais em suas transações com o mundo da tecnologia da informação e das novas redes comunicacionais, e a questão dos jornais brasileiros nessa relação com as novas mídias. A análise destas questões leva aos bastidores da crise midiática que envolve as empresas jornalísticas, onde para tal, além de analisar como grandes grupos internacionais estão desenvolvendo novas tecnologias para o jornalismo, tais como a Google, talvez a maior empresa do ciberespaço na atualidade, busca-se entender como eles se relacionam com os grupos locais de informação e com os novos públicos da era digital. Assim, em segundo lugar, cumpre analisar como esses grupos locais de mídia estão interagindo dentro dessa sinergia onde, por esse caminho, chega-se ao objeto empírico deste estudo: como tudo isso se dá no contexto das empresas brasileiras de mídia. Uma notícia recente do Jornal da Tarde informa[4]: “Só percebe qualquer alteração cultural quem a observa muito de perto, como faz desde julho o jornal MetaNews, mantido pelo Grupo Estado exclusivamente no mundo virtual”. É a presença do velho jornal O Estado de S. Paulo dentro da Internet e dentro do mundo virtual conhecido por Second Life[5]. Já na TV, a propaganda anuncia: “Clique ÃO!”. Por outro lado, o da concorrência, um videocast na web irradia: “Folha OnLine, a credibilidade da Folha na Internet”. Essas informações, que perambulam por todas as mídias, direcionam aos alvos previamente mirados pelo presente estudo, demonstram de forma prática a questão das novas tecnologias e da convergência midiática mencionadas acima, e expõem o estudo empírico levado em conta nesta dissertação. Assim, pesquisa-se como os dois maiores jornais paulistanos, O Estado de S. Paulo e a Folha de S.Paulo, estão sobrevivendo e se adaptando no novo mundo digital binário da Internet, o que, obviamente, leva em conta a análise dos seus respectivos websites, o Estadao.com.br e o Folha Online, onde observam-se as novas práticas desses jornais frente e através do novo meio. É por meio desses dois tradicionais jornais de São Paulo, ou melhor, através dessas duas megacorporações do mundo da notícia nacional, que se tenta entender como a Internet está alterando o mundo da notícia no cenário brasileiro, de forma que se possa analisar tendências para esses veículos dentro desse cenário midiático digital, que se mostra cada vez mais abrangente. Com a junção de todos esses fatores, as análises bibliográficas, os diversos estudos e pesquisas acadêmicas, e somando-se o estudo de caso sobre os dois grandes jornais paulistanos, além das entrevistas com especialistas em Internet e jornalismo, busca-se uma soma cujo extrato aponte tendências para o mundo do jornalismo e sua inserção na “Galáxia da Internet”, inclusive tentando verificar de algum modo se o jornal impresso irá de fato sucumbir diante do novo meio e, enfim, se se pode entender como clarividêntica a afirmação de Baudrillard no parágrafo primeiro desta introdução: irá o ‘cyberespaço’ desertificar o mundo do jornalismo? Na resposta a esta pergunta jaz a nossa hipótese para este estudo: o ‘cyberespaço’ tanto não desertificará o mundo do jornalismo, quanto não relevará à inexistência os tradicionais meios impressos. Para elucidarmos a hipótese acima, esse estudo se estruturará da seguinte forma: Capítulo I – Aborda quais os fatores que fazem a Internet alterar o paradigma comunicacional e como o jornalismo se encaixa nesse novo cenário. Questões como a do espaço público; da crise do jornalismo impresso, que apresenta queda nas tiragens em todo mundo; dos conglomerados internacionais e nacionais de mídia; da convergência e da crise ética são estudadas neste capítulo. Capítulo II – Mostra as novidades do jornalismo através da Internet, conceituando o webjornalismo. Analisa-se o blog como nova ferramenta de veiculação da notícia e como ele se relaciona com o paradigma estudado no capítulo anterior. Também busca-se entender o papel do indivíduo perante as novas mídias. Capítulo III – Analisa-se o jornalismo na atualidade observando-se as novas iniciativas que surgem dentro do ciberespaço, incluindo uma análise da empresa Google, diversos blogs, websites noticiosos e dois grupos midiáticos brasileiros – Estadão e Folha – e seus respectivos sites jornalísticos na web, com entrevistas em profundidade com especialistas nas questões relacionadas. Capítulo I - O NOVO PARADIGMA DA INTERNET “I'm no puppeteer. I don't make things happen. I only set the stage; you put your own streams” – Devil’s talking[6] Neste capítulo buscamos entender a mudança do paradigma comunicacional a partir da introdução da Internet no contexto midiático contemporâneo. Ao longo dessa análise, veremos como tal mudança se relaciona com o jornalismo. Como ela altera o espaço público e leva o jornalismo a uma crise geral: jornais impressos perdem leitores, a ética se coloca em cheque e, até mesmo, a identidade jornalística estaria se perdendo, segundo algumas visões. Mas, antes de tudo, vamos esclarecer o que vem a ser paradigma. Segundo o dicionário Michaelis, um paradigma é um modelo, padrão ou protótipo. O dicionário ainda define a palavra como sendo um “conjunto de unidades suscetíveis de aparecerem num mesmo contexto, sendo, portanto, comutáveis e mutuamente excludentes. No paradigma, as unidades têm, pelo menos, um traço em comum (a forma, o valor ou ambos) que as relaciona, formando conjuntos abertos ou fechados, segundo a natureza das unidades”. Quem aborda o conceito de paradigma com profundidade é o estudioso Thomas Kuhn. Ele parte de uma definição de Platão (428-347 a.C.), filósofo da Grécia Antiga, que entende paradigma como algo muito semelhante a um tipo de modelo. Mas Kuhn não pára seu estudo numa única definição, ele utiliza o conceito como amparo para o próprio estudo científico. O modelo, nesse entendimento, se transforma num mapa, numa espécie de guia que serve para embasar diversos estudos em seus respectivos campos. Um ponto interessante do estudo de Kuhn refere-se à ruptura de um paradigma: “(...) quando a comunidade científica repudia um antigo paradigma, renuncia simultaneamente à maioria dos livros e artigos que o corporificam, deixando de considerá-los como objeto adequado ao escrutínio científico” (Kuhn, 2003:209). O estudioso português Boaventura Sousa Santos, em livro intitulado Introdução a uma ciência pós-moderna, discute a questão de ruptura de paradigma. Com base no pensamento kuhniano, ele se pergunta se a crise atual da ciência relacionada à ruptura de paradigma (que, no nosso caso, volta-se ao terreno da comunicação e, mais especificamente, a habilitação em jornalismo), pode ser considerada de crescimento: Têm lugar ao nível da matriz disciplinar de um ramo da ciência, isto é, revelam-se na insatisfação perante métodos ou conceitos básicos até então usados sem qualquer contestação na disciplina, insatisfação que, aliás, decorre da existência, ainda que por vezes apenas pressentida, de alternativas viáveis (...) a reflexão epistemológica é a consciência da punjança da disciplina em mutação e, por isso, é enviesada no sentido de afirmar e dramatizar a autonomia do conhecimento científico em relação às demais formas e práticas do conhecimento (Santos: 1989:18-19). Ou de degenerescência, essa sim, de fato, de mudança completa de paradigma: “(...) são crises do paradigma, crises que atravessam todas as disciplinas, ainda que de modo desigual, e que as atravessam de um modo mais profundo” (Santos: 1989:19). Assim, buscaremos entender se a mudança do paradigma comunicacional é algo que pode ser entendida como positivo, trazendo uma evolução, um crescimento para o ramo jornalístico, ou é de ruptura, levando tal habilitação a uma degenerecência de seus valores e teorias – de modificação completa de seus alicerces. Seria o cenário atual da comunicação relacionado a qual tipo de ruptura? A compreensão da questão do paradigma comunicacional dentro da era da informação digital mostra-se fundamental para lançarmos uma luz sobre essa questão ao fim deste estudo. A pesquisadora e livre-docente em Ciências da Comunicação Beth Saad (ECA/USP), em Estratégias para a mídia digital, citando Clayton M. Christiansen (The innovators dilemma, p. XV), vê a Internet como um novo paradigma comunicacional que causa uma ruptura no setor midiático, “que, em curto prazo, piora a performance do produto ou serviço que a empresa informativa possui, pois seus indicadores de desempenho são típicos da mídia tradicional (aferição de circulação e/ou audiência) não sendo adequados à inovação digital” (Saad, 2003:47). Saad procura, em seu estudo, estabelecer uma série de estratégias que as empresas de mídia devem adotar para tirar o melhor proveito dos negócios provenientes do novo ambiente digital, além de analisar quais são as estratégias adotadas por diversas empresas nesse setor. A definição de Kuhn, o questionamento de Santos e a afirmação de Saad nos remetem ao objetivo que buscamos atingir neste primeiro capítulo: entender como se dá a ruptura do paradigma comunicacional a partir do surgimento das novas tecnologias binárias e interconectadas. Para entender essa ruptura e saber qual é esse novo paradigma, vamos também refletir sobre algumas dessas mudanças que, no seu conjunto, alteram o paradigma comunicacional. 1. A Nova Relação Midiática: Internet e Jornalismo “I’ll take the bricks out of your shoulder. I’ll give you pleasure” – Devil’s talking[7] Virtualização e Atualização Para entendermos como a Internet está alterando os paradigmas comunicacionais e estes, por sua vez, estão alterando o jornalismo como um todo, buscamos analisar essa nova mídia por variados conceitos de diversos estudiosos, o que vai muito além de olhar (ou navegar) para o novo meio apenas como mais um veículo midiático a nós disponível. O primeiro estudioso a quem recorremos é aquele que mencionamos logo na introdução deste estudo, o filósofo francês Pierre Lévy. Segundo os conceitos discutidos por Lévy em sua obra O que é virtual, a Internet é o “mundo virtual”, pois neste mundo nada é definitivamente concreto, as páginas e os sites na World Wide Web – ou simplesmente web[8] – estão sempre em processo de atualização, principalmente por serem construídos por milhares de operários que nesse espaço interagem. A definição do “mundo virtual” de Lévy vai além de uma simples referência à Internet, é uma chave que conduz e abrange parte de todas suas teorias relativas ao mundo virtual e de como este está alterando a sociedade atual: Um movimento geral de virtualização afeta hoje não apenas a informação e a comunicação, mas também os corpos, o funcionamento econômico, os quadros coletivos da sensibilidade ou o exercício da inteligência (...) trata-se de uma onda de fundo que ultrapassa amplamente a informatização (Lévy, 1996:11). Outro fator que nos diz que a Internet é o “mundo virtual” está no simples fato de que, quando interagimos com esse mundo, seja através da navegação por páginas web, ou por outro protocolo qualquer de comunicação disposto na rede, estamos interagindo com representações gráficas e numéricas da informação, e não diretamente com a informação armazenada nos diferentes computadores da rede, pois esta informação é binária, matemática. Nós interagimos com a atualização de informações binárias que adquirem formas de palavras, gráficos, sons e imagens. No processo inverso, enviamos as nossas informações com comandos reais, um endereço de um site que digitamos, um clique com o mouse em um hipertexto etc., porém a informação que parte à rede é binária, portanto virtualizada, uma representação numérica de uma linguagem real e identificável pelo homem, daí a Internet ser o mundo virtual. Lévy também enfatiza que o termo virtual vai muito além da sua definição mais comum, atribuído ao mundo das possibilidades e, mais atualmente, à própria Internet. Para ele, o virtual e a virtualização vão muito além disso. Dentro da amplitude do termo, Lévy define o virtual como um processo oposto e vinculado a outro processo, que ele chama de atual: Já o virtual não se opõe ao real, mas sim ao atual. Contrariamente ao possível, estático e já constituído, o virtual é como o complexo problemático, um nó de tendências ou de forças que acompanha uma situação, um acontecimento, um objeto ou uma entidade qualquer, e que chama um processo de resolução: a atualização (Lévy, 1996:16). A atualização, segundo Lévy, é um processo de questionamento, no qual idéias, teorias ou entidades são atualizadas e, assim, levadas a novas realizações concretas, a busca, a quebra e o estabelecimento de novos paradigmas, como ele bem coloca: “A atualização aparece então como a solução de um problema, uma solução que não estava contida previamente no enunciado. A atualização é a criação, invenção de uma forma a partir de uma configuração dinâmica de forças e de finalidades” (Lévy, 1996:16). Sendo a virtualização um processo vinculado e inverso à atualização, poderíamos entendê-la como um processo de onde o real, o concreto, passa ao conjunto das possibilidades. Porém não é exatamente isso que Lévy expõe sobre a virtualização. Para ele a relação do virtual com o real e o atual se dá da seguinte forma: “O real assemelha-se ao possível; em troca, o atual em nada se assemelha ao virtual: responde-lhe” (Lévy, 1996:17). E, para ficar clara sua posição, ele a exemplifica: “Virtualizar uma entidade qualquer consiste em descobrir uma questão geral à qual ela se relaciona, em fazer mutar a entidade em direção a essa interrogação e em definir a atualidade de partida como resposta a uma questão particular” (Lévy, 1996:18). Portanto, para Lévy, uma entidade ou qualquer outra representatividade no mundo virtual se entende como um corpo em contínuo processo de mutação, o que ele coloca na seguinte passagem: “(...) a virtualização da empresa consiste (...) em fazer das coordenadas espaço-temporais (...) um problema sempre repensado e não uma solução estável” (Lévy, 1996:18). Fica claro então, que o virtual é o que surge de um processo de virtualização, o processo inverso da atualização: “A virtualização pode ser definida como o movimento inverso da atualização” (Lévy, 1996:17), enfatiza o francês. A virtualização remota o inventivo de uma solução a uma problemática. O atual, a solução particular de um problema no aqui agora se virtualiza e se torna existente. Tendo esses pontos em mente, então, temos a definição do que é virtual, para Lévy: “(...) o virtual constitui a entidade: as virtualidades inerentes a um ser, sua problemática, o nó de tensões, de coerções e de projetos que o animam, as questões que movem, são uma parte essencial de sua determinação” (Lévy, 1996:16). O ciberespaço, um termo cuja nomenclatura não é uma criação de Lévy[9], refere-se ao espaço virtual criado pelas redes computacionais interconectadas pelo mundo através da Internet. A atividade das pessoas nesse ciberespaço, sejam elas físicas ou jurídicas, compõe o que Lévy chama de cibercultura. Como fator essencial da cibercultura, dado que esta é composta por milhões de pessoas, sempre em contínuo processo de virtualização, nasce o que Lévy chama de inteligência coletiva. Partindo do pressuposto de que cada indivíduo humano deste planeta é possuidor de inteligência, Lévy define: Cada indivíduo humano possui um cérebro particular, que se desenvolveu, a grosso modo, sobre o mesmo modelo que o dos outros membros de sua espécie. Pela biologia, nossas inteligências são individuais e semelhantes (embora não idênticas). Pela cultura, em troca, nossa inteligência é altamente variável e coletiva. Com efeito, a dimensão social da inteligência está intimamente ligada às linguagens, às técnicas e às instituições, notoriamente diferentes conforme os lugares e as épocas (Lévy, 1996:99). Dado que a inteligência coletiva é fruto da cultura, da interação entre os homens, entendemos que a integração comunicacional entre esses indivíduos através de uma rede global eleva à potência máxima a inteligência humana. Assim pode ser compreendida a inteligência coletiva de que Lévy fala, e que ganha força através do mundo virtual. A expressão dessa inteligência coletiva é o que Lévy chama de cibercultura, a cultura que provém das peculiaridades interativas e conectivas do ciberespaço, que tem por trás de si a tecnologia binária computacional interligada. Texto e Hipertexto Algumas implicações das novas peculiaridades interativas da Internet nos mostram como a nova grande rede amplifica o poder comunicativo do Homem, e como ela está diferenciando o tradicional jornal impresso do mais recente jornal virtual, online ou webjornal, de que falaremos neste trabalho. Existem, nas teorias de Pierre Lévy, algums escritos que dizem respeito às diferenças entre texto e hipertexto que nos mostram as dimensões do jornalismo dentro dessas duas formas de escrita, impressa e digital, respectivamente. Podemos compreendê-las ao mensurarmos a diferença do texto para o hipertexto, dado que o texto é a linguagem básica dos jornais impressos e, o hipertexto, a linguagem básica dos webjornais. Segundo Lévy, o advento da escrita eleva o conhecimento e a inteligência humana, mas a escrita depende não só das palavras, e sim de representações destas sobre um suporte, de modo que fiquem dispostas continuamente no tempo-espaço, sejam perpetuadas, daí a sua superioridade sobre a comunicação feita de forma apenas oral: Com a escrita, e mais com o alfabeto e a imprensa, os modos de conhecimento teóricos e hermêuticos passaram portanto a prevalecer sobre os saberes narrativos e rituais das sociedades orais. A exigência de uma verdade universal, objetiva e crítica só pode se impor numa ecologia cognitiva largamente estruturada pela escrita, ou, mais exatamente, pela escrita sobre o suporte estático (Lévy, 1996:38). A própria escrita, segundo Lévy, é um mundo virtual, ou, talvez, o primeiro mundo virtual criado pelo homem, como uma precursora da Internet como mundo virtual tal como hoje a conhecemos. O “poder de virtualização” da escrita é entendido pela seguinte passagem do pensador francês: “A linguagem, primeira realidade virtual a nos transportar para fora do aqui e agora, longe das sensações imediatas, potência de mentira e de verdade, por acaso nos fez perder a realidade ou, ao contrário, nos abriu novos planos de existência?” (Lévy, 1999:219), fica fácil compreender que a Internet não só reafirma essa “virtualidade”, como a eleva a novos patamares muito superiores, sem limites visíveis. Tal fato já havia sido previsto pelo estudioso canadense Marshall McLuhan, quando ele comenta o impacto dos meios elétricos (aos quais, além do rádio, TV e cinema, ele inclui o telefone) sobre a palavra escrita: “Nossos valores ocidentais, baseados na palavra escrita, têm sido consideravelmente afetados pelos meios elétricos, tais como o telefone, o rádio e a televisão” (McLuhan, 1961:101). Agora, novamente, a palavra escrita – base da comunicação jornalística impressa – está sob o impacto de um novo meio, o computador e, em especial, a Internet. Dessa forma, vemos que mais uma vez, novos patamares são delineados. Se a escrita leva o Homem além do aqui-agora, a Internet vai além, pois nela não se faz mais sobre um suporte estático e, sim, dinâmico, digital: Pois o texto contemporâneo alimentando correspondências on-line e conferências eletrônicas, correndo em redes, fluido, desterritorializado, mergulhado no oceano do ciberespaço, esse texto dinâmico reconstitui, mas de outro modo e numa escala infinitamente superior, a copresença da mensagem e de seu contexto vivo que caracteriza a comunicação oral. De novo, os critérios mudam. Reaproximam-se daqueles do diálogo ou conversação: pertinência em função do momento, dos leitores e dos lugares virtuais (Lévy, 1996:39). Fica claro, então, que o texto flui na Internet numa escala muito maior que sobre um suporte estático, pois na Internet ele passa de um simples texto a um texto dinâmico e sempre reconstituído, já que está dentro do palco da inteligência coletiva que é a aquela construída pela coletividade da Internet. Porém, além do texto em si, Lévy nos fala a respeito do próprio ato de ler: Na verdade é somente na tela, ou em outros dispositivos interativos, que o leitor encontra a nova plasticidade do texto ou da imagem, uma vez que, como já disse, o texto em papel (ou o filme em película) forçosamente já está realizado por completo. A tela informática é uma nova “máquina de ler”, o lugar onde uma reserva de informação possível vem se realizar por seleção, aqui e agora, para um leitor particular. Toda leitura em computador é uma edição, uma montagem singular (Lévy, 1996:41). Então, fica evidente que além do texto ser mais fluído e dinâmico quando compartilhado numa rede interativa, o próprio leitor também se torna mais dinâmico, pois entra numa máquina de leitura, onde programa o que ler, o que compartilhar. É o leitor quem faz a montagem e a seleção do conteúdo que lhe convém. Assim, sobre a leitura e o suporte digital, Lévy complementa: Enfim, o suporte digital permite novos tipos de leituras (e de escritas) coletivas. Um continuum variado se estende assim entre a leitura individual de um texto preciso e a navegação em vastas redes digitais no interior das quais um grande número de pessoas anota, aumenta, conecta os textos uns aos outros por meio de ligações hipertextuais (...). Se ler consiste em selecionar, em esquematizar, em construir uma rede de remissões internas ao texto, em associar a outros dados, em integrar as palavras e as imagens a uma memória pessoal em reconstrução permanente, então os dispositivos hipertextuais constituem de fato uma espécie de objetivação, de exteriorização, de virtualização dos processos de leitura (Lévy, 1996:43). Esclarece-se nesta passagem que o hipertexto, texto composto de vários textos diretamente conectados, somado ao hábito de ler através de hipermídias, estende a leitura para um horizonte maior, que compreende a dinâmica da inteligência coletiva. E sobre essa “superioridade” do hipertexto sobre o texto no suporte estático, o autor nos fala: (...) o suporte digital apresenta uma diferença considerável em relação aos hipertextos anteriores à informática: a pesquisa dos índices, o uso dos instrumentos de orientação, de passagem de um nó para outro, fazem-se com rapidez da ordem de segundos. (...) a digitalização permite associar na mesma mídia e mixar finamente os sons, as imagens animadas e os textos (Lévy, 1996:44). Então não só o texto em hipermídia estende a leitura humana, ele o faz de maneira mais rápida e eficiente, agregando novos elementos, igualmente dinâmicos, ao texto, tais como imagens, vídeos e sons. Estes ainda podem ser combinados de maneira adequada, agregando novas informações, dinamizando a leitura, a informação e o conhecimento. E mais, dispostos numa rede global, como a Internet, texto e hipertexto perdem suas fronteiras: Os dispositivos hipertextuais nas redes digitais desterritorializam o texto. Fizeram emergir um texto sem fronteiras nítidas, sem interioridade definível. Não há mais um texto, assim como não há uma água e uma areia, mas apenas água e areia. O texto é posto em movimento, envolvido em fluxo, vetorizado, metafórico. Assim está mais próximo do pensamento, ou da imagem que hoje temos deste. Perdendo sua afinidade com as idéias imutáveis que supostamente dominaram o mundo sensível, o texto torna-se análogo ao universo de processos ao qual se mistura (Lévy, 1996:48). O hipertexto na Internet, diferentemente do texto estático – limitado às margens de um papel, às páginas de um livro, às prateleiras de uma biblioteca ou um acervo de jornal –, é parte de um grande mar, composto de todas as redes e informações nele dispostos. No ponto de vista de um jornal diário, poderíamos entender que este se limita às suas páginas, à sua presente edição, enquanto na Internet o webjornal se estende em um mar de conexões que trazem informações e conhecimentos que jamais poderiam ser dispostos em uma ou mais edições de um texto limitado. Em suma, o webjornal também pode ser considerado desterritorializado, ao passo que o jornal diário fica limitado em si mesmo, ao seu número de páginas e, em termos de abrangência, ao seu campo de distribuição e número de impressões. Outro autor que analisa a capacidade do hipertexto como uma nova forma de leitura e fluência da informação é o professor doutor em Sociologia, André L. M. Lemos (Universite de Paris V – França /UFBA – Brasil), que o relaciona com as novas possibilidades de interação do leitor com esse “texto vivo”: Um hypertexto é um texto aberto a múltiplas conexões a outros hypertextos. Com os hypertextos, é a figura do leitor que se vê substituída pela do “netsurfista”. Esse não é mais um simples leitor, mas um ator, um autor e um agente de interação com as interfaces do ciberespaço (Laurel, B. Computer as theater. Addison-Wesley, 1993). O ciberespaço é assim um conjunto de hypertextos interligados entre si onde podemos adicionar, retirar e modificar partes desse texto vivo (Lemos, em http://www.futuro.eng.br/CIBER.html, 11/07/2008). Na obra de Asa Briggs e Peter Burke, Uma história social da mídia, em que eles descrevem com profundidade a evolução comunicacional do Homem desde o surgimento da prensa gráfica, um capítulo inteiro é dedicado à “vaporização da comunicação”[10]. Fala de como a tecnologia do vapor, trens, navios e maquinários diversos expandiu assombrosamente o poder comunicativo do Homem, quebrando diversas barreiras físicas que o limitavam. Agora, pelas palavras de Lévy, é possível perceber que a Internet, a conexão/binarização de várias redes comunicacionais mundo afora, expande com furor essa fronteira a novos níveis cujos limites são impossíveis de se predizer. Estamos novamente em meio a uma vaporização comunicacional. O Ciberespaço e o Novo Mercado A Internet não traz mudanças apenas no ato de ler, no suporte do texto e do hipertexto, na desterritorialização que advém da web, vai muito além: ela altera e cria novos mercados, como nos fala Lévy: O ciberespaço abre de fato um mercado novo, só que se trata menos de uma onda de consumo por vir que da emergência de um espaço de transação qualitativamente diferente, no qual os papéis respectivos dos consumidores, dos produtores e dos intermediários se transformam profundamente (...). O mercado on-line não conhece as distâncias geográficas. Todos seus pontos estão em princípio igualmente “próximos” uns dos outros para o comprador potencial (Lévy, 1996:61). Quando se fala em “novo mercado da Internet”, não podemos excluir os jornais que, através de suas versões digitais, também se fazem presentes na grande rede, somados aos novos webjornais que têm veiculação exclusiva pela web, que nasceram na Internet. Se a Internet coloca todos os consumidores numa mesma loja, mesmo que de forma não-presencial, o ciberespaço nos traz uma banca de jornais única, onde podemos encontrar todos os jornais nela dispostos, uma banca de jornais sem limitações geográficas. Porém, Lévy não fala apenas em questões geográficas, mas também da relação entre produtores, consumidores e intermediários dentro desse novo mercado que surge com a Internet: Como os produtores primários e os requerentes podem entrar diretamente em contato uns com os outros, toda uma classe de profissionais corre doravante o risco de ser vista como intermediários, parasitas da informação (jornalistas, editores, professores, médicos, advogados, funcionários médicos) ou da transação (comerciantes, banqueiros, agentes financeiros diversos) e tem seus papéis ameaçados. Esse fenômeno é chamado de “desintermediação” (Lévy, 1996:62). Como vemos, a profissão de jornalista é diretamente citada como intermediária entre o público e a informação. Neste caso, a desintermediação coloca em risco a profissão do jornalista, e explica em parte o porquê do sucesso dos blogs na Internet, pois estes são feitos não só por jornalistas, mas diversos tipos de usuários que utilizam a rede para informar, dar opinião e escrever sobre assuntos diversos. O blogueiro, por exemplo, é o jornalista “desintermediado”, que faz notícia e gera informações diretamente ao público, sem a intermediação da editoria de um jornal. É o consumidor quem faz a notícia. Sobre isso, Lévy expõe: O consumidor não apenas se torna coprodutor da informação que consome, mas é também produtor cooperativo dos ‘mundos virtuais’ nos quais evolui, bem como agente de visibilidade do mercado para os quais se exploram os vestígios de seus atos no ciberespaço. Os produtos e serviços mais valorizados no novo mercado são interativos, o que significa, em termos econômicos, que a produção de valor agregado se desloca para o lado do consumidor, ou melhor, que convém substituir a noção de consumo pela coprodução de mercadorias ou serviços interativos (Lévy, 1996:63). O estudioso norte-americano de Tecnologia do MIT (Massachusetts Institute of Technology) Nicholas Negroponte, na obra A vida digital, ratifica os pensamentos de Lévy, refletindo como as novas tecnologias podem substituir muitas funções dos distribuidores de informação. Ele coloca que “(...) a distribuição de átomos é muito mais complexa que a de bits e requer a força de uma empresa gigantesca. Transportar bits, ao contrário, é bem mais simples e, em princípio, capaz de prescindir desses gigantes. Ou quase” (Negroponte, 1995:83). O estudioso enfatiza como grandes marcas comunicacionais, inclusive os grandes jornais, exercem papel fundamental de triagem da informação, são meios de “testar a opinião pública” (Negroponte, 1995:84). Tanto pelas colocações de Lévy quanto de Negroponte, fica evidente que esse processo de desintermediação altera o negócio de distribuição da informação, mas percebemos nas objeções do norte-americano que nada indica categoricamente que ela será total. Como ainda iremos abordar mais adiante neste estudo, a existência de grandes marcas comunicacionais é algo que se faz presente também no mundo da informação digital e da Internet. Outro filósofo francês, Jean Baudrillard, em sua obra Simulacros e simulação, embora analise a questão da Internet sob outro foco, onde percebe um lado mais obscuro dentro de sua expansão, ainda assim, mesmo que indiretamente, reafirma os argumentos de Lévy sobre a desterritorialização advinda da Internet e, para isso, apóia-se na teoria do estudioso canadense Marshall McLuhan: “Medium is message não significa apenas o fim da mensagem, mas também o fim do medium. Já não há (...) instância mediadora de uma realidade para outra, de um estado do real para outro. Nem os sentidos nem a forma. É esse o significado rigoroso da implosão” (Baudrillard, 1997:108). O que Lévy entende beneficamente como a “desintermediação”, Baudrillard prefere chamar de implosão, mas de comum entre eles, entendemos que esse fator é algo que coloca em cheque o papel dos produtores e distribuidores (o que inclui os jornais). Afinal, depois da “implosão”, o público estaria quase que em pé de igualdade ou, ao menos, mais próximo desses intermediadores, dentro do processo comunicativo. Neste sentido, Baudrillard vai além. Defende que, após a “implosão” dos meios, os papéis chegam até a se inverter: “A fórmula de McLuhan, Medium is message, que é a fórmula-chave da era da simulação (...) o emissor é o receptor – circularidade de todos os pólos” (Baudrillard, 1997:107). Essa implosão, como analisaremos adiante neste estudo, quando relacionada com o jornalismo, pode ser entendida como a “explosão”, ou o “boom” do jornalismo a partir da web, quando várias empresas, instituições e até indivíduos passaram a veicular informações através da Internet, além do próprio surgimento da blogosfera, adventos que, com a maior inserção de todos na mídia, cada vez mais e mais, tornam-se elementos que compõem a pólvora que explode a dinamite e implode esse segmento do mundo comunicacional, subvertendo-o. A implosão de Baudrillard ratifica o pensamento de McLuhan, quando ele comenta sobre a evolução dos meios. Referindo-se ao cinema, ele diz: Nos dias atuais, o cinema como que ainda está em sua fase manuscrita; sob a pressão da TV, logo mais, atingirá a fase portátil e acessível do livro impresso. Todo mundo poderá ter seu pequeno projetor barato, para cartuchos sonorizados de 8 mm. cujos filmes serão projetados como num vídeo. Este tipo de desenvolvimento faz parte de nossa atual implosão tecnológica. A dissociação do projetor e da tela é um vestígio do nosso velho mundo mecânico da explosão e da separação de funções, ora em fase de desaparecimento ante a ação da tecnologia elétrica do nosso velho mundo mecânico da explosão e da separação de funções, ora em fase de desaparecimento ante a ação da tecnologia elétrica (McLuhan, 1969:327-328). McLuhan explica que a implosão é característica da evolução dos meios enquanto eles avançam tecnologicamente e, após a implosão, ele complementa: “Mas agora a implosão elétrica reverteu o processo todo da expansão em fragmentação” (McLuhan, 1969:330). Dessa forma, o processo descrito e vinculado ao cinema pode ser associado à Internet e sua ação sobre outros meios, como o jornal diário, uma vez que hoje assistimos à sua “portabilidade”, ou seja, surgem novas iniciativas no ciberespaço que vão abrindo o leque de atores dentro do palco da notícia (incluindo simples cidadãos conectados, como o blogueiro e também os diversos novos suportes informacionais, os novos gadgets) e, além disso, a fragmentação – diversos novos serviços especializados, sites e publicações sobre os mais diversos temas, de todas as áreas da atividade humana – vão se multiplicando nessa nova era da informação “implodida”. Essas iniciativas que surgem e mesmo as empresas jornalísticas mais tradicionais vão multiplicando as suas funções e nelas se especializando, abrangendo múltiplas novidades, tanto na forma de noticiar quanto no tipo de informação, ampliando públicos antes inatingíveis ou de difícil acesso. Ora, o internauta não só é parte do “jogo” de criação da informação, mas também, parte do valor dos serviços oferecidos[11]. Em se tratando de webjornais, o internauta tem seu valor e valoriza o produto através da participação ativa na construção da informação, que se dá através de ferramentas que possibilitem a sua interação com a notícia e a informação. E, uma afirmação que podemos relacionar diretamente ao papel dos jornais como um produtor de informação com a questão desse novo mercado, aponta para a virtualização do texto. Lévy expõe: “(...) a virtualização do texto nos faz assistir à indistinção crescente dos papéis do leitor e do autor, também a virtualização do mercado põe em cena a mistura dos gêneros entre consumidor e a produção” (Lévy, 1996:63). Aqui não cabe mais o sistema onde a informação parte de um centro e se irradia para o público (de poucos para muitos). O público também é parte do movimento, da onda de criação das informações, e essa mudança de papel, a novidade dessa interatividade em relação às mídias tradicionais, é o que expressa Lévy na seguinte passagem: O “produtor” habitual (professor, editor, jornalista, produtor televisivo) luta assim para não se ver relegado ao papel de simples fornecedor de matéria-prima. De onde a batalha, do lado dos “produtores de conteúdos”, para reinstaurar tanto quanto possível, no novo espaço de interatividade, o papel que eles ocupavam no sistema unilateral das mídias ou na forma rígida das instituições hierárquicas (Lévy, 1996:64). E, sobre o novo papel dos profissionais no espaço da interatividade, Lévy faz considerações em outra obra sua, Cibercultura: Numerosas posições de poder e diversos “trabalhos” encontram-se ameaçados. Mas se souberem reinventar sua função para transformarem-se em animadores dos processos de inteligência coletiva, os indivíduos e os grupos que desempenham os papéis de intermediários podem passar a ter um papel na nova civilização, ainda mais importante que o anterior. Em contrapartida, caso se enrijeçam sobre as antigas identidades, é quase certo que ficarão em situação difícil (Lévy, 1999:231). A desterritorialização, para Lévy, então, vai ser um elemento-chave para essa nova era da comunicação, o que ele intitula de “universal sem totalidade”: O ciberespaço se constrói em sistema de sistemas, mas, por esse mesmo fato, é também o sistema do caos. Encarnação máxima da transparência técnica, acolhe, por seu crescimento incontido, todas as opacidades do sentido. Desenha e redesenha várias vezes a figura de um labirinto móvel, em expansão, sem plano possível, universal (...). Essa universalidade desprovida de significado central, esse sistema da desordem, essa transparência labiríntica, chamo-a de “universal sem totalidade”. Constitui a essência paradoxal da cibercultura (Lévy, 1999:111). Sendo um sistema universal, o ciberespaço se constrói sem a mediação de uma instituição central (ou uma pequena porção delas), razão pela qual Lévy o coloca como um sistema “sem totalidade”. Um sistema desses, então, acolhe tanto a reprodução e os modelos midiáticos tradicionais, com suas mensagens (ou não-mensagens) hiperreais – uma das “denúncias” que Jean Baudrillard faz em seus estudos –, quanto as novas expressões da cibercultura e da inteligência coletiva. Assim entendemos o espaço universal sem totalidade: aberto a todas as formas de comunicação e expressão. Da mesma forma que Baudrillard, Lévy faz uso da fórmula de McLuhan, interpretando-a como uma chave que define a Internet como o meio expressivo da cibercultura: (...) o significado último da rede ou valor contido na cibercultura é precisamente a universalidade. Essa mídia tende à interconexão geral das informações, da máquina e dos homens. E, portanto, se, como afirmava McLuhan, “a mídia é a mensagem”, a mensagem dessa mídia é o universal, ou a sistematicidade transparente e ilimitada. Acrescentemos que esse traço corresponde efetivamente aos projetos de seus criadores e às expectativas de seus usuários (Lévy, 1999:113). Dentro de um espaço universal e não totalitário, que conecta os usuários diretamente através de uma hierarquia comunicacional “todos-todos”, as iniciativas têm de ser igualmente “não-totais” (apenas irradiadas de um centro), não se limitando a empurrar o conteúdo em direção ao internauta, mas trazendo este para si, para fazer parte de sua criação. E isso se faz não somente colocando informações numa página web, não se faz apenas reproduzindo no meio virtual as mesmas informações dispostas por meios analógicos, como numa simples reprodução do jornal diário impresso na web, se faz através da construção de plataformas que tragam interatividade aos usuários, onde estes participem da criação da notícia, com espaço para debates, conferências etc. (que também permita aos gerenciadores dessas plataformas monitorar os hábitos de seus usuários, interagindo com eles, e buscando, assim, estar sempre em sintonia com estes, satisfazendo-os, saciando suas necessidades informativas, dessa forma, agregando valor ao seu negócio). Espaços que não só permitam ao jornalista propagar a informação, mas, além disso, aproximar esta do público e, também, aproximar o público das fontes de informação. Em suma, no mundo digital, o papel do jornalista não é pura e simplesmente informar, mas também fomentar a informação, o acesso a esta e ao pensamento crítico[12]. Sobre o papel desses novos “mediadores” e das mídias digitais, Lévy complementa: As tecnologias de comunicação de suporte digital (...) conhecem neste fim de século XX mutações massivas e radicais (...). Como um dos principais efeitos da transformação em curso, aparece um novo dispositivo de comunicação de coletividades desterritorializadas muito vastas que chamaremos “comunicação todos-todos”. É possível experimentar isso na Internet, nos chats (BBS), nas conferências ou fóruns eletrônicos, nos sistemas para o trabalho ou aprendizagem cooperativos, nos groupwares, nos mundos virtuais e nas árvores de conhecimento. Com efeito, o ciberespaço em via de constituição autoriza uma comunicação não mediática em grande escala que (...) representa um avanço decisivo rumo a formas novas e mais evoluídas de inteligência coletiva (Lévy, 1996:112). Com isso, fica objetivado que no mundo virtual, de interação mútua entre pessoas dispersas por todo globo terrestre, as formas de comunicação, de informação e de notícia não podem apenas privilegiar a informação unicamente, mas devem trazê-las para um novo contexto, um contexto de produção coletiva, que beneficie o coletivo, o todo, e que integralmente faça parte da criação de uma nova consciência, constituinte e construtora da inteligência coletiva. E não basta pensar nisto como uma hipótese futura. Trata-se de fomentar e criar iniciativas que privilegiem a inteligência coletiva a partir de já, pois, apesar de ainda incipiente, o mundo virtual já se apresenta como uma mídia que não pode mais ser deixada de lado[13], uma rede de grande abrangência mundial e em expansão ainda, que não se limita apenas à sua constituição física. Vai além e abrange o crescimento e o surgimento de novas formas de comunicação, novas interatividades e assim tende a ser cada vez mais, como já dizia o próprio Lévy (embora ele tenha sido muito otimista quanto aos prazos de suas perspectivas futuras para este século que se inicia): “A perspectiva da digitalização geral das informações provavelmente tornará o ciberespaço o principal canal de comunicação e suporte de memória da humanidade a partir do início do próximo século” (Lévy, 1999:93). Fica claro que nesse novo cenário, nesse novo mercado, o jornalismo deve privilegiar as iniciativas coletivas e a interatividade. É evidente que a desterritorialização da notícia e da informação é um processo em andamento que tende a crescer na mesma medida em que o ciberespaço cresce. Tudo isso já está alterando o mundo do jornalismo e o impactará ainda mais, como pretendemos analisar no decorrer deste estudo. A Fórmula de McLuhan Em função de os filósofos franceses Pierre Lévy e Jean Baudrillard fazerem uso da fórmula de Marshall McLuhan, “o meio é a mensagem”, para embasarem suas teorias e ambas interpretações falam sobre o novo paradigma que a Internet está trazendo para o mundo da comunicação, devido a tal importância, recorremos à clássica obra Os meios de comunicação como extensões do homem objetivando um entendimento mais profundo desta fórmula. Logo na introdução do livro o autor comenta sobre a sua famosa frase: “‘O meio é a mensagem’ significa, em termos da era eletrônica, que já se criou um ambiente totalmente novo. O ‘conteúdo’ deste novo ambiente é o velho ambiente mecanizado da era industrial. O novo ambiente está reprocessando o cinema. Pois o conteúdo da TV é o cinema” (McLuhan, 1964:11). Uma reflexão sobre o fato de a TV reprocessar o cinema, as diversas outras mídias que reprocessam suas predecessoras e também reprocessam as demais mídias com que interagem, nos remete ao fato de a Internet igualmente reprocessar a TV e as demais mídias, algo que se pode relacionar com ambas as teorias de Baudrillard e Lévy. É fácil compreender, pelo que estudamos até aqui, que a Internet, ao mesmo tempo em que se expande, absorve os elementos das velhas mídias. Encontramos na web desde os velhos jornais impressos reproduzidos digitalmente até as novas iniciativas peculiares do webjornalismo que estão reprocessando o tradicional jornalismo: a superioridade do hipertexto sobre o texto, do suporte dinâmico sobre o estático, a desterritorialização do texto e a desintermediação do jornalista, como vimos. Exemplos que encontramos na Internet hoje em dia nos mostram isto na prática, em ferramentas tais como: podcast, RSS e TV peer to peer, para citar apenas alguns exemplos básicos, são fórmulas que, respectivamente, reprocessam o texto jornalístico, o áudio e a própria TV. O texto jornalístico que utiliza a palavra escrita; o áudio que é o elemento fundamental do rádio; e a TV que utiliza a imagem, que por sua vez é uma característica do cinema, e utiliza também o áudio, característica do rádio; agora são todos elementos reprocessados pela Internet, fato que, segundo McLuhan, é uma característica da evolução dos meios: “Toda tecnologia nova cria um ambiente que é logo considerado corrupto e degradante. Todavia o novo transforma o seu predecessor em forma de arte” (McLuhan, 1964:12). A palavra reprocessar pode nos levar a duas interpretações, a primeira é a que acabamos de comentar, e a segunda seria o fato de ela também fazer uso do que já era processado, remodelando-o ao novo meio, a mesma mensagem replicada em novos meios. Afinal, a mensagem busca o seu formato de acordo com o meio, conforme entendemos pela fórmula de McLuhan, mas, na construção de sua peculiar forma de transmitir a mensagem, cada novo meio que surge utiliza-se dos e também fortifica os demais meios existentes: “O ‘conteúdo’ de um meio é como a ‘bola’ de carne que o assaltante leva consigo para distrair o cão de guarda da mente. O efeito de um meio se torna mais forte e intenso justamente porque o seu ‘conteúdo’ é um outro meio” (McLuhan, 1964:33). Nenhum meio existe sem depender do outro: “(...) nenhum meio tem sua existência ou significado por si só, estando na dependência na constante interrelação com os outros meios” (McLuhan, 1964:42). Assim, grande parte do conteúdo da Internet é o conteúdo de outros meios, como exemplificamos, o jornal, o rádio e a TV. Esta reflexão de McLuhan vai ao encontro do que expõe Beth Saad em relação ao cenário midiático atual, quando ela afirma que “as novas mídias não surgem de forma espontânea e independente, mas, sim, de uma metamorfose[14] das velhas mídias, que, por sua vez, não morrem, mas evoluem e se adaptam às transformações” (Saad, 2003:56), o que a autora entende como conceitos de “coevolução e coexistência das comunicações” (Saad, 2003:56). McLuhan ainda nos fala das extensões do homem, a mídia como extensão comunicacional com seus diversos meios. Ele mostra que a inteligência coletiva – defendida por Lévy como a expressão peculiar da Internet como meio comunicacional – é fator presente no mundo da tecnologia elétrica, como expressa o autor, e também atualmente, quando pensamos na informação que, além de elétrica, é também binária: Estamos nos aproximando da fase final das extensões do homem: a simulação tecnológica da consciência, pela qual o processo criativo do conhecimento se estenderá coletiva e corporativamente a toda a sociedade humana, tal como já se fez com nossos sentidos e nossos nervos através dos diversos meios e veículos. Se a projeção da consciência – já antiga aspiração dos anunciantes para produtos específicos – será ou não uma “boa coisa”, é uma questão aberta às mais variadas soluções (McLuhan, 1964:17). McLuhan fala que o processo criativo do conhecimento se expandirá coletivamente, tanto para as corporações quanto para a sociedade e seus indivíduos. Ora, essa nova consciência coletiva nada mais é do que uma outra interpretação do que vimos ser a inteligência coletiva, como nos apontou Lévy. Business Inteligence, apenas para citar um exemplo, é um conceito corporativo tecnológico que está modificando a forma das corporações trabalharem, uma forma de expressão da inteligência coletiva, a coletividade elétrica e binária, no mundo empresarial. A cibercultura é a expressão da sociedade com seus indivíduos conectados frente à inteligência coletiva que advém das novas mídias digitais interativas deste mundo eletro-binário. Como vimos, a citação de McLuhan mostra que já estamos vivendo a atualidade da “fase final das extensões do homem” e, dessa forma, estamos assistindo a novas expressões da inteligência coletiva que surgem e vão modificando a nossa vida dia após dia. Em capítulo de sua obra, intitulado não por acaso de “O meio é a mensagem”, temos a explicação do que significa essa fórmula pelas palavras do próprio McLuhan. A primeira citação da fórmula aparece logo na primeira frase do capítulo: “Numa cultura como a nossa, há muito acostumada a dividir e estilhaçar as coisas como meio de controlá-las, não deixa, às vezes, de ser um tanto chocante lembrar que, para efeitos práticos e operacionais, o meio é a mensagem” (McLuhan, 1964:21). Mas enfim, qual é esse efeito prático? Em relação à Internet e os demais meios, qual seria esse efeito? Como vimos, Baudrillard afirma que a Internet implode com todos os meios. McLuhan antecipa a fala do francês quando diz que “a aceleração da velocidade da forma mecânica para a forma elétrica instantânea faz reverter a explosão em implosão” (McLuhan, 1964:53). Essa implosão pode ser entendida também quando McLuhan fala da fragmentação: “A reestruturação da associação e do trabalho humanos foi moldada pela técnica de fragmentação, que constitui a essência tecnológica da máquina” (McLuhan, 1964:21). Os novos meios eletrônicos, baseados em máquinas computacionais, implodem os demais meios, levando-os à fragmentação. Estes precisam buscar as suas peculiares formas de veicular a mensagem como, dentre eles o velho jornal, deixando de se alimentar apenas dos outros meios, buscando o que seria, como sugere McLuhan em passagem anterior, a sua “arte”. Ao mesmo tempo, a binarização que advém da Internet e dos novos meios eletrônicos digitais absorve toda aquela mensagem e a reprocessa; ou seja, a Internet transmite as mensagens que eram do jornal, do rádio e da TV com novas características, as características próprias do novo meio, a interatividade de um meio comunicacional todos-todos que, voltando ao nosso exemplo, levaria a um jornalismo mais compartilhado, comunitário, o jornalismo não mais necessariamente totalizado apenas por grandes instituições, mas feito também por aqueles que com estas interagem, e também entre si. Nesse caso, a implosão da comunicação questionada por Baudrillard estaria relacionada ao fato de as velhas mídias se modificarem em função da Internet, sendo esta uma mídia que expressa a inteligência coletiva, a universalidade, como bem colocam tanto McLuhan quanto Lévy, características que aumentam ainda mais as extensões comunicacionais do homem, estendem o jornalismo a uma parte maior da humanidade, assim como todo o mundo comunicacional. A Internet, ao mesmo tempo em que fragmenta as demais mídias, recria a própria mídia a partir desses fragmentos e projeta-os dentro do universal. Não é preciso fazer um profundo estudo para perceber que a Internet permite inúmeras novas modalidades de prática jornalística, muitas das quais pretendemos analisar, e tal maleabilidade do novo meio traz consigo uma ampla gama de novos sites noticiosos, portais informativos especializados nos mais diversos assuntos e modalidades informativas, uma fragmentação que pode ser entendida pelo que foi exposto nas palavras de McLuhan, pela questão da desintermediação e da desterritorialização apontada por Lévy e, finalmente, pela “implosão” comunicacional denunciada por Baudrillard.Enfim, McLuhan desvenda parte de sua fórmula: “‘O meio é a mensagem’, porque é o meio que configura e controla a proporção e a forma das ações e associações humanas” (McLuhan, 1964:23). A importância do meio, como entendemos, está no fato deste configurar a mensagem por ele emitida: o impacto e a abrangência da mensagem sobre os receptores dependerá, assim, do meio utilizado. O meio configura a mensagem entre emissores e receptores, como intermediadores de ações e associações do Homem. Sendo assim, percebemos que a Internet – com as suas novas características interativas – tem a capacidade de aumentar radicalmente essa extensão comunicativa do Homem, permitindo novas associações que irão gerar, e já o fazem em diferentes graus, novas ações. Essas novas ações passam, como vimos, pela nova cultura midiática, a cibercultura, e também pela extensão de velhas culturas da mídia, como o jornal, o rádio e a TV. McLuhan relaciona a sua própria fórmula com o movimento cubista. Segundo o autor, é o movimento artístico cubista que delata a existência de sua fórmula: Ao propiciar a apreensão total instantânea, o cubismo como que de repente anunciou que o meio é a mensagem. Não se torna, pois, evidente que, a partir do momento que o seqüencial cede ao simultâneo, ingressamos no mundo da estrutura e da configuração? (...) Os segmentos especializados da atenção deslocaram-se para o campo total e é por isso que agora podemos dizer, da maneira a mais natural possível: ‘O meio é a mensagem’ (McLuhan, 1964:27). Além de delatar o cubismo como uma expressão artística que possui as características dos novos meios digitais interativos, a passagem acima também delata os embasamentos das teorias de Lévy. Nesta passagem, McLuhan fala da substituição do seqüencial pelo simultâneo e do deslocamento das atenções para o total, elementos que embasam o universal sem totalidade, um dos pontos-chave das teorias de Lévy em relação à Internet que, podemos dizer, são reveladas por McLuhan nesta associação de sua fórmula com o cubismo. Neste caso, a Internet seria uma expressão midiática, na forma de um novo meio, correspondente ao mundo da estrutura e da configuração. E, justamente por sua estrutura comunicacional ser aberta à comunicação universal sob diferentes configurações, vai permitir o deslocamento da atenção de seus usuários para o todo, e esse todo seria, então, o universal não-totalitário comentado por Lévy. Um dos elementos que, segundo a análise das teorias do francês, poderiam libertar o mundo comunicacional da rigidez dos antigos meios. Porém não podemos abrir mão do fato desses novos meios se apropriarem das características dos velhos meios, como vimos, e a ênfase que o próprio McLuhan dá ao fato das novas configurações midiáticas estarem abertas tanto às novas expressões da coletividade, quanto às novas possibilidades de exploração desse novo mundo universalizado pelas velhas fórmulas do “antigo” mundo midiático (que não é totalmente antigo, pois ainda coexiste com o novo). A instantaneidade e simultaneidade mencionadas por McLuhan são fatores que remetem à mídia do “mundo elétrico” apontado pelo autor, em que a comunicação, ao eletrificar-se, ganha as características de velocidade da luz, refere-se a toda era contemporânea da comunicação, quando esta é mediada também por diversos aparatos eletrificados – dos eletrodomésticos até, na atualidade, os computadores – o rádio e a TV em conjunto com várias tecnologias eletrônicas que vão até o satélite e, hoje, também através das redes computacionais, carregando mensagens de forma instantânea e simultânea. Esses dois fatores que McLuhan relaciona à sua fórmula, instantaneidade e simultaneidade, são característicos da comunicação que ganhou força a partir da era da rádio-transmissão e que perduram até hoje com uma capacidade maior de conectividade, ganhando ainda mais força através das redes inteligentes de comunicação que quebram a seqüencialidade que, dentro de um contexto midiático menos rígido como a Internet, pode ser entendida como um obstáculo à Comunicação – a própria rigidez desses meios antigos. Esse novo meio é quem ditará as novas expressões, as novas mensagens, com todas as características midiáticas que possui, englobando, inclusive, as características que pertencem às mídias tradicionais, dentro da atualidade comunicacional. McLuhan e a Imprensa Ainda na obra Os meios de comunicação como extensões do homem, Marshall McLuhan faz algumas explanações sobre a imprensa. Como as explanações do filósofo canadense costumam ser paradigmáticas, tanto que embasam diversos estudos comunicacionais, vamos dar uma olhada e refletir sobre algumas importantes passagens suas sobre esse peculiar meio midiático. Numa das primeiras colocações sobre a imprensa, McLuhan diz: “Mas a imprensa de tipos móveis foi, por si mesma, o maior limite de ruptura na história da leitura fonética, assim como o alfabeto fonético foi o limite de ruptura entre o tribal e o homem individualista” (McLuhan, 1969:58). Como vimos, Pierre Lévy fala nesse contexto do surgimento do “primeiro mundo virtual”, a escrita; já McLuhan fala da ruptura causada pelo tipos móveis. Ora, se a capacidade de aumentar a produção escrita representa uma ruptura dentro da humanidade, cremos que a adição do hipertexto dentro desse mundo dos tipos móveis também representa uma ruptura e, além disso, a ampliação dessa capacidade de ler e escrever. O que representa essa “ruptura” do texto para o hipertexto dentro da sociedade atual é algo que ainda se faz necessário estudar. A nós vale tentar entender o que isso representa em relação aos tradicionais jornais diários impressos. McLuhan fala da fragmentação causada pela imprensa: “A imprensa (...) expandiu a expressão no sentido da simplificação e da ‘exorcização’ ou decifração do significado. A imprensa acelerou e fez ‘explodir’ o manuscrito condensado em fragmentos mais simples” (McLuhan, 1969:358). Como vemos, uma das causas da ruptura causada pelo surgimento dos tipos móveis e do crescimento das empresas que desses se utilizam, a imprensa, acaba por fragmentar-se. Se a Internet representa uma nova ruptura, a tendência é que esse processo se intensifique ainda mais, o que se pode observar no plural de iniciativas que surgem através da web e dos novos serviços e informações dispostos nos sites noticiosos, inclusive naqueles de grandes empresas jornalísticas tradicionais. Sobre o impacto dos meios, McLuhan comenta a respeito da invenção do telégrafo: “Em 1848, o telégrafo, então com apenas quatro anos de idade, obrigou vários dentre os maiores jornais americanos a se organizarem coletivamente para a criação de notícias. Essa iniciativa se tornou a base da Associated Press” (McLuhan, 1969:285). Se o telégrafo obrigou a imprensa a reorganizar-se em torno dele, hoje a Internet faz o mesmo, e assistimos a esses órgãos de imprensa se engendrando no novo meio, procurando englobar os novos serviços e recursos que a tecnologia digital oferece. Não podemos esquecer que essas tecnologias digitais, que formam não só a Internet, mas que baseiam também uma miscelânica variedade de dispositivos (tais como celulares e handhelds), têm como alicerce a tecnologia binária do computador. Embora nos idos de 1960 o computador fosse apenas um projeto em desenvolvimento, McLuhan já percebia a sua potencialidade; em primeiro lugar, ele comenta sobre sua capacidade binária de tudo abraçar: “(...) o computador digital com suas inúmeras seleções de tipo sim-não, tudo isto implica em acariciar os contornos de todas as coisas pelos múltiplos toques desses pontos” (McLuhan, 1969:279), e complementa: Hoje os computadores parecem prometer os meios de se poder traduzir qualquer língua em qualquer outra, qualquer código em outro código – e instantaneamente. Em suma, o computador, pela tecnologia, anuncia o advento de uma condição pentescostal de compreensão e unidade universais. O próximo passo lógico seria (...) superar as línguas através de uma consciência cósmica geral, muito semelhante ao inconsciente coletivo (McLuhan, 1969:99). Como vemos, McLuhan já preconizava a fala de Pierre Lévy a respeito da universalidade gerada por tal capacidade maquinária do Homem e, além disso, atribuía a instantaneidade ao meio que, hoje, através da capacidade comunicacional dos computadores em rede, assistimos tornar-se uma realidade. Essa capacidade do computador pode ser relacionada com outra afirmação de McLuhan: “A Imprensa forneceu uma memória enorme e nova para os escritos do passado, tornando a memória pessoal inadequada” (McLuhan, 1969:199). O que pensar da memória fornecida pelo computador? Hoje, podemos pesquisar as notícias antigas dentro do site de um jornal com a facilidade do clique do mouse, o que amplifica de forma imensurável essa capacidade de memória (tanto que muitas instituições jornalísticas e informativas já utilizam seus acervos como valor de negócio). Se antigamente a data do jornal era o que o diferenciava as suas edições – de acordo com o que diz McLuhan: “(...) a data é o único princípio organizativo da imagem jornalística da comunidade. Elimine-se a data e o jornal de um dia se torna igual ao do dia seguinte” (McLuhan, 1969:240) –, hoje ela representa uma chave-primária de pesquisa dentro da memória jornalística que se estende através dos dados armazenados nas informações acessíveis através da Internet. Outra afirmação de McLuhan suscita reflexões sobre a chegada da Internet, os serviços que nela hoje se oferecem e o seu impacto dentro do mundo jornalístico. Diz o canadense: “Os anúncios classificados (e as cotações de mercados e títulos) constituem o alicerce da Imprensa” (McLuhan, 1969:235). A questão que paira no ar depois de tal afirmação é: a Internet não estaria solapando esses serviços, dado que nela encontramos sites especializados nesses recursos e com facilidades que um jornal impresso é incapaz de fornecer? Mesmo os tradicionais jornais hoje estendem esses serviços para Internet, meio que oferece maiores facilidades para esse tipo de informação. Por fim, McLuhan fala sobre os computadores e, em sua afirmação, nos remete ao temor denunciado por Jean Baudrillard, de que o processo de simulação da consciência gerada por essa nova capacidade processual se transforme na arma dos publicitários na contemporaneidade e, além disso, a ferramenta que destruiria de vez o já fragmentado significado dentro do processo comunicacional: “(...) os computadores (...) obviamente, eles podem chegar a simular o processo da consciência, assim como a rede elétrica global já começa a simular as condições de nosso sistema nervoso central (...) o sob medida supera o produto em massa” (McLuhan, 1969:394). Sendo esse processo de simulação a nova arma dos publicitários e a publicidade uma das vilãs dentro da crise ética por que passa o jornalismo (como veremos mais adiante), dado que as relações entre jornalismo e publicidade são cada vez mais estreitas, o temor de Baudrillard pode não ser totalmente injustificado. O que talvez McLuhan tenha previsto erroneamente é a superação do produto sob medida sobre o produto de massa. Hoje, essa primeira instância tem nome próprio e, como é tradicional nos jargões publicitários, em inglês: on demand. Está aí algo não precisamente previsto por McLuhan. Atualmente, escoltados com a inteligência e os dados binários armazenados, somos capazes de produzir sob medida em massa, desde a publicidade que chega via e-mail e cumprimenta o usuário pelo nome, passando pelo carro que podemos encomendar via web com todos os acessórios e modificações que queremos, e finalmente, chegando a uma infinidade de produtos, serviços e informações impossíveis de serem quantificadas. A Galáxia da Internet A expressão “Galáxia da Internet”, título da obra do estudioso espanhol Manuel Castells, é, na verdade, uma analogia do autor ao título da famosa obra de McLuhan A Galáxia de Gutenberg. Dessa forma, já é a partir do título desse estudo que o espanhol revela que a Galáxia da Internet nada mais é do que a extensão ou ampliação da Galáxia de Gutenberg, agora não mais somente através da impressão tipográfica, mas também pelos “tipos binários”, ou seja, de toda informação digital que hoje se espalha através da Internet. Em poucas palavras, o autor reafirma muito do que estudamos com base nos estudos de Lévy e McLuhan, sobre o que a chegada e a expansão da Internet significam para o mundo comunicacional: As redes eram fundamentalmente o domínio da vida privada; as hierarquias centralizadas eram o feudo do poder e da produção. Agora, no entanto, a introdução da informação e das tecnologias de comunicação baseadas no computador, e particularmente a Internet, permite às redes exercer sua flexibilidade e adaptalidade, e afirmar assim a sua natureza revolucionária (Castells, 2001:7-8). A passagem acima é parte da introdução de sua obra. Já nas considerações finais, o autor expõe: A Galáxia da Internet é um novo ambiente de comunicação. Como a comunicação é a essência da atividade humana, todos os domínios da vida social estão sendo modificados pelos usos disseminados da Internet (...). Uma nova forma social, a sociedade em rede, está se constituindo em torno do planeta (...) sob uma diversidade de formas e com consideráveis diferenças em suas conseqüências para a vida das pessoas, dependendo de história, cultura e instituições (Castells, 2001:225). Como vemos, o mundo da comunicação está sendo “revolucionado” pela Internet e, dentro dele, as empresas jornalísticas, que há séculos estão inseridas no palco comunicacional, integram e são parte dessa revolução. Ou, até, em alguns casos (como veremos), sofrem para se adaptar ou mesmo se colocar dentro dessa revolução. Enquanto os autores que mencionamos anteriormente fazem uma análise mais filosófica sobre a Internet, Castells procura embasar suas teorias em fatos que se dão através da grande rede e na própria história do meio. Quando Pierre Lévy fala em “projetos de seus criadores”, em passagem que associa a Internet ao meio da universalidade, refere-se às tecnoelites que participaram do desenvolvimento inicial da grande rede, que inclui hackers[15], comunidades de desenvolvedores e, inclusive, empresários. Castells define essas tecnoelites como primordiais no desenvolvimento da cultura da Internet, uma cultura que ele define como tecnomeritocrática: “Trata-se de uma cultura da crença no bem inerente ao desenvolvimento científico e tecnológico (...) numa relação de continuidade direta com o Iluminismo e a Modernidade” (Castells, 2001:36). Foi a cultura explorada por essas elites no desenvolvimento inicial da grande rede que nela enraizaram suas características até hoje fundamentais para o sucesso e o desenvolvimento da Internet, onde “A pedra angular de todo processo é a comunicação aberta do software” (Castells, 2001:37). Se Lévy nos fala da Internet como meio da universalidade, em parte isso segue os anseios das comunidades hackers que participaram dos primeiros estágios de criação da rede, uma “cultura de convergência entre seres humanos e suas máquinas num processo de interação liberta. É uma cultura de criatividade intelectual fundada na liberdade, na cooperação, na reciprocidade e na informalidade” (Castells, 2001:45). Assim, fica entendido que, dentro da universalidade não totalitária, como explica Lévy, os valores mencionados acima são características fundamentais da Internet: liberdade, cooperação, reciprocidade e informalidade. Se para McLuhan o “meio é a mensagem”, para Castells “a rede é a mensagem” (Castells, 2001:65). É assim que o espanhol define a nova economia baseada nos negócios eletrônicos. Como vimos com Lévy, a Internet está alterando o mundo dos negócios e, seguindo a lógica da frase acima, Castells expõe que o novo modelo de negócio nela baseado “(...) permite escalabilidade, interatividade, administração da flexibilidade, uso de marca e customização num mundo empresarial em rede” (Castells, 2001:56). Em referência aos grandes portais, um dos objetos deste estudo, o espanhol afirma que eles “(...) valem-se ainda mais (...) da possibilidade de organizar a administração, a produção e a distribuição na Internet (citando Anthony Vlamis e Bob Smith. Do you: Business the Yahoo! Way. Milford: CT: Capstone, 2001). Na verdade, há uma mudança na cadeia de valor da indústria do comércio eletrônico para os sistemas de distribuição de informação em detrimento do valor da própria informação” (Castells, 2001:65). Essa afirmação, paradigmática, explica em parte a presença de grandes empresas comunicacionais, como os tradicionais meios impressos, dentro da grande rede em associação a grandes portais informativos ou no comando de seus próprios portais, pois, como colocou o ibérico, estão atreladas ao novo modelo de negócio através da Internet. O importante é fornecer informação, e quanto mais, melhor, independente da qualidade e do valor dessas informações, numa forma de abraçar os novos públicos que hoje buscam conteúdo, entretenimento e serviços via web. Essa última frase também pode ser entendida através da interpretação da famosa frase de McLuhan por Castells (“a rede é a mensagem”), segundo uma menção à mesma por parte do professor doutor em Ciências da Comunicação Caio Túlio Costa (ECA/USP), que diz: “Se o meio é a mensagem, então a rede também passa a ser a mensagem. Estar em rede seria mais determinante do que usar a rede para essa ou aquela causa” (Costa, 2008:282). Isso demonstra a importância, em primeiro lugar, de estar na Internet, independentemente de como, e, uma maneira de estar presente, é tentar estar onipresente em tudo que a web oferece, ou seja, abraçando tudo que for possível. Daí a fome de conteúdo que vários portais e sites informativos demonstram na sua inserção no novo meio. Outra palavra-chave neste novo modelo de negócios dentro da Internet é a inovação que, segundo Castells “(...) é uma função de trabalho altamente especializado e da existência de organizações de criação de conhecimento” (Castells, 2001:85). A inovação confere vantagem competitiva a quem a implanta e a adota: “Uma vez gerada a inovação (...) sua aplicação confere uma vantagem competitiva aos que participaram no processo (...) eles são os primeiros a adotar (...) aprender (...) sabem melhor que tipos de produtos e processos podem ser desenvolvidos a partir desse caminho de inovação” (Castells, 2001:86). Essa colocação também explica o fato de os portais informativos objetivarem estar sempre sincronizados com as novidades do mercado, oferecendo produtos e serviços atrelados às novas tecnologias que vão surgindo, tanto na área de softwares como, por exemplo, um grande portal que disponibiliza servidores aos seus assinantes para que eles possam jogar em rede a última versão do mais novo e sensacional game tri-dimensional, quanto na área de hardwares onde, por exemplo, o usuário pode baixar skins, trilhas sonoras, ou atualizar a informação, via web, de seu handheld ou smartphone, ou então, simplesmente mandar um torpedo para um celular qualquer através do site. Essa lógica, segundo Castells: (...) permeia toda a indústria de serviços on-line, uma vez que os portais dão acesso a informações e serviços, como uma maneira de vender publicidade e obter informação que possa ser reutilizada para fins de marketing. Nesse lógica, os compradores são produtores, já que podem fornecer informação crítica por seu comportamento, e por suas demandas, ajudando constantemente as companhias eletrônicas a modificar seus produtos e serviços (Castells, 2001:86). Assim, fica claro como a participação do público é fundamental dentro da nova era da informação, e entende-se a importância da afirmação de Lévy quando ele afirma que o “usuário é coprodutor da informação dentro do ciberespaço”. Em termos de valor de negócio, segundo Castells, é mesmo. Assim, entende-se que as empresas que buscam prosperar dentro da Internet devem entender e observar os gostos de seus públicos e, como se explicita pela citação acima, a Internet e a tecnologia computacional são ótimas ferramentas para o monitoramento dos hábitos dos usuários, dos consumidores. Para o jornalismo, permite uma melhor sintonia entre editorias e jornalistas com os seus públicos e se coloca como um meio, tanto de atingir mais públicos, como de melhor satisfazer às necessidades dos seus já conquistados públicos, além de servir como amparo dinamizador à profissão (como veremos com mais profundidade no Capítulo II). Quem também expõe esse fato é a comunicóloga Beth Saad, que relaciona o papel do usuário com o valor da informação jornalística através da Internet. Saad afirma que “também emerge com destaque o papel do usuário, ou seja, o conhecido leitor, agora equipado com seu arsenal particular de informática e telecomunicações que tem o poder (...) de selecionar conteúdos, as informações, os serviços, as notícias que lhe interessam” (Saad, 2003:60). E complementa: “(...) quanto mais próxima dos interesses pessoais do usuário, mais valor tem essa informação” (Saad, 2003:61). Além do valor da informação estar diretamente atrelado ao usuário, o processo comunicacional outrora monopolizado pelas empresas de mídia agora sofre com a interferência desse novo ator, o que fica claro quando Saad expõe que “o domínio do processo produtivo fica mais fragilizado com a interferência ativa e muito próxima do usuário” (Saad, 2003:60). Daí podermos extrair a compreensão desse novo momento comunicacional como um movimento de ruptura que leva à crise alguns dos meios mais tradicionais, como o jornal impresso, como veremos mais adiante. Uma das características desta nova “Galáxia da Internet” está no crescimento da inteligência em diversos níveis, desde a eficiência dos novos sistemas interconectados, dos computadores, até a contribuição das pessoas individualmente, ou estas se organizando de diversas novas formas – a própria inteligência coletiva. Nicholas Negroponte faz diversas considerações sobre a inteligência do novo mundo conectado, que descreve na obra A vida digital, e as relaciona também com os jornais. A primeira pergunta que o estudioso se faz é se “a peculiaridade de um veículo pode ser transportada para outro” (Negroponte, 1995:25). E, sobre a questão das diferenças físicas e interativas dos meios, afirma: Um jornal também é produzido tendo toda inteligência do lado do transmissor. Mas, como veículo, o papel em formato grande propicia algum alívio ante à “mesmice” da informação, uma vez que o jornal pode ser consumido em diferentes momentos e de diferentes formas. Nós folheamos, dobramos suas páginas guiados por manchetes e fotos, cada um tratando de um modo bastante diverso os bits idênticos enviados a centenas de milhares de pessoas. Os bits são os mesmos, mas a experiência da leitura é diferente (Negroponte, 1995:25) [16]. Embora a Internet não tenha a portabilidade de um jornal impresso, percebe-se que o ponto mencionado por Negroponte, a experiência de leitura, se assemelha e vai além do que já nos propiciava o jornal em relação a outras mídias (o rádio e a TV), sobretudo no momento atual, quando a informação, cada vez mais, se espalha por diferentes meios e modos de interação proporcionados pelas novas tecnologias que nos abraçam dia-a-dia e que vão além da web. Dentro deste novo contexto tecnológico, as reflexões de Negroponte seguem a mesma direção das ponderações de Lévy, Castells e até mesmo McLuhan, onde a informação se fragmenta e se personaliza: A resposta está na criação de computadores que filtrem, classifiquem, estabeleçam prioridades e gerenciem os múltiplos veículos, a multimídia, para nós – computadores que leiam jornais, assistam à televisão e que ajam como editores quando solicitados. Esse tipo de inteligência pode alojar-se em dois lugares distintos. Ela pode estar do lado do transmissor e comportar-se como se você tivesse seu próprio time de redatores – como se o New York Times estivesse publicando um jornal único, feito sob medida para seus interesses. Nesse primeiro exemplo, um pequeno subconjunto de bits foi selecionado especialmente para você. Esses bits são filtrados, preparados para você, talvez para serem impressos na sua casa, ou para serem vistos de modo mais interativo, com auxílio de um aparelho eletrônico. Num segundo exemplo, seu sistema editor de notícias está no receptor, e o New York Times transmite uma quantidade enorme de bits (...) dentre as quais seu aparelho seleciona umas poucas, dependendo dos seus interesses, hábitos ou planos para o dia em questão. Nesse caso, a inteligência está no receptor, e o idiota do transmissor está enviando os bits todos para todo mundo, indiscriminadamente (Negroponte, 1995:25-26). Enfim, Negroponte conclui que ambas as fórmulas deverão ser encontradas na vida digital. Mas a inteligência do transmissor/receptor e a fragmentação não são os únicos pontos que alteram o cenário da informação que concerne também aos jornais impressos. A sua profundidade é algo que cresce com as redes e novas tecnologias, como evidencia a seguinte afirmação: No mundo digital, o problema do volume versus profundidade desaparece, de modo que leitores e autores podem mover-se com maior liberdade entre o geral e o específico. Na verdade, a idéia de “querer saber mais sobre o assunto” é parte integrante da multimídia, e está na base da hipermídia (Negroponte, 1995:71). A maior profundidade proporcionada pela informação em rede, além do que escreve o norte-americano, é algo notório na Internet, meio que permite a conectividade de diversas empresas de mídias, inclusive com seus usuários e de todos entre si. Hoje, é fácil notar isso em qualquer meio, seja na TV, no rádio, em jornais ou revistas, que convidam o público para “saber mais sobre o assunto” através de informações adicionais que dispõem em seus sites. Isto, somado ao que o público pode encontrar por conta própria navegando na web, nos permite afirmar que a Internet é o meio atual de maior profundidade informativa. 2. A Internet e a Esfera Pública “By freedom shall he imprison many” – Talking in the Devil[17] Antes de analisarmos quais são os novos impactos da Internet sobre a esfera pública, precisamos entender melhor o que vem a ser uma esfera pública. Para tal, buscamos a definição da mesma através dos estudos do alemão Jürgen Habermas em sua clássica obra, Mudança estrutural na esfera pública, uma das maiores referências sobre o tema. Para definir o que vem a ser uma esfera pública, em primeiro lugar, Habermas faz algumas definições dos principais termos ligados ao assunto, onde temos: público, publicar, publicidade, opinião pública e esfera pública[18]. Habermas então, antes de chegar na esfera pública, busca a definição do que vem a ser “público”, e coloca: “Chamamos de ‘públicos’ certos eventos quando eles, em contraposição às sociedades, são acessíveis a qualquer um – assim como falamos de locais públicos ou de casas públicas” (Habermas, 1984:14). Em suma, quando nos referimos a qualquer termo como ele sendo público, significa que tal termo, que pode ser uma praça, um estádio, ou um jornal, é acessível a todos (mesmo que mediante o pagamento de algum valor, como a compra de um ingresso para assistir a uma partida de futebol, por exemplo). Uma vez esclarecido o que vem a ser público, Habermas passa a trabalhar o conceito de opinião pública e outros termos. Embora opinião pública e esfera pública tenham significados distintos, os dois possuem uma relação direta, como explica Habermas: “(...) no sentido de opinião pública, de uma esfera pública revoltada, ou bem informada, significados estes correlatos a público, publicidade, publicar. O sujeito dessa esfera pública é o público enquanto portador da opinião pública” (Habermas, 1984:14). Fica claro que opinião pública vem a ser a opinião das pessoas que compõem uma esfera pública, pessoas que são, portanto, o público. Os termos publicidade e publicar referem-se ao “caráter público” (Habermas, 1984:14) de algo, do espaço público inclusive – algo público é algo dotado de publicidade[19] – e, verbalmente (publicar), é tornar algo público. Em comum, todos os termos têm o caráter de se referirem ao primeiro termo acima colocado, o público. Depois que define os termos, Habermas, por fim, trabalha em cima do conceito de esfera pública: A própria “esfera pública” se apresenta como uma esfera: o âmbito do que é setor público contrapõe-se ao privado. Muitas vezes ele aparece simplesmente como a esfera da opinião pública que se contrapõe ao poder público. Conforme o caso, incluem-se entre os órgãos estatais ou então os mídias que, como a imprensa, servem para que o público se comunique (Habermas, 1984:14). Vimos até aqui que Habermas coloca duas funções fundamentais, relacionadas aos termos de esfera pública e opinião pública: a necessidade de termos um público informado, e a função da imprensa em serviência à comunicação pública. A importância da imprensa na construção da opinião pública dentro do espaço público é um fato relevante neste estudo e, também, um objeto de grande destaque dentro dos estudos de Habermas, no que ele denomina como esfera pública. Habermas também coloca a importância da esfera pública na construção de uma crítica ao poder, outro fator de suma importância em seus estudos. As primeiras esferas públicas mencionadas por Habermas em seus estudos surgiram na Grécia Antiga e no Império Romano, porém com características distintas das esferas públicas modernas mediatizadas pela mídia, no caso a imprensa, que surgiram a partir da emergência dos Estados modernos e da sociedade burguesa. As próprias características dessas esferas públicas antigas contrapõem o conceito de públicas, pois não eram de alcance de todos os cidadãos dessas sociedades e, sendo assim, nos permitem um “salto na história”, levando-nos diretamente à Idade Moderna. A importância da esfera pública dentro de um Estado moderno é o que nos coloca Habermas: “(...) a esfera pública (...) passam a ter novamente uma efetiva aplicação processual jurídica com o surgimento do Estado moderno e com aquela esfera da sociedade civil separada dele: servem para a evidência política” (Habermas, 1984:17). Mais uma vez, o alemão ressalta a importância da esfera pública na discussão política, evidenciando a importância dessa sua peculiar característica. Outra característica do Estado moderno relacionada com a esfera pública da emergente sociedade burguesa é o capitalismo: (...) para fazer aflorar a esfera da “boa sociedade”, tão singularmente suspensa ao longo do século XVIII, mas nitidamente destacada depois dos Estados nacionais e territoriais, à base da economia do capitalismo comercial, terem aparecido após destruírem os fundamentos do poder feudal. A última configuração da representatividade pública, ao mesmo tempo reunida e tornada mais nítida na corte dos monarcas, já é uma espécie de reservado, em meio a uma sociedade que ia se separando do Estado. Só então é que, num sentido especificamente moderno, separam-se esfera pública e esfera privada (Habermas, 1984:23). O Estado moderno surge a partir da necessidade capitalista de regulamentação do mercado. O mercado capitalista separa o púbico do poder, mesmo que o poder servisse para mediar os interesses de instituições capitalistas, com isso surge uma nova “casta” social que se amolda em torno desse mercado capitalista, a sociedade burguesa. É nesse momento que temos nitidamente uma esfera pública separada de uma esfera privada. Habermas destaca iniciativas anteriores à imprensa, o uso do correio e das cartas privadas, como uma necessidade da nova sociedade comercial capitalista em receber informações comerciais. Essa troca de informações vai ganhando novas dimensões informativas que cumpriam os papéis típicos da imprensa, porém não poderiam se caracterizar como públicas por se tratarem de mensagens privadas, característica fundamental que condiciona a mídia como fator construtor da esfera pública. Assim, o germânico destaca a importância da imprensa na construção do espaço público a partir do momento em que ela se torna acessível ao público: “(...) só existe uma imprensa em sentido estrito a partir do momento em que a transmissão de informações regularmente torna-se pública, ou seja, torna-se por sua vez acessível ao público em geral” (Habermas, 1984:30). Esta emergente burguesia que surgia, composta de capitalistas e prestadores de serviços, veio a compor o público, elemento primordial sem o qual não existe a esfera pública. A partir de divergências entre o Estado e esse público, deflagra-se um antagonismo entre esses dois setores da sociedade, como narra Habermas: As autoridades provocam uma tal repercussão nessa camada atingida e apelada pela política mercantilista que o publicum, o correlato abstrato do poder público, acaba por revelar-se conscientemente como um antagonista, como o público da esfera pública burguesa que então nascia (Habermas, 1984:38). O público burguês entra em atrito com o poder em função de questões políticas mercantilistas, e assim passa a desenvolver uma consciência crítica em relação às políticas deste poder, como evidencia Habermas: (...) em função das intervenções públicas na economia doméstica privatizada é que se constitui, finalmente, uma esfera crítica (...) a referida zona de contato administrativo contínuo torna-se uma zona “crítica” também no sentido de que exige a crítica de um público pensante. O público pode aceitar esta exigência tanto mais porque precisa apenas trocar a função do instrumento com cuja ajuda a administração já tinha tornado a sociedade uma coisa pública em sentido estrito: a imprensa (Habermas, 1984:39). Nessa construção do pensamento crítico burguês, Habermas mostra que um fator primordial está em cena, a imprensa. A imprensa então, é o elemento fundamental que transforma a consciência crítica e política burguesa em uma crítica pública. O público agora tem acesso à consciência crítica política. A Esfera Pública de Jürgen Habermas Uma vez definidos os termos e o contexto da sociedade burguesa capitalista, Jürgen Habermas passa então, a trabalhar o conceito de esfera pública propriamente dito, e coloca: A esfera pública burguesa pode ser entendida inicialmente como a esfera das pessoas privadas reunidas em um público; elas reivindicam esta esfera pública regulamentada pela autoridade, mas diretamente contra a própria autoridade, a fim de discutir com ela as leis gerais da troca na esfera fundamentalmente privada, mas publicamente relevante, as leis do intercâmbio de mercadorias e do trabalho social (Habermas, 1984:42). Na frase acima, estranha-nos o fato de uma esfera pública ser composta por sujeitos inseridos em uma esfera privada, e sobre esse fato singular, Habermas explica: Os burgueses são pessoas privadas; como tais, não “governam”. Por isso, as suas reivindicações de poderio contra o poder público não se dirigem contra a concentração do poder que deveria ser “compartilhado”; muito mais eles atacam o próprio princípio de dominação vigente. O princípio de controle que o público burguês contrapõe a esta dominação, ou seja, a esfera pública, quer modificar a dominação enquanto tal (Habermas, 1984:43). Assim, fica claro que, embora os burgueses componham uma esfera pública privada, eles se organizam como público, pois estão separados do poder, separados do Estado e da aristocracia da Corte. Em um diagrama, Habermas faz uma condensação do cenário onde estão o setor privado, a esfera do poder público, a esfera pública política e a esfera pública literária (Habermas, 1984:45). Do lado do setor privado encontram-se a sociedade civil composta do mercado e dos trabalhadores sociais e o espaço íntimo da pequena-família, espaço este de suma importância para o crescimento da intelectualidade burguesa: “A compreensão que o tirocínio público tem de si mesmo é dirigido especificamente por tais experiências privadas que se originam da subjetividade, em relação ao público, na esfera íntima da pequena-família” (Habermas, 1984:43), diz o alemão. Para compreendermos melhor a importância da pequena-família, ela está no fato de a vida pública burguesa começar dentro da própria casa, como expõe Habermas: As pessoas privadas que se constituem num público não aparecem “na sociedade”; toda vez elas, por assim dizer, destacam-se primeiro em relação ao pano de fundo de uma vida privada que ganhou forma institucional no espaço fechado da pequena-família patriarcal. Este é o local de uma emancipação psicológica que corresponde à emancipação político-econômica (Habermas, 1984:62). Do lado da esfera do poder público, como colocamos, estão o Estado, que inclui a polícia e a Corte, e a sociedade da aristocracia. No meio desses dois setores, público e privado, estão a dita esfera pública política e a esfera pública literária, composta por clubes, imprensa e o mercado de bens culturais. Assim como a esfera íntima da pequena-família burguesa tem papel importante no desenvolvimento da intelectualidade burguesa, o mercado de bens culturais também assume papel importante em tal desenvolvimento, como evidencia Habermas: “Interesses psicológicos também dirigem o raciocínio que se inflama nos espaços culturais tornados públicos: na sala de leitura ou no teatro, em museus e concertos. À medida que a cultura assume forma de mercadoria, (...) pretende-se ver nela o objeto próprio de discussão e com qual a subjetividade ligada ao público entende a si mesma” (Habermas, 1984:44). Por ironia do destino, esse mesmo mercado de bens culturais que fomentou o surgimento da esfera pública iria, no futuro, ser responsável pelo fim da esfera pública, como veremos a seguir. E, como vimos na descrição do diagrama de Habermas, entre os setores público e privado temos também a esfera pública literária, que o alemão destaca ser de suma importância para a construção do pensamento crítico burguês: A “cidade” não é apenas economicamente o centro vital da sociedade burguesa; (...) ela caracteriza, (...) uma primeira esfera pública literária que encontra as suas instituições nos coffee-houses, nos salons e nas comunidades de comensais. Os herdeiros daquela sociedade de aristocratas humanistas, em contato com os intelectuais burgueses que logo passam a transformar as suas conversações sociais em aberta crítica (Habermas, 1984:45). A importância dessa esfera pública literária é fundamental, pois são nesses espaços que, como vimos nessa citação, se desenvolve a crítica burguesa. Esse espaço é, então, o mesmo espaço, ou a esfera pública política, como deixa claro Habermas: “A esfera pública política provém da literária; ela intermedia, através da opinião pública, o Estado e as necessidades da sociedade” (Habermas, 1984:46). É nesse espaço literário que a imprensa vai ter uma atuação fundamental, tornando-o um espaço ou esfera pública de debates que questiona os rumos da sociedade. Fica claro que, na medida que a burguesia desenvolvia uma consciência de seu papel na sociedade, utilizando-se desses espaços – tanto em esferas públicas como privadas – fomentada por uma imprensa de opinião e em contato com uma aristocracia que também se afastava do poder do Estado[20], surgia uma crítica em relação ao poder, e esta burguesia passaria, então, a reivindicar o seu papel dentro da sociedade. Até aqui nós temos todos os elementos constituintes de uma esfera pública: o mercado capitalista, o Estado moderno, a sociedade burguesa, as esferas públicas política, literária e íntima, a mídia (que no caso da emergente sociedade burguesa, era a também emergente imprensa escrita) e o desenvolvimento de uma consciência política e crítica dentro das esferas públicas. Esse enorme palco tinha diferentes esferas públicas, muitas delas dentro do conceito estrutural (ou temporárias) e, a que nos interessa mais, as esferas públicas conjunturais (ou permanentes)[21], como muitas que surgiam na Europa durante os séculos XVI, XVII e XVIII, onde sempre se destacava o uso da prensa gráfica fomentando intensos debates públicos como, por exemplo, na iconoclastia calvinista[22], na institucionalização da imprensa na Holanda[23], no aparecimento dos jornais oficiais e não-oficiais na França pré-revolucionária do século XVII[24], e os exemplos clássicos da história: a própria Revolução Francesa (1789), a Revolução Gloriosa Inglesa (1685) e, no novo mundo, a Revolução Norte-Americana (1776). Vemos que a imprensa escrita aparece como um vetor importantíssimo na construção da crítica burguesa e, como esclarecemos, tal fato é de concordância de vários estudiosos[25], porém creditar somente a ela a construção desse pensamento seria falta de bom senso. Mencionamos, inclusive, que, antes do surgimento da esfera pública burguesa, os comerciantes europeus utilizavam-se de outras formas de comunicação e mantinham uma grande tradição na transmissão de informações e conhecimentos de forma oral. A influência do jornal vai ganhar dimensões com o advento da tipografia, que surge em meados do século XV, como vemos na passagem a seguir: A impressão tipográfica foi uma das maneiras de se produzir jornal, mas não a única. (...) o jornal impresso somente surgiu por volta do ano 1600, um século e meio após o advento da máquina tipográfica, inventada na Europa em meados do século XV. Todavia, neste período de cento e cinqüenta anos durante o qual a tipografia esteve imprimindo somente livros, houve jornais, só que feitos a mão, as chamadas “gazetas manuscritas”. É bem verdade que o jornalismo multiplicou enormemente sua influência depois que se tornou tipográfico (Costella, 2001:15). Como vemos, o jornal impresso vai ter a sua atuação marcada na Europa do século XVII, justamente quando temos o surgimento dos Estados modernos, do capitalismo e da burguesia. Porém, antes do advento da imprensa, já havia outras formas de transmitir notícias, informações e opiniões, como vimos, as “gazetas manuscritas” e, como mencionamos, a comunicação oral. A importância da comunicação oral é fundamental pois, introduzindo-se nela a imprensa, obtemos um cenário onde os jornais vão fomentar as discussões políticas dentro dos espaços públicos, como se explicitou nos estudos de Habermas, e esta, a imprensa, foi o elo fundamental que fez emergir a esfera publica. O Fim da Esfera Pública O jornalista e pesquisador livre-docente Mauro Wilton de Sousa (ECA/USP), em palestra para estudantes de jornalismo no Espaço Cultural CPFL (São Paulo)[26], discorreu sobre “as quatro idades da imprensa” e o papel do jornalista e da esfera pública. Referindo-se aos estudos de Habermas e outros teóricos (entre os quais Baudrillad, Adorno e Horkheimer) contou como uma imprensa que nasceu opinativa, fomentadora da esfera pública, acabou se modificando e “matando” essa esfera pública. Sua palestra é fundamental para entendermos a evolução da imprensa, um pouco de sua história, e de como ela se relaciona com o presente assunto, dessa forma, iluminando um entendimento mais profundo sobre o papel da imprensa e, na atualidade, da Internet dentro desse contexto. A-) 1ª Idade da Imprensa – Imprensa de Opinião É justamente a impressa à qual nos referimos no tópico anterior. Data do surgimento da prensa gráfica até o crepúsculo do século XVIII e início do século XIX, ou seja, esta fase termina pouco depois da Revolução Francesa. A imprensa, nesta época, é caracterizada por não possuir interesses econômicos e ser livre de qualquer tipo de coação. É a imprensa da troca de opiniões nos cafés literários, de argumentação política, que intermediava a esfera pública coletiva, fomentando a discussão política e a troca de opiniões. B-) 2ª Idade da Imprensa – Fase Comercial Datada do início do século XIX, a chamada de Fase Comercial da imprensa marca a entrada do interesse econômico na produção dos jornais, sendo a imprensa que evolui junto à Revolução Industrial. O interesse então passa a ser a obtenção de lucro com a venda de jornais. Dessa forma, a imprensa perde a sua característica de isenção total e começa não mais a propagar idéias, e sim a vender idéias. Vender idéias e interesses com o intuito de angariar leitores, de manter um público leitor. O comprometimento político já não existe mais, embora a política vá sempre fazer parte do noticiário; porém, agora ela o faz objetivando (e objetivamente) o lucro com a venda do jornal. Essa fase marca a entrada do folhetim nos jornais, que eram obras literárias (ficção, romances) publicados em capítulos a cada edição como uma forma de prender o leitor ao jornal. Esta fase marca também o início da entrada da publicidade nos jornais. Essa mudança de uma imprensa de opinião sem interesses econômicos para a fase comercial marca o início do fim esfera pública. C-) 3ª Idade da Imprensa – Interesse Ideológico Se a fase comercial da imprensa marcou o início do fim da esfera pública, a terceira idade da imprensa, que começa a partir do alvorecer do século XX, acaba de vez com qualquer resquício de esfera pública nos moldes que trabalhamos até agora. A imprensa já não é mais local, ela agora atinge as massas, é uma imprensa que produz jornais em escala de massa, em ritmo industrial (evoluindo e ampliando fronteiras com novas tecnologias que iam surgindo: telégrafo, cabo submarino intercontinental, fotografia e radiotransmissão entre outras). O interesse da imprensa, então, passa a ser as massas, é uma imprensa que media a criação da indústria cultural. O século XX marca a entrada de várias mídias de massa no grande palco da mídia, surge o mainstream media: o cinema, rádio e a televisão (além da já tradicional imprensa escrita). Com isso temos um grande crescimento na indústria que produz e reproduz os bens culturais. A imprensa, então, trabalha num conceito de ideologização das massas sob o interesse comercial de difundir e expandir essa indústria cultural[27]. Os meios de comunicação, incluindo a imprensa, passam a ser intérpretes dos interesses privados, é uma imprensa guiada pelo interesse do marketing e o capital da publicidade. Acaba o espaço da argumentação na imprensa e entra a informação, a imprensa passa também a ser um veículo de entretenimento. A imprensa, que antes era um espaço de argumentação política, de opinião, se torna um espaço de troca de interesses econômicos sobre questões político-ideológicas. É o fim da esfera pública dentro dos conceitos que trabalhamos. D-) 4ª Idade da Imprensa – Gerações Públicas Generalizadas A quarta idade da imprensa se inicia a partir da metade do século XX. É quando diversas instituições, Estado, empresas, organizações, igrejas etc., passam também a buscar o seu espaço dentro da mídia (imprensa, rádio e TV), de forma a se colocarem generalizadamente na sociedade. É quando surgem as acessorias de imprensa e as relações públicas, evidenciando a importância que as instituições têm de se colocar na mídia, em mostrar suas idéias e defender seus interesses. A imprensa mostra, assim, uma pluralidade de interesses, a argumentação fica dispersa dentro dessa pluralidade. Este cenário de pluralidade montado por Wilton Sousa, somado ao que já averiguamos sobre as novas características midiáticas que tomam o palco da comunicação na atualidade com o advento da Internet, poderíamos, apenas para uma rápida compreensão desse contexto, intitulá-lo de fase das “Gerações Públicas Binárias, Conectivas e Massivamente Generalizadas”, ou algo parecido, apenas para compreendermos um pouco da dimensão de como a evolução tecnológica atual que permeia toda sociedade, mais e mais instituições e até indivíduos, têm como se colocarem de forma generalizada dentro do cenário midiático em diferentes graus. E ainda, com o passar dos anos, a imprensa passa a conviver com o fenômeno da globalização, que a afeta diretamente. O capital da imprensa agora é globalizado, seja através dos grandes conglomerados de mídia, os global players, seja na própria comunicação veiculada, que passa a ser mista, ao mesmo tempo local e global. Outro fenômeno antagônico acontece com a imprensa, como coloca Wilton Sousa: “O processo de globalização fez com que o processo de informação esteja ao mesmo tempo generalizado e centralizado”. Ou seja, ao mesmo tempo em que vários setores da sociedade buscam seu espaço na mídia de forma generalizada, o mass media é centralizado, com poucos emissores falando para milhões de receptores. A imprensa deixa de ser um espaço de argumentação e passa a ser o espaço da visibilidade da informação e, neste contexto, a liberdade é limitada. A esfera pública, então, desaparece completamente da imprensa e passa a buscar o seu espaço fora da mídia. Outra característica de dualidade da mídia na atualidade, que se intensifica com a expansão da Internet e do mundo interconectado, é apontada por Nicholas Negroponte. O autor afirma que a mídia tornou-se maior e menor ao mesmo tempo, o que, entendemos como mais amplas (alcançando mais públicos) e mais fragmentadas (cada vez se especializando em assuntos mais específicos e direcionados para públicos menores, o narrowcasting): Na era da informação, os meios de comunicação de massa tornaram-se simultaneamente maiores e menores. Novas formas de transmissão televisiva como a CNN e USA Today atingiram públicos maiores, ampliando ainda mais a difusão. Revistas especializadas, videocassetes e serviços por cabo deram-nos exemplos de narrowcasting, atendendo a grupos demográficos pequenos. Assim, os meios de comunicação se tornaram maiores e menores a um só tempo (Negroponte, 1995:157). Voltando à palestra de Mauro Wilton Sousa, no seu fim, o pesquisador discute o papel da imprensa hoje, onde esta está inserida dentro de um contexto de uma sociedade pós-moderna capitalista e economicamente globalizada, dentro de um mercado que não é apenas local ou nacional, é mundial. A imprensa hoje é o espaço do conflito, que reflete os conflitos típicos de uma sociedade globalizada, os conflitos raciais, étnicos, sociais e econômicos. E Wilton Sousa fala sobre o surgimento de duas novas esferas públicas: a esfera pública do conflito, que reflete e debate esses conflitos; e a esfera pública midiática, onde o “estar junto na sociedade” passa pela mídia[28], é a esfera que reúne o público em grandes eventos, tais como futebol, carnaval, cinema, shows, supertragédias[29], etc.. Esses espaços, entretanto, não são mais de argumentação e discussão política, são espaços de discussão da esfera privada. E, para finalizar e ilustrar esse novo contexto da imprensa, Wilton Sousa diz: “A opinião pública hoje se sustenta através da mídia, como espaço de circulação e não mais como espaço da argumentação”. Em suma, não há mais esfera pública como na conceituação que vimos nos estudos de Jürgen Habermas. O foco político, fundamental nos conceitos do alemão, não só dentro do contexto da Idade Moderna, de outros mais remotos, como nas antigas Roma e Grécia, se perderam no cenário acima descrito. Porém, no novo paradigma que se molda dentro da cena midiática atual e sua nova vedete, a Internet, vale investigar se tais mudanças afetam este palco revelado por Wilton Sousa. Poderia a Internet alterar de forma radical este contexto e até, quem sabe, resgatar a esfera pública? Nos referimos à esfera do debate político, que dá rumo ao destino das sociedades, como já bem mencionamos anteriormente. As reflexões no tópico a seguir buscam encontrar uma luz no fim do túnel para essa obscura questão. A Esfera Pública na Internet Antes de lançarmos uma luz sobre a questão, se a Internet resgata a esfera pública ou não, vamos voltar ao diagrama de Habermas e analisar se os termos ali colocados estão presentes nos dias atuais. Habermas falava em dois setores: o privado e a esfera do poder público. Dentro do setor privado se destacavam a sociedade civil, com o seu setor de troca de mercadorias, e o trabalho social, setor esse que ainda existe, porém com um mercado agora globalizado. Ainda no setor privado existia o espaço íntimo da pequena-família que, naturalmente, ainda existe nos dias atuais. Vale frisar que esse setor era composto basicamente da burguesia que de fato ainda existe hoje, embora essa burguesia não se autodenomine mais como burguesia. Na esfera do poder público, onde se destacavam o Estado e seus aparelhos repressivos, estes não só perduram até os dias atuais como ainda têm seus poderes e seus aparelhos replicados em diversas instituições que o compõem. Não temos mais a Corte e nem uma aristocracia como a conhecíamos nos tempos das Cortes Reais, mas, com ampliação do Estado e seus aparelhos, estes suplantam a existência dessa Corte aristocrática como era nos tempos da realeza. De qualquer forma, ainda temos atualmente, um setor público e um setor privado visivelmente separados entre si, e uma sociedade civil que se organiza como público. Entre esses setores, Habermas colocava as esferas públicas política e literária, esta composta de clubes e a imprensa, e também, do mercado de bens culturais. No papel creditado por Habermas aos clubes, hoje temos diversas outras formas de agrupamentos de pessoas onde debates, políticos ou não, acontecem, de forma que espaços públicos (físicos) existem em abundância, locais onde a sociedade poderia estar discutindo o seu destino. O mercado de bens culturais existe e está mais forte do que nunca, é, inclusive, globalizado também. Se transplantarmos as teorias de Habermas sobre o mercado de bens de consumo onde ele dizia que este, uma vez público, ajudou a criar a autoconsciência burguesa, podemos pensar o mesmo da Internet. A Internet é uma mídia que traz junto de si toda uma onda consumista de bens culturais e, junto desta onda, novas formas de interatividade que levam os cidadãos, conectados, a terem mais conhecimentos sobre si mesmos. Sobre esse tema em particular é o que nos fala Pierre Lévy: A cibercultura é propagada por um movimento social muito amplo que anuncia e acarreta uma evolução profunda na civilização. O papel do pensamento crítico é o de intervir em sua orientação e suas modalidades de desenvolvimento. Em particular, a crítica progressista pode esforçar-se para trazer à tona os aspectos originais das evoluções em andamento (Lévy, 1999:229). Lévy aponta para um movimento social amplo, liderado pela cibercultura, que é a cultura que provém das peculiaridades interativas do ciberespaço. A questão então é: essa nova forma de consumo cultural que nos traz a Internet, não teria o mesmo papel que o incipiente mercado de bens culturais nos primórdios da imprensa? Nem Lévy nos responde essa questão, pois ele mesmo diz que esse movimento social “anuncia” uma evolução na civilização, e invoca o pensamento crítico como guia para esse desenvolvimento. Ele não nos fala que de fato isto está ocorrendo, mas, passados nove anos desta afirmação de Lévy, estaria ocorrendo? Uma coisa apenas é certa: o crescimento da Internet traz consigo um mundo informativo exponencial e incomensuravelmente maior em comparação ao que tínhamos até então. Toda essa informação, esse conteúdo – a “avalanche”, o “boom” – as novas formas de interação e tudo que já levantamos neste estudo, de alguma forma está mudando as pessoas que partilham desse novo mundo comunicativo. Mas, nessa explanação, acabamos deixando de lado a questão de que a Internet, e sua peculiar forma de expressão cultural, realmente colabora para a criação de uma consciência crítica maior dos seus usuários conectados entre si. Vimos nos estudos de Habermas que a autoconsciência burguesa era uma consciência de seu papel dentro de um mercado de bens de consumo na sociedade capitalista. Transplantando esse aspecto para o mundo atual em seu mercado globalizado e interligado pela Internet, fica claro que o consumidor, sendo coprodutor da informação, evolui com ela, e isso pode levar a crer que, neste processo, ele vá criar uma autoconsciência de seu papel na sociedade e, potencialmente, criar uma consciência crítica a respeito disso, o que poderá levá-lo a querer fazer parte da discussão dos rumos da sociedade na qual está inserido. Ao menos em si mesma, como meio, podemos dizer que, nesse sentido, a Internet é uma mídia mais democrática que as demais, apesar de problemas como a exclusão digital, o que atribuímos ao fato de ela permitir a comunicação todos-todos e os demais meios não. Outro fator que Habermas trouxe à luz sobre a imprensa na Idade Moderna é: “Quando, 1709, Steele e Addison publicaram os primeiros números do Tatler, os cafés já eram tão numerosos, os círculos dos freqüentadores dos cafés já eram tão amplos que a coesão desse círculo multiforme só podia ser mantida através de um jornal” (Habermas, 1984:58). Entendemos que, nos dias atuais, com uma sociedade globalizada, onde o mercado é local e global, assim como a imprensa e os tradicionais meios do mass media, como vimos anteriormente, a única mídia capaz de trazer uma coesão a esta dispersão seria a Internet, pois ela é ao mesmo tempo local e global, e também é a única mídia que conecta todos seus usuários e as diversas redes dispersas por todo mundo, o que inclui até mesmo as redes de radiotransmissão e os tradicionais jornais diários, que hoje registram seus endereços na web e assumem a forma de portais de notícia. Sobre a hipótese que se lança aqui, Pierre Lévy, sem dúvida, dá diversas pistas sobre as mudanças na sociedade com a criação de um novo espaço comunicacional interativo, pistas que nos levam à busca do elemento que nos falta para completar o diagrama de Habermas no mundo globalizado: a esfera pública. Sem dúvida, uma esfera pública que discute os destinos da sociedade pode ser chamada de democrática, e, sobre a democracia no ciberespaço, Lévy nos diz: Para cortar pela raiz imediatamente os mal-entendidos sobre a “democracia eletrônica”, vamos esclarecer novamente que não se trata de fazer votar instantaneamente uma massa de pessoas separadas quanto a proposições simples que lhes seriam submetidas por algum demagogo telegênico, mas sim de incitar a colaboração coletiva e contínua dos problemas e sua solução cooperativa, concreta, o mais próximo possível dos grupos envolvidos. (...) Articular os espaços (...) visa antes compensar, no que for possível a lentidão, a inércia, a rigidez indelével do território por sua exposição em tempo real no ciberespaço. Visa também permitir a solução e, sobretudo, a elaboração dos problemas da cidade por meio da colaboração em competências, dos recursos e das idéias (Lévy, 1999:195). Aqui Lévy revela que a Internet, sendo uma mídia interativa, poderia ser um espaço de discussão dos rumos da sociedade, de forma que, potencialmente, poderíamos afirmar que a Internet é a forma comunicacional que traz em si uma “tecnologia” que se permite usá-la como uma esfera pública. É um espaço que poderia servir como a esfera literária do século XVIII, um espaço onde as pessoas poderiam buscar informações e argumentar politicamente mesmo que separadas fisicamente. Se de fato a Internet se dá a esse espaço é outra questão que merece uma resposta satisfatória. Esses espaços virtuais de debates poderiam ser as chamadas “comunidades virtuais”. Lévy aponta essa questão, contrapondo a Internet aos mass media que acabaram com o espaço público, como vimos no tópico anterior: A maioria das comunidades virtuais estrutura a expressão assinada de seus membros frente a leitores atentos e capazes de responder a outros leitores atentos. Assim (...) longe de encorajar a irresponsabilidade ligada ao anonimato, as comunidades virtuais exploram novas formas de opinião pública. Sabemos que o destino da opinião pública encontra-se intimamente ligado ao da democracia moderna. A esfera do debate político emergiu na Europa durante o século XVIII, graças ao apoio técnico da imprensa e dos jornais. No século XX, o rádio (...) e a televisão (...) ao mesmo tempo deslocaram, amplificaram e confiscaram o exercício da opinião pública. Não seria permitido, então, entrever hoje uma nova metamorfose, uma nova complicação da própria noção de “público”, já que as comunidades virtuais do ciberespaço oferecem, para debate coletivo, um campo de prática mais aberto, mais participativo, mais distribuído que aquele das mídias clássicas? (Lévy, 1999:129). Apesar de Lévy terminar essa colocação com uma interrogação, ela tem implícita uma resposta positiva. Sem dúvida, pelas suas peculiaridades interativas, a Internet, bem como a imprensa no século XVIII, serve como aparato técnico para o resgate da esfera pública em alternativa aos mass media que, como vimos no capítulo anterior, irradiam a informação de poucos para muitos, afinal, em contraposição a isso, o ciberespaço é uma via comunicacional de mão dupla. Como mencionamos no exemplo da Revolução Francesa, o Iluminismo teve um papel fundamental na criação de uma esfera pública. Os ideais iluministas e seus filósofos foram de imensa valia para a construção da consciência crítica burguesa que precederam à revolução. Lévy defende a teoria de que a cibercultura é, de certa forma, um resgate dos ideais iluministas e, portanto, subentende-se, um resgate da esfera pública (ao menos no que poderia se assemelhar com o cenário daquela época): Em contraste com a idéia pós-moderna do declínio das idéias das luzes, defendo que a cibercultura pode ser considerada como herdeira legítima (ainda que longínqua) do projeto progressista dos filósofos do século XVIII. De fato, ela valoriza a participação em comunidades de debate e de argumentação. Na linha direta das morais igualitárias, encoraja uma forma de reciprocidade essencial nas relações humanas. Desenvolveu-se a partir de uma prática assídua das trocas de informações e de conhecimentos, que os filósofos das luzes consideravam como sendo o principal motor do progresso (Lévy, 1999:245). Assim, podemos afirmar que a Internet, a mídia do palco cuja peça é a cibercultura, ao menos de forma potencial, resgata a esfera pública, já que é um veículo que tem dentro de si, espaços para argumentação e o debate. Como vimos anteriormente, o estágio atual da mídia é o espaço do conflito. Surge, assim, a esfera pública do conflito. Na mesma medida em que Lévy abre a possibilidade para a Internet ser o palco que resgata a esfera pública, ele aponta que a cibercultura, embora resgate os ideais da idade das luzes, também, de certa forma, recai dentro dessa esfera, pois é uma expressão de conflito: A cibercultura surge como a solução parcial para os problemas da época anterior, mas constitui em si mesma um imenso campo de problemas e conflitos para os quais nenhuma perspectiva de solução global já pode ser traçada claramente. As relações com o saber, o trabalho, o emprego, a moeda, a democracia e o Estado devem ser reinventadas, para citar apenas algumas formas sociais mais brutalmente atingidas (Lévy, 1999:246). Em suma, mesmo que a Internet tenha consigo a tecnologia e os fundamentos ideológicos que resgatam a esfera pública, até mesmo Lévy levanta a necessidade de se reinventar as relações que citou, somente assim, constituindo-se como uma forma para solucionar os problemas advindos de uma época que marcou o fim da esfera pública. Pierre Lévy não é o único teórico que partilha da idéia de que a Internet é o caminho para o resgate da esfera pública, mesmo sem afirmar isso diretamente. O jornalista e especialista em ética jornalística Eugênio Bucci, referindo-se à Paris revolucionária do século XVIII[30], traça um paralelo daquela época com a Internet. Ele revela que Paris, pouco antes da Revolução, contava com centenas de diferentes títulos de periódicos distribuídos gratuitamente para a população, e assim se faziam os debates políticos. Os jornais eram, naquele momento, os condutores que oxigenavam a formação da opinião pública. Tal processo, de efervescência de idéias, era baseado numa idéia central que surgia na época: todo poder emana do povo, portanto o povo precisa ter informação para poder delegar poder, portanto a informação é um direito fundamental do cidadão. Tendo essa idéia como paradigma, tal efervescência de idéias é o que acontece nos dias atuais através dos meios digitais. Tais meios são, segundo Bucci, formadores de opinião pública que de alguma forma interferirão nos negócios públicos e, dentro deste contexto, a mediação do jornalista é muito importante e vem ao encontro do que está acontecendo com a Internet. Em suma, o fundamento da idéia nascida no século XVIII, que aponta a informação como um direito fundamental do cidadão, reaparece com força através da Internet e, para ilustrar melhor essa idéia, Bucci diz: “Na era do digital, o cidadão tem mais condição de chegar à informação, ou ao obstáculo que o separa da informação”. Vemos então que a informação, sendo parte fundamental na construção da esfera pública, é muito mais acessível através da Internet. Portanto a Internet tem, neste aspecto, mais condições de resgatar a esfera pública. Existem diversos estudiosos que percebem a potencialização da Internet como novo amparo à esfera pública. Tal debate é considerado por uma instituição de direitos humanos na Internet (DHnet)[31] em seu site, onde um texto não assinado expõe: “Pode-se dizer que a Internet é uma organização e materialização comunicativa da esfera pública, como teorizada, por exemplo, por Jürgen Habermas”. Apesar desse texto não chegar à conclusão nenhuma, ele faz uma análise muito parecida com a nossa em diversos aspectos. Expõe a “culpabilidade” dos interesses comerciais no “assassínio” da esfera pública e analisa até que ponto as características da Internet e a formação de comunidades virtuais pode resgatar o diálogo através da mídia e, dessa forma, contribuir para o resgate da esfera pública. O que fica evidente na seguinte passagem: “A constituição de uma esfera pública ‘saudável’, capaz de abrigar diferentes opiniões e qualidades de interação, pode ser considerada um dos fundamentos de uma sociedade democrática e participativa. Daí a importância que a Internet assume nesse processo de organização da esfera pública, da ordem social e política atual”. Cremos que, em concordância com essa afirmação, a característica de inserção do indivíduo na mídia, somente possível através da Internet e suas peculiaridades conectivas, é fundamental para recuperar o que foi perdido dentro do processo de formação da opinião pública como característica básica da esfera pública. Tal fato ganha relevância quando, como destacamos, hoje as sociedades estão imersas num mundo globalizado. Sendo assim, somente as características de uma rede global, como tem a Internet, teria a capacidade de ampliar qualquer debate, ou filtrá-lo, do nível local para o global e vice-versa. Como vimos até agora, a Internet, pelo menos de forma cultural, técnica, ideológica e informativa, é um caminho que, potencialmente, pode resgatar a esfera pública. Encontramos na Internet e na atual sociedade, os elementos que Habermas dispôs em seu diagrama, atualizados dentro de um mundo globalizado e palco de uma nova mídia interativa. Porém, se isto de fato está acontecendo – a volta da esfera pública – mesmo que num estágio inicial, uma ampla e efetiva pesquisa de campo seria necessária para tentar oferecer uma luz a essa questão. Mas, podemos buscar iniciativas dentro da Internet que nos levem a, ao menos, elucidar parte dessa questão, novas iniciativas que de alguma forma já estão, se não mudando a sociedade por completo, estão mudando um importante setor que, como vimos, sempre teve um papel de extrema importância na sociedade moderno-contemporânea, o jornalismo. Ainda neste estudo, veremos acontecimentos que podemos atribuir a um renascimento da esfera pública através da Internet, exemplos que nos mostram como isso já está acontecendo pelo mundo afora. O pesquisador e doutor em Ciências da Comunicação Rovilson Robbi Britto (ECA/USP), num longo estudo dissertativo onde aborda a questão da esfera pública no ciberespaço, chega a duas conclusões que envolvem o espaço real e o midiático, duas esferas que, na sua visão, são distintas, mas que interagem e se alteram: a nova realidade conterá diversos espaços, a Internet terá um amplo papel na reconfiguração dos espaços já existentes e na criação de novas esferas. Sobre o espaço público na Internet, o que ele chama de “ciberespaço público”, diz que “essa nova dimensão causa impacto (...) e começa a gestar a possibilidade real de uma democracia mais direta sobre as questões decisivas para a sociedade (...) ganha crescente importância e passa ser um lugar social de importantes encontros de processos que vão alterar de sobre-maneira a forma de estruturação do social” (Britto, 2001:180-181). Em poucas palavras, Britto aponta para uma nova dimensão que se abre para a esfera pública a partir da introdução da Internet como novo meio midiático por onde o debate de questões fundamentais para os rumos da sociedade está acontecendo. 3. A Crise dos Jornais Impressos “No problem, we have a few reporters in the pocket, they’ll plant a story and destroy his credibility” – Devil’s whisperson[32] Em artigo intitulado “Modernidade Líquida, Comunicação Concentrada”[33], o professor de ética jornalística Dr. Caio Túlio Costa (ECA/USP) escreve sobre convergência midiática e a sinergia dos grandes conglomerados de mídia que, a partir do advento das novas mídias e da Internet, estão colocando em risco o tão rentável e secular negócio mantido pela imprensa escrita, leia-se os grandes jornais impressos. Embora todos setores da mídia estejam sofrendo com a globalização e a Internet, Túlio Costa destaca que os jornais impressos são os que mais sofrem com as mudanças que vêm ocorrendo no palco da mídia. Túlio Costa demonstra através dos números o declínio da mídia impressa ao redor do mundo. Analisando dados da UNESCO em quarenta países no período entre os anos de 1965 e 2000, o professor faz algumas constatações: · A circulação de jornais estagnou-se em três países, cresceu em somente cinco e caiu em 32 do total de 40 países; · Entre os cinco países que revelam crescimento no consumo de jornal dois são de primeiro mundo (Noruega e Japão), dois podem ser considerados em desenvolvimento (Portugal e Paquistão) e um é comunista (China); · A maior queda se deu na Argentina, a circulação média caiu 65%; · Nos EUA, o estrago foi de 37% em 35 anos, uma queda anual de 1,3%. Mas ali se lêem 196 exemplares de jornais diários para cada grupo de mil habitantes; · No Brasil o baque foi de 15% em 35 anos, uma queda média de quase 0,5% ao ano. Só que no Brasil se consomem apenas 45 jornais para cada grupo de mil habitantes (Costa, 2005:84-185). Um olhar mais atento aos mesmos dados demonstra que a circulação dos jornais vem caindo a partir de 1997 – dois anos após a chegada da World Wide Web – embora em alguns países tenha-se obtido um ganho entre 1997 e 2003. Mesmo dentre os cinco países mencionados por Túlio Costa (Noruega, Japão, Portugal, Paquistão e China), que apresentaram um aumento de circulação tendo como base o ano de 1965, os dois mais desenvolvidos também apresentam queda na circulação após 1997. Apesar desses números apontarem um declínio da circulação dos jornais após o surgimento da Internet, Túlio Costa não enxerga a nova mídia como o bode expiatório para essa crise: O fato novo – também lembrado pelo trio[34] – é que empresas cuja tradição não se encontra na indústria da comunicação (nem na indústria da distribuição e, muito menos, na indústria do conteúdo) começam a dominar um sistema tradicionalmente tocado por famílias ou empresas cujas marcas impuseram-se, principalmente, pela construção de conteúdos, mesmo quando dominavam toda a cadeia, da produção à distribuição (Costa, 2005:182). Sobre o exposto acima, podemos acrescer as novas empresas que surgiram no mundo virtual, tais como a Google, que não precisam de toda essa parafernália para inserirem-se no novo contexto midiático e, igualmente, apresentam-se como novos concorrentes na disputa pelo mercado informativo. Além disso, com a quebra das fronteiras comunicacionais a partir dos portais informativos dispostos na rede mundial e a crescente globalização econômica, “empresas egressas de outras indústrias que não a de conteúdos em comunicação entraram firme neste mercado” (Costa, 2005:182), e, assim, estariam pulverizando diversos negócios solidamente construídos desde o grande impulso da indústria cultural a partir do início do século passado. Os jornais sempre foram acostumados com altas margens de lucros e, com a pulverização[35] dos negócios entre diversos novos atores, ávidos na busca de novos mercados globais, essa lucratividade baixou. Um jornal com baixa lucratividade torna-se um negócio pouco interessante para um possível comprador (como veremos mais adiante no estudo de Philip Meyer) e, como o jornal depende de uma larga base de leitores para se manter rentável, a concorrência informativa advinda da Internet (e suas novas formas de interação), à medida que se desenvolve, contribui para a diminuição dessa base, o que, no pior cenário imaginável, poderia levar esses veículos à falência. Existe saída? Sim, a própria Internet. Porém, tudo indica que o negócio desenvolvido secularmente pelos impressos jamais volte a ter a mesma rentabilidade e terão de conviver com novos atores que, além das novas empresas que entram nesse setor, inclui o internauta. Como coloca Rupert Murdoch[36], dono de um dos maiores conglomerados de mídia do globo (News Corporation), “dê às pessoas o controle da mídia, elas o usarão; não dê às pessoas o controle da mídia, você as perderá” (em Costa, 2005:192). Essas sábias palavras mostram que o monopólio secular informativo dos jornais (e também dos veículos que compõem o mainstream media – TV, rádio e impressos – no século XX) acabou, mas essas grandes marcas da comunicação mundial conseguirão manter seus negócios se souberem utilizar as novas tecnologias para fomentar o acesso à informação entre o público. Como vimos nas palavras de Pierre Lévy e Manuel Castells, hoje o leitor é parte do negócio da informação, não mais apenas como consumidor, mas como produtor também. A edição de Agosto de 2006 da revista The Economist, publicação inglesa, destacou a seguinte manchete em sua capa: “Who Killed the Newspaper?” (Quem matou o jornal?), onde uma matéria comenta sobre o estudo de Philip Meyer, Os jornais podem desaparecer?. Meyer prevê o fim do jornal impresso nos Estados Unidos dentro dos próximos 35 anos, como já comentamos na introdução desse trabalho e ainda abordaremos com mais profundidade logo adiante. Em matéria publicada em O Estado de S. Paulo em 24 de agosto de 2006[37], o jornalista Renato Cruz responde à pergunta da manchete de capa da revista The Economist com a simples colocação: “A Internet”. E depois acrescenta o seguinte dado: na Inglaterra, leitores de 15 a 24 anos dizem que gastam 30% menos tempo com jornais desde que começaram a usar a Internet[38]. Sobre esta mesma matéria da revista The Economist, os jornalistas Filippo Cecílio e Rodrigo Delfim escreveram uma longa matéria no jornal laboratório Contra Ponto, do curso de Jornalismo e Filosofia da PUC-SP, em setembro de 2006. O título da matéria questiona: “Onde seria o velório?”. No texto, os dois jornalistas expõem opiniões de especialistas e outros jornalistas, dentre eles Renato Pompeu, da revista Caros Amigos, que diz: “Não sou capaz de prever o futuro, mas assim como o cinema e a TV não acabaram com o teatro e a literatura, e a fotografia não acabou com a pintura, também acho que a Internet não vai acabar com a mídia impressa, que deverá procurar os seus nichos, tal como fizeram o teatro e a literatura e pintura”. O doutor em Ciências da Comunicação José Salvador Faro (PUC-SP ), alerta para o fato de as notícias transmitidas pela Internet serem mais “quentes”, ou seja, veiculadas logo após os fatos concretos decorridos enquanto os meios impressos precisam esperar a próxima edição – um dos nichos para evitar a “morte” do jornal impresso seriam eles “tornaram-se cada vez mais veículos analíticos do que simplesmente informativos”. Podemos observar, em ambas opiniões acima, que a solução apontada para evitar a “morte” do jornal impresso seria a sua segmentação, mas, nesse caso, eles não estariam então fazendo o mesmo papel das revistas, ou mesmo os impressos, conhecidos como tablóides? Nesse caso, os jornais impressos teriam de virar revistas ou pequenos tablóides e, de qualquer maneira, estariam morrendo, pelo menos da forma como são concebidos atualmente. A matéria não pára por aí, ela questiona o fato de a revista The Economist referir-se aos cenários europeu e norte-americano, e tal discussão no cenário brasileiro tem de levar em conta outros fatores, dentre eles está o fato de que, ao contrário das sociedades européias, onde a maior parte da população é consumidora de jornais, no Brasil grande parte das pessoas sequer sabem ler e os públicos dos jornais são apenas das classes A, B e C, os mesmo consumidores que têm acesso à grande rede. Por outro lado, os planos de inclusão digital para as classes baixas, que passam também pelo aprendizado e o hábito da leitura, poderiam fomentar o aumento da demanda tanto de jornais quanto de revistas, contrariando as previsões negativistas em relação à falência dos jornais. A matéria também aponta o fato de os novos tablóides que surgem no país, que fomentam o aumento da mídia impressa, e de o Brasil também consumir jornais estrangeiros, o que demonstraria a importância do jornal impresso por aqui e a sua força. Outro destaque importante da matéria foi a menção ao 6º Congresso Brasileiro de Jornais (29/08/2006), que coloca uma notícia alarmante. A AJN – Associação Brasileira de Jornais – através da voz de seu presidente, expõe: “A AJN não visa uma maior integração com os meios eletrônicos, como os blogs, e sim cobrar dos sites de notícias uma parte dos lucros e possivelmente processá-los por quebra de direitos autorais”. Tal declaração foi feita em função da gradativa perda de receita publicitária dos jornais impressos frente aos seus rivais digitais e, como veremos mais adiante em comentário de artigo de Caio Túlio Costa, demonstra um total despreparo e desconhecimento das potencialidades das novas mídias, sobretudo a Internet e a sua capacidade de veiculação da notícia. Um pensamento negativo como esse demonstra claramente a falta de visão que está fazendo as mídias tradicionais perderem seu espaço frente às digitais. É sobre o que comenta o jornalista Alberto Dines através do site Observatório da Imprensa: “Todas as soluções para salvar a imprensa mencionadas na reportagem são sopradas por consultores e analistas que jamais meteram a mão na massa, não aparece um jornalista eletrônico explicando as vantagens da Internet sobre os jornais impressos” e, vamos além, não aparece também a figura mais importante desse complexo sistema, o leitor, seja ele do impresso, do digital ou de ambos. Apesar de a matéria da revista The Economist anunciar o fim do jornal impresso, não podemos concluir se isso irá mesmo ocorrer, porém tal notícia e sua repercussão demonstram claramente que algo está acontecendo, algo está mudando, daí tanto debate, tantas discussões e opiniões diversas. Mas no meio de tanta discussão, de tantas informações e questionamentos sobre o futuro dos jornais, uma notícia veiculada na Folha de S.Paulo[39] traz um dado interessante de uma pesquisa divulgada nos Estados Unidos em 2007. Enquanto os dados demonstram a queda de circulação dos jornais impressos, o estudo mencionado aponta para um aumento de 8% na leitura dos jornais, computando-se os impressos e os digitais, e a leitura dos sites dos jornais teria aumentado 200% entre 2001 e 2005. Estes dados mostram que, se existe uma crise que afeta os jornais impressos, não existe crise para o jornalismo. Aliás, é o que aponta a própria Folha em pesquisa dentro de sua redação, onde 89% dos ouvidos são otimistas em relação ao futuro do jornalismo, embora muitos (35%) acreditem que a web nunca superará o impresso como principal veículo informativo. Essa pesquisa mostra que a crise dos impressos é algo muito relativo, mas que a chegada da Internet aponta para novas tendências, tanto para os impressos quanto aos novos espaços viabilizados pela web. Isso é fato[40]. Um exemplo de uma nova tendência para os jornais impressos poderia estar em um novo jornal que só cresce enquanto os tradicionais sofrem com queda de tiragem, o Metro. A publicação é originária da Suécia e alcança países na Europa, Ásia e América, com cerca de 80 edições diárias em 20 línguas[41], totalizando cerca de 22 milhões de leitores mundo afora. O veículo é um tablóide diário que trata de generalidades e é distribuído gratuitamente em locais públicos, como nas estações de metrô, e tem grande aceitação entre o público jovem cosmopolita. Trata-se de uma iniciativa privada custeada pela propaganda veiculada no jornal (através de contratos com grandes marcas mundiais). Em São Paulo, duas publicações utilizam-se da mesma estratégia, o Destak e o Metrô News, somando tiragens que ultrapassam 300 mil unidades. Ainda existem diversas outras publicações gratuitas semelhantes que vêm registrando um aumento vertiginoso de tiragens em grandes cidades mundo afora. Mas existe uma grande diferença entre receber um pequeno tablóide de graça no metrô e receber um O Estado de S. Paulo ou um The New York Times. Indicar esse tipo de iniciativa, como caminho à crise que afeta os grandes jornais impressos, é apontar para o abismo e falar “pule”. Esses tradicionais jornais seculares são muito mais que veículos de informação e publicidade, abrangem uma dimensão muito mais ampla, possuem história, têm peso na formação da opinião pública, se colocam ideologicamente dentro da sociedade, algo que não pode ser substituído apenas por uma fórmula que traz tiragens volumosas e retorno financeiro. No entanto, grandes jornais (como os dos grupos Folha e Estado) podem considerar a hipótese de lançar esse tipo de publicação como um novo meio para aumentarem a renda de suas empresas, como uma nova publicação. Mas imaginar que esse tipo de publicação possa substituir seus principais veículos, torna-se uma hipótese cujos fundamentos nem precisam sequer ser considerados, representaria o fim dos jornais como os conhecemos. Tiago Bugarin, diretor-geral do Metro de Portugal, falando sobre o fenômeno dos jornais gratuitos, destaca que “em termos editoriais é feito de maneira diferente da imprensa diária, é muito objectivo, escrito de forma concisa, factual e muito independente. A informação é feita para quem tem muito pouco tempo a perder. E nós tentamos dar uma resposta eficaz a essa necessidade”. Bugarin ainda dá ênfase ao fato de esse tipo de publicação, tanto não ser um caminho alternativo à crise dos impressos, quanto não se constitui como uma ameaça aos mesmos, onde expõe: Os jornais pagos terão sempre lugar no mercado, têm uma audiência própria. Pelo tipo de artigos que têm, pelo desenvolvimento das notícias que fazem, pela quantidade de crónicas de opinião. Coisas que o Metro não tem. Tem outra forma de ser construído, outra filosofia editorial e dirige-se a outro público. (...) um é gratuito outro é pago. Tem a ver com a densidade e com a complexidade de informação que é encontrada num e noutro título. Um jornal pago da imprensa tradicional não pode ser lido da mesma forma. As peças jornalísticas são de investigação, procuram aprofundar muito os temas e obrigam a uma leitura muito mais densa[42]. Percebemos, dentro de todas essas colocações, que são várias as peças que se posicionam em torno dessa relação entre o jornal e as novas mídias. Enquanto algumas movem-se em favor da tradicional mídia impressa, outras a cercam e a ameaçam de cheque-mate. Como se não bastasse, o jogo ainda ganha novas peças. Da mesma forma que as novas mídias se posicionam de forma ameaçadora frente ao jornal impresso, elas se colocam como a válvula de escape: o jornal continuaria existindo, seu suporte apenas é que deixaria de ser impresso, tornando-se digital. Nesse caso, o principal canal de comunicação dos jornais, até então impressos, passaria a ser a Internet, e os impressos seriam apenas um complemento, um luxo para carregar para qualquer lugar, sem bateria, que não “pifa” e que pode ser dobrado, amassado, rabiscado, virar material de limpeza e que nenhum ladrão tem interesse em roubar. Em entrevista para Robert Cauthorn – um dos pioneiros na informação online no Brasil – publicada no jornal Folha de S.Paulo em 25 de Março de 2007[43], o jornalista Laure Belot P. Santi, do jornal francês Le Monde, afirma que “o barateamento da banda larga e telas portáteis de alta qualidade modificarão profundamente os jornais impressos, que em breve deverão sair apenas nos fins de semana”. O jornalista destaca que importantes diários norte-americanos correm o risco de serem extintos em apenas uma geração, que tal mudança “é só uma questão de os preços do ‘papel eletrônico’[44] e das conexões sem fio chegarem a um nível acessível”. Em sua entrevista ao citado repórter, Cauthorn também destaca que tal revolução, já em curso, dizimará o jornal impresso quando, além do papel eletrônico (que ele se refere como telas flexíveis), outros meios físicos se tornarem acessíveis em grande escala, dentre eles a tinta digital. Cauthorn também destaca que a cadeia de produção e distribuição dos jornais impressos é hoje obsoleta em relação à necessidade de rapidez na informação jornalística, e que, nesse quadro, os meios digitais suplantarão totalmente os diários impressos. O jornalista também destaca o avanço dos blogs, e comenta que alguns blogueiros, sobretudo nos Estados Unidos, gozam da mesma notoriedade quanto alguns dos maiores editores, mas adverte que, em questões mais profundas, principalmente as ligadas ao jornalismo investigativo, sempre será necessária a retaguarda de uma grande editoria[45]. Dentro desse raciocínio, fica evidente que a Internet, ao mesmo tempo em que põe em cheque o velho modelo de jornalismo impresso, apresenta-se como um novo suporte que poderá representar uma grande economia de custo dentro de toda cadeia produtiva (incluindo a produção de informação) e distributiva inerente a tal negócio, vindo, assim, a beneficiá-lo. Outra notícia que surpreendeu muitos, e que demonstra como a Internet está realmente mudando os hábitos de consumo do cidadão moderno e “matando” o jornal impresso, e que se encaixa no raciocínio acima, foi o anúncio da Time Warner[46] que divulgou estar retirando de circulação a tradicional revista fotográfica norte-americana Life, cuja última edição foi a de 20 de abril de 2007. Porém o acervo fotográfico e novas publicações da Life continuarão acontecendo, mas agora apenas através da Internet. A editora chefa da revista, Ann Moore, por ocasião do anúncio do fechamento da revista, afirmou: “O mercado mudou de maneira dramática desde outubro de 2004, e hoje já não é apropriado continuar a publicar a Life como suplemento de jornal”. Esse fato, apesar do tom tristonho da notícia, mostra como uma publicação que perde seu valor para comercialização de forma impressa tem espaço na Internet, mesmo que com menor, pouco ou, até, nenhum valor comercial, mas que de qualquer forma está lá, seja como marca e/ou conteúdo. A crise dos jornais impressos também é sentida e debatida em diversos países da América Latina. O editorial de abril de 2007 da revista Chasqui[47], debate as mudanças que afetam os periódicos impressos como “el cambio más importante de su historia en el que – afirma el profesor Ramón Salaverría – no está en juego su supervivencia pero sí su hegemonia”[48]. A crise deixa de ser vista apenas como uma queda de venda ou faturamento, mas sim, como uma ruptura hegemônica: o império dos jornais impressos está ruindo. O editorial também aponta para uma das tendências vistas como a saída para essa crise por parte dos jornais: “las dificultades que enfrentan los diarios y sostiene que, si quieren mantenerse vivos, ya no podrán continuar siendo órganos puramente noticiosos sino optar – por ejemplo – por la interactividad, entendida como la posibilidad que tienen los ciudadanos de escribir en los diarios por propia iniciativa, manifestando opiniones que no necesariamente coincidan con la página editorial del médio”[49]. Essa tendência inclui usufruir as novas características do novo meio (que analisaremos no próximo capítulo), fazendo da interatividade um caminho para a pratica de um jornalismo mais pessoal e livre de coerções. Enquanto alguns estudiosos enxergam a ruptura de uma hegemonia, outros enxergam essa mudança não como uma ruptura, mas como o fim da profissão de jornalista, como insinua o professor de ética jornalística Álvaro Caldas: “O que se coloca em discussão diante desse quadro de rápidas transformações é não só o futuro do jornal impresso na era da informação eletrônica como também do jornalismo como profissão” (Caldas, 2002:38). O fim do jornalista é algo que vai além da crise dos jornais impressos na atualidade, inclui um amplo debate que chega até as raízes epistemológicas da Comunicação, onde uns crêem que o jornalismo é um campo de estudo à parte, aquém dessa área de conhecimento, outros enxergam essa profissão apenas como o domínio de um conjunto de técnicas, que não demandaria o status acadêmico que detém. Como vemos, essa crise extrapola as questões que hoje afetam a hegemonia dos jornais impressos. A relação da Internet dentro deste debate do jornalismo ganha urgência quando, com as novas mídias, a desintermediação e a introdução do indivíduo neste terreno cibernético, surgem pessoas sem vínculo com essa tradicional instituição com a mesma capacidade, no mínimo técnica, para essa prática profissional. O blogueiro, como ainda analisaremos no decorrer desta dissertação, talvez seja o grande exemplo desse novo profissional que aparece após o advento da grande rede. No cenário nacional, uma matéria da Folha de S.Paulo, “Tem futuro?”[50], aponta números da queda das tiragens dos três maiores jornais do país (Folha de S.Paulo, O Globo e O Estado de S. Paulo). Os dados mostram uma queda de 30% na circulação dos três grandes entre os anos de 2000 a 2005, “é como se um dos três tivesse deixado de circular”, diz a matéria, que depois se pergunta: “O que está acontecendo com os jornais?”. Na tentativa de responder, algumas hipóteses são traçadas: “a concorrência com as novas mídias, o crescimento ininterrupto da Internet e o fluxo livre de informações, a chegada dos blogs de notícia, as mudanças de comportamento”, fatores que são citados por diversos outros jornalistas e estudiosos que percebem as mudanças que vêm afetando os jornais impressos. Uma das perguntas que a matéria da Folha faz dentro desse cenário de crise é: “E a credibilidade?” que, segundo uma única pesquisa do Ibope (2006), os jornais estariam bem, mas, “os leitores estão cada vez mais críticos, e questionadores. E irritados também”. No final, a matéria ainda traz um texto do jornalista Matias Molina (do jornal Valor Econômico), que pode ser relacionada com essa mudança de postura do leitor, agora mais crítico. Molina diz: “Há um consenso entre os observadores do mundo da comunicação que o futuro dos jornais depende em parte da qualidade de informação que conseguirem colocar à disposição do leitor” (o que analisaremos através do estudo de Philip Meyer no tópico a seguir). Neste consenso, entendemos que a qualidade de informação que um jornal deverá fornecer independe da sua plataforma, impressa ou digital. Sendo assim, a Internet não pode ser apontada como vilã na crise que afeta os jornais impressos. Um artigo apresentado no XXX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, de autoria do especialista em Jornalismo Científico Sabine Righetti e do pesquisador livre-docente Ruy Quadros (UNICAMP), analisa a inovação tecnológica dos dois grandes jornais paulistanos, a Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo (Righetti e Quadros, 2007). Algumas informações desse estudo mostram como essas empresas estão lidando com a crise de seus jornais diários, chegando a desmistificar alguns dos contornos de sua relação com a Internet. Eles apontam um estudo de Manta (1997) onde a Internet não estaria roubando verbas publicitárias dos jornais, pelo contrário, “pode se tornar alvo do mercado publicitário, pois oferece formas vantajosas de publicidade, como a interatividade, a redução dos custos de produção e de distribuição” (em Righetti e Quadros, 2007:4). Assim, eles verificam que a questão da verba publicitária não teve peso na queda de circulação dos jornais que veio em paralelo à ascensão da Internet. Eles mostram que em relação à Folha de S.Paulo: Apesar de ter praticamente mantido sua renda publicitária, o jornal observou uma redução de 44,6% na sua circulação, tendo caído de uma média de 518 mil exemplares por dia (em 1996) para 287 mil exemplares diários (em 2006). Também o número de assinantes sofreu uma redução significativa de 33,1%, tendo passado de 405 mil assinantes para 272 mil, no mesmo período (Righetti e Quadros, 2007:10). Através de declarações de Sandro Vaia, diretor do Estadão em 2006, Righetti e Quadros entendem que a crise dos impressos vem de antes do advento da Internet, os dados relativos à publicidade seriam mais um demonstrativo dessa tendência. Aliás, as vendas já vinham declinando antes, levando também abaixo, o valor publicitário do veículo. Apesar do baque descrito durante o decênio 96-06, os jornais conseguiram manter-se graças à “uma movimentação com objetivo de aumentar a circulação dos jornais para atrair novos mercados anunciantes, a partir dos chamados ‘anabolizantes de vendas’ (fascículos acompanhados do jornal, como enciclopédias e livros) e da criação de novos títulos, em especial jornais populares” (Righetti e Quadros, 2007:4). Ainda esclarecem que: Vaia dialoga com a literatura ao afirmar que a crise do jornalismo impresso teve início antes da Internet, mas acredita que a web pode ter acelerado o processo. Para o ex-diretor do O Estado de S.Paulo, um dos problemas do jornalismo impresso que acaba repudiando (ao invés de atrair) os leitores é a queda de qualidade do produto. Tal processo é provocado principalmente pela falta de recursos humanos necessários para manter um bom jornalismo, devido ao enxugamento das redações e à sobrecarga dos profissionais atuais (Righetti e Quadros, 2007:14). Para o Grupo Estado, a crise trouxe conseqüências além da perda de leitores, o grupo não se estruturou rapidamente na Internet como a Folha fez através do UOL, e não “conseguiu manter seu mercado leitor e, tampouco, aumentou seu mercado anunciante no jornalismo impresso” (Righetti e Quadros, 2007:14). E se a Folha perdeu cerca de 44% de leitores e 33% de assinantes até 2006, hoje, ela ainda se gaba por ter mais de 84 mil leitores que o concorrente (Estadão) na cidade de São Paulo. Em outro artigo de Caio Túlio Costa, intitulado “Por que a Nova Mídia é Revolucionária” (2006), o professor faz um ensaio demonstrando a dificuldade das empresas tradicionais de comunicação ao lidar com a emergência das novas mídias, em especial a Internet, onde afirma: O desenvolvimento das novas tecnologias (...) exige que se compartilhe o poder da comunicação com o consumidor (...) A Internet é rica porque pode misturar texto, foto, áudio, vídeo na tela do computador à sua maneira – exigindo a interação. Permite (...) a intervenção direta do consumidor, de uma forma difícil para os mais velhos entenderem, mas que qualquer criança intui (Costa, 2006:21). Com tal declaração, fica fácil compreender o porquê dos jovens, segundo os dados apontados anteriormente, desenvolverem o hábito de se informarem através da Internet, relegando à segunda mão os veículos impressos, confirmando, assim, os prognósticos de que a próxima geração será “digital”, onde os tradicionais meios impressos serão relegados a um segundo plano, muitos tendendo até mesmo a desaparecer. O professor, porém, não é tão pessimista. Ele acredita que o jornal impresso não irá “morrer”, mas ratifica a tendência de que esses veículos se tornarão pouco rentáveis: Ninguém vai matar o jornal [...] Desde a década de 90, [...] essa indústria necessita voltar sua atenção total às margens decrescentes de lucro, e tornou-se imperativo cortar custos – seja de mão-de-obra seja de matéria-prima. Ela não está condenada a morrer, mas está destinada a parar de crescer da maneira como sempre cresceu, a não ser que domine a plataforma da nova mídia, caso contrário, alguém lhe toma o lugar (Costa, 2006:21-22). Em seu artigo, o professor exemplifica com um simples dado comparativo, como o valor da comunicação mudou com a chegada da Internet: o valor de mercado da Google é quase o dobro da Time Warner, uma das mais tradicionais empresas comunicacionais norte-americanas e detentora de inúmeras revistas, canais de TV, empresas cinematográficas e até mesmo um portal de acesso à Internet, a AOL[51]. E a coisa não pára por aí, como veremos, o movimento da Google em torno das empresas jornalísticas, inclusive as brasileiras, já se faz presente na Internet. Esta referência a Google mostra como uma companhia que sabe usufruir as novas peculiaridades interativas da web ganha espaço e valor dentro dessa nova era digital. Para Túlio Costa, a chave dessa “revolução” da Internet está na quebra do alicerce em que a mídia sempre se apoiou, onde um emissor construía e enviava o conteúdo para receptores passivos, até o surgimento da web. Como já enfatizamos, agora o receptor quer também fazer parte da emissão, participar ativamente do processo comunicacional, quer ouvir e ser ouvido – está aí a grande mudança de paradigma advinda da Internet. Além disso, com a magnitude de informações disponíveis na grande rede e o receptor, agora ativo, este tem mais chances de se esquivar da publicidade[52] imposta pelos meios tradicionais e escolher os conteúdos que melhor lhe convêm, o que é mais difícil nos tradicionais meios estanques do mainstream media. Talvez aí esteja a chave da crise dos antigos meios e dos jornais impressos. Diversas outras notícias perambulam pela mídia[53] e evocam a crise que os jornais impressos atravessam. Nos falam das diversas mudanças que, tanto a Internet como as novas tecnologias computacionais, vêm impondo ao jornalismo. Escreveríamos parágrafos e mais parágrafos analisando tudo que se diz nessas diferentes matérias, sendo que muitas delas têm como base o profético estudo de Philip Meyer que, devido a sua forte repercussão, iremos analisar no próximo tópico. A Profecia de Meyer Até aqui vimos colocações diversas sobre a relação das novas mídias e as dificuldades por que passam os jornais impressos. Fica claro que o novo “alicerce” da mídia digital altera todo panorama dos negócios comunicativos, uma mudança que afeta a mídia como um todo, inclusive o jornalismo. Mas qual seria o claro fator que explicaria o fato de apenas os jornais impressos estarem sofrendo com essas mudanças? O estudo de Philip Meyer, Os Jornais podem desaparecer?, é muito preciso ao apontar os fatores que levam à crise dos impressos e, segundo o autor, poderão levá-lo à extinção antes da metade deste século. Logo na introdução de seu estudo, Meyer expõe qual é a peça-chave que faz a Internet levar os impressos à crise: a segmentação. Citando os estudos do sociólogo Richard Meisel[54], ele mostra que a segmentação da mídia, que envolve todos seus setores, é uma tendência que vem de muito tempo e, cada vez mais, se intensifica. Dessa forma, Meyer afirma que “a Internet é apenas a mais recente de uma série de avanços que contribuíram para a ‘segmentação’ da mídia” (Meyer, 2007:12). E depois complementa: “Ao atender de modo cada vez mais eficiente quem busca informação segmentada, a Internet acelera essa tendência em direção a públicos menores” (Meyer, 2007:12). Ao mesmo tempo em que a segmentação é um fator que está diluindo os leitores por novos meios, quadro que, com a Internet se agrava, essa tendência explica a busca ávida por “conteúdo” vista nos portais informativos da web, incluindo os jornais impressos que lá se encontram, tanto em parcerias com grandes provedores, como provendo acesso e diversos novos canais comunicacionais, numa mostra que, nesse novo terreno, é preciso se expandir para englobar os novos e, cada vez menores, públicos. Mas como se explica o fato de a Internet agravar a crise dos jornais impressos? Meyer responde a esta questão com o que chama de “o modelo de influência”. Segundo ele, “os jornais estão no ramo de expor leitores aos anunciantes”. Neste ramo, o negócio ganha valor quando o jornal consegue exercer influência sobre o público leitor, quanto maior a influência, maior o valor do veículo. Meyer aponta que “um jornal produz dois tipos de influência: influência social (...) e influência comercial” (Meyer, 2007:17), e relaciona essas instâncias com o valor do jornal: “A influência de um meio de comunicação pode aumentar sua influência comercial. Se o modelo funcionar, um jornal influente terá leitores que confiam nele e (...) mais valor para os anunciantes” (Meyer, 2007:18). A Internet está mudando o quadro sólido por onde esse modelo se estruturou no decorrer do século XX, pois “as novas tecnologias (...) mudam a natureza do público” (Meyer, 2007:18-19), além de outros fatores que alteraram o caminho por onde a publicidade se espalha: “A impressão mais barata e de melhor qualidade também tornou a publicidade de malas-diretas mais atraente e contribuiu para a segmentação da mídia muito antes de existir a Internet" (Meyer, 2007:19). Nesse último quesito, é evidente que as tecnologias de rede, com seu alto poder de contabilização e análise de dados, dentro da lógica da customização da informação (e também da propaganda), tende a agravar esse quadro. No seu estudo, Meyer aponta para um fato inexistente antes da era “pós-Internet”: a escassez de atenção (Meyer, 2007:19-20). Com a diluição da atenção do público diante das novas opções oferecidas pela web, os jornais impressos, que durante o desenvolver do seu negócio sempre se preocuparam mais em maximizar o lucro, estariam cometendo um erro: “os jornais deveriam estar mais interessados em conquistar uma percentagem relevante [de atenção na Internet] do que em maximizar a lucratividade a curto prazo” (Meyer, 2007:26), ou seja, os jornais deveriam reverter seu lucro em investimento em inovação. O fato se agrava quando pensamos que os grandes jornais deixam de ser comandados por famílias e passam a responder à sede de lucro dos acionistas, “Uma visão ainda mais abrangente (...) vê a pressão dos investidores corroer o profissionalismo em diversas áreas (...). A corrosão dos valores de profissionais liberais pode ser uma estrutura útil para examinar o que está acontecendo com os jornais” (Meyer, 2007:25). A questão da “corrosão dos valores” é algo que ainda abordaremos adiante, no capítulo sobre a crise ética do jornalismo. Dentro do seu modelo de influência, Meyer passa a medir valores de confiança nos jornais, comparando-os com dados de leitura dos mesmos, durante o período de 1967 a 2002. O gráfico destas medições mostra que: A linha de tendência cai a uma taxa média de 0,6 ponto percentual por ano, o que levaria a zero em 2015. Mas (...) o declínio deu sinais de nivelamento após uma quebra brusca entre 1991 e 1993. Agora vamos ver o que aconteceu com o hábito de leitura diária dos jornais no mesmo período. Esta é uma linha íngrime, e há menos variação ano a ano. A declividade é um pouco superior a 0,95 ponto percentual por ano. Tente prolongar essa linha com uma régua e ela mostrará que não haverá mais leitores de jornais no primeiro trimestre de 2043 (Meyer, 2007:27). Eis a “profecia” do estudioso. Porém, o próprio Meyer questiona a validade de sua projeção: “O fato de que tanto a confiança quanto o número de leitores vêm diminuindo a uma taxa semelhante no mesmo período não significa que uma coisa seja causa da outra” (Meyer, 2007:27). Em outro gráfico, Meyer mostra que a baixa no número de leitores também se relaciona com o hábito de leitura das novas gerações que, cada vez mais, lêem menos jornais: “Desde que a geração dos baby boomers [nascidos no pós-guerras] envelheceu, sabemos que os jovens lêem menos jornais (...). Durante anos, nos consolamos achando que eles se tornariam parecidos conosco e adotariam o hábito de ler jornais quando fossem mais velhos. Isso nunca aconteceu” (Meyer, 2007:28). Quanto à questão da diminuição da influência do jornal, expõe: “(...) precisamos de um projeto experimental que compare o uso dos jornais em comunidades com diversos níveis de credibilidade durante um longo intervalo de tempo” (Meyer: 2007, 29), ou seja, um longo estudo sobre credibilidade[55], item que, como vimos, pode ser chave para a sobrevivência, ou o fim (caso mal trabalhada), para os jornais impressos dentro da nova era comunicacional interconectada. Embora o estudo de Meyer aponte para o fim dos impressos, em parte pela perda de sua influência perante o público, entendemos que essas instituições têm chances de reverter esse quadro, a credibilidade pode ser reconstruída, re-trabalhada e, até, valorizada como marca, inclusive através dos novos meios. Se o público jovem é desabituado à leitura de jornais e, cada vez mais, tende a migrar para os novos meios interativos, tudo leva a crer que os jornais tentarão migrar para essa nova esfera onde poderão, inclusive, conquistar a confiança de novos públicos e, quem sabe, reverter esse quadro relacionado a sua influência. E mais, o estudo de Meyer aponta a influência dos impressos em grande parte relacionada com a cidade (condado) de sua origem e, sendo a Internet uma mídia global, um grande jornal poderia utilizar o seu valor de marca para conquistar públicos mais amplos, além do seu condado de origem. Mas como medir isso? Essa é uma dúvida que ainda põe em cheque os modelos de negócio na Internet, e foram as exatas palavras do diretor do Ibope Inteligência Marcelo Oliveira Coutinho Lima[56] ao se referir às novas iniciativas provenientes do usuário na web que ganham a atenção de milhares de internautas (como um simples vídeo no Youtube), em contrapartida à escassez de atenção típica do novo meio sofrida por grandes órgãos de mídia que investem milhões em publicidade. O próprio Meyer aponta a Internet como uma saída para os jornais impressos dentro dessa tendência, dentre outras alternativas, expõe: “Entre na indústria substituta” ou “Trate de exaurir a posição do mercado” (Meyer, 2007:42), esta última seria uma tática de “espremer a laranja ao máximo”, extraindo todo lucro possível antes do fim do negócio, estratégia que Meyer também chama de “pegue-o-dinheiro-e-corra”. Em seguida, ele discorre sobre esses dois cenários táticos que as empresas podem adotar num momento de crise como este. 1-) Pegue o dinheiro e corra Neste cenário[57] “os donos aumentam os preços e simultaneamente tentam manter a sua rota de lucratividade com as técnicas usuais: diminuir espaço editorial, cortar pessoal, reduzir a circulação em áreas remotas (...) manter baixos salários” (Meyer, 2007:49). Essa seria uma maneira de resolver o problema financeiro, mas que não se sustentaria em longo prazo, pois “cobrar mais e entregar menos não é uma estratégia que possa ser mantida por tempo indefinido” (Meyer, 2007:48)[58]. Ainda cremos que, nessa estratégia, a credibilidade do jornal acaba sendo colocada em segundo plano e, como vimos, a credibilidade é parte fundamental dentro do “modelo de influência” proposto por Meyer. Portanto, deixar a credibilidade em segundo plano significa, em longo prazo, diminuição na influência do jornal sobre a comunidade e, portanto, sua desvalorização perante o público e, conseqüentemente, perante os anunciantes. Ainda, neste cenário, podemos perceber que a Internet e os novos aparatos digitais vêm servindo como uma maneira de diminuir custos, neste sentido, ela se mostra como uma ferramenta que não engrandece a antiga mídia e, embora possa dar fôlego financeiro para empresas com a automatização de tarefas e redução de pessoal, no longo prazo é uma tática que não colabora para o fortalecimento da credibilidade perante a comunidade. Sobre o valor da credibilidade, Meyer expõe que ela “explica 19% da variação residual nos preços dos anúncios publicados. Seu efeito é estatisticamente significante” (Meyer, 2007:63), e complementa: “(...) um ponto percentual de melhora da credibilidade vale um aumento de 2,5% no preço de tabela do espaço publicitário de um jornal” (Meyer, 2007:64). Fica claro que apostar em táticas que levem à diminuição da credibilidade do jornal não pode ser uma estratégia duradoura, por mais que se mantenham altas as taxas de lucro dentro do curto prazo. 2-) Insira-se no novo ambiente Este cenário é assim descrito por Meyer: “Os donos atuais – ou seu sucessores – aceitarão a realidade da nova competição, investirão no aprimoramento de produtos que explorem totalmente o poder da mídia impressa e transformarão os jornais em grandes players num mercado de informação que inclui a mídia digital”, que depois aponta: “No segundo cenário, as empresas jornalísticas aprimorariam, em vez de degradar, seus produtos editoriais” (Meyer, 2007:50). Assim entendemos que, nessa tática, as possibilidades de manutenção e fortificação da credibilidade são maiores, já que não há degradação no produto, ao contrário, ele se renova. As empresas jornalísticas que hesitam em explorar os novos ambientes podem realmente falir, pois dificilmente conseguirão vender o seu negócio. Segundo Meyer, durante muito tempo os jornais foram um negócio com altas taxas de lucro. No novo cenário midiático atual, essas margens caíram drasticamente, “(...) não existe uma transição simples de uma indústria acostumada a margens de 20% a 40% para uma que se contente com 6% ou 7%” (Meyer, 2007:48). Os jornais são um bom negócio quando apresentam alta lucratividade, uma vez esta em baixa, tornam-se um “mau negócio”. Para ilustrar essa situação, Meyer faz a seguinte reflexão: Se eu lhe vender uma galinha que bota um ovo de ouro por dia, você me pagará um preço baseado na sua expectativa de retorno sobre o investimento (ROI, na sigla em inglês), que deve ser maior do que o banco pagaria num certificado de depósito, mas não muito maior. Ao negociarmos o preço que você quer pagar (e que eu quero vender), ambos estaremos buscando um ROI favorável (...). E partiremos do princípio de que a galinha continuará a botar ovos à mesma taxa. Avance um pouco no tempo. A galinha (...) passa a botar um ovo de ouro por semana. Isso faz de você um grande perdedor. Veja, a galinha continua sendo ótima. Você pode resignar-se à diminuição de receita ou vendê-la para um terceiro (...) que ficará orgulhoso (...) simplesmente porque pagou um sétimo do valor gasto por você (Meyer, 2007:49). Independente da “profecia” que demonstra através de seu modelo, seu estudo aponta para dois fatores que levam à queda da circulação dos jornais: a mudança dos hábitos de leitura das novas gerações de leitores e a queda da influência dos jornais, instância esta que se relaciona, inclusive, com a credibilidade. Além disso, o estudo aponta para uma desvalorização do negócio. A relação da Internet nisso tudo está na quebra do monopólio da informação, hoje o jornal tem um novo concorrente que, aos poucos, vai lhe sugando público e verbas publicitárias, baixando sua lucratividade. Afora os dados que apontam para o fim do jornal impresso em 2043, a verdadeira profecia de Meyer, aquela que parece melhor definir o novo cenário do jornal impresso dentro da era digital, talvez esteja na seguinte frase: “No futuro, haverá espaço para os jornais num ambiente sem monopólio. Eles não serão tão lucrativos, e isso será um problema para seus donos – sejam proprietários privados ou acionistas –, mas não para a sociedade” (Meyer, 2007:48). O Jornalismo é uma “bobagem” Em palestra acadêmica realizada na Faculdade Cásper Líbero (São Paulo), em 21 de maio de 2008, o coordenador do programa de pós-graduação de Mestrado e Doutorado da Universidade Metodista de São Paulo, Prof. Dr. Sebastião Squirra, comentou sobre algumas questões que envolvem o jornalismo na atualidade. Suas afirmações foram duras, contundentes e nos remetem à crise que essa instituição atravessa. Sem meias palavras, Squirra afirmou que o modelo de jornalismo atual, institucionalizado e de bases sindicais, praticado por empresas como a Folha de S.Paulo e instituições de ensino como a ECA/USP, é algo que “já morreu”. Comentou que o jornalismo impresso no Brasil “é uma bobagem” e colocou que a “Folha pasteurizou o jornalismo”, hoje, não haveria mais diferença entre os jornais e as assessorias de imprensa e, com relação às fontes, deixou claro que apenas se compõem de “ricos e poderosos, o sistema estabelecido”, enfatizando que “é o sistema que pauta o jornal”. Ainda sobre a Folha, esclareceu que o novo projeto do jornal nada mais é do que uma cópia do USA Today, onde os jornalistas ficam apenas na redação sentados à frente do computador, o trabalho de reportagem é praticamente inexistente. Todas essas argumentações de Squirra podem ser entendidas como um desabafo de alguém que, dentro de sua grande experiência como comunicólogo, percebe a falência de valores que afetam não só as empresas jornalísticas, mas também as instituições de ensino de jornalismo. Essas afirmações podem ser, inclusive, compreendidas como a expressão da crise ética que vive o jornalismo, e que perpassam pelo que abordaremos no tópico “A Crise Ética”, adiante neste capítulo. Pode-se também observar nas entrelinhas de suas afirmações que, hoje, estamos vivendo um novo paradigma comunicacional, apesar de algumas instituições continuarem a se basear em modelos já ultrapassados. Isso fica claro quando ele se refere aos modelos de jornalismo praticados que já estariam “mortos”. Squirra findou sua palestra afirmando que “o novo jornalismo é o de autor”. Assim, fica evidente que, sendo o jornalismo de autor uma nova tendência para essa habilitação comunicacional, a Internet se oferece como a plataforma perfeita para essa prática, já que nela o espaço está sempre aberto para qualquer um que queira se engendrar nesta prática, independente dos modelos de jornalismo praticados pelas instituições mais tradicionais. O blog, inclusive, já pode ser apontado como uma plataforma utilizada por diversos jornalistas, englobando toda uma gama de recém-formados, além do próprio cidadão conectado, por onde pode-se observar essa tendência ao jornalismo de autor, seja ele individual, seja ele coletivo (como um produtor colaborativo). A Questão da Convergência A convergência pode ser entendida de várias formas. A primeira delas seria como uma evolução tecnológica, onde antigos meios comunicacionais convergem para um novo sistema, melhor, mais dinâmico e, até, mais econômico. Tal prisma de entendimento passa pela obra do professor de História e Legislação dos Meios de Comunicação Antonio F. Costella (USP), Comunicação: do grito ao satélite. No livro, Costella demonstra que toda evolução comunicacional do Homem o leva à criação de uma rede informativa que, hoje, corresponderia à Internet. Antes mesmo do advento da grande rede, quando do lançamento da primeira edição de seu livro, o autor previa: (...) essa evolução toda, segundo se supõe, levará à dissolução das fronteiras entre as formas de comunicação hoje compartimentadas. Talvez se perca, no futuro, a noção de divisa entre jornais, rádio, televisão, atualmente entidades estanques. A eletronização total da comunicação conduzirá à criação de sistemas multimeios, onde a notícia, a instrução e o entretenimento se integrem no mesmo vídeo e respectivo amplificador de som. Por um mesmo caminho eletrônico nos chegarão todas as informações que agora são trazidas por meio de livros, jornais e revistas, discos e fitas, telefone e rádio, cinema e televisão. E mais, essa avalanche de informações nos será disponível a todo instante pois estarão arquivadas em computadores (Costella, 2001:217). Esse trecho foi extraído do último capítulo do citado livro, cujo título é “O futuro da comunicação”, publicado em 1984. Em 2001, já em sua 4ª edição, no mesmo capítulo (com um novo título, “O futuro da comunicação... já chegou”), o autor expõe: “(...) tudo aquilo que, em 1984, apresentamos como hipótese futura, já aconteceu. E foi tão rápido!” (Costella, 2001:218). Sim, já aconteceu e está acontecendo, as entidades estanques citadas pelo autor, os diferentes meios de comunicação existentes, agora convergem para a Internet ancorados pela linguagem binária dos computadores. Esse tipo de convergência deixa claro tratar-se de uma evolução comunicacional. Dessa forma, os meios antigos passam a buscar o seu espaço através do meio novo, mais avançado, e assim, evoluem. É também uma forma de entender que a Internet veio para ficar, não se trata apenas de mais um meio que se soma aos antigos, e sim da própria evolução dos meios, a própria evolução comunicacional. E o que a Internet traz de novo e leva a uma evolução comunicacional? O que a Internet traz de novo é o que já mencionamos, a mudança do paradigma comunicacional de um-para-muitos para o paradigma muitos-para-muitos, está aí o alicerce da revolução que muitos pregam. Neste contexto, fica evidente que o futuro da mídia está nesse novo parâmetro comunicacional e, como veremos, esse parâmetro, onde muitos agora têm acesso à mídia, é também um parâmetro por onde se pode observar a convergência midiática. Para o professor Caio Túlio Costa, em citação aos estudos de Burch, Leon e Tamayo[59], a convergência seria um fator que “dissipa as barreiras antes existentes entre os diferentes meios (rádio, televisão e imprensa) e, inclusive, entre setores diferentes (telecomunicações, informática e comunicação de massas), reduzindo textos, imagens e som a somente um único suporte digital: o bit” (Costa, 2005:182). Além de remeter à afirmação anterior de Antonio Costella, esta colocação ilustra um dos movimentos da convergência que tomam ação dentro da atualidade midiática, a concentração dos sistemas de mídia – que inclui as comunicações, os sistemas de telecomunicações e as empresas de tecnologia – na mão dos mesmos atores (ou de poucos atores), sejam estes advindos de qualquer um desses setores (o que, como vimos, traz novos atores não comunicacionais para o palco da grande mídia). Hoje, no despertar do século XXI, o mundo da comunicação estaria concentrado em menos de dez grandes conglomerados mundiais e, nesses conglomerados, aparecem empresas desses três setores que, aos poucos, vão se fundindo em algumas poucas. Um dos exemplos que citamos e ilustra essa situação é a compra da Time Warner pela AOL. Tal exemplo mostra que, como previra Costella, os meios midiáticos antigos convergem para a nova mídia digital e, se, no desenvolver do seu negócio, este não incluía a nova plataforma digital, hoje eles buscam o seu espaço nela através de compras, vendas e fusões com empresas de tecnologia e de infraestrutura de rede e comunicação (as teles), o que demonstra a necessidade de os antigos meios se colocarem no novo. Essa questão dos grandes conglomerados de mídia é o que ainda abordaremos no tópico a “A Sinergia da Mídia”. Outra maneira de se entender a convergência é como um novo hábito, uma nova maneira de como as pessoas, os usuários das diversas mídias, interagem com ela e, neste momento em especial, com a nova mídia, já que, nesta, o usuário também é coprodutor da informação. Neste cenário, a evolução midiática não vai só ao encontro das novas tecnologias comunicacionais disponíveis, vai também ao encontro do uso que as pessoas estão fazendo delas. Muitas vezes é o próprio uso que as pessoas fazem dos meios que dita quais serão as formas de interação entre os mesmos e as próprias pessoas, é um conceito que se relaciona com a peer production, a produção dos indivíduos conectados em rede. O conceito de peer production é diretamente relacionado com o novo paradigma comunicacional, é uma maneira de os indivíduos conectados compartilharem informações e recursos sem qualquer tipo de intermediação. Nesse caso, novas maneiras de interação surgem de acordo com a própria criatividade dos usuários. Até mesmo o blog – que já foi colocado como uma ferramenta de jornalismo “subversiva”, pois a discussão, a pauta, parte da base e não de uma editoria –, pode ser entendido como uma expressão de peer production do jornalismo na Internet. Alguns exemplos de como pode funcionar essa peer production relacionada aos blogs ainda serão apresentados neste estudo. Talvez o maior exemplo que temos dessa nova lógica do peer production esteja na criação do Napster[60], como destaca Manuel Castells: O caso da Napster, em 2000, foi um momento decisivo. Diante das possibilidades de uma tecnologia (MP3) que permite às pessoas (particularmente aos jovens) compartilhar e trocar suas músicas em escala global, sem pagar nada, companhias fonográficas mobilizam tanto os tribunais quanto os corpos legislativos para restaurar seus direitos de propriedade. Editorias e companhias de mídia em geral enfrentam uma ameaça semelhante (Castells, 2001:149). Esse é um exemplo claro de como a peer production pode derrubar o monopólio do acesso à informação que, durante séculos, vem sendo controlado por poucas instituições. E, como enfatizou Castells, é uma ameaça não só à indústria fonográfica, mas a toda mídia. Nesse exemplo da Napster, o passo seguinte das gravadoras, além de reivindicar os direitos autorais de suas publicações fonográficas – o que passa por uma longa discussão sobre os direitos autorais em rede, talvez a maior discussão sobre os rumos da comunicação dentro dessa nova era – foi o de melhorar seus serviços de distribuição de música online, mesmo que eles ainda não atendam aos anseios de muitos internautas, que é o livre acesso e compartilhamento de músicas. De qualquer modo, isso mostra como os novos hábitos do usuário em rede podem gerar novas formas de acesso à informação que forçam os antigos meios a convergir, mesmo que a contragosto. Enquanto Castells aponta para o maior exemplo de como a peer production pode abalar os alicerces da mídia “pré-internet”, o tecnocrata e doutor em Ciências Políticas Sérgio Amadeu da Silveira (USP), define de forma clara as bases de tal conceito. Para aqueles que possam questionar a idéia colaborativa, exclamando que produção em grupo é algo que já existe há muito tempo, Silveira esclarece: Apesar de os processos colaborativos já existirem há muito tempo no cenário dos negócios e das empresas, o fenômeno atual é diferente. A diferença está no fato de a atual colaboração massiva articular agentes individuais livres, que o operam e reúnem-se para resolver problemas que são do seu interesse. Não colaboram por obrigação, nem estão submetidos a instituições ou companhias (Silveira, 2008:50). Tal conceito relaciona-se com a compreensão do fenômeno da peer production do professor norte-americano da Escola de Direito de Harvard Yochai Benkler, cuja definição do termo é simplesmente brilhante: For decades our understanding of economic production has been that individuals order their productive activities in one of two ways: either as employees in firms, following the directions of managers, or as individuals in markets, following price signals. (...) In the past three or four years, public attention has focused on a fifteenyear-old social-economic phenomenon in the software development world. (...) I suggest that we are seeing is the broad and deep emergence of a new, third mode of production in the digitally networked environment. I call this mode “commons-based peer-production”, to distinguish it from the property and contract-based models of firms and markets. Its central characteristic is that groups of individuals successfully collaborate on large-scale projects following a diverse cluster of motivational drives and social signals, rather than either market prices or managerial commands (Silveira, 2008:51 citando Benkler, 2002:3)[61]. Sobre essa “queda de braço” entre os meios mais antigos de produção e os novos meios colaborativos, uma reflexão do professor Caio Túlio Costa sobre as posições de Benkler que aparecem em sua tese de doutorado (2008) através da análise de diversos estudiosos, enfatiza a exposição de Castells de como isso se torna uma ameaça ao meio produtivo e distributivo até então instituído: O crescimento da força de produção e de circulação da informação e da cultura, pelo indivíduo e de maneira colaborativa, fora da economia de mercado, ameaça aqueles que se beneficiam com a economia informacional de caráter industrial. Nos próximos dez anos [até 2016] será decidido qual dos dois modelos prevalecerá, tendo uma implicação de como ficaremos sabendo do que acontece no mundo e de qual maneira poderemos influenciar como vemos o mundo hoje e como ele pode ser no futuro (Costa, 2008:330 citando Spyer, 2007:118-119). Como vemos, o conceito de peer production pode ser diretamente relacionado como sendo uma das unidades fundamentais que compõem o novo paradigma da mídia dentro do novo ambiente interconectado. Também pode ser entendido como uma expressão tanto da convergência, quanto da cibercultura de Pierre Lévy, ou até mesmo como um novo paradigma de produção intelectual livre de propriedade, o commons (Silveira, 2008:49-59), que se opõe ao copyright. O caso da Napster é um exemplo claro dessa lógica, como vimos na citação de Castells. Castells analisa os grandes setores da mídia em sua convergência à plataforma digital e as formas de distribuição de conteúdo online. Além do que destacou do potencial sobre a distribuição de produtos fonográficos, em relação aos impressos, ele enfatiza que “o processo de concepção, produção e publicação de material impresso está sendo inteiramente transformado pela Internet, mas o produto em si (...) não mudará de maneira substancial no futuro previsível” (Castells, 2001:163). Nem a presença de grandes jornais na Internet pode indicar uma convergência dos mesmos para a nova mídia, segundo Castells: “(...) jornais estabelecidos têm de estar on-line para estar sempre lá, prontos para seus leitores, para mantê-los sob o mantra de sua autoridade” (Castells, 2001:163). Se a presença de grandes jornais na Internet não pode ser o indicativo real de que eles estejam convergindo à nova plataforma, para entender como a convergência está mudando as formas de acesso e compartilhamento da informação, é necessário entender como o usuário está interagindo com a rede e o que ele tem trazido de novo para o ambiente comunicacional, e não apenas olhar para a reprodução digital dos meios analógicos agora presentes na web. Aliás, é o próprio Castells que depois de refletir sobre a dimensão “sinergética” da convergência, faz uma afirmação que deixa em aberto qualquer projeção do que pode vir a ser a integração total dos diversos meios e suas respectivas corporações que se fundem. O espanhol aponta o olhar em direção aos exemplos positivos de interação que surgem na Internet como uma maneira de entender o novo meio, como expõe: “O meio para compreender a relação potencial entre Internet e o mundo da mídia é refletir sobre as poucas histórias de sucesso de sua interação”. Em seguida, o autor expõe aquilo que cremos ser de extrema relevância para entender a convergência: “O que a tecnologia tem de maravilhoso é que as pessoas acabam fazendo com ela algo diferente daquilo para que foram originalmente criadas. (...) a Internet é o resultado da apropriação social de sua tecnologia por seus usuários/produtores” (Castells, 2001:160). Caio Túlio Costa também vê na questão do bit, além do que já mencionamos parágrafos acima, um ponto de convergência do usuário sobre as novas mídias quando diz que “hoje se sabe que a convergência chega via chip, com o poder de unir diversos aparelhos em um só ponto de distribuição, seja no lar, no escritório ou na rua, mas quem converge mesmo é o indivíduo, em um novo processo de comunicação (Costa, 2008:335). Mais uma vez, as colocações que levantamos logo no início deste estudo se mostram pertinentes para a compreensão do papel do jornalismo na atualidade. Entender como o usuário interage jornalisticamente dentro da nova mídia ou, ao contrário, entender como novas formas de interação surgidas podem ser consideradas uma nova forma de jornalismo e, também, tentar entender como os velhos jornais poderiam se inserir nessa convergência, talvez essa seja a única maneira de compreender o contexto do jornalismo dentro da nova era da informação. A Crise Ética do Jornalismo Diversas questões éticas concernem o papel da comunicação na sociedade atual, e dentro desse contexto está o jornalismo. Para o estudioso da Escola de Frankfurt, Theodor Adorno (1903-1969), a questão ética comunicacional enraíza-se com a própria criação da indústria cultural que, como vimos, foi um dos vetores que transformou a imprensa ao longo dos séculos[62] – da imprensa de opinião para a fase comercial e chegando à fase do interesse ideológico, quando a esfera pública desaparece da mídia. O frankfurtiano coloca que a ética está ficando subserviente a outros fatores: A questão atual é (...) saber se (...) os homens se sentem em condições de agir individualmente, isto é, agir moralmente. A massificação, a indústria cultural, a ditadura dos meios de comunicação e mesmo as ditaduras políticas são fenômenos que têm de ser analisados também nessa perspectiva, para sabermos até que ponto o homem de hoje ainda pode escolher entre o bem e o mal (Adorno citando Valls, 1996:69). O professor e doutor em Filosofia Álvaro L. M. Valls (Universitat Heidelberg –Alemanha) ratifica Adorno, atrelando a liberdade com a questão econômica e citando-o: “'Liberdade da economia nada mais é do que a liberdade econômica', ou, mais simplesmente: só não depende do dinheiro quem o tem de sobra" (Valls, 1996:69). E seguindo essa linha frankfurtiana, uma das questões da ética atual que põe em cheque o papel da comunicação é: (...) na massificação atual, a maioria hoje talvez não se comporte mais eticamente, pois não vive imoral, mas amoralmente. Os meios de comunicação de massa, as ideologias, os aparatos econômicos e do Estado, já não permitem mais a existência de sujeitos livres, de cidadãos conscientes e participantes, de consciências com capacidade julgadora. Seria o fim do indivíduo? (Valls, 1996:47). Adorno ainda “(...) chama a atenção para o fato de que hoje a ética foi reduzida a algo privado. (...) E se hoje a ética ficou reduzida ao particular, ao privado, isto é um mau sinal" (Adorno citando Valls, 1996:70). Os questionamentos éticos levantados, dos mais gerais chegando aos mais específicos, chega onde figura o jornalismo (que é mantido por empresas privadas na maioria dos casos). Esta instância específica tem os seus específicos códigos de ética. Valls então, questiona o próprio valor do noticiário: (...) valeria a pena analisar a ótica e a sintaxe da comunicação que aparecem (...) nos noticiários atuais (...) a lógica simples do 'e', da adição pura e simples (...) este tipo de comunicação (...) não favorece o despertar de uma consciência eticamente mais crítica (...) reforça a indiferença e o sentimento de impotência do espectador (Valls, 1996:77). Essa sintaxe do jornalismo atual (informativa) teria mudado muito em relação aos primórdios da imprensa (de opinião), teria atrofiado a capacidade analítica das massas, as questões éticas assim, teriam desaparecido (mas parecem estar de volta à tona com o advento da web que traz consigo novas questões a serem discutidas além de expor as mais antigas, num meio aberto à crítica aos próprios meios). Tal advento relaciona-se diretamente com os estudos do alemão Jürgen Habermas, que questiona o desaparecimento do espaço público na sociedade atual, fato vinculado ao papel dos meios de comunicação atualmente, e que vão além da imprensa: Assim, o rádio e a televisão podem ser muito mais ditatoriais do que o telefone, o qual, como as antigas cartas, possui uma forma mais dialogal. Isto não significa que aqueles, como meios de comunicação, não podem ser postos a serviço da democracia (...) na medida em que a informação também é uma forma de poder e como tal, se bem distribuído, de favorecer as relações éticas entre os homens (Valls, 1996:77). Habermas coloca muito claramente que a informação é uma peça chave para a conscientização ética. Dessa forma, o jornalismo tem papel crucial nas questões que concernem à ética na sociedade atual, e que passam pelo noticiário, a informação e cobertura dos fatos, a escolha de pautas e fontes, e pelos próprios jornalistas. Ao jornalismo, talvez uma das grandes questões éticas seja a levantada por Valls: até onde a construção de linguagem informativa e imparcial da imprensa pode ser ou não considerada ética? Cremos que até o ponto onde a sabedoria nos indica que tal jargão informativo/imparcial não passa de um instrumento para angariar mais leitores e aumentar a venda dos jornais (Costa, 2008:320-344). Outra resposta poderia estar dentre as novidades que surgem na Internet, onde diversas novas formas de interação e veiculação da notícia permitem o aparecimento de novas vozes que se fazem ouvir ao lado das mídias tradicionais. Como veremos mais adiante, os blogs representam uma nova forma de expressão jornalística que traz de volta o jornalismo de opinião (entre uma miscelânea de gêneros narrativos, como veremos no próximo capítulo), o que pode, com o desenvolver da grande rede, vir a contrabalancear a “sintaxe da passividade” atual denunciada por Valls. Espetáculo e Jornalismo Guy Debord é o principal filósofo de referência teórica da Sociedade do Espetáculo, uma unanimidade em tais estudos. Sem meias palavras, o estudioso francês inicia a sua obra clássica já denunciando e definindo o que é a “Sociedade do Espetáculo”: “Toda vida das sociedades (...) se anuncia como uma imensa acumulação de espetáculos. Tudo o que era directamente vivido se afastou numa representação” (Debord, 2003:9). Aqui já conseguimos entender a relação da questão do espetáculo com o capital, a relação entre as teorias de Debord com as teorias de Karl Marx: o espetáculo cresce e, portanto, se acumula como o próprio capital, “o espetáculo é o capital a um tal grau de acumulação que se torna imagem” (Debord, 2003:23). O livro Comunicação e sociedade do espetáculo (Coelho e Castro, 2006) traz textos que são fundamentais para entendermos as relações das teorias de Debord com a questão do jornalismo dentro da Sociedade do Espetáculo e, como veremos, é fundamental para entendermos como as colocações de Adorno sobre a questão da ética e da indústria cultural ganham novos contornos na contemporaneidade. Uma das palavras-chave que expressa a relação entre espetáculo e o jornalismo é entretenimento, como nos aponta o professor doutor em Sociologia Cláudio Novaes Pinto Coelho (USP): “Vivemos numa sociedade do espetáculo (...) A lógica do entretenimento está por toda parte: nos shopping centers, nas campanhas políticas, nas obras de arte, nas salas de aula, nos meios de transporte e, obviamente, nos veículos de comunicação (jornais, revistas, cinema, televisão)” (em Coelho e Castro, 2006:9). Já existe uma expressão em inglês, um trocadilho que até virou termo comunicacional, que designa essa relação entre o espetáculo e o jornalismo, entre o entretenimento e a informação, é o infotainment, junção das palavras information e entertainment em inglês, informação e entretenimento em português, é o infotenimento[63], palavra que escancara a atual lógica do jornalismo como parte da sociedade do espetáculo. Hoje, o leitor/navegador/ouvinte/telespectador não quer mais apenas se informar, ele quer ser entretido com informações. Assim, como veremos, o jornalismo na atualidade, principalmente aquele ligado ao mainstream media, vai priorizar o entretenimento em detrimento da informação e prestação de serviço, que deveriam ser a sua função primordial e, mesmo essas funções, estariam seguindo a lógica do infotenimento e aos interesses comerciais dos veículos. O professor e mestre em Comunicação e Mercado Fábio Cardoso Marques (Faculdade Cásper Líbero), em artigo em que reflete sobre a espetacularização da imprensa[64], aponta como é essa lógica dentro do jornalismo contemporâneo: “Os assuntos de interesse público (...) cederam espaço, na chamada grande imprensa, a temas pessoais, sobre figuras públicas e matérias sensacionalistas” (em Coelho e Castro, 2006:33). Dentro dessa lógica voltada para o entretenimento, o jornalismo faz uso daquele item mágico imagético que tanto Debord quanto Baudrillard apontam como ferramentas do espetáculo hiperreal, o uso de imagens: “(...) os jornais e revistas continuam defendendo (...) o trabalho com as imagens e outros elementos gráficos” (em Coelho e Castro, 2006:34). Em outras palavras, a lógica do entretenimento dentro do jornalismo se apropria de valores publicitários ao trabalhar com o seu público. O jornalismo também produz signos como o espetáculo, ou melhor, produz signos que também são os signos do espetáculo, como nos dizia Debord: “A produção da mercadoria-notícia (...) pode revelar uma articulação de níveis simbólicos que produz mitos e preconceitos sobre algumas personalidades ou movimentos sociais. Para isso, podem ser utilizados alguns elementos gráficos” (em Coelho e Castro, 2006:37-38). Citando Ciro Marcondes Filho[65], Marques também relaciona a produção de símbolos do jornalismo com teorias de Barthes e Baudrillard: “A política de produção de notícias tem, assim, o caráter de cultivar a passividade. O tratamento que ela dá aos fatos, quer como mitos (Barthes, 1982) ou signos (Baudrillard, s.d., pp. 99 e ss.; Prokop, 1986 e ss) conduz, em qualquer caso, à despolitização do real” (em Coelho e Castro, 2006:38). Para Marques, as bases do espetáculo dentro do jornalismo estão nos alicerces da indústria cultural. O jornalismo de massa estaria, então, em conluio com essa indústria, servindo como um propulsor da mesma: “A atividade jornalística da grande imprensa (...) pertence à esfera da indústria cultural, segundo a conceituação de Theodor Adorno e Max Horkheimer (1985). Desde o modo como produzem as notícias até o conteúdo do discurso jornalístico, esses grandes jornais e revistas passam a ser importantes difusores ideológicos” (em Coelho e Castro, 2006:34). A questão é como a produção e a construção do discurso jornalístico faz isso. Baseado nas teorias frankfurtianas e no pensamento de Marx, Marques nos dá algumas pistas, tais como a criação de manuais de redação, o manual da “lavagem cerebral” que padroniza o discurso jornalístico à linha diretriz dos donos dos veículos de mídia e os seus interesses comerciais, e o uso de pesquisas que direcionam a produção de notícias de acordo com o gosto do público, além de outros recursos, tais como o controle da produção jornalística da mesma forma como são os controles na produção de qualquer mercadoria, é a “notícia enlatada”: (...) a centralização da produção das notícias pelas agências nacionais e internacionais; padronização do discurso jornalístico com manuais de redação e estilo; a reestruturação dos projetos editoriais; sistemas internos de controle individual da produção de matérias; racionalização (...) sobre o processo produtivo (...) e as informações dos institutos de pesquisa (em Coelho e Castro, 2006:36). A lógica do “jornalismo-survey” também aponta para outro aspecto que pertence à lógica maior do infotenimento, o jornalismo de prestação de serviço que, segundo Marques, “(...) com o qual o jornal busca criar ou atender interesses ou necessidades de consumo no publico-leitor, quando a informação política, por exemplo, já não tem o mesmo valor (...) como teve em outros tempos” (em Coelho e Castro, 2006:37). A noção comercial por trás dessa lógica nos diz que, apesar de atender ao interesse do público, também atende a manutenção da imagem da entidade jornalística perante esse público, como uma guardiã do cidadão, além de ser um meio de mantê-lo preso ao veículo. Esta lógica pode ser apontada, inclusive, como detentora do mesmo propósito que tinham os folhetins no passado, com o objetivo de “novelizar” a notícia e prender o leitor ao veículo. Karl Marx denuncia a alienação no trabalho, Guy Debord revela a alienação no espetáculo, já dentro do jornalismo a alienação se revela, segundo Marques, da seguinte forma: “Os grandes veículos de comunicação preferem, na maioria das vezes, utilizar um jargão jornalístico formado por uma conceituação funcional ou operacional, desvalorizando o pensamento não funcional ou crítico” (Coelho e Castro: 2006, 44). Em outras palavras, o jargão jornalístico que predomina no mainstream media é informativo, desvalorizando o jornalismo de opinião, como já colocamos. Esse tipo de linguagem, mesmo que possa transparecer neutra, pode ser utilizada como “clichês ou preconceitos, repetindo-os até se tornarem verdade” (em Coelho e Castro, 2006:44), de forma que pode ser utilizada para “induzir mentes” como no próprio jornalismo de tribuna[66], porém de forma maquiada, mascarada de neutralidade. Essa é também uma questão que concerne à ética do jornalismo, como vimos em citação do professor de ética Álvaro Valls. Esse é um assunto que precisa de atenção no debate das questões que envolvem o jornalismo dentro do seu importante papel na sociedade atual. O que comentamos, refere-se à alienação do discurso jornalístico. Quanto à produção do trabalho jornalístico, essa segue a mesma lógica da alienação do trabalho de Marx. Assim, segundo Marques: “(...) na grande imprensa também há (...) o fenômeno do afastamento do trabalhador do domínio do seu processo de trabalho, dificultando ao jornalista o exercício de sua consciência crítica e da autonomia para exercer sua atividade” (em Coelho e Castro, 2006:56). Essa é outra questão que além de estar dentro da lógica da alienação do espetáculo de Debord, concerne à ética jornalística, sendo a autonomia, um desses padrões éticos comprometidos dentro dessa lógica atual e que assim colaboram para alienação maior do espetáculo. Marques também apresenta suas reflexões sobre as teorias de Debord, na clássica citação do autor definindo a Sociedade do Espetáculo – o primeiro parágrafo de sua obra que também citamos logo no início deste tópico. Relacionando-a com o jornalismo, ele a interpreta da seguinte maneira: “Como uma forma de representação do mundo e de seus fatos, a imprensa pode se aproximar mais das verdades que explicam o funcionamento das sociedades modernas ou se afastar através de uma representação ideológica da realidade” (em Coelho e Castro, 2006:52). Pelo que vimos até aqui, a grande imprensa parece ter se afastado da realidade numa representação ideológica que serve de pano de fundo para a indústria cultural, indústria esta que nos parece ser o carro-chefe na condução do espetáculo. Isso fica claro na passagem onde Marques comenta o pensamento de Debord sobre a imprensa, “(...) deixa de aprofundar os assuntos estratégicos que podem demonstrar contradições essenciais entre as forças fundamentais que compõem as sociedades capitalistas, ou seja, o capital e o trabalho” (em Coelho e Castro, 2006:54), em outras palavras, ela se afasta da realidade dos assuntos estratégicos e fundamentais das sociedades, e mergulha no mundo hiperreal do mass media e da indústria cultural. Por fim, Marques faz uma afirmação que põe em cheque o papel da imprensa na sociedade atual, relacionando-a com a questão da Indústria Cultural e da Sociedade do Espetáculo de Debord: A imprensa acaba se constituindo num significativo meio de reprodução de discursos ideológicos, que tentam explicar o que não pode mais ser visualizado e vivido como experiência direta por grande parte dos cidadãos (...) Essa forma de divulgação ideológica (...) procura legitimar e transportar, para a sociedade como um todo, as preocupações específicas de setores dominantes da sociedade (em Coelho e Castro, 2006:53). Em outras palavras, a imprensa é também uma ferramenta ideológica de dominação que, entre outros interesses, atende aos ideais de um desses setores dominantes da sociedade que é a indústria cultural, onde temos, como conta Marques, os grandes conglomerados de mídia, “(...) estamos vivendo uma época de hegemonia dos grandes conglomerados de comunicação” (em Coelho e Castro, 2006:52), que divulgam e legitimam as suas idéias, que veiculam o espetáculo também através do jornalismo. Na matéria do Observatório da Imprensa que mencionamos ao nos referirmos ao termo infotenimento, o jornalista Luciano Martins Costa comenta sobre a relação dos conglomerados de mídia e a questão do espetáculo que permeia o jornalismo: “Os grandes conglomerados de mídia, que nos últimos dez anos se revelaram autênticos predadores, engolindo redes inteiras de jornais, cadeias de rádio e TV, portais e tudo que parecia apetecível ao capital, estão se defrontando com a dura realidade”, e complementa: Nesse rumo, o capital se desinteressa daquilo que costumamos chamar de jornalismo. Já é muito claro que os grandes conglomerados praticam com mais gosto aquilo que em inglês se chama infotainment – a mistura de informação e entretenimento que usa jargões do jornalismo para se revestir de certa seriedade. Em escalas variáveis, encaixam-se nesse padrão o Programa do Jô, o Programa do Ratinho, a revista Veja, os programas de “debates” sobre futebol, as publicações voltadas para o consumo de luxo. Sem a presença das tradicionais famílias, que aos poucos perdem espaço nesse ambiente, e com as gigantes do setor se desinteressando do jornalismo de qualidade, onde ele irá acontecer? (http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=373SAI001, 12/01/2007). Para quem pensar no fenômeno dos blogs, na blogosfera, o jornalista adverte: “Os blogs, salvo algumas exceções, ainda são território para autolustração de egos mais ou menos bem equipados de conteúdo”. De forma que a pergunta colocada na citação acima ainda é uma questão que merece a nossa atenção, concerne ao jornalismo e às novas mídias como partes da Sociedade do Espetáculo. De qualquer modo, a plataforma aberta da web nos indica um caminho viável para a prática de todas as formas de jornalismo, incluindo aquele tido como de qualidade. Em artigo que analisa a questão da informação-mercadoria do jornalismo e as novas formas de trocas culturais na sociedade globalizada[67], o jornalista e mestre em Integração da América Latina Carlos Sandano (USP ) ressalta dois problemas que afetam o jornalismo atual, da notícia-mercadoria e do infotenimento, e os liga ao espetáculo, quando afirma que: “(...) ressalta-se não apenas a queda do muro que separava (idealmente) publicidade e jornalismo, mas também da barreira que separa(va) a mídia dita séria do sensacionalismo” (em Coelho e Castro, 2006:63). Essa também é uma preocupação do professor de ética jornalística Caio Túlio Costa, que a estende ao contexto das novas mídias e, segundo as reflexões do professor, se agravam dentro da Internet: “Há em muitas delas a enunciada ‘muralha’ destinada a separar os departamentos editoriais dos comerciais. Esta separação – enunciada normativamente em muitas empresas – tende a se relativizar nas novas empresas multimídias” (Costa, 2008:338). Assim, além de conectar o jornalismo com as questões da publicidade que alicerçam a Sociedade do Espetáculo, Carlos Sandano revela outra palavra-chave ligada ao jornalismo dentro dessa sociedade, o sensacionalismo. Sobre o sensacionalismo, o estudioso de Filosofia e mestre em Comunicação Jaime Carlos Patias (Faculdade Cásper Líbero), no artigo que analista o espetáculo no telejornal sensacionalista[68], diz o seguinte: “Além disso, pelo estilo e forma como os programas são apresentados, eles se inserem no contexto da sociedade do espetáculo descrita por Debord, onde o sensacionalismo sugere que informa enquanto faz espetáculo” (em Coelho e Castro, 2006:103). Assim, mais essa faceta do jornalismo, o sensacionalismo, é outro mecanismo de alienação do espetáculo, como Debord nos revelou. A quebra do “muro” que separava o jornalismo da publicidade se dá em função dos interesses ideológicos, como já identificávamos e, agora, nos confirma Patias, da indústria cultural: “Na indústria cultural, publicidade e noticiário estão fundidos, intensificando-se a fusão entre aquilo que é noticiado e os bens de consumo apresentados nas publicidades e mesmo inseridos nas matérias que financiam o telejornal” (em Coelho e Castro, 2006:96). Como já enfatizamos, por trás dessa indústria cultural estão os conglomerados de mídia que vão acabar por influir na pauta jornalística, priorizando o espetáculo, um fato também destacado por Sandano: “As sinergias dos conglomerados de mídia comprometem a independência da produção, e a concorrência no campo jornalístico (...) altera suas práticas em nome de uma eficiência técnica e econômica, espetacularizando a notícia” (em Coelho e Castro, 2006:67). Essa alteração de práticas, para Sandano, são mecanismos vetores do espetáculo, da alienação e da serviência aos interesses da indústria cultural, utilizados para fins de manipulação ideológica: “(...) assistimos hoje (...) uma simbiose de processos técnicos e diluição das fronteiras entre publicidade e o jornalismo, assim como a manipulação (consciente ou inconsciente) da informação” (em Coelho e Castro, 2006:67). Assim seria então o jornalismo de massa atual: alinhado aos interesses da indústria cultural, alienador e manipulador. Realmente é preciso se repensar o papel do jornalismo como um todo dentro da sociedade contemporânea e mais, com o surgimento de uma nova esfera comunicacional através da web, até onde ela poderia influenciar neste cenário, seja positivamente ou negativamente? Enfim, Sandano atribui todo esse cenário a uma crise geral da instituição Jornalismo: É uma crise econômica: o jornalismo perde leitores para a Internet e outras forma de ‘entretenimento’. É uma crise de identidade: a tendência dos grandes grupos de comunicação em transformar tudo em espetáculo descaracteriza o conteúdo jornalístico. É uma crise profissional: assiste-se à diluição das fronteiras entre a publicidade e o jornalismo, assim como à manipulação (...) da informação (em Coelho e Castro, 2006:66). Dentro dessa lógica, Sandano aponta uma única alternativa para “afrontar a idéia de informação como mercadoria”, que seria “respeitando a diversidade e a complexidade de um planeta globalizado que se constitui com base em condições assimétricas e cuja perversidade não pode ser enfrentada sem que haja um direito de informação e comunicação livre” (em Coelho e Castro, 2006:77). Em relação à definição de Sociedade do Espetáculo de Debord, poderíamos dizer que a alternativa seria o direito ao acesso a informações que não se afastem do mundo real em uma encenação. Para finalizar esta reflexão, destacamos uma afirmação de Jaime Patias que nos mostra como os conglomerados de mídia trabalham seus veículos em prol da espetacularização da sociedade, fundindo todas áreas comunicacionais, o jornalismo e a publicidade (a lógica do infotenimento), além de outros, como as relações públicas, a editoração eletrônica e cada um dos meios disponíveis em massa nos dias atuais, o rádio, a televisão, o cinema, a Internet etc., tudo isso à luz do conceito de Sociedade do Espetáculo de Debord que trabalhamos até aqui. Em outras palavras, Patias seleciona varias “farinhas” do espetáculo e as põe todas “no mesmo saco”: Desde que a sociedade do espetáculo foi definida por Debord, a cultura do espetáculo se expandiu em todas as áreas da vida. Surgiu a economia do espetáculo numa fusão entre negócios e diversão, onde o entretenimento se torna rapidamente um dos principais aspectos geradores dos negócios. Por meio da ‘entretenimização’ da economia, as corporações e empresas fazem circular na TV, nos filmes, na Internet, nos videogames, nos cassinos, nos esportes etc.., suas imagens e marcas para que os negócios e a publicidade se combinem, tudo sob a forma de espetáculo. Eis o paradigma da atualidade: a transformação da própria vida em uma forma de entretenimento. (Coelho e Castro, 2006:92-93). Assim, estaríamos, como nos diria Frederick Jameson (1996:268-284), vivendo na “sociedade do prazer”, que seria algo muito próximo disso mesmo: a própria vida transformada em entretenimento, e pior, num entretenimento condicionado ao consumo, confirmando assim as palavras de Debord, “uma evidente degradação do ser em ter (...) do ter em parecer” (Debord, 2003:15). Dentro dessa perspectiva, se no decorrer do século XX o jornalismo evoluiu ao pano de fundo da indústria cultural, hoje ele se recria a partir da realidade afastada que ajudou a criar dentro da Sociedade do Espetáculo. A Galáxia do Espetáculo Muitos, como já comentamos, podem apontar para as novas mídias, onde se destaca a Internet, como uma nova estrada que possui caminhos alternativos ao espetáculo associado ao mainstream media, embora ainda haja muitas objeções sobre essa alternativa. Carlos Sandano ainda tece algumas observações sobre a nova sociedade em rede, onde o livre acesso à informação estaria colocando em risco a lógica do infotenimento, a informação-mercadoria estaria assim diante de um novo concorrente de potencial ameaçador, com capacidade de remar contra a maré da alienação dessa lógica instituída. Assim, ele diz que “(...) uma observação crítica implica a capacidade de abarcar idéias contraditórias em todo complexo. Isso é algo que o formato industrial da transmissão de informação não permite, mas pode potencialmente ser encontrado na navegação não determinada e aberta e na interação que esse novo meio permite” (em Coelho e Castro, 2006, 73:74). Embora para Sandano os novos meios ainda tenham algumas limitações, o seu formato, entretanto, traz consigo um fator que sai da lógica contemporânea intrínseca do espetáculo, a quebra do monopólio da narrativa, algo importante quando buscamos um “ponto de partida para a observação crítica da realidade” (em Coelho e Castro, 2006:74), como afirma nas palavras: “Evidentemente que estamos ainda limitados às possibilidades críticas que um navegador/leitor empiricamente determinado é capaz de fazer. Mas já temos aqui uma reformulação de um aspecto importante da lógica jornalística: a quebra do monopólio da narratividade contemporânea” (em Coelho e Castro, 2006:74). Com a quebra desse “monopólio”, Sandano aponta algumas vantagens que o leitor/usuário da Internet vai encontrar em alternativa ao jornalismo espetacular do mass media, “(...) hoje ele pode encontrar outros discursos no universo digital” e, acrescenta, “(...) também saber dos fatos por meio de blogs não-jornalísticos ou acessando o site de um grupo midiático que possui outra Weltanschauung” (em Coelho e Castro, 2006:74). Assim como Sandano, são diversos os filósofos e estudiosos que enxergam na estrutura comunicacional das novas redes computacionais um caminho mais aberto à informação do que aquele construído pela mídia tradicional, dentre os quais Manuel Castells. Castells afirma que a própria mídia (a velha mídia), ao se deparar com a Internet, traça uma série de boatos e mentiras sobre o novo meio, que o autor passa a desmistificar no decorrer de sua obra, mas através dessas críticas infundadas da mídia, ele fala sobre um fato que já nos é familiar pelo que estudamos até aqui, a questão do sensacionalismo do jornalismo atual: “A mídia (...) carecendo da capacidade autônoma de avaliar tendências técnicas sociais com rigor oscila entre noticiar o espantoso futuro que se oferece a seguir o princípio básico do jornalismo: só notícia ruim é notícia” (Castells, 2003:9). Mas quando Castells denuncia essa característica espetacular do jornalismo numa menção crítica à Internet, ele, implicitamente, a aponta como um novo caminho, caminho esse que pode ser, assim, oposto ao espetacular. Em tópico que analisa a questão da democracia e da política informacional na Internet, Castells faz colocações que nos dizem se existe esse caminho alternativo ao mass media pela web, e faz uma importante ressalva: “A Internet não pode fornecer um conserto tecnológico para a crise da democracia” (Castells, 2003:129). Mas, em seguida, faz uma explanação que nos mostra algumas das iniciativas que só são possíveis pela grande rede e que afetam o modelo vigente de comunicação, inclusive o jornalismo: A Internet fornece, em princípio, um canal de comunicação horizontal, não controlado e relativamente barato, tanto de um-para-um, quanto de um-para-muitos (...) Há, contudo, um uso crescente da Internet por jornalistas rebeldes, ativistas políticos e pessoas de todo tipo como um canal para difundir informação e rumores políticos (...) há também casos de informação política relevante difundida através da Internet que não teria podido ter sido tão ampla, nem tão rápida, se tivesse circulado através da mídia convencional (Castells, 2003:129-130). Se fôssemos fazer uma quantificação numérica de exemplos e iniciativas ligadas ao jornalismo que aparecem a cada dia na Internet, e que – da mesma forma como Castells, sempre fazendo ressalvas em relação à potencialidade da web –, estão construindo uma nova esfera no mundo da informação, este estudo não mais findaria. Um exemplo relevante, porém, podemos citar para ilustrar algumas coisas que já fazem parte desse novo contexto: a blogosfera, ou seja, o conjunto de blogs atuantes, sejam ou não de jornalistas, mas que consegue veicular “informação política relevante”, chamando a atenção do público para fatos que não encontram espaço nos mass media, ou até mesmo quando não existe interesse dentro dos mass media em dar espaço para certos fatos e informações. Apesar de ainda não se saber se, como os próprios blogs, as novas iniciativas interativas da Internet irão se efetivar como um contrapoder ao que está instituído, já podemos entender que algumas novidades surgiram com a web como sendo parte e tendo peso na atuação dentro do contexto geral maior da mídia. Castells também adverte que esse novo espaço, além de servir para dar vazão a informações relevantes que não são veiculadas na grande mídia, serve para a boataria: “A fronteira entre o mexerico, fantasia e informação política valiosa fica cada mais difusa, complicando assim ainda mais o uso da informação” (Castells, 2003:130). De certa forma, quando as barreiras da comunicação são quebradas, possibilitando essas novas peculiaridades conectivas da grande rede, elas também favorecem a diluição de outras fronteiras, como citou Castells, entre fantasia e informação, e entre publicidade e jornalismo, como vimos. Assim, se existia um mundo que se afastava da realidade nos veículos embordeirados nos limites de suas próprias fronteiras totalitárias, no mundo virtual sem fronteiras e limites[69], ele também pode alcançar horizontes nunca dantes imaginados, de forma que a Galáxia da Internet também é a Galáxia do Espetáculo. Castells traz dois dados relevantes que mostram que, de fato, a Internet está se tornando um meio alternativo de mídia: “(...) os jovens norte-americanos estão vendo menos televisão (...) Essa tendência foi atribuída em parte a um maior tempo dedicado pelos jovens para surfar na Internet (The Economist, 2001, p. 60)[70]” (Castells, 2003:157). Porém, embora tal dado demonstre que de fato o público jovem tenha mais disposição de estar na Internet do que assistindo TV, não sabemos exatamente o que ele tem procurado na Internet, e nem se o faz em alternativa ao que os mass media lhe oferecem, ou mesmo, se busca outro tipo de conteúdo específico da grande rede[71]. Um outro dado que Castells traz à tona demonstra uma característica típica desse público jovem, que cresceu habituado a não precisar tirar a carteira do bolso para pegar uma folha de papel com informações, que não tem o costume de pagar por informações: “Um terço dos americanos lê notícias on-line pelo menos uma vez por semana. Não se dispõem, contudo, a pagar por isso. O único jornal com um serviço bem-sucedido de assinaturas pagas on-line é o Wall Street Journal” (Castells: 2003, 162-163). Dessa forma, os tradicionais jornais impressos têm na Internet um forte concorrente capaz de quebrar o velho modelo do jornal pago pelo leitor na banca[72]. O fato de o jornalismo estar sofrendo os maiores impactos com o crescimento da Internet, vai desde a produção da notícia, que se reestrutura em função da nova mídia: “As salas da redação em toda a mídia estão sendo reequipadas em torno da Internet. Trabalham num fluxo contínuo de processamento da informação, no tempo da Internet, segundo modelo adotado pioneiramente pelo The Chicago Tribune/Los Angeles Times em 2000” (Castells, 2003:157), até o impacto através de sua forte ligação com a Internet, “(...) a Internet mantinha-se separada da televisão e (...) separada da maior parte do mundo da mídia – com exceção talvez do noticiário” (Castells, 2003:158), que acrescenta: “E a relação com o mundo da mídia é limitada à leitura de jornais diários” (Castells, 2003:159). A presença da informação na Internet é um fato incontestável, em um volume muito maior que a totalidade dos jornais impressos poderia absorver (e outros veículos jornalísticos também). Embora a Internet não tenha ainda capacidade técnica para transmitir imagem em tempo real com a mesma qualidade da TV, ela já tem capacidade de transmitir informação na forma de texto e imagens estáticas, ou até em pequenos vídeos e animações, capaz de suprir as necessidades, ao menos informativa, de seus usuários. Pensando-se na capacidade da Internet em trabalhar apenas com texto e fotos, somada à abundância da informação, podemos entender por que os jornais impressos (que trabalham com texto e imagens estáticas apenas) são os primeiros a sofrer com a introdução da Internet. A Internet já permite iniciativas relativas ao jornalismo na rede que ainda não estão disponíveis para o mundo da imagem, como a TV e o cinema. Somente o jornalismo pode ser feito com qualidade e em tempo-real através da Internet, a TV e o cinema ainda não (trabalham mais on demand). Porém, Castells nos fala de um trunfo que as velhas empresas jornalísticas ainda têm: “Os jornais não estão sendo solapados pela Internet porque, num mundo de informação infinita, a credibilidade é um ingrediente essencial para os que a buscam” (Castells, 2003:163). Essa passagem também demonstra que, mesmo a Internet sendo uma concorrente ao seu modelo de negócio, a presença dessas empresas jornalísticas na web é uma maneira ainda de manter o seu leitor preso a elas, de cercá-lo pela nova mídia (como vimos em passagem anterior onde Castells afirma que os jornais na web objetivam manter o leitor/usuário sob o mantra de sua autoridade dentro do novo espaço midiático digital que, aliás, é uma continuação da frase citada acima). Como nem tudo são pétalas, Castells traz à luz aquele que talvez seja o único trunfo que essas empresas têm para sobreviver no novo ambiente, a credibilidade, algo que, embora a Internet possibilite a entrada de novos atores no mundo da notícia e novas fórmulas de práticas comunicacionais, é difícil de se conquistar e manter – no entanto, fácil de perder –, é uma carta na manga que os velhos jornais têm para sobreviver em meio a esses novos concorrentes do mundo virtual. Por fim, Castells atribui a toda essa reformulação que a Internet está causando nas demais mídias[73], em especial no jornalismo, em função da sinergia dos grandes conglomerados de mídia que estão mudando os negócios do mundo da mídia, embora ainda busquem na Internet um meio de ganhar dinheiro sem a estrutura totalitária que construíram até a chegada do novo meio: “Essa profunda reestruturação está associada a fusões e consolidações entre grandes companhias, de modo que sete megagrupos de multimídia controlam a maior parte da mídia global, e em cada país um pequeno número de corporações (...) determina o que é publicado e transmitido” (Castells, 2003:157). Como vimos, esses grandes conglomerados compõem a indústria cultural, responsável pela criação do hiperrealismo da mídia e da transformação da notícia em mercadoria, do jornalismo em instrumento ideológico que serve para movimentar a indústria do espetáculo. Resta-nos saber como essa sinergia absorverá o novo mundo multimídia da Internet, e como isso afetará ou não, reforçará ou não, os pilares da atual “Sociedade do Espetáculo” em que hoje estamos inseridos. A Sinergia da Mídia Como vimos anteriormente, alguns estudiosos da Comunicação colocam por trás da crise ética do jornalismo na atualidade, que passa pela questão da análise da Sociedade do Espetáculo, a pressão cada vez maior que as empresas jornalísticas têm em responder aos ganhos lucrativos. Essa situação se agrava dentro do cenário atual onde grandes corporações de mídia e outras advindas de outros setores (teles e tecnologia), passam a atuar no mundo da informação, o que chamamos de sinergia midiática ou sinergia da mídia. Vimos também que a sinergia pode ser entendida como uma convergência de diversos setores da própria mídia para um único setor, para a mesma cadeia produtiva, tendo como plataforma comum a tecnologia digital e as redes de comunicação, daí a seqüência de fusões e a proximidade cada vez maior entre corporações desses três setores: o setor da mídia, que passa a produzir ou reproduzir todo seu conteúdo também de forma binária; da tecnologia, que cria hardware e software que serve de plataforma para esse mundo de informação binária; e das teles, responsável por toda infraestrutura de comunicação que inclui telecomunicações, satélites e redes digitais entre outras, que interliga todo esse mundo binário. Mas afinal, por que isso ocorre? Para respondermos a essa questão, precisamos entender o que vem a ser o conceito de sinergia. Quem explica de forma clara esse conceito é o estudioso e pesquisador de mídia e política Venício Lima (Universidade de Brasília): Esse inédito processo de oligopolização e emergência de novos e poderosos global players no cenário econômico e político mundial tem sido explicado pelos executivos (CEOs) do setor como correspondendo ao processo biológico da sinergia. Argumentam eles que, considerado o nível elevado dos investimentos necessários, a integração horizontal, vertical e cruzada da indústria de comunicações, isto é, a ação coordenada de várias empresas no mesmo grupo, torna-se inevitável e é mais eficiente do que a de empresas isoladas (Lima, 2004:92). O conceito de sinergia associado à busca da eficácia dentro das Comunicações[74], expressa pela convergência de grandes empresas para o mundo da informação binária pode ser associada à Internet como o novo meio comunicacional evoluído, para onde os outros setores, tanto da mídia, quanto da infraestrutura de comunicação e da tecnologia, acabam convergindo. Ora, se a Internet e a comunicação binária representam de fato a evolução dos meios como vimos na colocação de Costella[75], essa sinergia que se forma em torno do bit, como bem colocou Túlio Costa, também aponta para o mesmo sentido, ou seja, a evolução dos meios, deixando-se de lado, é claro, as implicações que advém da formação desses imensos oligopólios que, como vimos, acabam sobrepujando a ética jornalística. Sem entrar num estudo à parte sobre a evolução tecnológica advinda do mar informacional da Internet, é evidente que a própria eficácia dos meios comunicacionais hoje em dia, inclusive na parte gerencial dos negócios do mundo das Comunicações, passa pela inteligência conectiva da própria Internet. Nada mais natural, então, que o rumo a esta eficácia seja o rumo a binário-eletronização total dos meios. Beth Saad apóia-se em diversos estudos para relacionar o conceito de sinergia com as estratégias que os grupos de mídia devem adotar, ou estão adotando, para inserir-se dentro do novo contexto midiático. Além de entender a sinergia como um movimento rumo à eficácia empresarial, ela afirma que “tal sinergia é fator essencial para a transformação dos velhos jornais, por exemplo, numa empresa pós-jornalística, com estrutura não mais baseada em meios, mas, sim, em mercados informativos”[76]. Esse posicionamento embasa a estratégia de vários grupos midiáticos numa forma de ampliar seus públicos tendo como base, também, a nova plataforma digital, somando-se novos públicos aos antigos dentro do mercado informacional[77]. Sinergia Brasileira Uma vez explicado o conceito de sinergia, Venício Lima passa a descrever o cenário nacional dentro deste movimento. Primeiro ele nos fala a respeito da relação entre os conglomerados mundiais com as empresas brasileiras: “Estudiosos do setor (...) já constataram que o mercado global de mídia é hoje controlado, num primeiro nível, por cerca de dez enormes conglomerados, num segundo nível, por outras 40 empresas, direta e indiretamente associadas às primeiras” (Lima, 2004:92). Os braços desses grupos internacionais se estendem ao Brasil através desse segundo nível de associações mencionadas por Lima, como, por exemplo, citam os jornalistas e estudiosos da mídia Antonio Biondi e Cristina Charão em artigo em que analisam a situação dos grupos brasileiros de mídia[78], a associação entre Sky do grupo de Rupert Murdoch (News Corp) e a DirecTV da família Marinho (Organizações Globo) no ramo da TV a cabo. Quem dá a conta final do número total e atual de corporações globais de mídia é Caio Túlio Costa, que expõe: “(...) nos anos 80 existiam cerca de 50 empresas globais de comunicação. Essa quantia caiu para 27 no começo dos anos 90 e reduziu-se a apenas sete no começo do século XXI. Com a emergência da Google, a conta fechou em oito[79] empresas globais de comunicação” (Costa, 2008:332). No Brasil, segundo a mesma matéria de Biondi e Charão, são oito os grandes grupos comunicacionais: Bandeirantes, Globo, Sílvio Santos, Abril, Record, RBS, Estado e Folha, sendo que a configuração do capital estrangeiro pode ser vista explicitamente em pelo menos cinco desses grupos (Globo, Sílvio Santos, Abril, Folha e Bandeirantes), através de diversas participações em variados setores. Existem, ainda, parcerias inúmeras entre os variados negócios dentre esses grupos, o que demonstra que o seu conjunto forma um grande oligopólio. Em outras palavras, temos oito grandes grupos nacionais de mídia, nos quais se observa a participação societária de empresas de tecnologia e de telecomunicações internacionais, que é por onde os braços dos grandes conglomerados de mídia internacionais se estendem ao nosso país. Vale lembrar que essa análise e esses dados referem-se à composição do capital das empresas, e não engloba as parcerias comerciais (que são incontáveis). Uma das conseqüências dessa concentração de empresas está nas implicações éticas, como ressaltamos. A matéria de Biondi e Charão exemplifica isso através da própria pesquisa que fizeram ao elaborá-la, e expõem: “A edição 2007 de ‘Valor Grandes Grupos’, anuário do jornal Valor Econômico, lista os grupos Sílvio Santos (...), Abril (...), RBS (...) e Estado (...). Outros dois gigantes, Organizações Globo e Grupo Folha – exatamente os que partilham a propriedade de Valor Econômico – não são citados no anuário” (Biondi e Charão, janeiro de 2008:7). Ou seja, isso mostra como esses conglomerados pautam a seu favor as informações dos veículos que detêm, colocando os seus próprios interesses acima da função informativa e da ética jornalística, criando barreiras e manipulando informações segundo seus próprios interesses. Com essa simples análise, algo já se pode afirmar com os dados até aqui expostos: a sinergia mundial da mídia já é um fato que também toma forma no território brasileiro. CAPÍTULO II – A NOVA FACE DA NOTÍCIA: O WEBJORNALISMO “You were right about one thing: I have been watching; I couldn’t behave my self, watching, waiting… Hold the vibe breathes…” – Devil’s talking[80] Neste capítulo buscaremos analisar o novo advento do jornalismo que é a sua “fusão” com a Internet, o webjornalismo. Procuramos entender o que a nova plataforma digital está agregando à velha prática do jornalismo na criação e veiculação da notícia. Vamos esmiuçar ao máximo a nova prática comunicacional jornalística através da Internet e analisar quais foram as inovações que os meios digitais trouxeram ao bom e velho jornal. Iremos também estudar os novos fenômenos e práticas do jornalismo que surgiram com a nova mídia, dentre as quais temos o weblog, blog ou diário virtual, que deu origem a uma nova esfera comunicacional, a blogosfera. Verificaremos que novas tecnologias vêm se amoldando em torno do jornalismo e como os jornalistas, os editores e as empresas de mídia estão fazendo uso desses novos recursos. Nesse contexto, iremos também analisar a convergência do usuário dentro desse novo cenário. Como vimos no capítulo anterior, o usuário é, dentro da grande rede, um coprodutor da informação, sendo assim, vamos tentar analisar o papel desse novo ator e como ele também está se engendrando no mundo da notícia e, indo além, como os tradicionais jornalistas e empresas de mídia enxergam esse novo ator. Para avançarmos nessas questões, iremos nos valer de estudos de experientes jornalistas e também de diversos estudos acadêmicos que, assim como o nosso, vêm tentando compreender a nova plataforma digital como amparo ao jornalismo. 1. As Novidades do Jornalismo na Internet “It’s your time now. Our time” – Devil’s talking[81] O professor doutor em Ciências de Comunicação J. B. Pinho (ECA/USP) publicou, em 2003, o livro Jornalismo na Internet: planejamento e prática da informação on-line, onde discute os novos e ampliados recursos tecnológicos advindos da grande rede que facilitam inúmeras atividades da prática jornalística, e cita alguns deles (Pinho, 2003:9-10): · a comunicação rápida e ágil entre jornalista, fonte e leitor; · a busca de idéias que possam se transformar em notícia; · a ajuda ao repórter para encontrar fontes autorizadas e levantar o contexto dos fatos e acontecimentos a serem cobertos; · o monitoramento da discussão de diversos assuntos em áreas específicas; · o acesso a arquivos em todo o mundo para a busca de documentos que auxiliem o jornalista no levantamento de informações prévias sobre o assunto de uma matéria pautada pelo editor; e · a consulta a grandes bases de dados e bibliotecas que são repositórios de vasta gama de informações. Vemos que a grande rede aparece como uma ferramenta capaz de agilizar o trabalho do jornalista. Dentro dessa lista, podemos destacar duas capacidades que aproximam o jornalista do seu público. A rede facilita o contato entre o jornalista e o leitor, e permite um melhor monitoramento do que o leitor discute em diversas áreas, inclusive sobre a repercussão de matérias e notícias veiculadas. Pinho discorre sobre as diferenças entre a nova mídia em relação às demais mídias, o que se mostra importante para entendermos com mais profundidade o que ela agrega à comunicação e ao jornalismo: A Internet é uma ferramenta bastante distinta dos meios de comunicação tradicionais – televisão, rádio, cinema, jornal e revista. Cada um dos aspectos críticos que diferenciam a rede mundial dessas mídias – não linearidade, fisiologia, instantaneidade, dirigibilidade, qualificação, custos de produção e de veiculação, interatividade, pessoalidade, acessibilidade e receptor ativo[82] – deve ser mais bem conhecido e corretamente considerado para o uso adequado da Internet como instrumento de informação (Pinho, 2003:49). O professor atribui uma série de características à nova mídia. Em seguida, passa a discorrer sobre cada uma delas, analisando como elas se relacionam com a prática do jornalismo. Não lineariedade Comparando com a maneira tradicional de leitura oferecida pelos antigos meios impressos – a de um jornal que se inicia pelas manchetes de primeira página e segue o caminho de chamadas e submanchetes; a leitura de um memorando que se inicia a partir do topo superior esquerdo de uma folha de papel –, e, comparando com os antigos meios eletrônicos, o rádio e a TV – onde a informação segue uma seqüência pré-determinada, não podendo ser alterada pelo ouvinte/telespectador –, a Internet é completamente “randômica” neste aspecto. Pinho apóia-se num estudo da Sun Microsystems (1997) para apontar que, na web, não existe uma seqüência pré-determinada na busca de informações. Segundo Pinho, “o hipertexto permite que o usuário se movimente mediante as estruturas de informação do site sem uma seqüência pré-determinada, mas sim saltando entre os diversos tipos de dados que necessita” (Pinho, 2003:50). O mesmo estudo da Sun, sob o foco da fisiologia do meio digital, revela que o usuário lê mais devagar na tela do computador, e recomenda um texto 50% menor do que normalmente se publica num material impresso[83]. Mas, se na Internet os textos jornalísticos são mais enxutos – muitos poderiam dizer, mais superficiais – a não-lineariedade permite um aprofundamento maior nos assuntos através de uma navegação livre; assim, “o internauta que navega em páginas de hipertexto vai acumulando conhecimento, segundo o seu interesse e até se satisfazer” (Pinho, 2003:50). O jornalista e pesquisador Mike Ward (University of Central Lancashire. Preston, Lancashire, Inglaterra), no livro Jornalismo online, demonstra que a lineariedade torna-se abstrata no novo meio, pois, na verdade “as aplicações online, como navegar na web, envolvem consumo não-linear de produtos principalmente lineares” (Ward, 2007:128). A não-lineariedade da web, dessa forma, estaria ligada à maneira que o net-surfista navega pelo mar de informações da Internet, não pelas informações em si. Estas teriam a mesma lineariedade dos produtos das demais mídias. É o acesso à informação que é não-linear. Instantaneidade Essa é uma das características mais marcantes dos mais abrangentes meios eletrônicos, o rádio e a TV. É a capacidade de veicular informação instantaneamente, ao vivo. Aliás, a mensagem da TV e do rádio só existe no instante em que é veicula, depois desaparece “no ar”. Se alguém, por exemplo, perdeu a hora de sua novela favorita e não havia programado o seu videocassete ou DVD recorder para gravá-la, essa pessoa perdeu o capítulo, e terá de se contentar com o resumo que sairá no jornal do dia seguinte (ou antes, na web), ou com a boa memória de sua vizinha para se inteirar dos fatos decorridos naquele episódio. Nesse ponto, a Internet se avantaja sobre os velhos meios, pois, além de poder veicular informações instantaneamente, tem a capacidade de armazenar tudo aquilo que veicula para consulta a posteriori. No entanto, na cobertura de fatos ao vivo, o rádio e a TV ainda possuem uma agilidade maior que a Internet. A TV, principalmente, pois não existe ainda uma capacidade de veiculação de imagem ao vivo pela Internet (o que na web se conhece por live stream) com a mesma rapidez e qualidade da TV. Mas se a Internet não rivaliza com a TV, ela já pode transmitir som com a mesma qualidade do rádio: hoje qualquer estação de rádio pode ser acessada e ouvida através da Internet no mundo inteiro. Tal entendimento fica claro através da seguinte passagem de Bruno Rodrigues, autor do livro Webwritting: pensando o texto para mídia digital[84]: Traz perenidade à notícia. A noticia da TV, do rádio ou impresso são voláteis, se esvaem no ar. Você viu e ouviu – mas passou, ou então virou embrulho de pão. Na Internet ela permanece, e se expande, novos aspectos são agregados e criam-se células de informação, como minúsculas agências de notícias específicas sobre um determinado assunto. Eternas, se necessário (em Pinho, 2003:52). Se a instantaneidade da Internet ainda não é páreo para a TV e o rádio, ela já rivaliza com o jornal – inclusive em termos de penetração. O jornal é, em comparação com a rede, “ainda mais lento” (Pinho, 2003:51). Segundo Pinho, a velocidade das informações na web é algo que só havia sido alcançada pelo telefone e o fax, pelos quais informações são transmitidas “quase instantaneamente” (Pinho, 2003:51). Toda essa velocidade leva o autor a dizer, “na mídia on-line, a instantaneidade da informação modificou até mesmo o sentido de furo de reportagem” (Pinho, 2003:51). Hoje, muitos sites informativos até se gabam por transmitir informação em “tempo real”, o que, afirma Pinho, não é uma conquista da Internet, e sim do rádio e da TV. Fica claro, então, que a instantaneidade é uma característica também da web, mas, nesse ambiente, a sua graça está no fato de ela, além de veicular a notícia com praticamente a mesma rapidez do rádio e da TV, vir acompanhada de uma série de informações e recursos adicionais que complementam essa instantaneidade. Relacionado à instantaneidade está o imediatismo, como aponta Mike Ward. Como o rádio e a TV, a Internet vem dotada de uma multiplicidade de canais que podem ser atualizados constantemente – nunca é preciso interromper qualquer informação em prol de outra. Ele diz: “Um único site de notícias pode divulgar inúmeras atualizações sobre reportagens a cada poucos minutos” (Ward, 2007:22). Esse imediatismo, aliado do poder de arquivamento da web, chama a atenção de Ward para o fato de um website conter “centenas de páginas separadas, ligadas entre si, mas capazes de serem lidas e reconhecidas de forma isolada. Isso amplia a quantidade e o alcance tanto da cobertura como do público potencial” (Ward, 2007:22). Nesse sentido, um único website é capaz de atender a diferentes demandas separadamente e simultaneamente (outra característica dualística do novo meio). Dirigibilidade Como nenhuma outra mídia, a Internet é capaz de atingir os públicos mais específicos, mais segmentados. Essa vantagem da web, segundo Pinho, chega até mesmo a se caracterizar como um caminho para se driblar os gatekeepers da velha mídia. O professor expõe: “Os veículos de mídia impressa e de mídia eletrônica sofrem severas restrições de espaço e de tempo. Além disso, um editor determina (...) o que vai ou não ser publicado. Na Internet (...) a informação pode ser instantaneamente dirigida para a audiência sem nenhum filtro” (Pinho, 2003:52). Essa característica, aliada da interatividade (que discutiremos a seguir) e da capacidade de monitoramento dos hábitos do internauta através da inteligência digital, vai permitir o aproveitamento maior das informações que perpassam por qualquer empresa informativa. Não há motivo fisiológico, em termos de capacidade de armazenamento e disponibilização de dados, que leve à filtragem de notícias, na Internet há um espaço praticamente infinito para se publicar. O interessante é que, também pela fisiologia[85] da rede digital, não há um custo adicional àquele inerente para se manter a estrutura de um site ou portal informativo para se disponibilizar as informações que não teriam apelo para um público maior, como os dos meios impressos e eletrônicos tradicionais. É uma característica que permite ampliar o público total de uma empresa informativa através de audiências menores. Segundo a doutora em Ciências da Comunicação Pollyana Ferrari (ECA/USP), o conceito de dirigibilidade relaciona-se com outro já comentado anteriormente. Ela lembra que “nos Estados Unidos, convencionou-se chamar o novo jornalismo decorrente da mídia digital de narrowcasting – o específico, o personalizado, enfim, a informação dirigida ao indivíduo” (Ferrari, 2003:53). A capacidade de dirigibilidade da Internet é, dentro deste entendimento, um vetor que vai acelerar de forma imensurável a segmentação da mídia. É o vetor que conduz àquela tendência de crise para os jornais impressos, que já os afetava desde antes da chegada da Internet, como vimos no estudo de Philip Meyer. Como mídia, a Internet é segmentada por natureza. Qualificação Embora os dados atuais relativos à inclusão digital no Brasil não sejam ainda o ideal se comparados aos países do primeiro mundo, eles apontam para um incremento das classes mais baixas no acesso à Internet. Segundo o professor de Ciências Políticas e diretor executivo do Ibope Inteligência Marcelo Oliveira Coutinho Lima (USP), as classes C e D são as que mais têm contribuído para o aumento de usuários no Brasil. Hoje, 20% da população de nosso país tem acesso à Internet, seja em casa, no trabalho ou numa lan house[86]. O percentual é pequeno em relação aos países do primeiro mundo e a outros meios, o rádio e a TV principalmente. De qualquer forma, a postura diante do meio é diferente na Internet, o internauta é ativo na busca e disseminação de informações. E, nesse sentido, J. B. Pinho aponta que “a Internet apresenta um público jovem e qualificado, com alto nível de escolaridade, elevado poder aquisitivo e um perfil profissional em que predominam as posições de empresários, executivos e autônomos. Por essas características, a Internet deve merecer a atenção também como importante formadora de opinião” (Pinho, 2003:53). As questões sobre a esfera pública na Internet vistas no capítulo anterior, mostram que realmente a Internet tem características que favorecem o diálogo formador de opinião pública. A qualificação do usuário na Internet e sua postura mais ativa e participativa é outra característica que se soma a tudo discutido anteriormente. Também é algo que está intrínseco aos exemplos da “esfera pública conectada” que veremos mais adiante neste capítulo. Um exemplo, porém, de como a Internet pode ser um importante vetor na formação da opinião pública, e um espaço onde o usuário ativo pode encontrar informações de relevância que o auxiliem a, por exemplo, escolher o candidato à presidência de seu país, está na vitória de Barak Obama nas primárias norte-americanas de 2008. Enquanto alguns eufóricos dizem que isto só foi possível através do uso que o candidato fez da Internet como canal de diálogo com seus eleitores, os mais ponderados a vêem como uma importante ferramenta utilizada pelo presidenciável, mas não a única e decisiva nesta vitória parcial. De qualquer forma, percebe-se que, sendo decisiva ou não, a Internet foi um caminho por onde a discussão formadora de opinião esteve presente. Ainda mais, quando pensamos que as primárias estadunidenses contam com a participação de um público mais qualificado nessa fase do processo eleitoral. Enquanto muitos estudiosos vêm tentando compreender a ascensão do príncipe eletrônico – aquela figura cujo poder político advém, numa definição simplória, do uso que faz da mídia –, seria Obama uma metamorfose desse príncipe sob o aparato digital, uma espécie de “príncipe binário”? Só um amplo estudo de toda a sua campanha poderia dizer como e quanto a Internet foi, ou não, decisiva para o engajar de sua campanha. Custos de produção e de veiculação Os custos de veiculação na Internet são menores, pois podem partir de baixos investimentos. Hoje, com um laptop no colo, uma conexão telefônica à disposição e alguns aparatos tecnológicos à mão – um celular, uma câmera digital, uma webcam etc. –, e, mais, com o amparo do fluxo informativo e colaborativo da própria web, é possível se montar um site que gere conteúdo de relevância dentro da audiência ciberespacial. Um grande exemplo aqui por perto é o Blog do Noblat[87] que, como conta o professor Marcelo Oliveira Coutinho Lima, “iniciou-se com o próprio Noblat e, atualmente, com apenas cinco ou seis jornalistas – munidos de notebooks –, tem mais audiência que sites de grandes jornais brasileiros na Internet”. Referindo-se ao mesmo blog, o professor e jornalista criador do JB Online, um dos primeiros jornais brasileiros na Internet, Rosental Calmon Alves esclarece que este “já conta com mais de setecentos mil usuários únicos por mês. Trata-se de um número impressionante num país onde a circulação diária dos maiores jornais só chega perto deste número nos domingos” (Alves, 2006:100). Isso exemplifica o quanto mais acessível a Internet é para qualquer um que queira veicular informações. J. B. Pinho enfatiza que “depois dos investimentos iniciais em hardware e software, o uso da rede tem um custo pequeno” (Pinho, 2003:53). É claro que uma empresa de grande porte que queira entrar na web com uma larga capacidade de provimento de informações terá um investimento que, embora seja menor se comparado às demais mídias, é também alto. A grande vantagem é que, uma vez implantada a infraestrutura, seja ela um laptop, seja ela uma centena de provedores e roteadores de Internet, ela capacita de forma inesgotável a veiculação e o armazenamento de informações, e em qualquer formato. Interatividade Essa é uma das palavras-chave do novo meio. É a característica do meio digital que o coloca muito à frente dos mais tradicionais meios. Mesmo a TV digital, que agora começa a se desenvolver mundo afora, já chega com uma capacidade interativa que é ínfima se comparada à Internet. A diferença básica da interatividade nesse caso nem é o fato de a Internet ter uma capacidade tecnológica de software muito maior que a TV Digital e os demais meios eletrônicos. A diferença está em como o diálogo se forma nesses diferentes meios. Segundo J. B. Pinho, “na Internet a organização não está falando para uma pessoa, mas sim conversando com ela” (Pinho, 2003:54). Em outras palavras, a frase de Pinho mostra como o diálogo na Internet se relaciona como o novo paradigma comunicacional proveniente da Internet. É uma característica que, na pior das hipóteses, modificou completamente as possibilidades que as pessoas têm para se relacionar midiáticamente, além de ampliar as capacidades interativas – ínfimas se comparadas às possibilidades do mundo digital – que já existiam nos demais meios. Outra diferença é que a interatividade do novo meio proporciona uma maior pessoalidade nessa relação do indivíduo com a mídia. Segundo Pinho, “o que faz a Internet interativa, também faz a comunicação ser muito pessoal” (Pinho, 2003:54). Sendo mais pessoal, a comunicação se aproxima mais do indivíduo, seus interesses, seus hábitos e, assim, pode proporcionar informações e recursos mais satisfatórios para o internauta – uma porta aberta à dirigibilidade e a segmentação da informação, como já analisamos. Mas não podemos nos esquecer que a Internet é um canal de comunicação que conecta não só o indivíduo com as instituições, ela também conecta os indivíduos entre si, e assim estende todas essas portas abertas para a produção resultante das relações entre os próprios indivíduos – a peer production. A fisiologia do meio digital também é mais favorável à pessoalidade, no ciberespaço a relação do indivíduo com a mídia é mais íntima. Sob o foco de quem fornece a informação, um estudo de Sherwin & Avila[88] explica que: Em primeiro lugar, você está (...) fisicamente mais próxima do computador do que da tela de TV e, provavelmente, ainda estará sozinha. Em segundo lugar, aquela pessoa procura uma informação que você oferece. Em terceiro lugar, ele ou ela podem escrever diretamente para uma pessoa em sua empresa e receber uma resposta pessoal (...). Agora tente fazer isso com a televisão (em Pinho, 2003:54). A interatividade do meio proporciona um canal comunicativo aberto a todos nele inseridos, onde a comunicação também é feita de muitos-para-muitos, é a chave que abre para diversas outras características que ampliam a capacidade comunicacional de todos e, ao mesmo largo que ela se abre para a coletividade, ela se estreita para a intimidade do indivíduo – a pessoalidade do meio. Outra característica que pode quase ser confundida com a pessoalidade da Internet é a personalização. De acordo com Pollyana Ferrari, “a personalização de conteúdos Web tornou-se um dos elementos mais importantes para garantir a sobrevivência de uma empresa na Internet” e, ainda, “o usuário (...) migrará para sites que oferecem produtos e serviços customizados às suas necessidades” (Ferrari, 2003:35). Abrindo o espaço para o diálogo e interação do usuário, ou seja, um canal aberto para as características pessoais de cada um, o que Ferrari elucida baseia-se em três palavras, os três “is” – “interest, interaction and involvement[89]” (Ferrari, 2003:35). São três palavras-chave que se relacionam diretamente com todas as características da Internet que discutimos aqui. Mike Ward analisa a interatividade diferenciando o foco unilateral das demais mídias do foco bilateral da Internet, onde “esse modelo não apenas permite ao jornalista enviar algo, mas também permite que algo retorne do usuário” (Ward, 2007:149). Ward ainda identifica dois níveis de interatividade do usuário dentro desse modelo. Num primeiro nível, “são as escolhas que os usuários fazem a respeito de o que querem ver e ouvir, com base no modelo de consumo não-linear”, ou seja, os usuários têm mais controle sobre os conteúdos que querem consumir, cabe ao fornecedor de informações identificar o que o internauta procura para, desta forma, tentar melhor atender às suas demandas. No segundo nível, “os usuários começam a contribuir e consumir (...) o usuário torna-se fornecedor além de consumidor” (Ward, 2007:149). Neste nível, “feedback” é a palavra-chave na relação com o internauta, diz Ward. Hoje, através dos e-mails e celulares, muitas notícias são simplesmente enviadas para os jornalistas, os sites informativos só precisam filtrá-las e checá-las (Ward, 2007:150 citando Bob Eggington). Num certo grau, podemos afirmar que a produção do internauta, ou sua coprodução como mencionamos ao longo deste trabalho, ganha mais relevância que as informações levantadas pelos jornalistas. Em certos fatos, algumas “coberturas”, o cidadão conectado pode compor o melhor contingente de repórteres espalhado pelo mundo. Já é algo que está se tornando usual na cobertura de grandes acidentes e catástrofes, como no 11 de Setembro, no atentado em Madri ou na tragédia do vôo 3054 em São Paulo. Ward vai além, mostra que na Internet ainda existe o modelo tri-lateral de conversação/interatividade, quando “os usuários colaboram com outros usuários e com o jornalista” (Ward, 2007:150). Em outras palavras, quando o jornalista produz em colaboração com seus pares na web, ele abandona a sua condição de autor individual e passa para a produção colaborativa, a peer production. De certo modo, é quando o jornalista deixa um pouco de lado a sua condição de jornalista e vira um internauta, deixando-se levar e contaminar pela onda cibernética. É o que muitos jornalistas ainda hoje teimam em não perceber, ignorando que, na web, ele também é um internauta, um surfista digital, para Ward, “é o modelo que deixa alguns jornalistas nervosos” (Ward, 2007:150). Esse terceiro grau de interatividade pode ser expresso quando um jornalista participa do Orkut, por exemplo, onde, numa condição de igualdade com os demais participantes da comunidade, utiliza sua malha de relacionamentos para pesquisar e debater assuntos diversos, levantar informações, etc.. Através de uma citação de Slashdot, Ward expõe que, no meio digital, “isso se parece com uma assustadora perda de controle. Porém, você nunca realmente teve esse controle. Você apenas acreditava tê-lo” (em Ward, 2007:152). A interatividade dentro do fluxo de informações da grande rede, capaz de abraçar todos, expõe a força do todo em relação às formas mais centralizadas de criação e veiculação da informação. Receptor ativo Já comentamos, nos itens anteriores, que a postura do indivíduo é diferente diante do novo meio digital, ela é ativa. Além disso, o meio é mais dialogal, pessoal e interativo, abrindo espaço para as ações dos indivíduos, dando-lhes ouvidos. Voltando a refletir sobre essa característica do novo meio, J. B. Pinho lembra que: (...) com milhares de sites da Web disponíveis na rede mundial, a audiência tem de buscar a informação de maneira mais ativa. Daí se dizer que a Web é uma mídia pull, que deve puxar o interesse e a atenção do internauta, enquanto a TV e o rádio são mídias push, nas quais a mensagem é empurrada diretamente para o telespectador ou ouvinte, sem que ele tenha solicitado (Pinho, 2003:55). Quando o indivíduo aparece também como um produtor de informação, um receptor ativo que dialoga com outros indivíduos e instituições através da rede, sendo que dentre essas instituições estão as empresas de mídia, os jornais, os portais, etc.. Também, quando o indivíduo é quem deve ir ao encontro da informação, e não o oposto. Então, esse indivíduo não pode ser visto como um novo concorrente, e sim como um aliado. Em relação ao jornalismo praticado na web, Pinho chama atenção para todas essas características sobre as quais refletimos acima, como novas ferramentas em que se pode tirar proveito para uma prática jornalística online de qualidade: “o jornalismo digital deve considerar e explorar a seu favor cada uma das características que diferenciam a rede mundial desses veículos [televisão, rádio, cinema, jornal e revista]” (Pinho, 2003:58). E, dentre todas estas características, enfatiza que “o jornalismo digital diferencia-se do jornalismo praticado nos meios de comunicação tradicionais pela forma de tratamento dos dados e pelas relações que são articuladas com os usuários” (Pinho, 2003:58). Mais uma vez, vemos que, mais do que nunca, a coprodução do usuário é fundamental dentro do novo ambiente. Não basta mais, a qualquer instituição, apenas a sua inserção jornalística na nova mídia, ela deve e tem que considerar o agir jornalístico dos indivíduos a ela conectados. De todas as características que mencionamos acima, muitas já eram características de outras mídias, outras são próprias do novo meio e, ainda, algumas ganham maior relevância a partir da junção de todas essas características num único meio. Pinho aponta um estudo de Manta (1997), que demonstra a vantagem que o jornalismo tem dentro do novo meio: Há pouco tempo, a dissociação entre massivo e interativo era clara no âmbito da comunicação. Uma coisa ou outra. O telefone é interativo, mas não massivo, na medida que é apenas uma extensão tecnológica do diálogo entre dois interlocutores; a televisão, o rádio e as mídias impressas são massivas, porém não interativas. O jornalismo na Internet é, no entanto, massivo e interativo (em Pinho, 2003:141). Uma consideração há de ser feita: embora a Internet possa hoje ser apontada como um veículo de comunicação de massa, ela ainda está longe do patamar alcançado pela TV e até mesmo pelo rádio ao analisarmos esses meios sob o foco da simultaneidade. Não existe nenhum canal ou site na web capaz de chamar a atenção para um público de um país inteiro simultaneamente, como é possível através da TV e do rádio – como, por exemplo, em um informe oficial do governo (Ward, 2007:139). E não precisamos pensar em extremos, não é preciso recorrer a números para ter a certeza de que o Jornal Nacional tem um alcance simultâneo muito mais amplo que qualquer site noticioso que faça cobertura em “tempo real”. Talvez a simultaneidade seja uma das características dos meios eletrônicos mais carecidas pela Internet, e não sabemos se um dia ela a terá dentro dessas dimensões. Entretanto, se a audiência na web não consegue tal magnitude simultânea, ela pode ultrapassar as fronteiras de um país, pois qualquer site pode ser acessado em qualquer parte do globo terrestre. A acessibilidade da web é inigualável, como expõe Pinho: “Um site Web (...) está disponível ao acesso dos usuários 24 horas por dia, sete dias por semana e 365 dias ao ano” (Pinho, 2003:54). A Internet é incomparavelmente superior às demais mídias também em relação ao seu alcance global, como aponta Mike Ward: “O alcance global é o mais automático de todos os poderes distintos da mídia online” (Ward, 2007:139), mas não simultaneamente. Os sites na web funcionam como um banco, têm dinheiro para todos, mas se todos resolverem sacar todo seu dinheiro ao mesmo tempo, o banco vai à falência. Sobre a eloqüente frase da citação acima, que expõe a conectividade do telefone na contramão de sua massividade, basta refletirmos que, uma vez conectada à interatividade do telefone a inteligência binária dos computadores que, dentre uma vasta amplitude de possibilidades, permite a interação não apenas entre dois indivíduos, mas sim de inúmeros indivíduos, este tipo de rede de conversação comutativa se torna de fato uma mídia de massa. A junção desses dois itens – telefone e computador – também confere à Internet a sua característica comunicacional que é síncrona e assíncrona ao mesmo tempo. O telefone e o computador separados são apenas devices, gadgets, juntos, se tornam uma mídia. O conceito de mídia de massa ganha um outro viés na Internet. Nos tradicionais meios eletrônicos e impressos, tal conceito refere-se a um meio capaz de propagar suas mensagens a enormes contingentes humanos, as ditas massas. Com o crescimento da grande rede, hoje uma grande massa humana tem acesso às informações dispostas na Internet, mas de um modo diferente: as massas se compõem de inúmeros pequenos contingentes ou mesmo indivíduos que acessam uma massa diversificada de informações na rede, e não simultaneamente, como já comentamos. A rede também se torna massiva, não só em relação ao seu alcance por diversas populações, mas pela quantidade massiva de conteúdo que disponibiliza (Ward, 2007:137). A diferença da Internet para os demais meios de massa, nesta análise, estaria na massa de indivíduos se dispersar pela massa de conteúdos disponíveis, e não gravitando em torno de poucas mensagens. Usabilidade Este tópico, embora não apareça na lista que mencionamos através de J. B. Pinho, apresenta importantes considerações em relação aos novos meios digitais. Segundo Pinho, “a usabilidade diz respeito a técnicas e processos que ajudam os seres humanos a realizar tarefas em um computador no ambiente gráfico da Web” (Pinho, 2003:141). Já Pollyana Ferrari entende essas técnicas como algo focado na interatividade. Neste sentido, a usabilidade “é um conjunto de características de um produto que definem seu grau de interação com o usuário” (Ferrari, 2003:60). Pinho traça uma série de considerações sobre a construção da mensagem na Internet e quais são os aspectos-chave que devem ser levados em conta para se obter o melhor resultado através da positiva exploração das características do novo meio discutidas aqui. O professor expõe: “Os valores e aspectos funcionais da usabilidade são (...) a navegação, a interatividade, a estruturação das páginas, o uso correto da tecnologia e o estudo da audiência” (Pinho, 2003:142). É claro que a usabilidade do meio digital é muito diferente da dos outros meios. Diferentemente de apertar botões e selecionar canais e/ou freqüências, ou o simples abrir e trocar de páginas de um maço de papéis, onde a informação tem uma seqüencialidade praticamente padronizada, na Internet é o usuário quem tem de ir ao encontro das informações, o que, como já destacamos, o coloca numa postura pró-ativa diante deste meio. Além disso, a Internet exige uma qualificação maior dos seus usuários; afinal, este precisa, no mínimo, saber ler e possuir algum grau de ambiência tecnológica para usufruir o novo meio. Sendo assim, trata-se de um leitor diferenciado em relação às audiências dos meios tradicionais. Como na web temos mais informação à disposição, é mais fácil para o internauta encontrar opções de sites que possam satisfazer suas necessidades, o que torna suas demandas algo de muito maior importância na hora de se pensar o que veicular, como veicular e, é claro, para quem veicular. Facilitar o acesso à informação é outra demanda que figura aqui e, pode-se dizer, explica o sucesso de algumas empresas (como a Google), que se utilizam deste conceito. Dentro dessa e das demais perspectivas, vemos que o fator de maior relevância para a usabilidade é o papel do usuário. Fatores como a navegação, a estrutura das informações e a escolha da tecnologia ideal, devem se dar em função da necessidade do internauta, do uso que este faz da tecnologia/informação, observando-se como, quando e onde ele interage. É o que enfatiza Pinho em algumas de suas conclusões sobre a usabilidade: “Os responsáveis pelo site devem explorar ao máximo as possibilidades que a Internet oferece, em tempo real, para o levantamento e análise e o controle de dados relacionados com o acesso do leitor e o seu comportamento enquanto navega pelas páginas” (Pinho, 2003:152). É também a usabilidade um demonstrativo de que a Internet é a mídia do navegador. Ferrari vai mais fundo na questão da usabilidade. Segundo a estudiosa, o bom uso desta seria “uma relação de cumplicidade entre a empresa e o cliente”, no qual “o consumidor se sente capaz de interferir na qualidade do produto” (Ferrari, 2003:61). Para enfatizar esse pensamento, Ferrari aponta os estudos conduzidos por empresas de software, que disponibilizam seus produtos para teste dos usuários antes de serem lançados em suas versões finais – e depois continuam nesse processo constante de aprimoramento junto ao usuário final do produto. Enquanto Pinho diz que é importante observar-se o usuário, Ferrari é mais contundente, afirma ser este o único caminho para a efetiva criação de uma interface com boa usabilidade: “Atingir um alto nível de usabilidade requer que os designers concentrem esforços no usuário final” (Ferrari, 2003:62). O mais importante é a clarividência da relação da usabilidade com a própria confiabilidade da relação entre uma empresa e seu cliente, inclusive como um meio de fidelizá-lo, numa relação cuja palavra-chave é, mais uma vez, “feedback”. Uma pergunta cabe aqui: seria o feedback mais importante do que a mensagem original do emissor? Na Internet, a relação estaria mais presentemente ao lado do internauta do que em qualquer outra instância, site, empresa, provedor, etc.? São questões essas que tentaremos analisar com mais profundidade adiante neste capítulo. Mas fica claro que, mais do que nunca, o receptor está próximo do emissor e vice-versa. Além desses aspectos, Ferrari traz à tona os conhecimentos que adquiriu trabalhando em diversos projetos de websites informativos durante sua carreira. Ela chama a atenção para uma questão comum para quem veicula informação e conteúdo pela web, e a sua relação com a usabilidade: cobrar ou não pelos serviços? Conteúdo pago ou gratuito? No caso dos portais de conteúdo pago (...) primeiro os usuários pagam e só depois começam a testá-lo, sem ter para quem reclamar ou sugerir mudanças. Se tentarem algo nesse sentido, serão no máximo atendidos pelo técnico do setor de atendimento ao cliente, capaz de resolver falhas do serviço, mas não interferir no design do portal ou em questões de usabilidade. No caso dos conteúdos gratuitos, o usuário primeiro tem uma experiência particular de usabilidade. Depois, com a confiança do internauta já conquistada, o site pode faturar com outros serviços, como os de e-commerce (Ferrari, 2003:61). Ferrari ainda se apóia num estudo de Jakob Nielsen[90] para enfatizar o erro que muitas empresas cometem ao analisar a vontade do usuário baseando-se apenas nos dados de pageviews de suas páginas. Essa técnica nada mais seria que a replicação das técnicas de medição de audiência dos meios antigos, especialmente os eletrônicos, utilizada para valorização de venda publicitária. Nielsen diz que: Se um site for bem construído e fácil de ser usado, então os usuários vão clicar menos para achar o que procuram (...). Essa regra, muitas vezes, é propositalmente ignorada nos portais, já que a page view (...) é referência para a medição de audiência e, por conseqüência, moeda de troca na venda de espaços publicitários (em Ferrari, 2003:64). Nestas duas passagens, vemos que a usabilidade da Internet tem forte peso na relação entre emissor e receptor, e de um modo diferente, o peso do indivíduo é maior do que nas outras mídias. Os meios tradicionais que existem para medir essa relação e compreendê-la melhor não são os únicos e nem são suficientes para qualquer tipo de conclusão. Entretanto, evidencia-se aquilo que discutimos desde o início do presente estudo, a coprodução do usuário dentro do ambiente digital informativo, o seu valor e o seu peso nas relações oriundas do ciberespaço. Inovação Esta é outra palavra-chave ligada ao novo meio, a Internet. Manuel Castells e Beth Saad, por exemplo, conferem o status de vantagem econômica para aquele que inova dentro do mundo digital, tanto para as empresas de tecnologia quanto para as de infraestrutura e, inclusive, as de mídia – ou, segundo análise de Venício Lima, às Comunicações de um modo geral. E quanto ao jornalismo, o que foi inovado a partir do advento da Internet? J. B. Pinho, Pollyana Ferrari e Mike Ward, ao longo de seus estudos, discorrem sobre várias e novas ferramentas que a Internet e as linguagens binárias oferecem à pratica jornalística. Todos os devices, programas, códigos, elementos multimídia e a própria Internet – uma nova rede comunicacional –, são elementos que representam inovações que podem ser utilizadas, tanto sozinhas como em seu conjunto, para se inovar a arte do jornalismo. E, pensando que essas ferramentas, essas novas facilidades que conectam o indivíduo à mídia digital, estão disponíveis a quaisquer pessoas que porventura queiram se adentrar nessa prática, concluímos que, hoje, o jornalismo ultrapassa as fronteiras do próprio jornalismo. Assim, vemos que um novo e amplo suporte, quase que mágico, se oferece como uma plataforma para a inovação na prática do jornalismo, tanto para jornalistas como para qualquer um. Mas não podemos esquecer que as inovações tecnológicas advindas do chip começaram ainda na era pré-Internet, e desde então passam a inovar a pratica do jornalismo, como expõe a mestre em Comunicação Midiática Fernanda Maria Cicillini (UNESP) num estudo que faz sobre informatização na imprensa paulista: “Nesse contexto, os novos desafiantes da ‘mídia antiga’, incluem, (...) discos laser, (...) os aparelhos de fac-símile de última geração, banco de dados portáteis, livros eletrônicos, redes de videotexto, telefones inteligentes, satélites de transmissão direta” (Cicillini, 2007:8). Se continuarmos nessa regressão, vemos que uma série de invenções humanas foram, ao longo da história do jornalismo, sendo apropriadas e usadas para aprimorar essa técnica comunicacional, desde a prensa gráfica de Gutenberg, passando pelo cabo oceânico sub-marino, o telégrafo, a radiotransmissão, o satélite, finalmente chegando até o computador e sua linguagem binária. Voltando à contemporaneidade, além da própria rede computacional, inovaram a prática do jornalismo uma série de softwares, protocolos e siglas diversas, muitas até nem estão em uso mais, outras vão surgindo incessantemente. São: e-mail, usenet (newsgroup), chat, telnet, bbs, ftp, web, html, dhtml, recursos que praticamente nasceram com a Internet que, não podemos nos esquecer, além desse ferramental todo mencionado acima, também trouxe consigo a linguagem de hiperlinks, a hipermídia – o link poderia figurar nessa lista também, assim como outros dispositivos de armazenamento de informação em hipermídia que ganharam espaço junto com a ascensão da web, o CD-Rom e o DVD-Rom entre outros. E foram surgindo outras inovações que vão ganhando a atualidade: o weblog ou blog, rss, feed, atom, podcast/videocast, tag, twitter, xml, web 2.0. Outras siglas, ou extensões, apontam para as inovações que permitem a troca e veiculação de conteúdo multimídia através da web, que permitem ouvir rádio, som, música, assistir vídeos, imagens ao vivo, fotografias, e compartilhar de todo o mar de conteúdos da Internet; são os formatos mais comuns de arquivos diversos: gif, jpg, midi, mpeg, mp3, mp4, avi, divx, pdf, rtf, ascii, stream, zip, swf etc.. Poderíamos citar, inclusive, uma série de softwares, protocolos, linguagens de programação, tecnologias de armazenamento e pesquisa de dados, plug-ins, mecanismos de busca e browsers, que surgiram através das redes computacionais, como grandes inovações que vêm impulsionando todo esse mundo cibernético e o próprio jornalismo. Existem também as inovações que refletem o conceito de peer production, como exemplificamos através do surgimento da Napster, as rede BitTorrent, a blogosfera, os mundos virtuais como o SecondLife, os MMORPG e a Wikipedia, assim como o OpenSource e o software livre. A peer production em si já implica uma inovação conceitual de produção intelectual: o Commons. Assim como a cibercultura e a inteligência coletiva que também podem ser apontadas, por um certo prisma, como inovações advindas dos meios digitais interconectados. Podemos citar ainda aquelas inovações que muitos apontam como ruins, como efeitos colaterais da evolução tecnológica, e outros as utilizam mesmo assim: spam, worm, trojan-horse, pop-up, a comunicação viral. Enfim, os gadgets que tanto citamos ao longo deste trabalho, não seriam inovações tecnológicas que também modificam o cenário comunicacional como um todo? Sim: o notebook ou laptop, câmera digital, scanner, telefone celular, webcam, mini-DV, handheld ou palmtop, ipod, smartphone, usb, memory-key e muitos outros pequenos aparelhos baseados em chips que vêm revolucionando o dia-a-dia comunicacional das pessoas. Tudo isso seria inútil se não tivessem surgido uma série de inovações na própria infraestrutura comunicacional: a broadband (banda-larga), isdn, webtv, lan, wan, wap, fibra-óptica, 3g. Existem os aparatos que também estão por vir, e que muito já se especula como revolucionarão, ou, ao menos, inovarão no acesso à informação: o papel e a tinta digital, o documento eletrônico, a mesa digital e também uma série de devices e sistemas citados por inúmeros futurólogos, cujos contornos já se é possível vislumbrar: a superestrada da informação, os agentes inteligentes, os robôs domésticos, a realidade virtual. Todos esses nomes, aplicações, siglas, etc., são apenas algumas dentre o mar de novidades, de pequenas inovações que vão modificando as formas de veiculação da informação, a interação e o relacionamento das pessoas na sociedade dentro e fora da mídia. Precisaríamos de um extenso glossário para citar uma série de outras siglas que ficaram de fora dessa lista, mas não precisamos nos preocupar tanto com essas letras/conceitos/inovações/etc., pois, como já enfatizamos, não importa a tecnologia em si, e sim o uso que as pessoas fazem dela. Dessa forma, ainda mencionaremos muitas dessas siglas ao longo deste estudo, algumas já foram exaustivamente citadas e ainda o serão, mas sempre se levando em conta a convergência dos indivíduos/instituições sobre essas inovações. Sem dúvida o melhor e mais atual exemplo de inovação aliada ao sucesso empresarial está na Google e seu famoso algoritmo – uma fórmula matemático-binária tão misteriosa e valiosa quanto a da Coca-Cola. O algoritmo da Google nada mais é do que um mecanismo de busca e relacionamento de dados. A grande inovação está em como ele faz isso, quais as regras e operações ele realiza para relacionar esses dados, o que ninguém sabe ao certo. O que se sabe é que, de uma série de regras utilizadas para listar dados na web, leia-se, páginas web, a Google introduziu o critério de classificação de links[91], além de uma série de outros, dentro de seu mecanismo. O que a Google fez, de certo modo, foi adicionar novos critérios e filtros (subalgoritmos, muitos configuráveis pelo usuário) à busca de páginas web, possibilitando resultados mais inteligentes em comparação ao que se tinha disponível na Internet até seu surgimento. Muitos entendem o algoritmo da Google como uma fórmula matemática baseada no conceito de recomendações personalizadas e automáticas dos usuários, desenvolvido pelo site de vendas online Amazon, e aplicado ao link. Assim, de certa forma, o algoritmo da Google funciona como um sistema que aponta para os sites mais indicados pelo internauta[92]. Essa “pequena” inovação conferiu à empresa uma vantagem competitiva no mercado ciberespacial que a transformou, em poucos anos, num dos maiores global players da atualidade, aliás, a única empresa pure play que figura entre os maiores players do mundo. Voltando às siglas e nomes, dentro dessas incessantes inovações ligadas à busca na web, temos: diretórios, meta, Boole, spiders, clustering, metabusca e adsense. Beth Saad aponta em seu livro qual é a grande inovação ao jornalismo sob o amparo da Internet e das tecnologias binárias. Apoiando-se num estudo de Clark Gilbert[93], as inovações para os jornais que se aventuraram na Internet, foram (Saad, 2003:129): · Um ganho na velocidade de transmissão da informação: “o site poderia ‘furar’ a versão impressa, quando oportuno”; · As coberturas dos jornais impressos foram complementadas pelas informações online. Não parece muito, mas houve inovações. O mesmo estudo demonstra pouco avanço no uso da interatividade e a falta de criatividade dos jornais em utilizar o novo canal. Por exemplo, não se verificou o aparecimento de novas fórmulas para a geração de receitas com exceção da venda de espaço publicitário nas páginas web dos jornais – nesse aspecto, a grande inovação volta a ser, ainda, o algoritmo da Google aplicado à publicidade, de uma empresa que não é da mídia. Rosental Calmon Alves, em artigo que analisa a última década do jornalismo (até 2006), também aponta para o desperdício cometido pelas empresas tradicionais de mídia no aproveitamento da Internet. Ele expõe: Mas é justamente isto que tem havido de sobra no jornalismo digital desta primeira década: preguiça das empresas de apostar na Internet como um novo meio capaz de garantir sua sobrevivência numa era que se impõe de forma avassaladora. No fundo, o jornalismo digital tem sido muito tímido no que se refere à criatividade e à inovação. O medo de canibalizar o meio tradicional e a preocupação em obter lucros imediatos limitaram bastante o ímpeto inovador, mesmo quando os problemas iniciais de acesso (velocidade das conexões, por exemplo) foram sendo eliminados (Alves, 2006:94). Em contrapartida, o estudo de Gilbert demonstra que as empresas que estruturaram as suas operações web separadamente da operação do jornal tiveram mais inovações e um melhor desempenho, conseguindo aumentar os seus públicos (em Saad, 2003:129). Não seria este o caso do melhor desempenho do Grupo Folha, que estruturou suas operações web através do UOL, em relação ao Grupo Estado? Mas, para Saad, a grande inovação no jornalismo, com o advento da web e sua capacidade de armazenar, relacionar e disponibilizar dados, foi o enriquecimento imensurável de informações e serviços, principalmente os ligados às atividades financeiras, que as empresas de mídia passaram a dispor na web. Ou seja, a grande inovação foi a adição da inteligência computacional à simples veiculação de informações sob a plataforma de rede da web. Pollyana Ferrari atenta para as formas de interação e provimento de informações pela web como uma grande inovação, não só para a mídia, mas para a própria vida em sociedade. Nesse sentido, as comunidades virtuais, os portais informativos, o e-commerce, B2B e a própria personalização da informação e das relações na Internet representam uma grande inovação. Já Mike Ward, como vimos, acredita que a grande inovação para o jornalismo é a cobertura exclusiva online, ou seja, o jornalismo que é concebido e realizado para o novo meio, o próprio jornalismo online. Blog Muitos afirmam que uma inovação na prática do jornalismo através da Internet é o blog – ele até aparece entre as diversas siglas relativas às inovações que listamos no tópico anterior. O blog é uma ferramenta que passou a ser utilizada para disseminar informação pela Internet, tanto por jornalistas como por internautas. Através do seu conjunto, ou seja, uma infinidade de blogs que trazem informações e debatem diversos assuntos da sociedade, formam uma nova esfera de comunicação dentro da web, formam a blogosfera. Há um debate onde muitos apontam o blog como uma inovação que não pertence ao jornalismo, já outros afirmam que é uma inovação do jornalismo online. Essa discussão e o fenômeno dos blogs é algo que analisaremos em tópico logo adiante neste capítulo. O blog e a blogosfera podem ser vistos como inovações, mas sob diferentes perspectivas. O blog é uma ferramenta de publicação, nada mais que isso. Segundo o que apuramos[94], tal ferramenta foi criada pelo hacker norte-americano Jorn Barger[95] em 1997. Barger possuía um site, o Robot Wisdom Weblog[96], onde disponibilizava entradas, ou seja, links para diversas informações interessantes que encontrava pela Internet – criar links para páginas interessantes, na verdade, sempre fora um hábito no desenvolver de páginas para a web desde os seus primórdios. Essas entradas (o que atualmente se chama de post – postagem), eram conhecidas como registros, ou logs[97] (do termo em inglês), e continham a data e o horário de sua publicação. Em outras palavras, o blog é uma pagina web com registros datados, nada mais que isso. Se lembrarmos das eloqüentes palavras de McLuhan sobre a data ser o único princípio organizativo da linguagem jornalística, vemos aqui o primeiro laço do blog com o velho jornal. Entre 1997 e 1999, diversos internautas passaram a usar esse formato para publicar informações, e ‘logar’ os logs de outros weblogs inclusive adicionando comentários, um hábito que sempre esteve ao lado da prática de ‘logar’. O crescente número de internautas que passou a se comunicar através desse recurso criou uma malha de links entre os weblogs, formando uma nova comunidade virtual (que chegava a 50 mil em 1999)[98], esta malha era o primeiro estágio, embrionário, da blogosfera. Segundo Paquet[99], nessa época “tais serviços eram utilizados por designers e engenheiros de software cientes das potencialidades desta nova tecnologia” (em Escobar, 2007:10)[100]. O autor considera que blogs estão na raiz do que chama de personal knowledge publishing[101] (Escobar, 2007:10). Essa parece ser a palavra-chave que caracteriza essa ferramenta, que identifica tal espaço virtual como um blog: a pessoalidade da informação, do espaço, ou seja, a relação direta do publisher com o que é veiculado e o contato que ele, em diferentes graus, mantém com seus leitores/contatos. O blog ganhou impulso e passou dos mil para os milhares com o surgimento das ferramentas gratuitas e automatizadas de publicação. O recurso deixava a mão dos hackers e se estendia aos leigos em programação e scripts web – ainda em 1999 com o aparecimento de vários desses serviços[102]. As novas plataformas de blogs trouxeram uma inovação: o post passou a possuir link, e a possibilidade de se compartilhar as informações diretamente. Junto com a explosão dos blogs, vieram novos recursos para se partilhar fotos (flog), som e vídeo (vlog), apareceram os serviços de indexação e medição de blogs, de modo que esse crescimento manteve o conceito de interconectividade comunitária formada pelo conjunto dos blogs. Inclusive, vale esclarecer que os links criados pelos blogueiros acabam por organizar o fluxo de informações dos blogs segundo os temas e interesses que costumam abordar, são os blogrolls[103] – as rodas de blogs. Novos recursos vieram a se somar dentro desse conceito, permitindo um foco melhor dos assuntos abordados nos diversos blogs, tais como os meta-tags e as ferramentas de microblogging. Um estudo dissertativo sobre blogs, do mestre em Ciências da Comunicação Artur Vasconcellos Araújo (ECA/USP), aponta que, dentre o surgimento de várias plataformas gratuitas para a publicação de blogs, algumas características são comuns de todas. O espaço do blog, além da data/hora da publicação, é composto “com títulos e textos publicados em ordem cronológica inversa com espaço para comentários” (Araujo, 2007:32). Essas seriam algumas das características comuns e intrínsecas dos blogs. Talvez essa seja a grande inovação do blog, o seu caráter aberto a qualquer um que queira utilizar essa ferramenta, inclusive devido a sua simplicidade e, ao mesmo tempo, estar inserido dentro de uma comunidade interconectada capaz de fazer ressoar assuntos que ganham relevância dentro do amplo contexto midiático ciberespacial. É daí que se entende o blog como uma nova esfera de debate, a blogosfera. Nessa explanação, fica claro que a grande inovação do blog é o uso que as pessoas passaram a fazer desse simples recurso – logar informações –, a convergência das pessoas sobre esse recurso. A blogosfera é o resultado dessa convergência e pode ser entendida como uma verdadeira esfera devido à unidade que manteve, em diferentes níveis, durante a sua expansão. Esse crescimento, que partiu de um movimento dos internautas se interconectando, também pode ser um exemplo de como a peer production se mobiliza pelo terreno cibernético. Como os pares interconectados convergem sobre algumas tecnologias disponíveis na atualidade. Poderíamos dizer que o blog é, inclusive, uma manifestação jornalística da peer production. Web 2.0 A história da Internet reserva um capítulo especial para a figura do Sir Timothy John Berners-Lee, o feito desse cidadão londrino lhe confere tal honra: a criação da World Wide Web. A idéia trabalhada por Lee junto a sua equipe de engenheiros foi simples: adicionar o conceito de hipermídia para troca de informações na Internet. Assim desenvolveu um novo protocolo de comunicação, o HTTP, o protocolo de hipertexto (em 1990). Daí para a invenção do HTML – a linguagem de hipertexto – e do primeiro browser foi um pequeno passo para Lee, mas que para muitos foi muito maior para a humanidade do aquele dado por Neil Armstrong em 1969 no solo lunar. O ato heróico de Lee, no entanto, não está em sua invenção, e sim no fato de abdicar de sua patente, tornando-a de domínio público. A Web 2.0, ou seja, o segundo capítulo dessa novela, é a extensão do HTML no código XML – Extensible Markup Language –, linguagem que segue os mesmos padrões do HTML, mas permite uma infinita gama de programações que vai muito além de seu estático predecessor e, dessa forma, amplia e facilita a exploração de todos os recursos interativos da web. Hoje, muitos se deram conta de como essa extensão do código HTML vem beneficiando o diálogo na Internet, muitos usufruem o XML sem ao menos se dar conta. Um estudo do mestre em Comunicação em Semiótica José Renato Salatiel (PUC-SP), revela onde está essa inovação: Exemplos de mídias em web 2.0 são os blogs, em que o usuário produz, edita e publica seu próprio conteúdo; a Wikipedia, enciclopédia virtual em que os verbetes são escritos e reescritos de forma colaborativa; o YouTube, que mudou a forma do usuário se relacionar com o vídeo; redes P2P (...); comunidades virtuais, como o Orkut, Second Life, games e comunidades de portais; além do site do Google, Mashups, softwares Open Source, o site Del.icio.us, podcasts, RSS e sites de jornalismo cidadão como o “Overmundo” e o “OhMyNews” (Salatiel, 2007:2). Como alertamos, algumas das siglas e nomes que listamos como inovações anteriormente se repetem nessa citação, além de outras que são adicionadas. Apenas não se sabia que por trás de várias dessas inovações, estava a linguagem XML, a Web 2.0. Mas, aquém dos nomes, sites, serviços etc. listados acima, o fator de maior relevância é entender a Web 2.0 como uma inovação que beneficia a convergência do usuário sobre a mídia digital e, acima de tudo, serve de patamar para produção colaborativa, constituindo-se em um vetor impulsionador da inteligência coletiva. Além do mais, tendo o XML como base da inovação, as demais inovações listadas são exemplos da convergência dos usuários sobre essa nova linguagem, de como eles se apropriaram desse recurso para criar novas formas de relacionamento e distribuição de informação e conteúdo pela grande rede. É por isso que se aponta a Web 2.0 como uma nova revolução para a comunicação – uma revolução dentro da revolução da Internet –, pois foi uma inovação que alavancou diversas outras no novo meio. Em um estudo no qual o doutor em Letras Mauro de Souza Ventura (USP) analisa as potencialidades interativas do hipertexto, ele conclui que há limitações, “já que o usuário, como observa Aquino[104], ‘não interage totalmente nas páginas, porque não possui total liberdade e flexibilidade de se manifestar’” (Ventura, 2007:6 citando Aquino, 2007). Já “na Web 2.0 a participação do usuário na escrita hipertextual é ‘levada ao limite’” (Ventura, 2007:6 citando Primo[105], 2006:84). O limite da Web 2.0 é a transposição dos limites da sua predecessora. Isso ilustra a mudança no patamar interativo trazido pela Web 2.0, pois a Internet ganha uma nova magnitude a partir dessa inovação. Enquanto vivemos a revolução da Web 2.0, a mídia já veicula o termo Web 3.0[106], que seria o terceiro grande estágio evolutivo da Internet, na verdade, uma coevolução, pois se trata da mesma rede rodando sobre os mesmos protocolos. O primeiro estágio foi a própria criação da World Wide Web; o segundo, a Web 2.0, é, como comentamos, a flexibilização do código que permitiu uma maior convergência do usuário sobre a rede. O terceiro estágio, a Web 3.0, seria a convergência de uma série de sistemas que visam organizar o fluxo de informações da Internet que, além de integrar diversos mecanismos e plataformas (inclusive as móveis), trará serviços de classificação e busca de informações altamente sofisticados. A Web 3.0 seria conhecida como World Wide Database, pois toda a sua informação seria relacionada como dado e não como documento (página web). Após uma estruturação e classificação da imensidão de dados disponíveis nessa Database[107] mundial, nós atingiríamos um patamar que abre para a “Web 4.0”, que seria o desenvolvimento de sistemas capazes de relacionar esses dados de forma inteligente, os agentes inteligentes – tecnologia de ponta capaz de analisar e relacionar dados e “aprender” com eles, hábil em trazer à tona informações valiosas para seus usuários indo muito além do que inicialmente se requisita, enriquecendo infinitamente qualquer pesquisa ou levantamento de dados. Esse seria o patamar apontado por vários estudiosos das redes de informação e futurólogos, como Nicholas Negroponte e Pierre Lévy, apenas para ficar naqueles que citamos neste estudo. Nesse estágio, colheremos os benefícios da inteligência coletiva. Hoje, nós apenas estaríamos construindo a base para essa inteligência e já nos beneficiando com o novo patamar comunicativo atingido durante esse processo. E, se a “revolução” da Web 2.0 é baseada no código XML, a Web Database é baseada no conceito de “semântica na rede”, ou “Web semântica”, proposto por Tim Berners-Lee[108] e seus colegas[109]. Em palestra à Faculdade Cásper Líbero[110], o professor Luis Joyanes (Universidade de Salamanca – Espanha), abordou o tema da convergência digital. Parodiando os jargões publicitários, ele se perguntou se o próximo estágio coevolutivo da web seria a web 2.5 ou web 3.0, o qual ele prefere chamar, mais corretamente, de web semântica. Joyanes entende essa coevolução como a própria convergência digital, e que perpassa por duas palavras-chave: a mobilidade e a interatividade. Dessa forma, a web semântica trará uma coevolução onde a web apresentaria um grau de conectividade e interatividade jamais sonhado, e estará disponível aos usuários em todos lugares, este sim, seria o significado maior do que ele entende como sendo a convergência digital. O Jornalista no Ciberespaço Ressaltamos no início deste capítulo algumas das vantagens que o jornalista pode obter no exercício de sua profissão com o uso da Internet. Mas as mudanças que a Internet implica na função do jornalista vão além. Para muitos estudiosos, o tratamento e a veiculação de informações pela web reformulam completamente a função até então exercida pelo jornalista. Como já analisamos, ele deixa de ser um mediador da informação e passa a ser um incentivador, um fomentador ao acesso à informação, seja esta de qualquer natureza. Pollyana Ferrari esclarece em seu livro que a informação jornalística ganha um novo sentido dentro da web, é o “conteúdo”. O conteúdo engloba tudo que pode ser veiculado pela grande rede, textos, fotos, vídeos, som gráficos etc. Tudo na web é conteúdo. Assim, apontando para alguns estudos sobre esse “novo jornalista” e os novos currículos acadêmicos de jornalismo relativos ao novo meio, Ferrari conclui que “a capacidade de adaptação será uma característica muito valorizada nesse novo meio” (Ferrari, 2003:40), adaptação necessária para que este profissional consiga usufruir todos os recursos e formatos de “empacotamento” da informação que a web permite, ou seja, saber lidar e disponibilizar os conteúdos da melhor maneira possível para o seu público, utilizando-se de toda tecnologia e interatividade disponível, e de todos os meios, antigos e novos. Para Eugênio Bucci[111], a diversidade de informações disponíveis na grande rede não é uma ameaça à profissão do jornalista, pelo contrário, representam novas oportunidades para que os jornalistas possam exercer seu intermédio no sentido de facilitar o acesso aos diversos tipos de conteúdo que a web oferece, seja qual for a natureza destes conteúdos. Independentemente de como o jornalista deve exercer sua função tendo como pano de fundo os novos meios, Ferrari, com base na sua experiência, aponta para algumas mudanças que já vêm ocorrendo. A principal estaria no caminho que a notícia percorre até ser publicada que, na web, é muito curto. Uma reunião de pauta que antigamente demorava horas é feita em minutos; em contrapartida, o “fechamento nunca acaba” (Ferrari, 2003:56). Por ser um meio acessível 24 horas, a produção de notícias é contínua na web. Outro fato, ligado à reportagem, evidencia que o acesso às fontes e à notícia fica mais próximo ao jornalista, “raramente o repórter Web sai à rua em busca de um fato. O fato vem até ele pela própria net” (Ferrari, 2003:54). Ferrari diz que somente algumas coberturas muito específicas são feitas com a presença física do jornalista/repórter. Ela enfatiza que o “empacotamento de notícias”[112] virou padrão no jornalismo digital, e o jornalismo na web não pode se restringir a “o trabalho de produzir e colocar reportagens na Internet” (Ferrari, 2003:45), ele deve levar em conta as questões que já destacamos, o foco no usuário (narrowcasting) e a sua usabilidade. Citando outros estudos[113], Ferrari chama a atenção para a questão da autoria da notícia que, cada vez mais, se afasta do editor. Alguns chegam ao extremo de afirmar que a “hipermídia representa o fim da era da autoria individual” (em Ferrari, 2003:43). Hoje, não haveria mais espaço para a produção informativa sem a presença do internauta. Segundo Ferrari, definitivamente o narrowcasting é o caminho para a prática do jornalismo com qualidade na Internet. A preocupação em disponibilizar cada vez mais conteúdos para o internauta não está aliada às suas necessidades, afinal, nenhum deles é capaz de absorver tanta informação (como vemos em diversos portais informativos). Igualmente, a preocupação com o furo, com a necessidade de oferecer as “últimas notícias o mais rápido possível é um grande equívoco do meio” (Ferrari, 2003:49). Segundo nossa análise em relação às características do novo meio, a instantaneidade da Internet é rica porque vem adicionada das informações que complementam esta instantaneidade, não pela simples capacidade de disponibilizar informações em tempo real. Nesse sentido, Ferrari diz que “uma notícia superficial, incompleta ou descontextualizada causa péssima impressão. É sempre melhor colocá-la no ar com qualidade, ainda que dez minutos depois dos concorrentes” (Ferrari, 2003:49). As mudanças na didática jornalística diante do novo meio também compõem o foco do estudo de Mike Ward, que se apóia nos conhecimentos de jornalistas e webdesigners para analisar a prática ideal dessa habilitação no mundo digital. Ward entende que a grande dificuldade dentro do novo meio é ser ouvido. Assim traça uma série de considerações às quais os jornalistas devem atentar no sentido de não cair na maior armadilha da web: ser completamente ignorado. Os conhecimentos oriundos de webdesigners e jornalistas mostram uma das peculiaridades que surgem diante do novo meio, o aparecimento do profissional que mescla essas duas funções, o webwritter, ou webjornalista, que seria um jornalista preparado para lidar com a publicação dos conteúdos multimidiáticos da web – mas que não vai além de uma nova exigência técnica ao perfil desse antigo profissional. Os detalhes de sua obra seguem dentro desta linha, focados no novo meio de produção da notícia, e podem ser também apontados como um guia para se tirar o melhor proveito da usabilidade da Internet. Ward reafirma em seu estudo muito do que já concluímos sobre as características do novo meio, sua instantaneidade e rapidez na produção e veiculação da notícia, inclusive seguindo a mesma linha dos estudiosos que mencionamos até aqui (Pinho e Ferrari). Duas tendências que já identificamos também são destacadas como premissas básicas da Internet para Ward; o foco no usuário: “Online é um meio de comunicação diferenciado porque é controlado pelo usuário multifacetado”; e a questão do conteúdo: “Todos os elementos do meio de comunicação devem apoiar a oferta de conteúdo” (Ward, 2007:6). Além do papel do usuário, Ward reafirma a função do jornalista como um produtor de conteúdo, sendo este composto de uma variedade de categorias e preferências, como uma “igreja liberal”, que aceita tudo (Ward, 2007:6), outro aspecto que vai ao encontro daquilo que discutimos sobre a dirigibilidade e fragmentação do meio. O estudo de Ward também parte da premissa de que a web não é apenas mais um meio de disseminação de informação e conteúdo. Ele entende o novo meio dentro de um foco mais atual[114], um meio possuidor de peculiaridades que devem ser entendidas e utilizadas como um novo canal para novos conteúdos, e não apenas como um novo canal para os mesmos conteúdos. Ward enfatiza que “a aplicação dos princípios e processos jornalísticos básicos deve orientar todas as etapas de criação e apresentação do conteúdo online, desde a idéia original até a página ou site pronto” (Ward, 20077:6). Em suma, Ward chama a atenção para o fato de o verdadeiro jornalismo online ser aquele feito e pensado para ser veiculado sob a plataforma digital, levando-se em consideração tudo aquilo que refletimos a respeito até o presente momento – as características e peculiaridades do novo meio. Ética Apesar de estarmos falando das mudanças do jornalismo resultantes dos novos suportes digitais, todos os estudiosos chamam a atenção para algo que não mudou e não deve mudar no exercício da prática jornalística: as regras do bom jornalismo. Outro detalhe que não muda, segundo estudiosos como Eugênio Bucci e Caio Túlio Costa, é a ética jornalística. Esses pontos parecem ser os únicos que obtém unanimidade quando se estuda o curso das mudanças que vêm ocorrendo nesta específica habilitação – o surgimento da web – onde nenhuma monocausalidade pode apontar com precisão onde tudo irá parar, ou mesmo se vai parar. A essa unanimidade, faz coro a professora e pesquisadora Beth Saad: “Tudo isso sem deixar de lado os valores intrínsecos do jornalismo que não têm vinculação com sua forma de distribuição, mas sim, com a postura social e ética de quem o faz, independentemente da tecnologia adotada” (Saad, 2003:65). A Internet não muda as regras para o exercício de um jornalismo ético e de qualidade, porém, devido às peculiaridades do meio e às novas formas de interação que proporciona, “há algumas exigências adicionais” (Ward, 2007:57). Essas “exigências adicionais” implicariam num amplo estudo que não cabe aqui, mas que, com certeza, merecem considerações no que tange à prática do jornalismo dentro do ambiente digital. De qualquer forma, há muitos que enxergam as novas exigências surgirem através da mudança de hábitos que acontece em paralelo às novas possibilidades conectivas da grande rede, como expõem, respectivamente, o diretor e o professor do Departamento de Comunicação da PUC/RJ Miguel Pereira e Fernando Ferreira, em artigo que analisam os desafios da ética jornalística na nova era digital: “(...) basta lembrar a extraordinária revolução que a Internet está promovendo tanto na democratização da informação como no seu controle. São poderes em disputa que certamente darão uma nova face aos costumes que vigoram, e, portanto, tendentes à mudança” (em Caldas, 2002:96). Dessa forma, não seriam também as questões éticas relacionadas à Internet, sendo esta uma plataforma mais democrática, o repensar de certos valores éticos que ficavam escondidos sob o manto dos antigos meios não tão democráticos, agora mais expostos devido ao surgimento do novo canal midiático? O despertar de uma mídia mais democrática não expõe o autoritarismo que não tanto transparecia nas demais mídias? Todas as ponderações que fizemos a respeito da crise ética no capítulo anterior ainda pairam no ar, e na rede também – a Internet acelera certos movimentos que já punham a ética em xeque. Existindo qualquer debate ético relativo à mídia tradicional, é claro que ele se estende às novas mídias, e ganha novas dimensões em função da maior amplitude informativa erguida por esses novos meios. São os relativismos das velhas e das novas mídias analisados em profundidade pelo professor Caio Túlio Costa em sua tese de doutorado (2008:320-350). Enfim, a Internet é mais democrática ou os outros meios é que não são democráticos? O canal em si pode ser mais democrático, mas ele não resolve os problemas das democracias (ou ditaduras), como vimos nas análises de Pierre Lévy e Manuel Castells (Capítulo I). Compreende-se que, antes de analisar a ética num ou noutro meio, o novo expõe as cicatrizes dos seus predecessores. Num estudo sobre novos paradigmas de produção, emissão e recepção do discurso do jornalismo frente à chegada da Internet[115], o mestre em Jornalismo Comunitário Pedro Campos (UNESP) se pergunta como ficam alguns valores diante das mudanças que vêm ocorrendo: E quanto à Ética? Num mundo em que os meios têm tanta influência, será que o respeito às minorias, aos direitos inalienáveis do cidadão, à verdade, à transparência, à dignidade humana...são respeitados? Ou ainda achamos que o “furo” vale qualquer sacrifício? Diante do menor baleado na rua, queremos a foto dele ou levá-lo para o hospital mais próximo? O que vale mais: a notícia ou a vida? Será que os jornalistas não estão tão confusos como os próprios consumidores de notícias neste estonteante início de novo milênio? Vemos que entender as questões éticas relativas ao novo meio passa pelo entendimento e o questionamento de valores que perduram através dos meios mais tradicionais. Dessa forma, pode-se dizer que a Internet está também modificando certos valores éticos que antes se tinha como consumados na mesma medida em que traz novas questões para serem avaliadas. 2. A Mídia do “Eu” “You build egos on the size of cathedrals, fiber-optic connect the world with every ego impulse, until every human aspire emperor and become his own God” – Devil’s talking[116] Em praticamente todos tópicos que estudamos relativos às novas características da Internet e da prática jornalística dentro desse novo meio, sempre se destacaram as referências à figura do leitor, do usuário, do internauta, e a importância deste na produção da informação. Hoje, à prática jornalística soma-se esse novo elemento, o internauta como coprodutor da informação. Mas não é só isso, o internauta não é só um elemento que as empresas devem levar em consideração quando planejam distribuir informação via web, ele também é um produtor individual de informação. O internauta ganha relevância produzindo informações por conta própria na Internet e também colaborando junto com outros internautas. Além disso, o internauta apresenta-se como um caminho que também faz ecoar as informações pelo espaço cibernético, as informações também navegam junto do navegador, elas surfam com o surfista. Em sua tese de doutorado, Caio Túlio Costa chama a atenção para o novo usuário produtor de informações: o cidadão conectado e equipado com os novos aparatos digitais que lhe permitem ser um publisher, um criador e disseminador de conteúdos diversos através da Internet. Este, ao lado do jornalista, se apresenta como produtor de informação/conteúdo na web, e atua de duas maneiras básicas: A-) Cidadão-repórter. Conforme a definição dada por Shayne Bowman e Chris Willis num relatório sobre a nova mídia, escrito em 2003, o cidadão-repórter é aquele que “joga um papel ativo no processo de coletar, reportar, analisar e disseminar notícias e informações”. (...) a intenção (...) é de “prover informações independente, confiável, acurada, abrangente e relevante conforme requer a democracia”. Não deve ser confundido com o jornalista profissional (Costa, 2008:341 citando Bowman/Willis, 2003). O cidadão-repórter é aquele que utiliza os novos meios que lhe permitem disseminar informações em prol da cidadania. Ele exerce seu direito de cidadão através de uma atuação que pode ser chamada de jornalística, embora não seja um profissional. Ele é um importante ator capaz de atrair a atenção para assuntos diversos, ou ser um especialista de alguma área que divulga informações específicas que não teriam espaço em outras mídias, pode ser o defensor de uma causa qualquer que não desperdiça os meios digitais para veicular suas idéias. O cidadão-repórter também é conhecido por diversos estudiosos como netizen, junção das palavras internet e citizen[117], trata-se do “cidadão da Internet, a pessoa que participa da Internet. Esse conceito inclui atributos de cidadania, responsabilidade social e participação” (Pinho, 2003:254). B-) Indivíduo-repórter. Trata-se de qualquer pessoa que se aventure na rede com sítio próprio, blog ou mesmo participação em portais e empresas que agregam conteúdos colaborativos na rede, mas que atua sem nenhuma “preocupação social”, ao contrário do cidadão-repórter. (...) Pode aparecer sempre ou de vez em quando. Usa a rede porque ela está à sua disposição (Costa, 2008:341). O indivíduo-repórter é aquele que interage descompromissadamente na Internet, mas que eventualmente pode trazer alguma informação de relevância e chamar a atenção de muitas pessoas. Todos os estudiosos da nova mídia são unânimes em afirmar que, neste novo ambiente, um simples e-mail pode criar um grande movimento na web, mover uma causa, ser o estopim de uma revolução, uma bola de neve que vai crescendo e navegando pelas caixas-postais digitais mundo afora, propagandeando informações diversas. O indivíduo-repórter é aquele que, eventualmente, pode disparar esse e-mail. De qualquer modo, é um indivíduo que, num certo grau, utiliza-se e interage com sites informativos, sempre em busca daqueles que lhe permitam usufruir ao máximo da interatividade que demanda. O indivíduo-repórter é aquele que faz da Internet a sua mídia, de forma que a sua individualidade se reflete no seu agir cibernético e, vez ou outra, o seu agir pode contaminar outros usuários, ou mesmo, refletir um contágio que recebeu. A personalidade desse indivíduo é algo que buscamos analisar nos parágrafos a seguir, quando refletiremos sobre o indivíduo “eu-cêntrico”. E o blogueiro? Tecnicamente, o blogueiro nada mais é do que o indivíduo que utiliza um blog, que mantém um diário virtual na Internet – que sequer precisa ser atualizado diariamente. Hoje, qualquer um pode criar gratuitamente um blog e compartilhar todo tipo de conteúdo midiático, inclusive o cidadão-repórter, o netizen. Quando apontamos o blogueiro como um novo jornalista, trata-se na verdade, do netizen, que pode ser ou não um jornalista, e pode ou não utilizar um blog, o blog é só uma ferramenta, existem outras. Hoje existem blogs tão notórios, com tal dimensão informativa, que tornam-se pequenos portais. Antes de mais nada, o blog é apenas uma página web com conteúdo multimidiático, e pode ser utilizada tanto para compartilhar poucos posts, como se abrir para um gigantesco receptáculo de informações, tanto de outros blogs quanto de portais informativos, além da produção interativa do dono do blog (ou donos). Dentre os blogueiros netizen, às vezes, figura o próprio jornalista. Mas há de se considerar uma diferença entre aquele jornalista que tem um blog, daquele jornalista que é blogueiro. Quem faz essa distinção é a jornalista e blogueira Lucia Freitas[118]. Primeiro ela define quem é o blogueiro: “ele é um cara antenado, que está a par dos sistemas de métricas digitais, que está familiarizado com o Alexia, que está no Technorati, no BlogBlogs, no Analitics[119], sempre buscando um destaque, buscando atingir determinadas metas. Ele tem um domínio de software, de como usar a Internet que nenhum jornalista tradicional tem”. Em outras palavras, além de ser um cidadão que dissemina informações utilizando-se das novas mídias digitais, o blogueiro tem uma postura muito parecida com a dos hackers que criaram o weblog: é alguém que usa e entende a tecnologia como um caminho inerente à própria evolução humana, que tem ligação com os ideais que nortearam a criação da Internet, onde a construção do conhecimento é colaborativa, e a rede é o canal que permite essa colaboração e compartilhamento. É dessa característica que emerge a própria unidade dos blogs, a blogosfera, que, segundo Freitas, “é a roda dos blogs, a roda digital, qualquer blog faz parte da blogosfera. Não existe um caráter único de temas ou estilos, não existe uma blogosfera disso e uma blogosfera daquilo, ela é uma coisa só. É a esfera dos blogs ou o conjunto dos blogs. Já o blog nada mais é que uma ferramenta de comunicação”. Em uma analogia ao exemplo de Mike Ward em relação ao webjornalismo com a definição de Freitas mencionada acima, também poderíamos afirmar que a blogosfera é uma grande “igreja liberal”, que aceita de tudo, mais liberal que os próprios portais noticiosos e webjornais inclusive, pois é tão plural quanto a massa de internautas hoje incluídos na mídia através da Internet. O blogueiro, na acepção da palavra, é mais do que o netizen, é também um hacker, ou um nerd tecnológico, como muitos dizem. Exatamente por isso, muitos jornalistas que possuem blogs não podem ser considerados blogueiros, pois não possuem essa relação com a tecnologia típica do blogueiro. Freitas expõe que “tem jornalista que vai pro blog, mas mantém a mesma postura que tinha na redação, mantendo-se isolado” e, como vimos, um blog é mais que uma ferramenta de publicação, é uma nova maneira de relacionar-se partilhando informações, que só ganha relevância com interatividade, com feedback. O blog só ganha força através do conjunto, da blogosfera, sozinho não representa nada além de uma página web. Esse é o grande diferencial, “aliás, essa é uma característica dos blogueiros, a capacidade de compartilhar conhecimentos, todos se ajudam”, diz Freitas. Todos talvez seja exagero, mas sempre existe alguém disposto a compartilhar. Nesse universo margeado pelo jornalista que possui blog, mas não interage, e o jornalista que mantém um blog e é um nerd tecnológico, existe uma série de jornalistas-blogueiros que atuam em diferentes graus de interatividade, tanto com leitores quanto com outros blogueiros. Nota-se que esse universo é aberto, de forma que, cada vez mais, jovens jornalistas, mais familiarizados com o mundo high-tech, encontrarão nele um espaço para desempenhar sua profissão. Dessa forma, mesmo que muitos vejam o blog como uma inovação que não pertence ao jornalismo, cada vez mais teremos jornalistas que atuarão dessa maneira. O conceito de mídia do “eu” é debatido pelo professor Rosental Calmon Alves. Seus estudos remetem ao fim dos impressos e da forma atual de se fazer jornalismo. Na Internet, teríamos um jornalismo mais voltado para o indivíduo e mais democrático, conforme citado pelo próprio autor em palestra em Londres, e comentado em artigo intitulado Como se preparar para a mídia do ‘eu’[120], do doutor em Ciências da Comunicação Cláudio Tognolli (ECA/USP): Estamos entrando numa era de mídias “eu-cêntricas” (I-centric): o que importa é que tragam o conteúdo que eu quero, quando eu quero, no formato que eu quero, mas apenas quando eu o quiser (...). Em “Abandoning the news”, da Carnegie Corporation, divulgado no primeiro semestre deste ano, Rosental mostrou que 39% dos jovens americanos entre 18 e 34 anos vêem a Internet como a fonte de informações mais importante, seguida de notícias locais de TV (14%), das notícias de TV a cabo (10%), vindo em seguida os jornais (8%) (...). Enquanto o jornalismo tal como o conhecemos está morrendo, novas formas de jornalismo estão sendo construídas. Nos próximos anos essas versões vão se erigir na Internet, nos celulares, nos aparelhos de MP3, na TV interativa, nas novas plataformas a serem lançadas”, vaticinou Rosental. “O leitor quer editar, não quer apenas ser editado por alguém”. Mike Ward é outro estudioso que aponta para essa característica “eu-cêntrica” da Internet. Referindo-se ao internauta que navega em busca de informações, ele coloca que “cada vez mais, há também uma atitude indefensável – ‘Eu sei o quero e quero agora’ no mercado da notícia” (Ward, 2007:28). Uma atitude que remete a essa característica intrínseca do novo meio, a sua relação mais individualizada, mais íntima do usuário para com o meio. Tal postura do usuário também reflete as características fisiológicas da grande rede que já analisamos – uma mídia on demand, e essa demanda nada mais é que a imposição do usuário sobre a mídia. Na mesma trilha segue o editor de blogs da BBC de Londres[121], Giles Wilson. Ele afirma que “o jornalismo mudou, está virando uma conversação. Não é mais uma via de mão única”, dessa forma, Wilson acredita que o blog é um instrumento que serve para o jornalista “conversar” com seu leitor. Tal conversa inclui a participação do publico na notícia, e deve ser explorada não só pelos blogs independentes, mas também por grandes veículos, de modo que se possa criar “uma verdadeira interação entre o público e a redação”. Wilson destaca que, além do blog, a BBC objetiva explorar mais os recursos de microblogging, hoje, já há um consenso no meio jornalístico de que a empresa informativa não deve focar a sua energia na centralização da informação, mas sim de explorar os meios de disseminá-las através de diversas plataformas, do blog ao microblogging, as redes sociais e outras formas de interação disponíveis que surgem incessantemente pela web. Wilson enfatiza que a centralização não funciona mais diante das novas gerações que não se preocupam em correr atrás da notícia, “eles acham que, se os acontecimentos forem importantes, chegarão até eles de qualquer jeito na Internet, principalmente por indicação dos amigos”, diz o inglês. Nos estudos que destacamos no tópico anterior, evidenciou-se o importante papel do internauta na construção e veiculação da notícia no ciberespaço. As afirmações acima são mais contundentes, elas remetem à dúvida que colocamos anteriormente, cuja resposta coloca a Internet não como uma mídia onde se deve entender melhor o receptor, a fim de conquistá-lo, de chamar a sua atenção. As afirmações acima remetem ao fato de a Internet ser a mídia do usuário; assim, são as instituições que são coprodutoras da informação, pois o verdadeiro produtor é o internauta. Será? Este entendimento é possível quando interpretamos uma afirmação de Ward que expõe a quebra da hierarquia relativa à produção e veiculação da notícia: “Não há lugar para uma falsa hierarquia entre notícias e informações imposta pelo jornalista, quando é o usuário quem define o que é notícia para ele” (Ward, 2007:41). Na Internet, a informação seria, dessa forma, pautada pelo usuário e não mais pelo editor. Este produz em função das regras dos internautas, portanto seria um coprodutor deste e não o contrário. A reflexão sobre o que é essa nova expressão do sujeito dentro da mídia, ou melhor, dentro da Internet, pois esta possui uma série de características que colocam o internauta dentro do palco midiático, extrapola a simples análise relativa ao meio e abraça campos da Sociologia e da Psicologia, entre outros. Caio Túlio Costa aborda essa questão em sua tese de doutorado: é o individualismo que impera dentro da atual sociedade capitalista, que ele expõe através de um conceito com o qual esbarramos ao longo deste trabalho, a “Modernidade Líquida”: Pois quem talvez melhor explicou a desagregação do espaço público e desenhou a pós-modernidade, não no sentido de aceitá-la nem de negá-la, mas de criticá-la para desbravar caminhos alternativos, foi exatamente o polonês Zygmunt Bauman. Integralmente ligado à questão ética, exatamente porque a pós-modernidade se funda no individualismo, o resumo que se segue de uma obra capital de Bauman, Modernidade Líquida, é feito como uma espécie de vacina para iluminar o espaço no qual se insere o trabalho do comunicador. Não importa qual comunicador. Pode ser um comunicador tradicional formado nas inúmeras escolas de comunicação, pode ser um comunicador formado nas escolas tradicionais de ensino humanista ou técnico, pode ser um comunicador formado na escola do mundo, pode ser uma fonte qualquer ou seu preposto, pode ser um cidadão-repórter ou mesmo um indivíduo-repórter (aquele para o qual o culto a si mesmo se sobrepõe à noção de cidadania) e cujo poder de comunicação lhe foi dado pelas novas mídias porque ele é parte da dispersão que alimenta a mídia e ajuda na sua ubiqüidade (Costa, 2008:279). A cultura atual seria fundada no individualismo, e a expressão desse individualismo na nova mídia seria a centralidade do indivíduo em si mesmo, daí estarmos numa nova era de mídias eu-cêntricas. Na Internet, o indivíduo se torna a centro de si mesmo, onde a sua demanda é irrefutável. Essas duas características que se somam, o individualismo com pessoalidade do novo meio, mostram o seu potencial diante do establishment, pois a Internet é a mídia que possui as portas abertas para o indivíduo reivindicar o seu espaço dentro dela, ou exigir o que ele quer dela, muito além do que ela lhe oferece. Apesar da Internet ser uma mídia que reflete essa característica do mundo pós-moderno, a Modernidade Líquida, ela também pode refletir outras características muito diferentes, sendo que uma delas seria o seu sentido imediatamente oposto. Se o eu-centrismo da mídia reflete o individualismo que impera no mundo atual, a mídia universalizada através da Internet também reflete o sentido de coletividade (não seria a peer production um reflexo dessa nova coletividade digital?). Um estudo do mestre em Comunicação na Contemporaneidade, professor Luis Fernando Câmara Vitral, no qual ele analisa o nascimento, a vida e a morte do suplemento Seu Bairro publicado pelo jornal O Estado de S. Paulo, no qual trabalhou em todo seu período de existência. Ele destaca que um dos grandes pontos fortes da publicação estava nas narrativas que se afastavam das grandes coberturas típicas de um grande veículo como o Estadão, e voltavam-se para reportagens de cunho humanitário e com aspectos de solidariedade, cooperação e respeito social, que refletem o sentido de coletividade através das expressões peculiares de diversos bairros da cidade de São Paulo: “existe um espaço vivo dentro da sociedade onde pode-se observar a cidade pelo seu sentido mais humano”, diz Vitral. Seu estudo mostra que, ao menos em São Paulo, pode-se observar as pessoas além de sua individualidade, de modo que o conceito da Modernidade Líquida não pode ser entendido como uma lógica generalizada, mesmo que seja majoritária. E, se, após oito anos de publicação, o suplemento Seu Bairro perdeu o seu espaço dentro do Estadão e deixou de ser veiculado, a Internet é um canal aberto a uma série de iniciativas e diversas formas de narrativas, inclusive, valendo-se da commons-based peer production, que refletem esses conceitos destacados por Vitral, podem, inclusive, suprir essa carência narrativa que é pouco interessante para um grande veículo acostumado a grandes repercussões. No jornalismo, existe uma série de novas iniciativas baseadas na plataforma digital que refletem isso, tais como jornalismo participativo, open source e também os blogs, que possuem múltiplas formas de narrativa e interação. Outra relação do conceito da Modernidade Líquida com a contemporaneidade está no próprio esfacelamento da esfera pública, o indivíduo voltado a si mesmo esquece-se do seu papel dentro da coletividade, dessa forma, abdica de sua participação na definição dos rumos da humanidade, na vida política da sociedade[122], onde, no intermédio entre sujeito e a sociedade está a mídia que, também, volta-se para questões mais ligadas à vida privada, inclusive, como grande vetora desse individualismo. Como analisamos, a Internet tem características abertas e inclusivas que podem, técnica e potencialmente, resgatar a esfera pública, mas para que isso aconteça, ou se isto vier a acontecer, pois este é ainda um ambiente que está sendo construído, esse resgate passa por um movimento que vai de encontro e choca-se diretamente contra o conceito da Modernidade Líquida, de forma que, poderíamos dizer, para voltarmos a ter uma esfera pública atuante dentro da sociedade, é preciso que a modernidade se solidifique. Podemos dizer que essas duas idéias, o resgate da esfera pública e a “Modernidade Sólida”, estão diretamente relacionadas, como uma sendo a medida e a expressão da outra. Com isso, entende-se que não basta só a Internet, como aparato tecnológico e meio multimidiático, para que esse cenário da esfera pública se altere, é preciso o engajamento dentro de um amplo movimento social[123]. Vemos que a Internet demonstra várias características e lógicas antagônicas, lógico, toda característica que ela toca, nos parece, carrega outra que lhe é imediatamente oposta; tecnologicamente, como o próprio bit, composto de dois estados opostos e, filosoficamente, como Yin e Yang. A própria modernidade é expressa através dessa forma dual, mesmo que o equilíbrio que se busca através da filosofia de Yin e Yang ainda seja algo totalmente utópico. Assim, apesar de líquida, podemos dizer que ela possui partes sólidas (e talvez outras que sejam vapor ou estejam se vaporizando). Se a mídia que reflete a Modernidade Líquida, reflete a esfera privada e, nos meios digitais, reflete o eu-centrismo, da mesma forma, os grandes veículos passam a refletir tal característica. Calmon Alves também analisa a questão da centralidade no indivíduo como um fator que poderia ser entendido como contagioso, como uma onda cibernética que acabará por levar as empresas jornalísticas a tornarem-se “webcêntricas”, canalizando suas produções para a Internet, onde estarão lado a lado com o leitor. Para Calmon Alves, a atuação dos blogs ao lado dos jornais é o grande exemplo dessa tendência. Ele mesmo evidencia como isto ocorre: (...) a proliferação dos blogs abriu o caminho para a criação de milhões de sítios que contém links para notícias e comentários sobre os mais variados temas. Os blogs se espalham em uma forma viral, criando comunidades e audiências até mesmo em ambientes fora do alcance dos meios de comunicação de massa, onde é difícil imaginar como uma pessoa poderia arregimentar tantas outras (Alves, 2006:100). Parafraseando um colega (Dan Gillmor), Calmon Alves diz que “o jornalismo costumava ser uma leitura, agora é uma conversação”, que é muito comum nos blogs, enraizados no feedback, mas nem tanto em grandes portais informativos e jornais online. Pollyana Ferrari[124] lembra que essa conversação não é uma exclusividade dos blogs, ela pode ser vista também nas revistas online e diversos canais de jornalismo que são encontrados em várias comunidades, como o Orkut e no site Youtube, por exemplo. É claro que a Internet também se abre para o individualismo do jornalista, hoje vemos diversos sites ou blogs de grandes jornalistas que, além dos espaços em outros veículos, se colocam em contato com o internauta, explorando a interatividade do novo meio. Dentre os indivíduos que partilham do poder informativo que mencionamos até aqui, o jornalista, o cidadão-repórter (ou netizen), o indivíduo-repórter, o nerd tecnológico, o eu-cêntrico, existe aquele que é a mistura de tudo isso. Quanto o internauta se coloca como um canal midiático, um vetor que faz circular a informação segundo sua própria demanda junto aos demais internautas, ele tem a capacidade de atrair parte do fluxo informativo que flui na grande rede. Basta imaginar que a multidão de navegantes é muito maior que o número de instituições para enxergar o potencial informativo que os indivíduos agora dispõem. É de se imaginar que o centro dessa mídia se desloque em sua direção. Não sabemos, ainda, se o internauta é o centro de sua mídia, mas vários pesquisadores são unânimes ao afirmar que a Internet não possui um centro, como a doutora em Comunicação e Semiótica Lúcia Leão (PUC-SP): “Pode-se dizer que, na Internet, o centro está em toda parte e em lugar nenhum, o que nos leva à definição de um sistema acentrado” (Leão, 2001:71). Ou mesmo o mestre em Comunicação e Semiótica Wilson Roberto Bekesas (PUC-SP), em dissertação que discorre sobre as novas interfaces da notícia através da web, onde afirma: “Lembremos que uma das características presentes no mundo digital diz respeito justamente a ausência de centros” (Bekesas, 2006:83). Calmon Alves também vê, nas características eu-cêntricas da web, esse deslocamento, o que representaria a reestruturação completa do que até hoje entendemos por mídia: “Neste início da segunda década do jornalismo digital, estamos percebendo com mais claridade essa extraordinária transferência de controle do emissor para o receptor” (Alves, 2006:96). Resta saber até que ponto as massas são capazes de produzir para as próprias massas, mas, cremos que, dentro dessa dispersão toda, sempre será necessário o trabalho apurativo do jornalista. Afinal, todo o know-how que este possui em trabalhar informações não se perde no ciberespaço, pelo contrário, ele ganha muita importância, e tal conhecimento, sem dúvida, lhe dá até uma certa vantagem em relação a muitos. Talvez essa seja a grande mudança imposta pela mídia eu-cêntrica, pois o jornalista e as instituições perdem a centralidade inerente do meio, e inserem-se no novo, onde, até um certo nível, estão em pé de igualdade com o indivíduo. Sendo a própria sociedade centrada no indivíduo, este se impõe no novo meio. Se a sociedade moderna é líquida devido a sua incapacidade de manter sua forma, as peculiaridades da Internet e seu fluxo não centralizado de informações, criam uma mídia que, igualmente, é incapaz de manter uma forma. O que é ruim para as instituições, afinal elas não podem mudar tão rapidamente quanto os indivíduos. Enquanto as instituições têm que estar sempre inovando para sobreviver no novo meio, o que lhes demanda um grande esforço, neste ponto o indivíduo é soberano, suas ações é que representam a inovação. Aqui poderíamos evocar as colocações de Pierre Lévy sobre o processo de virtualização/atualização que analisamos no início deste estudo, entendendo que a capacidade de virtualizar do usuário é muito mais rápida e dinâmica do que a das empresas. Este também é o entedimento de Lucia Freitas, alguém que já atuou como jornalista em grandes veículos (Estadão, Abril) e hoje atua como blogueira: “O problema é que essas grandes corporações de mídia, que lidam com dez ou vinte mil funcionários, têm dificuldades em se adaptar num cenário que muda constantemente. Quem lida com um blog não tem esse problema, você muda de um dia para o outro”. O blog, como um espaço que atende jornalisticamente ao indivíduo, ilustra bem a diferença do poder de adaptação do usuário em relação às empresas dentro do terreno cibernético. A análise da mídia eu-cêntrica é, em última instância, esse reflexo do individualismo através da grande rede, que também esbarra nas teorias de Jean Baudrillard que mencionamos no capítulo anterior. A expressão midiática de cada indivíduo na mídia representaria o fim do significado, pois, estando ausentes de instâncias mediadoras, o significado só teria sentido para o emissor. Ao contrário, talvez essa dispersão toda reforce a necessidade do papel do jornalista, filtrando e selecionando aquilo que é de importância para diversos públicos, como sempre se espera deste profissional. São duas características antagônicas da Internet debatidas por Yochai Benkler, que analisa os aspectos positivos e negativos, tanto da centralidade típica dos veículos de mass media que também se reproduz na web, como da dispersão do diálogo, o que ele chama de “Torre de Babel”, questões que analisaremos com mais profundidade adiante neste capítulo. Essa dispersão do diálogo pode ser relacionada com o eu-centrismo, pois temos a inclusão de uma infinidade de novos atores impondo diversos pontos de vista dentro do novo palco digital da mídia. Do indivíduo ao jornalista, todos, ou muitos, participam da mídia individualmente, ainda que seja de forma colaborativa, em rede. Em uma análise mais objetiva, a mídia do “eu” está ligada ao que vimos no tópico anterior sobre as características da Internet, a não-lineariedade, dirigibilidade e pessoalidade do meio. Calmon Alves diz que “isso abre caminho para uma comunicação que poderíamos chamar de eu-cêntrica, pois está baseada nas decisões individuais do receptor, diante do enorme leque de opções que a Internet lhe abre” (Alves, 2006:97). O que entende-se agora é que essas características são estabelecidas pelo emissor, num peso maior do que talvez se possa mensurar. Essa mudança faz com que as empresas jornalísticas tenham de se reestruturar completamente diz Calmon Alves: Ao transferir-se para a Internet, o velho jornalismo-produto se transforma num jornalismo-serviço, um fluxo contínuo de informação que se acumula, indexada, no sítio web, colocando-se à disposição dos usuários que queiram consumi-la. Esse processo significa a desconstrução dos produtos jornalísticos que foram criados ou tiveram o seu auge no século XX (Alves, 2006:97). O jornalismo-serviço pode ser visto na forma que, tanto jornais quanto qualquer grande veículo de mídia, adquiriram desde a sua inserção na Internet: grandes portais de informação e serviço. A cada vez mais ampla necessidade de conteúdo desses portais demonstra o esforço maior para atrair a atenção do usuário, totalmente dispersa no ciberespaço. 3. Os Blogs como Novo Meio de Expressão Jornalística “Don’t get too cocky, no matters how good job you’ve done. Keep your self small, innocuous: be a little guy, the nerd, the leper, cheap chicken surfer” – Devil’s talking[125] Segundo o professor Rosental Calmon Alves, o blog é a mais nova modalidade de jornalismo online, embora ainda existam muitos jornalistas e acadêmicos que relutem em aceitar essa idéia. Calmon Alves revela o porquê dessa relutância e expõe a sua análise sobre a questão: Os jornalistas inicialmente viam com desdém os blogs, mas foram aos poucos entendendo que se tratava de um fenômeno importante, estreitamente ligado às transformações impostas pelo jornalismo digital. Jornalistas e empresas jornalísticas precisam entender que o blog é apenas um instrumento. Com essa ferramenta nasceu, de baixo para cima, a partir dos cidadãos comuns, uma nova linguagem, uma formatação narrativa que pode muito bem servir para o jornalismo. Assim, em vez de ficarem empacados na inútil discussão para determinar se blog é ou não é jornalismo, muitos jornalistas e jornais adotaram seus próprios blogs, levando para eles os mesmos valores que aplicam nas formas tradicionais de jornalismo. Uma das vantagens que encontraram neste novo formato foi o diálogo com os leitores (Alves, 2006:100). Se entendermos as iniciativas que surgem do lado do internauta, como os blogs, e que ganham relevância para o jornalismo, vemos que as inovações dessa habilitação estão surgindo de fora das instituições, portanto não são inovações do jornalismo, e sim dos internautas (e/ou empresas de tecnologia). Sendo ou não inovações do jornalismo, sem dúvida, o blog e outras ferramentas são inovações para o jornalismo – assim como a invenção da prensa gráfica possibilitou novas práticas para o incipiente jornalismo em sua época. “Os blogs e todos esses sistemas novos podem parecer frágeis, pouco confiáveis e pouco sérios. Mas eles são uma demonstração de criatividade e inovação que está acontecendo fora do âmbito do jornalismo tradicional” (Alves, 2007:101). Para Calmon Alves, a lição dos blogs tem que ser entendida como a prática de um jornalismo mais comunitário, mais participativo, e cita vários exemplos de sites e comunidades informativas[126] que estão inovando dentro deste conceito. E mais, estão ganhando uma relevância cada vez maior dentro da opinião pública. Essa nova prática estaria ligada ao conceito de “virtual settlement” [127], que, de acordo com a mestra em Comunicação e Novas Tecnologias Juliana Lúcia Escobar (UERJ): É entendido como um lugar simbólico situado no ciberespaço que teria a função de territorialidade necessária para a constituição de laços comunitários entre os indivíduos. É um delimitador de fronteiras simbólicas e não concretas. Funciona como o suporte para a verdadeira comunidade virtual e é imprescindível para que esta se forme. No entanto, a mera existência de um virtual settlement não garante o estabelecimento de uma comunidade virtual. Uma sala de bate-papo, por exemplo, é um virtual settlement mas somente dará origem a uma verdadeira comunidade virtual se as pessoas de fato utilizarem este lugar no ciberespaço para a criação e manutenção de laços e relações sociais. Comunidades virtuais surgem a partir dos usos que as pessoas fazem de um determinado virtual settlement (Escobar, 2007:11 citando Quentin Jones). Dessa forma, a Internet – ambiente altamente conectivo – facilita esse tipo engajamento comunitário onde poderíamos encaixar o fenômeno dos blogs. O blog é a ferramenta comum dos indivíduos; a blogosfera, é a comunidade dos blogs, composta de laços simbólicos cujas conexões vão além das simples ferramentas disponíveis que facilitam a interatividade/conectividade. Existem laços que vão sendo construídos pelos indivíduos, incluindo o jornalista, que dão um novo fluxo para a informação dentro do ciberespaço, seja qual for a natureza dessas informações. Nesse sentido, poderíamos afirmar que o jornalismo na web – palco do indivíduo – se relaciona com este através de um tipo de virtual settlement expresso pelo surgimento da blogosfera (entre outras formas de agrupamento virtual). Entendemos que essa comunidade, a blogosfera, é um espaço virtual altamente interconectado que também conecta diversos outros virtual settlements, ela não tem um ponto de encontro, uma única URL (ou poucas), ela representa os laços que vão se formando entre diversas comunidades, instituições e indivíduos, entre blogs, blogrolls e diversas formas interconectivas. Esses laços, que compõem o fluxo informativo dos blogs, é algo que se apresenta de forma pouco compreensível, de difícil mensura. Dentro daquela idéia da igreja liberal, poderíamos dizer que o fluxo dos blogs e blogrolls seguem a pregação que diz que “Deus escreve certo por linhas tortas”, onde podemos entender que eles nunca apontam para os mesmos caminhos, caminhos esses que, além de divinamente liberais, também podem levar aos mais traiçoeiros precipícios como na mitológica descrição do Inferno de Dante Alighieri. Quem entende o blog como a melhor solução, até então surgida, para a prática do jornalismo online é a professora e mestra em Jornalismo Mariana Della Dea Tavernari (USP), que afirma: “A remediação do conteúdo jornalístico só atinge sua potencialidade ótima com o surgimento dos diários virtuais, que favorece a troca de informações de modo bilateral e interativo” (Tavernari, 2007:5). Embora aponte o blog como a melhor remediação para o tratamento de conteúdo jornalístico dentro da interatividade da web, ela não o enxerga como a cura, pois a grande massa de conteúdo jornalístico que circula nessa esfera “é proveniente de sites, agências de notícias e portais. Por outro lado, muitos jornais sofrem influência das características dos diários virtuais jornalísticos, que se tornam uma rica fonte de pautas para os jornalistas” (Tavernari, 2007:5). Dessa forma, a blogosfera pode ser vista como uma nova esfera por onde se distribui o jornalismo, que faz ecoar uma série de informações por suas associações, mas que não concorre com os grandes portais e jornais online na produção de informações (ou conteúdo), além de servi-lo com pautas e fontes. Mas é claro que a informação que corre nesta esfera sofre modificações que são inerentes às características hipermidiáticas desse novo espaço virtual. Tavernari discorre sobre algumas das características da informação que perpassa por essa nova esfera comunicativa. Ela diz que “um dos principais elementos da mídia tradicional que não se mantiveram nos diários virtuais é a figura do gatekeeper (...). Durante anos, o gatekeeper tem sido uma das figuras mais poderosas dos meios de comunicação, delineando tendências e controlando o fluxo de informação” (Tavernari, 2007:8). Uma das características do blog é a sua pessoalidade, a sua relação direta com o publisher, este não está hierarquicamente abaixo de ninguém, de forma que pode publicar, linkar e comentar aquilo que quer, ou não quer. Mas como um blogueiro também não pode falar de tudo, nem ser um índice para tudo, ele acaba sendo o seu próprio gatekeeper, escolhendo os assuntos que aborda em seu blog, estabelecendo conexões com um ou com outro, automediando suas relações. Com a Internet e seus mecanismos, como o blog, as barreiras à informação se dissolvem; assim, os gatekeepers se afastam das instituições e convergem para o indivíduo; este seleciona as informações e os serviços que quer, e as conexões que deseja estabelecer. Tavernari afirma que as funções do gatekeeper são as funções do blogueiro: “A etapa de filtragem de informações e captações e a figura do gatekeeper, especializado na função, inexistem no diário virtual, pois estas tarefas são exercidas diretamente pelo seu autor” (Tavernari, 2007:9). Muitas das funções do jornalismo são, assim, funções do indivíduo dentro da nova mídia. O interessante desse processo desempenhado pelo blogueiro é o novo trato que ele adiciona à informação, fazendo-a fluir pelo espaço cibernético com um proveito mais atrelado às características do novo meio. Tavernari aponta que “o diário virtual é uma das maneiras para diferenciar-se da reprodução não criativa da mídia impressa e aproveitar o máximo que a interconexão geral possibilita aos internautas e uma forma de impedir a dominação do fluxo de informação que controla a opinião pública” (Tavernari, 2007:9). Ou seja, as características do blog são mais eficazes para a dispersão de informação dentro do meio digital, pois são fomentadoras das características dialogais do meio, além de se colocarem como um novo canal não centralizado, que escapa ao controle do establishment, mais uma vez remetendo à relevância que isso ganha dentro da formação da opinião pública. Apesar de todas essas colocações, Tavernari volta para a discussão se essa nova forma de comunicação, o blog, poderia, de fato, ser considerado uma nova forma de jornalismo. Ela aponta alguns estudos e discorre, se, o cidadão-repórter, que entende como “jornalista-cidadão”[128], embora exerça algumas das mesmas funções de um jornalista diplomado, possa ser considerado um. Ela aponta um estudo de Rebecca Blood[129], que expõe: “Os diários virtuais não são, como dizem alguns, um novo tipo de jornalismo. Mais propriamente, eles suplementam o jornalismo tradicional com avaliações, comentários e, acima de tudo, filtragem da informação produzida mecanicamente pela imprensa” (Tavernari, 2007:12 citando Blood, 2002:23). Como já mencionamos, o blog estaria à margem da produção jornalística, consistindo-se apenas num meio de sugá-la e complementá-la[130]. O problema é que ao complementar e comentar as informações, o blog não leva em conta as regras do bom jornalismo, pelo simples fato de não ser praticado, pelo menos na grande maioria, por jornalistas. O problema então seria que: (...) o chamado jornalista-cidadão conta a sua versão dos fatos, de modo subjetivo, sem se ater aos princípios de objetividade pelos quais clamam os jornalistas. Não se compromete com a imparcialidade tida como necessária à ética jornalística (...) este novo jornalismo é visto como um jornalismo opinativo e parcial (Tavernari, 2007:13). Já mencionamos no decorrer deste estudo que o blog estaria dando uma nova força para o jornalismo opinativo. Basta se refletir sobre a pessoalidade do novo meio e a relação direta do blogueiro com a mídia, para evidenciar que um fato está diretamente ligado ao outro. Uma informação que navega pela esfera cibernética ganha a autoria de todos que porventura a encontrem, de forma que vai apresentar essas características descritas: subjetividade, parcialidade e também a falta de objetividade. A ausência desses princípios é que faz a esfera do blog ganhar uma nova relevância dentro da opinião pública, pois é um canal aberto a tudo e a todos. Nesse sentido, a Internet e a própria blogosfera se apresentam como um novo e múltiplo meio capaz de exercer sobre a própria mídia o mesmo papel que a mídia desempenha em relação à sociedade: vigília. Um exemplo claro dessa nova característica democratizante da mídia pode ser vista através da atuação do jornalista Luis Nassif. Demitido da revista Veja, montou seu blog na Internet e entrou numa “guerra” contra a revista passando a denunciar os abusos da mesma. Somente em uma rede de plataforma aberta e inclusiva como a Internet, Nassif poderia encontrar espaço para as denúncias que passou a fazer[131]. Vale lembrar que alguns estudiosos questionam a imparcialidade e a objetividade jornalística típica dos mass media. Nesse sentido, a Internet estaria suprindo essa carência da mídia como um todo e, mais uma vez, modificando as estruturas da esfera pública através de um canal aberto a todas as formas de diálogo: do jornalismo balizado em princípios éticos ao discurso radicalizado – espaço para o bom e o mau escritor, do Vossa Excelência, passando pelo você, tu e chegando ao vc e ao u –, incluindo novas formas que precisarão ser estudadas e entendidas (como a próprio fluxo comunicacional dos blogs). O jornalismo opinativo é uma das expressões dos blogs na atualidade, tanto que muitos jornais online transformaram os espaços de seus colunistas em blogs, embora em muitos a única mudança tenha sido apenas no nome do espaço. Tavernari lembra que hoje “jornalistas são contratados por grandes conglomerados jornalísticos para publicar conteúdo em diários virtuais próprios” (Tavernari, 2007:10). Também hoje, instituições e empresas diversas contratam jornalistas/blogueiros para montar e gerenciar blogs oficiais. Muitos blogueiros são patrocinados por portais e jornais online, e um grande número de jornalistas de renome têm site próprio e/ou blog. Devido às características do diálogo dentro desse espaço ser mais pessoal e interativa, vemos que não é só a blogosfera que se abre para a prática de um jornalismo mais opinativo; jornais, portais e instituições diversas também o fazem. Embora a prática do jornalismo opinativo seja comum nos blogs, Tavernari não vê essa modalidade narrativa como a expressão maior dessa esfera, que seria, na verdade, um “elemento introdutor de uma nova narrativa, pessoal e próxima do jornalismo literário” (Tavernari, 2007:14). Independentemente do gênero predominante – ou da ausência de gênero(s) –, a característica maior do blog é a pessoalidade do espaço, talvez o melhor para se comunicar jornalisticamente na web, daí o seu uso cada vez mais crescente, tanto por indivíduos, quanto por jornalistas e instituições. Para o jornalismo na web, “o weblog é a mensagem”. Enquanto alguns enxergam os novos tipos de narrativa que aparecem nos blogs como uma afronta às regras do bom jornalismo, onde o pilar sustentador seria a objetividade e a imparcialidade, um estudo dissertativo da mestra em Comunicação Diana Barbosa (Univ. Federal de Pernambuco) analisa a questão sob um outro foco. Ela entende que as narrativas do blog, embora sejam carregadas pela intervenção do blogueiro na manipulação das informações, atendem uma lacuna deixada pela grande mídia. Na verdade, a narrativa pessoal dos blogs está mais próxima da realidade cotidiana dos internautas do que a da grande mídia, cujo foco está no espetáculo. Apoiando-se num estudo de Muniz Sodré[132], ela questiona que “talvez se deva refletir que não é apenas o blog que se aproxima do jornalismo, mas o jornalismo que adere cada vez mais ao formato que tende para o show, perdendo seu status de interseção entre o fato e a informação ‘pura’” (Barbosa, 2005:45). Dessa forma, a linguagem do blog relaciona-se com o próprio fenômeno de sua popularização, mas não no preenchimento de uma lacuna deixada pelo estilo de narrativa jornalística, mas sim pela visão que se obtém através da narrativa do mundo que perpassa pela mídia. No blog, essa narrativa não estaria tão afastada da realidade quanto nos tradicionais veículos dos mass media – em muitos casos, o indivíduo se projeta na mídia por não se enxergar dentro dos clichês que ela veicula, assim ele adiciona os seus próprios, ou, ao contrário, ao deparar-se com o fantasioso mundo do mass media, o usuário, despido de táticas lingüísticas, marketeiras e persuasivas, descreve a realidade através de uma percepção muito mais fiel ao que ela é[133]. Levando em conta essa análise, Barbosa conclui que “apesar dos textos dos blogs (...) optarem por um padrão mais opinativo (...), essas características de sua escrita não os distanciaram, por si só, da produção jornalística” (Barbosa, 2005:42). Já o estudo do professor Artur Vasconcellos Araujo entra nesse mérito expondo que o “discurso da imprensa se afasta da marca do sujeito, e o autor que acrescenta a sua meta-narrativa legitima o discurso jornalístico. O blog faz mesmo que o jornalismo, mas volta-se para as narrativas e os fatos íntimos dos sujeitos” (Araujo, 2006:73). E, depois de uma longa análise do discurso tendo como objeto dois notórios blogs brasileiros[134], ele conclui que “o discurso dos blogs analisados os validam como ferramenta jornalística” (Araujo, 2006:225). Não é a questão do discurso ou do gênero narrativo que inviabiliza a prática de blogging (blogar, criar e manter um blog) como uma prática jornalística. Enquanto muitos argumentam contra ou em prol à tese do blog ser ou não jornalismo, existe também o ponto de vista dos blogueiros. Muitos não aceitam a prática de blogging por parte dos jornalistas, entendendo que blogueiro por natureza não pode possuir vínculos com quaisquer órgãos de mídia ou instituições. Muitos entendem que blogs vinculados a jornais online ou grandes portais compõem um veículo híbrido do jornal impresso com o próprio webjornalismo, numa apropriação da plataforma do blog para a mesma e velha prática jornalística e seus conhecidos vícios. Um blogueiro empregado sofreria os efeitos coercitivos de seus empregadores, o que seria um atentado à liberdade de expressão pretendida por muitos blogueiros. Barbosa entende que “a mais visível mudança significativa proporcionada pelos blogs (...) é que o jornalismo deixa de ser praticado por quem ‘escreve’ e passa a ser recriado por quem lê. (...) que reflete não mais o que um grupo de profissionais do jornalismo acredita que as pessoas querem ler, mas o que os próprios leitores gostariam de ter escrito” (Barbosa, 2005:68). Dessa forma, a arte de blogar só teria sentido se praticada por quem não é jornalista profissional, pois ela é a arte que reflete o que o leitor quer escrever, e o jornalista seria incapaz de escrever aquilo que o leitor quer escrever, ele escreve aquilo que acha que o leitor quer ler. Já o blogueiro, despreocupado em fazer da notícia o seu ganha-pão, não tem a necessidade de escrever para ser lido, e sim para se expressar através da mídia. Essa análise perde o sentido se levarmos em conta que, na atualidade, muitos blogueiros passam a trabalhar profissionalmente com seus blogs e canalizam suas tarefas baseados em metas de audiência, especialização em assuntos, obtenção de patrocínios[135] e venda de espaço publicitário, assim, da mesma forma que os jornalistas profissionais, passam a pautar suas informações em funções de seus ganhos. É por isso que muitos blogueiros acreditam que, quando um “colega” passa a atuar dessa forma, na verdade, deixa de ser blogueiro. O blogueiro de verdade não teria a intenção deliberada de atuar como um veículo de mídia (Barbosa, 2005:71), quando o faz, deixa de ser blogueiro, e se ele não é jornalista, então não se sabe o que é. Para a blogueira Bruna Calheiros, do blog Smelly Cat[136], a questão jornalística que esbarra em códigos de ética e conduta contrariam a própria essência do blog, e aí que se define uma das claras diferenças entre blogueiros e jornalistas (ou entre o blog e os veículos tradicionais de jornalismo), pois qualquer tipo regra limitaria o que o blog tem de melhor: a sua liberdade. Sem entrar no mérito dessa posição em prol de jornalistas ou blogueiros, ela pode ser entendida através da forma como são produzidas e veiculadas as informações por ambos os “lados”. No capítulo anterior, fizemos uma reflexão de como a notícia vem sendo transformada num produto mercantil, levando o jornalismo a entrar numa lógica de produção de espetáculos e ideologização de massas. Contra essa lógica instituída, está a emergência dos blogs proveniente dos cidadãos interconectados que passam a produzir dentro de uma forma cuja base está no compartilhamento, na colaboração e na reciprocidade, que produzem sem compromisso com a indústria do espetáculo e o objetivo de atingir e ideologizar as massas. Sendo assim, um blog deixa de ser blog, independentemente se for de um jornalista ou de um cidadão qualquer, quando sai da esfera da peer production, e passa a atender os velhos interesses das mídias de massa tradicionais, transformando-se num vetor cibernético do espetáculo. Na verdade, não é possível se afirmar que o blog seja libertário ou apenas mais um mecanismo para a prática jornalística espetacular. O blog é apenas uma plataforma de publicação, o seu uso pode atender a diversos tipos de demandas, sendo estas jornalísticas ou quaisquer que sejam. Temos, nos extremos dessa nova esfera comunicativa, diversas iniciativas que nos mostram isso. A blogueira Lucia Freitas nos dá um exemplo de uma colega que utiliza a plataforma blog para manter um diálogo intercontinental de cunho beneficente/humanitário que nos dá uma noção dessa dimensão libertária do blog (e da própria Internet): “Tenho uma colega que mora em Seattle e monta cursos de educação à distância para uma ONG na Holanda, para treinar médicos a lidar com a AIDS em Moçambique, e ela utiliza software livre”, conta Freitas. Outro extremo está no exemplo que Araujo cita em seu estudo dissertativo numa referência a uma matéria publicada pelo Observatório da Imprensa[137] que conta como um jornalista inglês chamado Nick Denton (Financial Times), utiliza sua fama, alguns blogs patrocinados e um pequeno investimento em publicidade online (via links patrocinados do Google), para transformar a prática de blogging numa máquina que rende “vários milhares de dólares por mês” (Araujo, 2006:146). Um exemplo de como e o quanto o blog pode ser utilizado para “a mesma e velha prática jornalística e seus conhecidos vícios” como colocamos dois parágrafos acima. Barbosa atenta para outra questão que também pode ser relacionada com a questão da ética e das regras ligadas a pratica jornalística e/ou blogging, confrontando o que os jornalistas entendem por neutralidade e objetividade, o que não seria algo ausente na blogosfera. Essa, assim como as empresas de mídia, também debate questões éticas, elabora seus próprios códigos[138] de conduta e traça regras para produção de informações com a mesma qualidade e preocupações que os jornalistas levam em conta em seu trabalho. Barbosa aponta que, dentro da produção dos blogs, a neutralidade transpareceria dentro das milhares de opiniões e comentários onde, dos mais radicais aos mais liberais, passando pelos pontos-de-vista mais moderados (a maioria), o próprio internauta é capaz de chegar na informação neutra, imparcial e objetiva. Ou seja, enquanto o jornalista precisa trabalhar a informação para deixá-la “neutra”, na blogosfera (e na Internet como um todo), a imparcialidade e a objetividade são obtidas pelo internauta através de seus próprios filtros da realidade. A objetividade, clamada pelos jornalistas como uma de suas funções ao narrar o cotidiano, equivaleria a uma percepção coletiva dos fatos que, na Internet, seriam narrados pela coletividade e abrangendo os mais diferentes prismas de visão (Barbosa, 2005:43-44). Nesse sentido, os blogs fazem uma apropriação da linguagem jornalística que tem pouco ou nenhum espaço na grande mídia, de forma que os blogueiros atuam como colunistas, críticos e comentaristas dos assuntos do dia-a-dia (Barbosa, 2005:27-28). Barbosa mostra que esse movimento de apropriação jornalística por parte dos blogs vem de uma sociedade que consome as informações de todo um complexo de mídia e que passa a atuar ao lado dela, complementando a realidade “que vê na TV” com suas próprias experiências. Dessa forma, se a sociedade se apropria do jornalismo, o jornalismo passa a se apropriar dos blogs como um novo meio de distribuição da informação e inserção na comunidade (Barbosa, 2005:34). Um dos problemas dos blogs profissionais, ou seja, com fins lucrativos para seus donos e/ou patrocinadores, que negociam espaços publicitários de suas páginas. Nesses blogs, o blogueiro passa diretamente a lidar com as questões ligadas à propaganda. De modo que a crítica sobre a quebra do muro que separava a publicidade do jornalismo como um vetor que compromete a ética do meio, na esfera dos blogs, se torna em algo muito tênue, tal “muro” se torna praticamente inexistente. Talvez, especula-se se ela já tenha existido em tal ambiente. O jornalista ou blogueiro, não habituado com os fundamentos da propaganda e do marketing, é capaz de cometer deslizes imperdoáveis, como, por exemplo, um visto no Blog do Noblat[139], um dos mais notórios do país. Nos dias subseqüentes à maior tragédia da aviação brasileira, o vôo JJ3054 para Congonhas (que espatifou-se durante o pouso no aeroporto paulistano em julho de 2007), o blog veiculava um post com uma frase de um parente de uma das vítimas do fatal acidente, enquanto na coluna ao lado, um banner rotativo anunciava uma promoção de venda de passagens aéreas[140]. Para o mestre em Comunicação e especialista em Marketing Roberto Jimenes (FIAMFAAM), tal caso trata-se de uma aberração publicitária, o que ele nos explica através do seguinte exemplo: A Pepsi adiou seis meses a veiculação de um filme publicitário mundial que deveria ser lançado após o natal de 2004 em função do Tsunami que atingiu os países no oceano Índico naquela ocasião. O filme continha cenas de craques do futebol jogando bola na areia e surfistas profissionais se divertindo nas ondas de uma bela praia tropical. Com a tragédia, a Pepsi não podia associar o seu produto à água e, principalmente, ao mar e as ondas. Esse é um exemplo de como a tal fronteira entre o interesse econômico advindo do lucro com publicidade e arte de blogar se torna algo muito difuso, fica difícil saber se o blogueiro, principalmente aquele que possui um blog atrelado a um grande veículo, tem controle total sobre o seu espaço. Caberia ao próprio Noblat retirar tal anúncio de seu site? Ou tal erro foi apenas uma distração que assim evidencia o desconhecimento dos princípios de marketing por parte dos responsáveis por este blog? Tal tipo de aberração publicitária, não é exclusividade de um ou de outro, o mecanismo AdSense da Google faz isso por conta própria, como explica Caio Túlio Costa, é o marketing contextual: “Quem introduziu no mercado foi o Google, com um mecanismo chamado AdSense (...). Esse mecanismo permite a inserção de anúncios elaborados unicamente com frases e palavras que diretamente se referem a conteúdos das páginas existentes na Internet (Costa, 2008:339). E, através dessa lógica, podem perfeitamente cometer o mesmo erro que Noblat, associando uma notícia de um acidente aéreo com venda de passagens aéreas, por exemplo. O caso do Noblat só se torna mais grave pois tal erro foi cometido manualmente, e não por um sistema automatizado cuja semântica é incapaz de diferenciar o joio do trigo. A questão que fica aqui é: o blogueiro, seja jornalista ou um cidadão qualquer, está preparado para trabalhar com os fundamentos da publicidade em seu site? Enquanto jornalistas e blogueiros debatem sobre o que é noticiar ou o que é blogar, o doutor em Comunicação e Cultura Contemporânea Carlos Eduardo Franciscato (UFBA), traz à tona uma consideração que põe uma pedra sobre o assunto. Citando Paul Bradshaw (2007), ele expõe: A televisão é uma forma de jornalismo? As palavras em uma página são uma forma de jornalismo? Os sons são uma forma de jornalismo? Blogs são uma plataforma. Eles podem conter jornalismo, assim como TV, rádio e publicações impressas podem. Muitos ‘bloggers’ praticam jornalismo, muitos não. Perguntar se o blog é uma forma de jornalismo é confundir forma e conteúdo (em Frasciscato, 2007:9). Franciscato questiona em seu estudo se o blog e as diversas novas práticas de jornalismo participativo e comunitário que surgem através da Internet – onde ele inclui o open source e a web 2.0 –, “implica em pensar a relação entre jornalismo e cotidiano. As rotinas da vida cotidiana estão repletas de marcadores do tempo presente” (Frasciscato, 2007:10). O fluxo da informação que se constrói na esfera digital, perpassando pelos blogs, trazem um novo incremento para o jornalismo, abrindo um espaço maior e de mais qualidade para o debate cotidiano das informações que se veiculam por toda a mídia, o que é extremamente positivo para todos, segundo pode-se concluir através das seguintes citações de Franciscato: A incorporação de usuários gera uma melhoria automática no sistema. Dois grandes modelos desta nova plataforma web: os sites de compartilhamento de conteúdo e os blogs (2007:6). Este modelo de jornalismo participativo permite à grande mídia incorporar uma parte do universo de questões que geram familiaridade ao leitor, as quais estão ficando descobertas pela estruturas jornalísticas cada vez mais reduzidas das redações das empresas (Frasciscato, 2007:10). A importância dessa nova esfera digital está exatamente na sua forma dialogal; assim, o debate volta sobre a questão dos gêneros narrativos dos blogs. Já ressaltamos que a Internet se abre para qualquer tipo de gênero, mas esse tipo de classificação parece não se aplicar nessa nova esfera, pois sua importância estaria na repercussão das informações, no feedback e no debate. Nestas formas de jornalismo, o principal bem simbólico de troca que os leitores oferecem é a produção de um discurso (na forma de texto, fotografia, áudio ou vídeo) sobre o cotidiano em que vivem com pretensão de verdade do real. O discurso pode ser factual (ao enviar contribuições a setores informativos dos sites) ou opinativo (ao comentar matérias jornalísticas dos sites), (Frasciscato: 2007,12). O jornalista e blogueiro Tiago Dória[141] é alguém que entende muito bem essa característica dos blogs, a de repercutir informações originárias de outros veículos ou de outros blogueiros, o que é conhecido como “reblogar”: “um dos principais papéis do blog é justamente repercutir o que o blogueiro vê na Internet”. Doria não vê problema no indivíduo gostar de reblogar, mas complementa dizendo que raramente alguém “rebloga” uma informação sem acrescentar nada a ela, um comentário, uma crítica, ou associá-la a outras informações que estão dispersas pela web. Dessa forma, podemos entender o verbo reblogar como um dos mecanismos que o usuário possui no mundo virtual para agir como um coprodutor da informação que consome. Doria crê que a essência do blog, ou do blogueiro que atua como um vetor da informação dentro do espaço cibernético, está na sua capacidade de exercer influência sobre o seu público, “de que adianta ficar se gabando com números? Isso é uma tremenda besteira (...) o The New York Times (...) não é o maior jornal do mundo, mas é o que mais repercute, influencia”. O estudo de Philip Meyer que analisamos no capítulo anterior expõe que o verdadeiro e único bem que um jornal possui é a sua influência sobre a sociedade, sobre o seu público, da mesma forma que Doria nos diz ser este o maior bem que um blogueiro pode possuir. Sendo assim, se um blog se sustenta por sua influência, ele se apresenta como um concorrente aos tradicionais veículos de mídia, sobretudo os jornais impressos, caso eles consigam desempenhar esse papel que antes era cumprido apenas por outros veículos, é mais um motivo que explica, hoje, essa súbita onda de blogs que surgem nos grandes sites e portais informativos e os blogs corporativos. Além de um novo meio para se obter a atenção do internauta, o blog também é uma ferramenta útil para exercer influência sobre ele. A explosão de blogs em portais de impressa além de uma infinidade de blogs corporativos que surgem sem parar, se apresentam como a própria Internet que teve o seu “boom” – a famosa “bolha” da web –, Doria acredita que essa nova “bolha” irá explodir, e dela só sobreviverão os blogs mais fortes, ou seja, aqueles que realmente possuem alguma influência sobre os seus usuários, segundo ele, os blogs já atingiram a sua fase de saturação e “é preciso um refino, vai ficar quem realmente tem relevância”. Se a influência é o maior bem do blog assim como do próprio jornalismo, então se confirma a expressão de que o “blog é a mensagem”, principalmente quando percebemos que existem blogs mais influentes, que repercutem mais que grandes veículos e portais, pelo menos dentro dos limites da audiência ciberespacial. Não somente a reflexão acima nos leva a crer que, dentro do mundo informativo digital, o “blog é a mensagem”, um estudo dissertativo no qual a Relações Públicas Carolina Frazon Terra (ECA/USP) analisa a questão dos blogs corporativos, traz um quadro comparativo entre os meios digitais, eletrônicos, impressos e o blog, por onde pode-se observar que este último se apresenta como o meio ideal para a mensagem dentro da atualidade midiática, e que, só não podemos afirmar que extrapola a Internet e ganha a mídia como um todo, devido ao problema da exclusão digital. Como se pode observar no quadro a seguir, o blog detém praticamente todas as características das demais mídias, algumas em menor escala, outras em maior, potencializadas, e algumas que lhe são praticamente exclusivas. O mais importante, porém, é que, no compito geral, as características do blog favorecem uma relação mais dialogal e interativa dos indivíduos e da coletividade (incluindo corporações e empresas diversas que hoje participam da Internet) com a mídia. Quadro comparativo dos meios tradicionais (eletrônicos e impressos), digitais e blogs
(Em Terra, 2006:103) Franciscato apóia-se em um estudo de Deuze (2003)[142] e identifica quatro tipos básicos de jornalismo online, para, assim, analisar em qual o blog se encaixa: 1) principais sites noticiosos, das grandes corporações, que produzem o denominado “jornalismo de referência”[143]; 2) sites de indexação e categoria, que auxiliam no estabelecimento de links com outros conteúdos[144]; 3) sites de comentários e meta-sites, destinados a atuar na avaliação e acompanhamento da produção jornalística, podendo produzir crítica de mídia[145]; e 4) sites de partilha e discussão, em que os sites jornalísticos facilitariam plataformas para troca de idéias e relatos[146] (em Franciscato, 2007:5). Os blogs seriam “um tipo de ‘jornalismo individual’ que se localizaria na fronteira entre os sites de indexação e os de comentário” (em Franciscato, 2007:5). Mas o que assistimos hoje é o blog avançando sobre esses quatro tipos de modalidades de jornalismo online, ou sendo um instrumento utilizado por todas, inclusive na produção de conteúdo de internautas dentro de grandes portais e sites noticiosos, e também no uso cada vez maior de blogs por jornalistas dentro desses sites. O que se evidencia é que, cada vez mais, a presença do indivíduo se coloca próxima dos veículos noticiosos através da Internet. Essa convergência do usuário sobre a mídia, e do blog sobre o jornalismo é, para Franciscato, uma nova dimensão para a experiência temporal cotidiana do jornalismo, que reforça a mensagem dentro da opinião pública. Utilizando-se de uma plataforma que tem por característica a pessoalidade – o blog –, as instituições também tentam se colocar como um indivíduo, ou através de indivíduos (jornalistas), para, assim, dialogar com o internauta dentro da, conforme já refletimos, mídia do “eu”. É um caminho para as empresas jornalísticas inserirem-se dentro da esfera dos indivíduos, aprendendo com eles e criando novos laços dentro do ciberespaço. Enquanto Franciscato busca entender o blog dentro das categorias de webjornalismo, Araujo busca definir quais são as características fundamentais do jornalismo e, assim, analisar se o blog pode ser entendido como um novo meio jornalístico. Baseando-se num estudo do alemão Otto Groth[147], ele aponta seis características inerentes ao jornal: periodicidade, publicidade (aparição pública), diversidade de conteúdo, interesse geral, atualidade e produção profissional (Araujo, 2006:29). Depois ele conclui que “se um blog contemplar as características supracitadas, ele poderá ser considerado jornalístico” (Araujo, 2006:31). Em seu estudo, Araujo analisa diversos blogs e, embora encontre essas características mencionadas em alguns deles, são raros os que possuem todas elas. Das seis características, a falta de diversidade de conteúdo é a lacuna mais comum dos blogs. Dessa forma o “blog não é jornal porque é especializado, e o jornal precisa ter vários assuntos”. Mas cabe aqui uma ressalva. Se, dentro de uma análise individual, a maioria dos blogs não apresenta diversidade de conteúdo, o conjunto deles pode apresentar. A diversidade dos blogs se faz na navegação pelas informações que compõem a blogosfera, nos blogrolls e no próprio fluxo informativo dos blogs. Nessa análise, se fossemos pensar em diversidade levando em conta toda produção e informação que é veiculada na blogosfera, teríamos de repensar o próprio conceito de diversidade aplicado ao jornalismo. Outro atributo intrínseco do jornalismo típico do mass media que também pode ser encontrado nos blogs, lembra o professor de jornalismo digital Dr. Walter Teixeira Lima Junior (ECA/USP), é a relevância social[148]. Aqui mais uma vez a pluralidade dos blogs é quem faz às vezes para este atributo, já que, se um único ou poucos blogs podem não possuir tal relevância, seu conjunto, a blogosfera, pode. Além de possuir uma ampla diversidade, a blogosfera pode exemplificar como as diversas individualidades conectadas à mídia podem contribuir para a construção de novas e importantes mensagens coletivas, ela “marca tanto uma dimensão de laços de comunidade entre os participantes quanto uma construção coletiva de referências cruzadas. Há uma visível experiência temporal de enunciação pública nos blogs” (Franciscato, 2007:12). Tanto nos parece que, de fato, existe essa enunciação pública quanto para as mais diversas instituições, midiáticas ou não, que, cada vez mais, estão entrando para o mundo dos blogs. Mais do que mensagens coletivas, a blogosfera seria uma nova camada comunicativa onde “cada blog apresenta links para outros diários formando, assim, uma imensa rede de pessoas publicando idéias”. (Terra: 2006, 156 citando Pinto, José Marcos. Blogs! Seja um editor na era digital. São Paulo: Érica, 2002:15). Ou seja, a relevância do blog não pode ser entendida através de sua expressão individual, e sim coletiva, nesse sentido, podemos entender a importância do blog por este ser um vetor para a inteligência coletiva, e não apenas como um instrumento simples e individual de publicação online. Um estudo da doutoranda em Ciência da Informação Joana Ziller (UFMG) aponta para o número crescente de blogs dentro dos portais brasileiros. Entre 2005 e 2006, ela observou que: Enquanto nas análises de 2005 praticamente não foram encontrados blogs, o aproveitamento do recurso foi detectado com freqüência em 2006. No G1 (da Globo), 4,5% das páginas ligadas ao portal eram blogs. O recurso também foi detectado no Uol (do Grupo Folha) em 0,4% das notícias com link no portal. Não foram apurados blogs ligados ao portal Terra (Ziller, 2007:12). Para Zinner, tal crescimento é um reflexo da expressão jornalística do indivíduo na web que “remete à multiplicidade específica da hipermídia. Multiplicidade de emissores, de trajetos, de opiniões. Sob o formato, cabe tanto ao ‘proprietário’ do blog publicar informações e opiniões quanto ao visitante concordar, discordar, reclamar, rebater o que foi publicado” (Zinner, 2007:12). Citando o estudo de Artur Vasconcellos Araújo (2006), Zinner ressalta que: (...) a gratuidade e acessibilidade do serviço e a facilidade do uso terminaram por fazer do blog uma metáfora no ciberespaço, do Hyde Park londrino, jardim público especialmente famoso por seu speaker corner, tribuna onde anônimos e famosos, dos mais diferentes credos, tomam a palavra e ressaltam suas idéias (Araújo, 2006:43). Mais do que evocar novamente o blog como um espaço para o jornalismo opinativo, enfatizando uma de suas facetas mais radicais, o jornalismo de tribuna, evidenciando o diálogo aberto do meio, é interessante a associação do blog a uma metáfora. O nome blog ou weblog, dessa forma, remete a todas essas características do meio, a facilidade, o acesso, a liberdade de expressão e exposição à mídia, a conectividade. Talvez o que estivesse em falta era um nome menos burocrático para um espaço informativo com essas características, que são as características da própria Internet. Assim, a palavra weblog veio identificar esse local peculiar no ciberespaço. Se se fala em jornalismo comunitário, participativo, inclusivo, open source, ou qualquer outra prática de nomenclatura instituto-acadêmica, poucas pessoas fazem idéia do que se trata. Blog, no entanto, todos já sabem identificar o que é, pois muitas dessas pessoas já tiveram contato ou mesmo possuem um. Zinner enfatiza que a frase acima também evidencia o caráter jornalístico do blog, pois este “não é apenas feito por adolescentes ávidos por tornar pública sua intimidade. Os blogs se transformaram em espaço privilegiado para os jornalistas, mediadores profissionais de informação” (Zinner, 2007:12), e que tal espaço também deve ser considerado como produtor de conteúdo e informações de extrema importância. Maria Barbosa, em seu estudo sobre blogs e jornalismo, além de vários outros estudiosos desse fenômeno, enxerga a utilização cada vez maior dessa plataforma por parte das instituições como uma “tentativa de usar uma linguagem mais descontraída e coloquial, quebrando um pouco a formalidade jornalística” (Barbosa, 2005:46) e, dessa forma, se aproximar e reforçar os seus laços com os leitores, os internautas, inclusive numa forma de alcançar novos públicos. Em outras palavras, se o internauta está se comunicando via blog, as instituições correm atrás dele com o mesmo mecanismo, utilizando a mesma forma de linguagem utilizada por ele. A questão é: será isso mesmo? Alguns fatos percebidos em nossa análise nos levam a esse questionamento, e todos se relacionam com uma palavra: link. Vimos que o blog nasceu e cresceu dentro de uma comunidade hacker que estabelecia vínculos entre si e entre informações que partilhavam. Vimos também, que com o surgimento das plataformas gratuitas e automatizadas, os blogs ganharam um novo recurso, a possibilidade de se partilhar posts através de links. Também vimos ainda que o Google, maior mecanismo de busca da atualidade, baseia seus critérios de busca no link, não só classificando-os em seus bancos de dados e diretórios, mas classificando os sites pelos links que levam até eles. Assim, um site cuja URL aparece em vários outros sites, conforme o número de links que apontem para esse sites, acarretará num destaque maior para tal URL numa busca através do seu mecanismo, entenda-se: aparecerá mais próximo do topo da lista dos sites encontrados – e fala-se que se não se aparece até a décima página de resultados do Google, não se existe no ciberespaço[149]. Muitos dizem que a blogosfera ganha destaque na Internet justamente por esse fator, como Lucia Freitas: “Os blogs aparecem em destaque no Google não porque são bons, mas sim porque fazem parte de uma rede de blogs linkados, links que vêm de diversos lugares”. Por se tratar de uma comunidade altamente conectada, muitos blogs acabam se destacando nas buscas através de sistemas baseados em links. Esse aspecto seria até desleal, pois grandes sites provedores de conteúdo não conseguiriam competir com uma esfera altamente conectada como a dos blogs. Assim, chegamos ao nosso questionamento: a inserção de empresas na blogosfera, sejam elas de mídia ou não, tem como intenção uma proximidade maior com o internauta e suas produção na web, ou estaria atrelada ao interesse de se inserir dentro dessa malha de links numa forma de valorizar o seu produto, dando-lhe maior visibilidade no espaço cibernético? Freitas expõe que, em contrapartida ao valor da informação aferido pelos mass media, na Internet “o segredo está em compartilhar as informações e produções através do link, o valor está no indivíduo conectado”. Ela mesma clarifica que a “mídia está de olho no blog”, sendo assim, ela estaria de olho no valor que o link dá às informações como uma forma de destacar os seus próprios produtos. Isso explicaria por que, apesar de tantos questionamentos a respeito do uso jornalístico dos blogs, a mídia estaria se inserindo dentro dessa esfera. Segundo análise de Diana Barbosa sobre vários blogs ligados a portais informativos de grandes jornais brasileiros (2005:46-54), o uso dos blogs por estas instituições vai fomentar os assuntos pautados pela própria empresa e, segundo nossa análise, essa valorização trazida pelo blog continua através do link com outros blogs. Aqui caberia o ditado “fale bem ou fale mal, mas fale de mim”, mas com uma diferença, “fale bem ou fale mal, mas crie um link pra mim”. Independentemente de qualquer conclusão, lembremos que Philip Meyer e Mike Ward chamam a atenção para a escassez de atenção que os grandes veículos sofrem na Internet, especialmente os jornais online. A tática de inserção dentro de uma esfera que vem ganhando notoriedade no ciberespaço, a blogosfera, pode ser vista como busca de um novo caminho para chamar a atenção do internauta. . Os Blogs e o Resgate da Esfera Pública A questão do blog como um vetor que pode trazer novos horizontes para o jornalismo, na perspectiva de influenciar a opinião pública sob um prisma alheio ao espetáculo, pode ser entendida através da argumentação de diversos estudiosos da mídia e jornalistas, que envereda num debate sobre as velhas e novas mídias, sendo o fenômeno dos blogs o objeto em foco. Apesar de ser utilizado por inúmeros jornalistas mundo a fora, o jornalista Wagner Barreira[150] entende o blog como uma ferramenta muito distinta do tradicional jornalismo, ou até mesmo do webjornalismo sob a forma dos grandes portais de notícias e/ou dos tradicionais jornais impressos em suas versões online. A grande diferença dos blogs para as instituições mais tradicionais do jornalismo está, segundo Barreira, na ausência de uma instância mediadora das informações veiculadas, na falta de comprometimento com a verificação das informações, na preocupação em ouvir todos os lados envolvidos na notícia de forma equilibrada e isenta, fatores que são fundamentais para um jornalismo de qualidade. Tudo isto é fato, porém se fizermos um estudo, encontraremos a ausência de tais instâncias em jornais tradicionais e de renome, de modo que o reverso da moeda também pode ser verdadeiro. Esta, porém, é uma discussão que não cabe aqui. Aqui nos interessa justamente isto, o fato de os blogs serem espaços virtuais que servem para o discurso jornalístico isento de mediações, isento de coações. É um espaço onde o jornalista e até mesmo qualquer cidadão pode escrever sem atender a interesses comerciais ou a linhas editoriais, o que, de certa forma, os torna um espaço muito parecido com os jornais que datam da primeira fase da imprensa. Os blogs são, de fato, um espaço onde se pode opinar e argumentar com liberdade e, assim como nas esferas literárias do século XVIII, sempre oferecem espaços para réplicas e tréplicas, de forma que também se constituem num espaço de debate, uma de suas características intrínsecas[151]. Quanto a esta colocação, podemos citar a opinião de Barreira, que acredita que “os blogs subvertem a ordem do jornalismo tradicional”. Ele também enfatiza que o jornalismo tradicional (referindo-se aos impressos) ainda é o palco da discussão política que pauta os rumos do país, o palco por onde passa a discussão pública. Os blogs, por sua vez, subvertem esta ordem e fazem a discussão partir da base. Na contramão do pensamento de Barreira está o estudioso Venício Lima[152]. Este concorda que a mídia, através da televisão e da mídia impressa (e ele exemplifica isso se referindo ao Jornal Nacional e à revista Veja), é quem media as discussões políticas. A questão é se tal mediação vai ao encontro do interesse público ou ao interesse da própria mídia. Apesar de colocar essa questão, através de seus estudos, Lima deixa claro que isenção e defesa do interesse público através da mídia tradicional é algo muito questionável, sobretudo no Brasil, que apresenta uma concentração de mídia sob a forma de monopólios horizontais[153], verticais[154] e cruzados[155]. Outro jornalista que se refere aos blogs como um caminho de disseminação de informação e opinião para a sociedade é Nelson Blecher[156], que enfatiza que os blogs permitem a troca de opiniões numa relação jornalista/leitor mais igualitária. Os blogs são ferramentas que mudam a relação de absorção da informação, democratizando-a. Ele acredita que o "fenômeno" dos blogs ainda tende a se expandir. Sobre a questão da Internet como “veículo democratizante” da informação, Lima discorda de Blecher, pois crê que o alcance de tal mídia ainda é muito pequeno no Brasil, mas enfatiza que este é um problema geral do país, onde ainda as mídias tradicionais também têm uma penetração menor do que potencialmente teriam caso o Brasil fosse mais desenvolvido, com exceção talvez do rádio e da TV aberta. O analfabetismo ainda é outro fator que agrava essa situação. Porém, vale frisar que este estudo não se refere somente ao Brasil e acreditamos que a Internet é de fato mais democrática como veículo em si, e não em relação a sua penetração na sociedade, pois permite a interação de seus usuários e possui custos baixos para se publicar um site. Neste aspecto, as colocações de Blecher vão ao encontro da hipótese da Internet resgatar a esfera pública. Já o jornalista Eugênio Bucci[157] acredita que os blogs “são novas vozes sobre os fatos que são apurados e debatidos”, e isto é outro fator que remete a uma esfera pública mediatizada por uma imprensa de opinião, como era nos primórdios da imprensa. O Poder dos Blogs Embora o título deste tópico refira-se aos blogs, na verdade, o “poder” ao qual nos referimos entrelaça-se com o conceito de peer production que refletimos anteriormente. Os blogs são uma parte dentro dessa esfera de produção colaborativa por onde esse “poder” também perpassa. O professor Sérgio Amadeu da Silveira, em palestra na Faculdade Cásper Líbero[158], fez uma excelente explanação sobre os estudos do norte-americano Yochai Benkler (2006:212-272), que aponta para o surgimento de uma nova esfera pública através da Internet, a qual ele chama de “esfera pública conectada”. Benkler parte do paradigma de que o ambiente de redes interativas, ou seja, a Internet, gera uma economia baseada em fluxos organizacionais e isso caracteriza a comunicação da própria rede. Essa característica das redes, diz Benkler, alteram a esfera pública. Benkler defende que a rede é usada para se construir uma esfera pública com praticas radicalmente diferentes das encontradas nos mass media. Existe um potencial maior de criação de esfera pública na Internet do que nos tradicionais veículos que compõem os mass media (rádio, TV e jornais), pois a Internet tem um potencial mais democrático devido ao fato de ela ser compartilhada e, assim, gera a peer production. Diferentes camadas em diversos níveis de conversações e conexões podem gerar diferentes graus de eficiência e efeitos, que por sua vez trazem novos horizontes para uma esfera pública através da Internet. Sobre os elementos fundamentais da diferença entre a informação econômica em rede e os meios de comunicação de massa, o professor Caio Túlio Costa faz uma explanação, em referência ao estudo de Benkler, demonstrando quais são as bases da economia de fluxos organizacionais em rede, que se compõe de dois elementos: O primeiro elemento é a mudança da comunicação unidirecional, voltada ao sujeito final, para uma arquitetura de conexões multidirecionais distribuída entre os inúmeros nós no ambiente da informação em rede. O segundo elemento é praticamente a abolição dos custos como barreira para se comunicar, ultrapassando fronteiras. Juntas essas duas características teriam alterado fundamentalmente a capacidade dos indivíduos no sentido de atuarem sozinhos ou com outros, de serem participantes da esfera pública (...) em oposição aos passivos leitores, ouvintes ou telespectadores (Costa, 2008:290-291). Ou seja, a peer production é resultado da democratização da mídia, com a abertura de canais múltiplos de comunicação de fácil inserção para os indivíduos. Para exemplificar sua teoria, Benkler mostra como isso ocorre através de dois cases. A-) Boicote a Sinclair Em 2004, durante o processo eleitoral norte-americano, quando George W. Bush foi reeleito presidente da nação, o dono da Sinclair – uma rede de televisão estadodunidense – juntou os seus editores para fazer um documentário sobre o adversário de Bush na campanha, o senador democrata John Kerry. O documentário visava enfocar de forma pejorativa e prejudicial a participação do candidato na Guerra do Vietnã, com o intuito óbvio de manchar sua imagem e favorecer Bush. A informação de tal documentário vazou da redação da televisão e causou indignação entre diversas pessoas, dentre elas alguns jovens e blogueiros. Esses blogueiros, de forma não articulada, fizeram a notícia circular pela Internet e também criaram um site, o Boycott Sinclair[159]. Esta iniciativa se voltou para os anunciantes de rede Sinclair, pedindo que esses retirassem seus anúncios. Tal articulação gerou uma queda de receita da rede televisiva e a sua conseqüente desvalorização na bolsa de valores. Foi pedida também a cassação da concessão de transmissão da Sinclair. Em função disso a Sinclair teve que retroagir e não veicular o documentário ante os prejuízos que teve e o furor do público. O caso mostra como o uso da Internet, através da disseminação de uma informação, gerou uma ação reativa do público e o conseqüente estrangulamento econômico de uma empresa. Esse exemplo também mostra como o novo meio serve, inclusive, como um mediador dos demais meios. B-) O Sistema Eletrônico da Diebold A Diebold [160] é uma empresa de softwares embarcados em máquinas (ATM machines) que cuidava das urnas eletrônicas nas eleições californianas. Uma blogueira defensora da transparência na condução de negócios públicos, o que incluía eleições, conseguiu, através da Internet, baixar documentos da Diebold. A massa de documentos continha muitas informações, incluindo diversos documentos criptografados. A blogueira, então, distribuiu os documentos por e-mail para diversas pessoas, pedindo que elas a ajudassem a descobrir do que se tratavam, já que ela não conseguiria sozinha fazer tal análise. A análise dos documentos por diversas pessoas levou à montagem de provas que colocavam em cheque o sistema eletrônico da Diebold. Além disso, um hacker conseguiu baixar dos servidores da Diebold um conjunto de e-mails da empresa com diversos fatos comprometedores e os publicou num site. A Diebold, baseando-se na lei de proteção ao copyright, reivindicou a posse de tais e-mails e conseguiu a retirada do site da web. Porém o hacker distribuiu os e-mails da Diebold por diversos computadores através da Internet, utilizando-se de uma plataforma Bit Torrent. As pessoas tiveram acesso a tais e-mails e, isto somado com as provas montadas através dos documentos obtidos, descredenciou a empresa e suas urnas nas eleições da Califórnia. Aqui temos um exemplo de compartilhamento do conhecimento e da informação, fruto de uma ação investigativa com conseqüências diretas sobre uma empresa privada, com reflexos dentro de um processo eleitoral, que só foi possível pela existência de uma rede interativa e compartilhada como é a Internet. É um exemplo claro de como se dá a atuação da inteligência coletiva, como contou Pierre Lévy (capítulo I), num contexto político dentro da web. Nesses dois casos, vemos que o público desvenda uma manipulação política e vai em busca das providências cabíveis. O público é quem acessa a informação e a dissemina ao próprio público, não um jornal ou qualquer outro tipo de veículo de mídia, um fato novo dentro do contexto de esfera pública e que demonstra a potencialidade, a força da peer production e da própria inteligência coletiva. Demonstra também como se constrói a força dos indivíduos na rede, onde, mesmo separados fisicamente, podem atuar em conjunto. Na sua análise da Internet dentro deste conceito de esfera pública, Benkler destaca alguns fatos relevantes. Em primeiro lugar, ele diz que o poder dos proprietários dos veículos de mass media é realmente um fato; em relação a isso, a Internet é um veículo que pode exercer um contrapoder. Em suma, dentro do que vimos no capítulo sobre o fim da esfera pública, os mass media têm relação direta com o fim da esfera pública. Nessa relação de poder e contrapoder fica claro que, enquanto os mass media matam a esfera pública, a Internet a resgata. Outro fato que Benkler destaca em relação à Internet e a esfera pública é que a esfera conectada é diversa do conceito que até então temos de esfera pública, ela permite diversos modos de articulação por grupos distintos e separados geograficamente em processos não coordenados. A Internet, em oposição aos mass media, trabalha com o conceito do “see for youself”[161], fundamental para a criação de uma opinião pública não manipulada, capaz assim de decidir os seus rumos com informações confiáveis e verificáveis, o que leva diretamente ao conceito que trouxe Eugênio Bucci[162], segundo o qual na Internet é mais fácil se chegar na informação ou ao obstáculo que nos separa dela (e, neste caso, um bom hacker pode transpor esse obstáculo, como vimos). A Internet aproxima o usuário das fontes e permite a interação e o compartilhamento das informações entre eles. Esse também é um aspecto que o professor Caio Túlio Costa enxerga em sua análise sob o foco ético das questões relativas às novas mídias; com amparo nas teorias de Benkler, expõe: “A nova condição do indivíduo pode ser uma plataforma para cultivar uma cultura mais crítica e autoreflexiva, aprofundar a participação democrática e trazer melhoras no desenvolvimento humano em nível mundial” (Costa, 2008:330). Por fim, Benkler fala sobre os efeitos da esfera pública conectada nas sociedades neoliberais. Em primeiro lugar, tal esfera, que se forma a partir da Internet, permite a emergência de novos atores não-comercias dentro do cenário da mídia (como a blogosfera nesse exemplo), e o engajamento nas atividades mediatizadas pela Internet é muito maior em relação ao do observador passivo dos veículos de mass media, fatos que, como vimos, vão ao encontro das reflexões de Caio Túlio Costa. Costa vai além, dentro das questões que concernem à esfera pública conectada, ele tece reflexões e traz exemplos de como a convergência muda o contexto dessa esfera. E mais, expande o poder mediático da Internet através dos gadgets que também compõem a grande rede como, por exemplo, os aparelhos celulares: “Nova mídia não significa apenas Internet, evidentemente. E sim, todas as novas formas atuais e futuras de comunicação baseadas em desenvolvimento tecnológico” (Costa, 2008:335), e enfatiza a capacidade comunicacional desse singelo aparelho, “(...) o celular alimenta informações na rede, recebe-as, emite-as, fotografa, grava vídeo, é emissor e receptor de informações de toda a espécie” (Costa, 2008:336). Enfim, faz considerações sobre esse novo aparato tecnológico e cita dois grandes exemplos de como ele pode disseminar informações relevantes dentro da esfera pública: A questão tecnológica é para ser levada a sério. Ela permitiu (...) a movimentação dos espanhóis no sentido de mudar os rumos de uma eleição usando aparelhos celulares, e-mails e mensageiros instantâneos, para convocar os compatriotas a ir às urnas e derrotar o governo que havia distribuído informação falsa sobre os responsáveis pelo atentado aos trens em Madri em 2005 que matou 191 pessoas (Costa, 2008:291). Como vemos, a somatória dos gadgets e da Internet trouxe uma nova luz à esfera pública no exemplo citado acima. Além do caso madrileno, Costa também lembra de como os celulares foram fundamentais para a instalação do terror quando, em 2006, o PCC – Primeiro Comando da Capital –, uma organização criminosa, parou a cidade que não pára, a “zettalópole” de São Paulo. Esse caso, embora tenha outras implicações que extrapolam a questão da esfera pública, é um exemplo de como as novas mídias são capazes de trazer informação relevante para os usuários, sejam estas idôneas ou não (que é o teor da reflexão de Costa). O caso do PCC é, para o professor Marcelo Oliveira Coutinho Lima[163], um grande exemplo do valor das informações que circulam através das novas mídias para os seus usuários. Nesse caso, a população de São Paulo confiou no que circulou pela Internet, pelo e-mail e pelo celular, e não nos informes oficiais veiculados no mainstream media. O outro exemplo de Caio Túlio Costa sobre a atuação das novas mídias na esfera pública, em nova referência aos aparelhos celulares, é o seguinte: No limite, ajudou a depor um chefe de Estado nas Filipinas, em 2001. Howard Rheingold conta como Joseph Estrada, presidente das Filipinas, foi o primeiro chefe de Estado em toda a história a perder o poder por conta das manifestações organizadas por meio desse novo meio de comunicação. Na ocasião, mais de um milhão de moradores da capital Manila, mobilizados e coordenados por uma onda de mensagens de texto, afrontaram o regime com manifestações pacíficas. Dezenas de milhares de filipinos convergiram para a avenida Epifanio de Los Santos, conhecida como “Edsa”, uma hora após a primeira mensagem de texto ter sido lançada: GO 2 EDSA WEAR BLACK, ou “VÁ PARA EDSA USE PRETO”. Durante quatro dias, milhares de cidadãos apareceram vestidos de preto na avenida. O presidente caiu (Costa, 2008:226 citando Rheingold, 2002:157-158). Mais uma vez, temos um exemplo de uma esfera pública amparada em novas tecnologias, capaz de, não só veiculares informações, mas de trazer coesão suficiente aos seus usuários de forma a conduzir um movimento forte o suficiente para alterar a cena política de uma determinada comunidade. Objeções As primeiras objeções que colocamos relacionam-se aos exemplos de esfera pública dentro dos conceitos que estudamos com Jürgen Habermas. Vimos que um dos exemplos clássicos de esfera pública se formou dentro do contexto histórico da Revolução Francesa. Diversos estudiosos vão contra a tese de Habermas e afirmam que não existia esfera pública em torno da Revolução Francesa, e sim uma “manipulação da opinião pública” ou uma “propaganda política”. Dentre os estudiosos que defendem essa idéia, está a jornalista revolucionária francesa Camille Desmoulins (1760-1794) que, segundo colocações na obra de Briggs e Burke (2006), introduziu tal idéia ainda naquela época: “(...) Camille Desmoulins (...), por exemplo, comparou ‘a propagação do patriotismo’ com a do cristianismo, enquanto os monarquistas no exílio denunciavam a ‘propaganda’ da Revolução” (Briggs e Burke, 2006:105). E, segundo Briggs e Burke, tal colocação se refere a “(...) mobilização consciente da mídia com objetivo de mudar atitudes pode ser descrita como propaganda” (Briggs e Burke, 2006:105). Outro estudioso que vai contra a idéia de imprensa de opinião que fez parte da esfera pública francesa no século XVIII, é o jornalista Eugênio Bucci[164]. Embora não fale em “manipulação da opinião pública”, Bucci contraria o conceito de jornalismo de opinião e exemplifica sua idéia através da Revolução Francesa. Ele afirma que o modelo jornalístico praticado no início do século XVIII era um veículo de propaganda das idéias iluministas, e o jornalismo deve ser um veículo isento de informação para que o público chegue às suas próprias conclusões. Já o estudioso Venício Lima[165] expõe que o próprio Habermas admite que o modelo de esfera pública que ele estudou só pode ser aplicado dentro do contexto da sociedade inglesa do século XVIII, e não pode ser aplicado para o atual contexto da mídia. Segundo Lima, nada do que ocorria no século XVIII pode ser aplicado no papel atual da imprensa, sobretudo no Brasil. Tal colocação vai diretamente contra parte deste estudo, quando tentamos buscar na Internet uma esfera pública dentro dos moldes traçados por Habermas. Apesar disso, nada nos impede de ousar e tentar contrariar tais figuras notórias. Além do mais, pelo que vimos nos estudos da esfera pública conectada de Yochai Benkler, a Internet é uma mídia que tem características muito distintas dos mass media, e por isso ela tem capacidade de resgatar a esfera pública, e se não o faz dentro do modelo de Habermas, poderá fazê-lo ao menos dentro dos ideais. Porém, concordamos com Lima que o modelo de Habermas não poderia ser aplicado à mídia no Brasil, e nem mesmo as colocações de Benkler sobre a esfera pública conectada pois, como vimos, tais estudos do estadunidense se fizeram em cima do cenário da sociedade norte-americana, que possui um modelo de mídia diferente do nosso, onde a liberdade de expressão é o pilar mais forte que a sustenta. Hoje Habermas baseia-se em outro modelo para estudar o entrono da esfera pública, modelo que não é seu, e sim do estudioso Bernhard Peters, citado em artigo da professora doutora em Comunicação Social Ângela Cristina Salgueiro Marques (UFMG), que analisa os meios de comunicação e a esfera pública no contexto contemporâneo. Assim descreve Marques o modelo utilizado por Habermas: (...) o qual organiza os atores políticos e sociais em um eixo composto de um centro e vários anéis periféricos. No centro estariam os complexos institutos formais, como parlamentos, cortes, agências administrativas responsáveis pelas decisões legislativas e judiciárias (...) etc. (...). Próximas ao núcleo administrativo estariam esferas autonomamente organizadas, mas intrinsecamente ligadas ao governo (universidades, câmaras, associações beneficentes, fundações etc.). E, em um terceiro nível, estariam as associações sociais politicamente orientadas para a formação da opinião (...) grupos de interesses, instituições culturais, grupos de ativistas ambientais, igrejas etc. (Marques, 2008:25). Apesar disso, Marques demonstra em seu artigo que, mesmo enxergando-se a esfera pública a partir de um diferente modelo, os questionamentos a respeito do fim da mesma como espaço donde erige a opinião pública, como vimos através das explanações de Mauro Wilton Sousa no capítulo anterior[166], ainda são pertinentes no contexto atual, apesar da sociedade organizar-se de forma diferente neste momento. Ela diz que: “Não obstante, é preciso ressaltar que suas críticas feitas permanecem atuais no que diz respeito ao modo como a produção da informação jornalística é limitada por diversos tipos de constrangimentos externos e internos” (Marques, 2008:24). Esses “constrangimentos” passam por todas as implicações éticas que levantamos no tópico “A Crise Ética”, além de questões as quais, tanto Habermas (2008:9-22) quanto Marques, destacam em seus estudos atuais relativos à esfera pública. Questões que falam de uma opinião pública que não é exatamente pública, pois esta opinião, dentro do modelo acima descrito, parte majoritariamente do centro à periferia, ao passo que o correto seria o inverso. O historiador e Ph.D Mark Poster (New York University) também entende que o conceito de esfera pública de Habermas não seria aplicável à Internet. Ele expõe[167]: Para Habermas, a esfera pública é um espaço homogêneo de sujeitos personificados em relações simétricas, perseguindo consenso através da crítica de argumentos e a apresentação de afirmações válidas. Esse modelo, eu afirmo, é sistematicamente negado nas arenas da política eletrônica. Nós estamos aconselhando então que o conceito de esfera pública de Habermas, que classifica a Internet como um domínio político, seja abandonado. O estudo de Poster diz que aqueles espaços públicos de antigamente que usamos como referência de esfera pública, da ágora grega aos inflamados salons franceses da Revolução, foram todos tomados pela mídia, iniciando-se pelos jornais impressos e chegando às mídias eletrônicas de massa, o rádio e a TV. Da mesma forma, a Internet e toda a sua tecnologia viriam a continuar esse processo. E, se nesse processo a mídia transformada em espaço público tornou-se o espaço da vida privada, a Internet o amplia, pois ela permite a transposição da vida privada do indivíduo para o espaço público cibernético. A Internet beneficiaria uma democratização em relação à vida privada, mas não modificaria substancialmente o cenário público. Ele afirma que “alguém precisa admitir que o mero fato de comunicar, sob as condições da nova tecnologia, não cancela as marcas das relações de poder constituídas sob as condições face-a-face, impressas e intercambiadas por meios eletrônicos de transmissão”. A objeção é válida, tanto que os meios eletrônicos tradicionais se fazem ecoar também na Internet, além de manterem seu peso fora dela, mas o estudo de Poster não leva em consideração uma série de fatos e novas iniciativas que vêm ocorrendo através da web, como analisamos durante este estudo. Portanto, se não podemos afirmar que de fato existe uma esfera pública na Internet, talvez se possa conjecturar a mudança que acontece no espaço público quando, além da mídia, o indivíduo têm o seu espaço privado tornado público através dos novos meios. A publicização do indivíduo poderia, em algum momento ou de alguma forma, contaminar o espaço público. Alguns dos exemplos vistos levam a esse entendimento. Outras objeções sobre este estudo recaem sobre o conceito de esfera pública conectada de Yochai Benkler, e é o próprio quem traz à tona tais objeções. São basicamente cinco obstáculos que ele faz em relação à Internet e à esfera pública conectada. Vejamos quais são. 1-) A Torre de Babel Benkler parte do fato de a esfera pública conectada ser mais democrática, ou seja, a Internet é uma mídia que, ao contrário dos veículos dos mass media, de onde a mensagem é irradiada de um (ou poucos) para todos (ou muitos), na grande rede a comunicação é de todos para todos. Se temos uma mídia onde todos são emissores e receptores, como a Internet o é, esta pode criar um efeito que Benkler, assim, intitula de “A Torre de Babel”: onde existe muita gente falando, ninguém consegue se ouvir. Muitos sites, muitos blogs etc., geram uma dispersão na informação, o que vai contra a idéia de esfera pública, pois esta precisa de “locais de encontro”, caso contrário ninguém se entende. Nesse caso, fica claro que quem tem mais capital é quem vai ter mais capacidade de ser ouvido, o que confirmaria as afirmações de Mark Poster que vimos anteriormente. Além disso, vários grupos falando e trocando idéias entre si criam uma tendência extremista e não um diálogo saudável e ponderável, o que mataria a esfera pública – o que nos leva às afirmações de Pierre Lévy, que expõe a Internet como a esfera do conflito. Por outro lado, a Torre de Babel pode gerar debates via Internet que jamais ocorreriam em outro lugar, um simples e-mail, por exemplo, pode mobilizar milhões de pessoas (e com custos ínfimos). 2-) Centralização e Concentração – Monopólio dos Códigos Outro obstáculo que pode acabar com a esfera pública conectada é, por ironia, um fator que está na contramão do efeito da Torre de Babel: a centralização e a concentração das atenções na Internet por meio de “pontos comuns de encontro”. Milhares de pessoas utilizam os mesmos serviços, sites e ferramentas de comunicação, tais como Google, Youtube, MSN etc., que se tornam, assim, locais de concentração. Nesse caso, quem controla tais ferramentas/sites, controla a comunicação. Isso se agrava quando as pessoas passam só a dar atenção aos “top sites”; dessa forma estaríamos replicando na Internet o mesmo modelo dos mass media. Tal fato é uma característica da própria Internet[168], onde as pessoas querem participar dos espaços que têm mais pessoas conectadas e que permitem maior troca de informações, pois têm entre si protocolos comuns de comunicação. Nesse caso, quem controla tais protocolos, pode controlar a Internet exercendo monopólio sobre esses protocolos. Existe também o risco de surgirem monopólios sobre a própria infraestrutura da rede e, sob esse tipo de monopolização, o preço de acesso e provimento de informação na Internet pode subir e inviabilizar a Internet como rede de acesso de baixo custo e democrática. Quem chama a atenção com veemência para a questão dos códigos é o estudioso Lawrence Lessig[169]. Ele parte do conceito habermasiano de que a esfera pública surge das relações entre as pessoas privadas e da premissa de que a Internet será o principal veículo de mídia no futuro. Lessig afirma que, neste caso, serão os intermediários da rede que irão mediatizar o diálogo na Internet. Esses intermediários serão as pessoas/empresas que terão o domínio técnico dos protocolos, códigos e softwares utilizados na rede. Lessig enfatiza que as pessoas comuns não sabem nada a respeito e nem têm interesse em conhecer tais protocolos e, sem conhecer tais protocolos, ficam de fora de qualquer discussão que englobe o próprio veículo de comunicação, ou seja, as pessoas não sabem lidar com os problemas técnicos e de infraestrutura de rede que podem atrapalhar o diálogo e a própria esfera pública conectada. No futuro, então, a discussão da esfera pública não partirá das relações na esfera privada, e sim de uma esfera à qual as pessoas comuns não têm acesso, a esfera dos técnicos e programadores da grande rede e das grandes empresas/corporações de tecnologia. O escritor Nicholas Carr[170] é um estudioso das novas mídias que teme esse movimento centralizador da Internet, ele expõe que “enquanto a net pode ser um sistema de comunicação descentralizado, sua operação realmente promove a centralização do poder”. Carr exemplifica sua posição através da hegemonia da empresa Google e referindo-se às palavras de executivos da Sun Microsystens e Yahoo!, que prevêem que a infra-estrutura da Internet estará centralizada na mão de meia-dúzia de corporações dentro dos próximos anos. O problema da centralização não pára por aí, a situação se agrava quando pensamos que ele está diretamente relacionado à concentração das empresas de mídia que analisamos no tópico sob o rótulo de “Sinergia da Mídia” (Capitulo I), de forma que esses dois movimentos centralizadores estão diretamente relacionados. Questiona-se se estas poucas corporações as quais Carr se refere, serão aquelas mesmas as quais nós estávamos nos referindo anteriormente. E se assim for, então se vislumbra o mundo das Comunicações como um único “monstro” de cinco ou seis cabeças diferentes, talvez sete, como uma espécie de “Prostituta da Babilônia[171] binário-midiática”? Maria Fernanda Cicillini lembra que essa também é uma das preocupações de Pierre Lévy. Ela “explica que a configuração de uma sociedade e cultura e suas relações com as técnicas não podem ser pautadas como uma oposição maniqueísta, cujas técnicas seriam agentes externos, estranhos a toda significação humana” (Cicillini, 2007:3). Em relação aos códigos, eles também não podem se tornar uma técnica dominada apenas por empresas, aquém do controle dos usuários, pois isto acabaria interferindo na própria liberdade do usuário em usar o código para se comunicar. Um grande exemplo desse tipo de controle/monopólio está num movimento das teles norte-americanas que tentam, com o amparo de novas leis, modificar o protocolo de comunicação da Internet, a fim de controlar o que os usuários enviam uns para os outros e, com esse controle, filtrar o que pode ou não pode ser compartilhado[172]. O paradigma, então, para efetivamente termos uma esfera pública conectada através da Internet, é não permitir monopólios e controles sobre a sua infraestrutura e seus protocolos, de modo que essa intermediação não interfira no diálogo e nos debates através da grande rede. Mais uma vez, o uso de software livre se mostra um dos poucos caminhos para a sociedade se livrar desse tipo de controle. 3-) Função “Cão de Guarda” Outro problema, segundo Benkler, diz respeito à função que ele chama de "cão de guarda". Sob o paradigma da liberdade de imprensa, os veículos de mass media exercem uma função de vigília sobre o que concerne ao interesse público (como, por exemplo, a revista Veja, o jornal Folha de S.Paulo, o telejornal Jornal Nacional etc.). Na Internet, tal função estaria dispersa, fragmentada. Mas, neste caso, enfatiza Benkler, se é possível termos, na Internet, pessoas trabalhando cooperativamente (como, por exemplo, na enciclopédia global Wikipedia e o jornalismo open source), essa função, então, ao invés de ser exercida por poucos veículos do mass media, pode ser cumprida por milhões de usuários espalhados pela rede, com milhares de “cães de guarda”. Os próprios cases levantados por Benkler exemplificam isso. 4-) Controle e Filtragem da Internet As objeções finais que Benkler faz dizem respeito ao fato de a Internet poder ser filtrada (como é na China, por exemplo). Nesse caso, países autoritários poderiam censurar conteúdos da rede ou até mesmo espionar as pessoas através da Internet. No Brasil temos um exemplo disso quando, em 2006, a justiça bloqueou o site Youtube. Hoje, no nosso país vive-se esse drama: um projeto do Senado[173] visa dar maiores poderes de policiamento para a justiça sobre os sites de conteúdo, além de outros detalhes que podem, até mesmo, levar à prisão jovens que baixam vídeos, músicas e conteúdos diversos através de redes de compartilhamento. Outro projeto, o PLC 89/03, visa acabar com anonimato na rede – o usuário seria obrigado a se identificar toda vez que se conectar na web. Iniciativas como essas são exemplos de como a liberdade e, conseqüentemente, a esfera pública conectada, podem ser limitadas mesmo dentro do ambiente que nasceu sob o paradigma de não possuir instâncias mediadoras centralizadas. Sobre o controle da Internet, Caio Túlio Costa faz um questionamento: “Quem a controla? (...) os Estados Unidos” (Costa, 2008:331). Todos os sites da Internet em todo o mundo são administrados primariamente pelo Internet Corporation for Assigned Names and Number (ICANN). “Na realidade (...) o acesso à rede está tanto nas mãos dos Estados Unidos quanto de instituições, empresas e governos” (Costa, 2008:332). Hoje existe um grande debate que visa, entre outros detalhes, tirar o controle da ICANN sobre o fluxo informacional da Internet. Embora Costa não cite nenhum exemplo de como esse controle tenha sido usado para limitar a liberdade na Internet, se é que já o foi – e não é o objetivo deste trabalho se aprofundar nesta questão –, é evidente que deixá-lo na mão de uma única nação é algo que se torna maior do que a simples discussão sobre o controle da Internet, torna-se um problema de segurança nacional para as nações que utilizam os fluxos informativos da grande rede. Se no passado temia-se o poder que os Estados Unidos tinha através do botão que, uma vez apertado, poderia destruir o mundo com um holocausto nuclear, hoje, teme-se o poder que emana da “chave” capaz de desligar a Internet. 5-) Exclusão Digital Por fim, o problema final da Internet seria a exclusão digital, devido ao qual pessoas excluídas da Internet inviabilizariam uma esfera pública conectada numa amplitude mais democrática. Para o Brasil, este é um problema de extrema relevância. Até hoje existem pessoas que sequer têm acesso à língua portuguesa. O analfabetismo ainda é um problema que precisamos resolver, um problema que não só afeta o acesso à Internet, mas todas as mídias que têm como base o texto. Segundo dados expostos na tese de doutorado do professor Caio Túlio Costa, a situação relativa à escolaridade brasileira, em 2008, é a seguinte: “9% é analfabeta, 25% tem até a quarta série, 23% cursou da quinta até a oitava série, 31% fez o ensino médio e 12% tem um curso superior ou mais” (Costa, 2008:287-288). Se muitas pessoas não têm acesso ao texto, também não têm ao hipertexto, portanto ficam de fora da esfera pública conectada. Ainda temos outra barreira que é a língua inglesa, a língua universal, a principal língua da Internet. Se no Brasil muitas pessoas ainda precisam aprender Português, o que dizer do Inglês? O problema do analfabetismo vem em dose dupla para a nossa pobre realidade. Essa barreira da língua inglesa não é um obstáculo somente à população brasileira, é uma barreira que se estende mundo afora. É fato que a Internet é uma mídia cujas conexões a tornam de acesso mundial. Mas, se a Internet não apresenta fronteiras como o mapa geopolítico mundial, ela apresenta fronteiras em relação às línguas. Hoje é comum se medir a penetração de muitos sites e serviços pela web em termos da língua nativa, mapeando a rede pelas línguas que são mais “faladas”. Por exemplo, o UOL foi apontado como o maior site do mundo em língua portuguesa em 2006, de não inglesa em 1998. Muitas empresas vêm tentando transpor essa barreira, criando serviços de tradução instantânea de sites, utilizando mecanismos para identificar a língua nativa do usuário e redirecionando-o para a página respectiva, e assim por diante. Existem limitações para a universalidade atribuída à Internet, a diversidade de línguas que existe no mundo é uma delas. Como dizia McLuhan, essa é a última barreira a ser transposta nesse estágio final da evolução das extensões comunicacionais do Homem. CONSIDERAÇÕES FINAIS – CAPÍTULOS I E II “You buy future; you sell future; when there is no future” – Devil’s talking[174] O Paradigma da Internet Iniciamos o capítulo nos referenciando à mudança de paradigma advinda da inclusão da Internet dentro do palco midiático. Assim, vamos ressaltar quais foram as palavras e conceitos-chave que embasaram esta mudança de paradigma que é, como expusemos várias vezes: a introdução do indivíduo dentro da cena midiática através de uma rede que permite a comunicação de todos com todos, e não mais somente de um (ou poucos) para muitos, uma nova hierarquia comunicacional, ou seria melhor dizer: o fim das hierarquias comunicacionais. Fazem parte dessa mudança de paradigma a cibercultura, a inteligência coletiva e a nova forma de produção de conhecimento livre de propriedade entendida como Commons, a base da produção dos pares (ou usuários) interconectados, a peer production, que também perpassa por novas formas de conexão dentro de um mundo desintermediado e desterritorializado. A extensão da escrita através do hipertexto também nos mostra o novo degrau alcançado dentro da produção e do acesso ao conhecimento nas novas mídias, muito aquém do patamar que antes era delimitado em textos sobre suportes estáticos ou em imagens e sons que desaparecem no ar após o exato instante em que são veiculadas. Até aqui, descrevemos o palco de um mundo midiático que pode ser entendido como universal sem totalidade, que abrange todo o planeta e todas as mídias, sem possuir qualquer tipo de instância centralizada de mediação, o que faz desse novo palco, a Internet, uma mídia mais democrática que as demais. A universalidade, também entendida pelo alcance global da Internet, transforma a somatória de uma série de pequenos teatros em espaços que englobam o todo; a mídia, além de local, agora é mundial; mais do que isso, o local se torna de acesso mundial – a mídia de alcance global. Sendo assim, a mídia, hoje, tem uma capacidade muito maior, tanto de filtrar as informações do global para o local, quanto de projetar a informação local para o global, de modo que a profundidade informativa hoje disponível é infinitamente maior do que se tinha disponível antes do surgimento da web. Isso também pode ser expresso através do paradigma jornalístico no qual a informação é um direito fundamental do povo e, hoje, o povo nunca esteve tão próximo da informação ou dos obstáculos que o separam dela. De forma que, se a informação representa um quesito fundamental para que o povo possa delegar o poder dentro das sociedades representativas, hoje ele tem condições de fazê-lo com muito mais sabedoria. O paradigma da Internet talvez seja único se comparado com as demais mídias, pois ela é uma mídia que, de certa forma e em diferentes graus, reflete o que seus criadores procuraram designar ao inventá-la, o que se verifica nos conceitos acima listados e através das palavras liberdade, cooperação, reciprocidade e informalidade. A informalidade reflete a relação indivíduo-indivíduo que não segue regras estabelecidas, da mesma forma que a mídia perde as suas instâncias mediadoras. Existem ainda certos movimentos que aceleram algumas tendências que vinham em curso antes do surgimento da Internet, tais como a fragmentação e a segmentação da mídia. A fragmentação pode ser, inclusive, entendida como a quebra da seqüencialidade típica das mídias tradicionais, não só pela não-linearidade do novo meio, mas pelas possibilidades que o cidadão hoje possui em acessar diversos conteúdos midiáticos de diversas formas e em diferentes momentos, inclusive burlando as ditatoriais formas de distribuição da informação como até então existiam (e que ainda coexistem com as novas). Além disso, a mídia passa a refletir uma série de características da sociedade, na atualidade muito centrada no individualismo e no narcisismo; assim, o centro da mídia se desloca para o indivíduo e a mídia se torna eu-cêntrica. Ruptura é outra palavra-chave dentro do novo paradigma comunicacional que se inicia com a quebra do monopólio informativo antes detido pelas corporações de mídia que hoje têm, ao seu lado, quase que em pé de igualdade, o indivíduo. Assim, todo o processo produtivo (e também distributivo) da informação sofre uma fragilização com a presença do usuário. O caso da Napster, que exemplificamos neste estudo, demonstra claramente esta situação, assim como a compra da Time-Warner pela AOL, quando este conglomerado apostava numa nova e lucrativa forma de distribuição de conteúdo via Internet, sem os custos logísticos de toda uma cadeia produtiva e distributiva inerente a produtos midiáticos analógicos, mas que não foi assimilada pelos usuários. Outra palavra-chave do meio reflete o que o próprio meio é: uma inovação. Enquanto muitos tentam entender se, de fato, a Internet é o vetor para uma grande revolução que deve abalar os alicerces da sociedade como um todo, uma coisa apenas é certa: ela representa uma grande inovação na forma como as pessoas se relacionam midiaticamente, e isto, direta ou indiretamente, acaba refletindo na vida da sociedade. Mas, o que enxergamos no dia-a-dia é uma constante evolução, que não pára, a cada inovação segue-se outra ou se formam as bases para uma nova e mais ampla inovação, típica de um meio que ainda não atingiu seu patamar máximo de evolução, que ainda está sendo construido. De forma que a inovação de hoje representa o obsoleto de amanhã, e tal palavra-chave se mantém sempre em atividade, construindo novas formas de comunicação que ainda precisarão ser entendidas e absorvidas pela coletividade – trata-se de um movimento de virtualização e atualização crônico. Essas inovações tecnológicas também nos levam a um novo mundo comunicacional; estaríamos, assim, entrando na era da estrutura e da configuração de forma em que o próprio campo comunicacional é hoje atravessado por uma série de devices, hardwares, códigos, protocolos e softwares que colocam em cheque as suas próprias bases epistemológicas que, se já eram frágeis dentro do entendimento de vários estudiosos[175], hoje se fragilizam ainda mais. Com esse suprassumo de palavras-chave e conceitos ligados ao novo paradigma comunicacional e, dentro dos entendimentos que apresentamos de ruptura de paradigma através das citações ao estudo do português Boaventura Sousa Santos, chegamos a mais uma característica de dualidade das novas mídias. Podemos afirmar que o novo paradigma comunicacional é de crescimento e de degenerescência ao mesmo tempo. É de crescimento, pois estamos construindo um novo mundo midiático muito superior e muito mais evoluído em relação ao “velho mundo” da comunicação, que carrega consigo também alguns dos valores positivos (e, infelizmente, os negativos também) que já existiam nas demais mídias, assim como cria novos valores e fortalece/enfraquece outros. É de degenerescência porque essas novas mudanças implicam uma revisão completa e de base epistemológica para readequar o campo comunicacional dentro desses novos paradigmas. O jornalismo, que foi a âncora desse estudo dentro do campo comunicacional, é o grande exemplo disso, pois hoje existe um profundo debate onde muitos se questionam se o jornalismo é uma habilitação comunicacional ou um campo único do conhecimento, outros crêem que o jornalismo não forma um campo de estudo próprio e sequer deveria ser agraciado com uma formação universitária, tal habilitação não passaria de uma coletânea de conhecimentos técnicos e, no mundo da estrutura e da configuração, a formação técnica chega mesmo a sobrepujar a acadêmica: o jornalista sozinho não é capaz de se manter na nova mídia, sendo refém de uma série de conhecimentos que estão fora do campo comunicacional. Se já se questionava se o conhecimento comunicacional flutuava por outras áreas do conhecimento, tais como a Filosofia, a Sociologia e as Ciências Políticas, hoje ele perpassa campos da Informática e da Tecnologia da Informação, entre outros. E mais, a Internet coloca em cheque a profissão do jornalista e muitos acreditam que não é mais necessário passar pela universidade para exercer essa profissão em toda sua plenitude. Tendências para o Jornalismo A nova grande tendência para o jornalismo praticado através das novas mídias está intimamente ligada com o novo paradigma comunicacional que tende a uma simplificação da informação e no acesso à mesma, o que acarreta numa democratização para os cidadãos que consomem as mais diversas formas de informação, notícia e conteúdo. Isso leva a crer que esse novo mar de informações agora acessíveis criará indivíduos mais conscientes de seu papel dentro da sociedade. Um exemplo da beneficie no acesso à informação é a maneira como a Internet facilitou e democratizou o acesso às informações de cotações da bolsa de valores e nos serviços de classificados, que são as bases fundamentais do jornalismo (como diz Marshall McLuhan[176]). Esse tipo de melhora no acesso à informação e a conteúdos diversos evoluirá constantemente, inclusive porque agora a mídia tem agregada em si os benefícios da inteligência coletiva (que também beneficiam o surgimento de cidadãos mais conscientes). Outra tendência deverá se tornar realidade quando alcançarmos o novo patamar coevolutivo da Internet através da web semântica, que agregará o conceito de agentes inteligentes em serviência a um acesso mais dinâmico, esperto e personalizado à informação (como diz Nicholas Negroponte[177]), outro vetor que beneficiará, mais do que nunca, o aumento e o acesso à inteligência coletiva. Outro fator, inevitável, ligado ao jornalismo, se deve ao constante processo de virtualização inerente das novas tecnologias que surgem incessantemente, tende-se a repensar as bases epistemológicas dos estudos de jornalismo a fim de acompanhar as novas peculiaridades informativas advindas das relações interativas dos meios digitais (mas que nada tem a ver com a discussão de o jornalismo ser ou não uma área do saber acadêmico ou não pertencer à Comunicação). Outra mudança de base epistemológica está na própria plataforma aberta das novas mídias que, cada vez mais, serão o palco por onde toda uma nova geração de jornalistas exercerá a sua profissão sem precisar se preocupar com os velhos gatekeepers da velha mídia, sendo, eles mesmos, os seus próprios gatekeepers. O jornalismo de autor, baseado em narrativas mais próximas da opinativa e literária, passará a ser uma tendência à qual os cursos de jornalismo se verão obrigados a convergir e, assim, educar os seus estudantes para esta nova prática. Porém, uma outra figura característica do Jornalismo, o editor e/ou publisher, como veremos no decorrer do próximo capítulo com alguns exemplos práticos mas vale adiantar aqui, não desaparece na Internet. Ele se modifica, pois não pode mais agir como o grande gatekeeper que era, mas continua existindo e sua importância é, e ao que tudo indica, sempre será vital para a prática jornalística dentro da esfera ciberal. O eu-centrismo que se verifica nas novas mídias tende a se intensificar, de modo que teremos um aumento da interatividade e do papel do usuário nas pautas editorais, defendendo seus próprios pontos de vista e sustentando opiniões e visões diferente das dos meios de massa, onde poderemos ter uma completa subversão de valores, com o usuário pautando a mídia e não mais o inverso. CAPÍTULO III - O WEBJORNALISMO NA ATUALIDADE “Free will, it is a bitch” – Devil’s talking[178] Neste capítulo vamos analisar o que está surgindo de novo na Internet em relação ao jornalismo, observando alguns exemplos de como diversas instituições estão utilizando a Internet e a tecnologia digital para se comunicar e disseminar a informação e o conteúdo. Mais que os exemplos de instituições, onde examinaremos com mais atenção os sites dos grupos Folha e Estado, analisaremos as novas iniciativas do indivíduo interconectado e como ele está contribuindo para disseminar a informação de novas maneiras diante das inúmeras possibilidades e novidades tecnológicas que vão surgindo no dia-a-dia. Neste capítulo, sobretudo, examinaremos os exemplos da convergência das pessoas diante as novas possibilidades interativas e comunicativas através das novas mídias digitais. Nesse sentido, seremos obrigados a observar algumas empresas que vêm contribuindo para a criação de novas formas de disseminação da informação, onde destacamos a Google, um dos grandes players comunicativos da era digital. Além de observarmos esses novos exemplos de convergência à nova mídia, finalizaremos este capítulo com um debate colhido através das entrevistas que realizamos com profissionais, estudiosos da comunicação e diversos blogueiros, quando abordamos diversos temas pertinentes a todo esse trabalho, o que inclui, evidentemente, o fenômeno dos blogs e o surgimento da blogosfera. 1. Iniciativas Mundo Afora “I’m the hand under the Mona Lisa’s skirt… I’m a surprise, they don’t see me come” – Devil’s talking[179] Google Dominando a Rede Um vídeo publicado no Youtube, intitulado Epic 2015[180], narra uma estória que, apesar de fictícia, causa terror para muitos, dentre estes muitos, as empresas de mídia e, é claro, os jornais impressos de que tanto falamos ao longo deste estudo. Para as empresas de mídia, o vídeo pode ser tudo, menos épico, pois monta um cenário futuro para a comunicação que não inclui nenhuma empresa do tradicional mainstream media. O futuro da comunicação seria totalmente controlado pelo usuário e por empresas que produzem a tecnologia que permite aos usuários se conectarem e serem os senhores da informação na Internet. O marco de tal mudança teria sido a criação do sistema de recomendações da Amazon que a Google transformou em algoritmo e, a partir deste (lidando com o link como uma recomendação), estaria, ou podemos até dizer que está, dominando o ciberespaço com diversas soluções que beneficiam a interatividade do usuário, inclusive, na partilha das verbas publicitárias. Seria a segmentação e a fragmentação total da mídia, onde o valor da informação estaria atrelado diretamente ao indivíduo e não mais a qualquer grande empresa como temos hoje; estas atenderiam aos resquícios de um velho mundo cujas gerações caminham para o fim, estando à margem do novo e grande complexo midiático digital conectivo e inclusivo da Internet. Embora tal cenário seja fictício, vários de seus elementos se encontram presentes na atualidade midiática, a começar pela própria Google, que hoje se apresenta como uma das oito maiores corporações de mídia globais. O medo da Google também é algo que se faz sentir em vários cantos do mundo; a agência Reuters[181], por exemplo, veiculou uma notícia revelando que executivos europeus dos setores de mídia, tecnologia e telecomunicações temem que a Google roube-lhe os negócios. Já nos Estados Unidos, até empresas de outros setores passam a temer a Google, e já estudam maneiras de não terem seus negócios afetados pela revolução que ela vem fazendo dentro do mercado ciberespacial. O problema é que a Google, que começou apenas com um sistema de busca inteligente na web, hoje avança para diversos outros setores, tais como softwares para celulares e soluções para diversas áreas, dentre as quais, medicina, agricultura e, inclusive, implementação de cabos submarinos de fibra-óptica e compra de freqüências de TV (que deixarão de ser utilizadas pelas redes televisivas convencionais que agora migram para o formato HD). Com as diversas soluções que a Google cria, ou compra, ela vai aumentado os seus mercados, e à medida que a Internet cresce e se desenvolve, a Google vai ficando mais forte. A própria ascensão da Google é algo assustador, foram dois anos que separaram o surgimento da empresa até o domínio do mercado de busca na web (entre 1998 e 2000). Hoje, até o lendário Gordon Moore[182] se demonstra impressionado com a empresa, “nesse universo, o Google é o que existe de mais impressionante”, diz o sapiente da informática. Mas nem todas as notícias remetem a este cenário de completa hegemonia das empresas digitais, enquanto alguns temem a Google, outros tentam derrubá-la, buscam fazer frente a este novo gigante da mídia. Uma matéria de capa da revista Newsweek[183] se pergunta se não está chegando a hora do “Takedown?[184]” da nova gigante, e aponta os esforços de diversas empresas em atacarem o coração da Google, o seu sistema de busca. A matéria foca as principais alternativas de sistemas de busca que estão sendo desenvolvidas, tais como o Quintura (tecnologia russa e norte-americana), o portal sul-coreano de busca Naver (que já é o principal sistema utilizado no país), o alemão Mister Wong (que realiza busca através dos bookmarks dos seus usuários), o sistema russo Yandex (Яндекс), o comitê do governo japonês conhecido como “Great Voyage Information Project” (Information Grand Voyage – 情報大航海プロジェクト), além dos sistemas da Microsoft, Yahoo e outras novidades desta área. A matéria chama atenção para dois fatos interessantes: é consenso que há um limite para o que uma única empresa possa fazer dentro do mundo informativo, de modo que imaginar a Google controlando sozinha todo o mercado de busca na Internet (ou uma única corporação qualquer) é algo inviável, inimaginável. O desenvolvimento desses novos grandes sistemas, inclusive, deve suprir as carências e as lacunas deixadas pelo Google, de modo que é mais fácil se imaginar um cenário futuro onde diversas empresas oferecerão variadas soluções para a busca de igualmente variados tipos de conteúdos que os usuários procuram pela grande rede, do que um cenário dominado majoritariamente pela Google. Uma das falhas mais evidentes do sistema da Google é que ele se baseia nos sites que são mais vinculados, ou seja, assumindo que, se, uma página possui muitos links que apontam para ela, ela deve possuir alguma importância[185]. Sim, faz sentido, mas nem sempre o usuário está em busca do que é mais relevante. Essa falha tem sido o hiato que outras empresas buscam explorar dentro deste mercado. O problema é que, enquanto isso, a Google se expande cada vez mais para outras áreas, de modo que outro consenso atual é que, se, não podemos afirmar que a hegemonia da Google será total dentro do ciberespaço, como aponta o vídeo que mencionamos, também é consenso se imaginar o cenário futuro da comunicação sem uma forte participação da Google é impossível. Uma rápida navegação pelo site do Google[186] nos mostra as soluções oferecidas pela empresa além da busca na web. Na página inicial, ao centro da página, um campo de busca com três opções (pesquisar a web, páginas em português ou páginas do Brasil), convida o usuário a digitar algo que esteja procurando. Há, ainda, ao lado do campo de busca, três links para outras opções oferecidas pelo site: pesquisa avançada, preferências e ferramentas de idiomas. No canto superior esquerdo da página são exibidas outras ferramentas da Google: pesquisa de imagens, mapas, notícias e links para os sites da comunidade virtual Orkut e para o serviço de e-mail G-mail. Há ainda, outro link para “mais” opções, sobre o qual discorreremos adiante. No canto superior direito há um link para outro serviço relacionado a noticias oferecido pela Google, o iGoogle (com um campo para login para este serviço que requer cadastro). Abaixo do campo de busca da página inicial do Google há ainda cinco links mais. Em Soluções para publicidade, o usuário fica a par e pode encomendar os dois pacotes básicos de marketing contextual do Google: o AdWords (links patrocinados), que é voltado para anunciantes em geral, um mecanismo que só cobra pelos anúncios quando os usuários clicam sobre eles, uma máquina que movimenta cerca de quinze bilhões de dólares por ano, dos quais, quatro bilhões vão para o cofre da empresa[187]; e o AdSense, que é voltado para proprietários de sites, mecanismo que oferece uma compensação financeira ao proprietário do site caso algum usuário efetue uma compra de um produto a partir de um anúncio que este dispõe. Há, ainda, outro link para contato com a empresa para aqueles anunciantes que procuram outros tipos de soluções personalizadas em propaganda na web, o que inclui um mecanismo chamado MOB (otimização do site em mecanismos de busca). Este serviço possui um tipo personalizado de monitoramento, e é otimizado ao site conforme as palavras-chave do cliente, fazendo com que o site fique posicionado nas primeiras colocações da busca orgânica[188]. Fechando essa pequena análise da página inicial do site da Google nós temos, além do campo de busca e suas respectivas opções, um menu superior com sete links, e mais cinco links com outros serviços e informações da empresa, num total de doze links. No entanto, o destaque maior da página é para o serviço principal da empresa, a busca. O logotipo da empresa e o campo de busca junto ao centro da página servem como um ponto de fuga de onde o olhar do navegante não consegue escapar, não há como um usuário entrar na página do Google e não encontrar o sistema de busca. Ele pode até demorar para encontrar outras informações, mas a principal, aquela que se inicia a partir da busca, não há nenhuma dificuldade ou obstáculo que o separam dela. O webdesigner Luli Radfahrer[189], baseando seu estudo na teoria da Gestalt, demonstra que qualquer usuário que se depare com uma página com mais de sete links tende a perder-se e, em muitos casos, desiste de procurar a informação que busca. Embora a página inicial do Google ofereça mais do que sete links, isso não ocorre em relação à busca, já que o único grande destaque da página é para o sistema de busca. Destacamos tal fato, pois, como vimos no capítulo anterior, usabilidade é um conceito fundamental para qualquer um que queira dispor informações na web, e cremos que o site da Google é um exemplo perfeito de usabilidade, tanto que, como destaca Mike Ward, muitos usuários preferem buscar notícias através de sites de busca ou outros mecanismos, ao invés de navegar no confuso mar de opções oferecidas pelos portais de notícias ou sites de empresas jornalísticas. Googlar é simplesmente mais fácil e, se não bastasse isso, a Google ainda oferece diferentes opções para o usuário encontrar e personalizar notícias de que queira se inteirar, como veremos adiante. E mais, como se a simplicidade e a usabilidade que destacamos até aqui fossem insuficientes, a Google ainda possui uma opção de página de busca configurável pelo usuário chamada Google mini, cuja página inicial se compõe apenas do logotipo da empresa e do campo de busca, nada mais (nem as opções de busca que listamos acima), inclusive, até o logotipo da empresa pode ser editado pelo usuário. Sem dúvida, a Google demonstra que entende muito bem o que o termo usabilidade significa e, antes de tudo, este relaciona-se com a simplicidade. Outro link, Tudo sobre o Google, traz mais informações sobre a empresa, perfil da Google, arquivos de ajuda e links para alguns dos serviços que estamos listando. Além deste, há outro link que leva o usuário para uma página de ajuda sobre questões relacionadas à Privacidade, um dos calcanhares-de-aquiles da empresa, que sofre com diversos processos judiciais relativos a problemas ligados a esta questão. Por fim, mais dois links abaixo do campo de busca da página inicial do Google trazem a opção do usuário configurar o Google como sua página inicial de navegação e outro que o leva à página original do site norte-americano da Google. Clicando no link para o site original da Google nos Estados Unidos, a página se mantém igual, apenas o link para o Orkut é substituído pelo link Shopping, e não há o link para configurar o Google como página inicial. No link para “mais” opções do Google, há destaque para os principais serviços oferecidos pela empresa e um link para outra opção intitulada “e muito mais”, onde são listados os seguintes serviços: · Soluções relacionadas à busca na Internet: Acadêmico, Barra de Ferramentas, Bloco de Notas, Google Chrome (browser), Desktop, Diretório, Earth, iGoogle, Imagens, Mapas, Pesquisa de Blogs, Pesquisa de Livros e Pesquisa na Web. · Outros serviços: Agenda, Blooger, G-mail, Grupos, Orkut, Picasa, Talk, Docs, Youtube e Pack. Estes são os serviços oferecidos pela Google que são visíveis aos usuários, mas existem diversos outros, alguns ainda, tais como o Froogle; busca de produtos ainda não disponível em nosso país, e o Google Watch; cookie que armazena informações sobre as buscas realizadas pelos usuários, também entendido como o sistema de espionagem da empresa, que tanto é capaz de usar as informações para melhorar e direcionar os seus serviços/produtos como é capaz de vendê-las para terceiros, entre os quais a CIA – Central Intelligence Agency (EUA) – seria um dos clientes (Araujo, 2006:488). Existem também os serviços e soluções voltados para empresas, tais como venda de sistemas para blogs corporativos, soluções para streaming de vídeo, licenciamento de tecnologia de busca e diversos outros[190]. Como vimos na lista acima, existem dois serviços relacionados ao mundo da notícia, a pesquisa de blogs e o iGoogle, mas há outros: o Google Notícias, o Google Reader e a plataforma de blogs Blogger. Outro site da Google que vem sendo muito utilizado pelos blogueiros é o Analytics, sobre o qual discorreremos no penúltimo tópico deste capítulo. O Google notícias é um serviço personalizável onde o algoritmo da empresa é utilizado para listar as principais notícias nos países onde este serviço é disponível (em 59 países, segundo disposto na página inicial do site), a página é divida em editorias (Últimas notícias, Internacional, Brasil, Negócios, Ciências, Esportes, Entretenimento e Saúde), mas limita-se a fontes parceiras da empresa naquele país (são duzentas no Brasil, segundo informação disposta no site). Há ainda uma opção específica para busca de notícias na web. O interessante do serviço é que além das notícias em manchete, o usuário pode acessar as demais notícias que se relacionam com as que aparecem em destaque. Assim, seguindo a lógica do algoritmo da empresa, as noticias de destaque são sempre aquelas que possuem mais notícias que se relacionam a mesma. Wilson Roberto Bekesas quando discorre sobre as novas interfaces da notícia através da web, inclui a análise do sistema de notícias da Google, e expõe: O Google News e os agregadores de notícias servem-se da tecnologia do que ficou conhecido como semantic web, que opera com metadados semânticos dentro da web, isto é, informações que descrevem o conteúdo, o significado e a relação entre todos eles de uma maneira que podem ser reconhecidos e agrupados pelos mecanismos de busca dos diversos banco de dados presentes na rede. O RSS faz parte desses metadados (Bekesas, 2006:76). O iGoogle é um serviço de RSS da Google, onde o usuário, através de um cadastro, pode personalizar as notícias que quer dispor em uma página configurável. A jornalista e blogueira Lucia Freitas diz que o iGoogle “é um sistema diferenciado de RSS, que não utiliza a dinâmica do código limpo (XML), e serve para compartilhar as informações que são dispostas num blog, por exemplo. O iGoogle (e o Google News) é só conteúdo, não mexe com o formato”. Na verdade, os serviços Google News e iGoogle se confundem, o segundo é um adicional ao primeiro, onde o usuário, mediante cadastro, pode configurar com mais precisão as notícias que queira acessar, inclusive, adicionando os seus próprios feeds e integrando informações de outros serviços da Google, como o G-mail e o Orkut, por exemplo. Pelo iGoogle é possível se identificar quais são as empresas parceiras da Google dentro do mundo da informação em nosso país, quais são os parceiros que oferecem conteúdo para tal serviço. O site oferece a personalização de notícias e informações de incontáveis empresas e sites do mundo, que seriam impossíveis de serem listados, são os gadgets e feeds que o usuário pode adicionar à sua página do iGoogle. Além das opções que a Google oferece, o usuário pode configurar os feeds de qualquer site que ofereça este recurso. Uma busca por novos gadgets e feeds nos retornou mais de duas mil opções, até o momento em que desistimos de continuar a busca. Basicamente, os gadgets e feeds são organizados em oito categorias: notícias, ferramentas, comunicação, diversão e jogos, finanças, esportes, estilo de vida e tecnologia. Dentre as opções oferecidas pela Google na categoria notícias, destacam-se as seguintes de empresas brasileiras: · Estadao.com.br, Meio & Mensagem, PCI Concursos, Folha Online, IstoÉ Dinheiro, Revista INFO Online, Clube do Hardware, UOL, Band Jornalismo, Terra, Google News Brasil, iG Último Segundo, Viva o Linux, Dicas-L, Geek, No Mínimo, Valor Online, Jornal do Comércio Online, IDG Now, Horóscopo Virtual, Baboo, Blue Bus, Info Money, BBC Brasil, Mundo Virtual, Portal do Desenvolvimento, Últimas Notícias FIAM-FAAM-FISP e Jus Naviganti. Vale frisar que algumas dessas empresas listadas acima oferecem diversos feeds e gadgets. No total, encontramos cerca de setenta opções ligadas a notícias no Brasil, mas existem inúmeras outras. Há, ainda, os feeds e gadgets mais populares, aqui listaremos as empresas brasileiras que não aparecem na lista anterior. São as cem (100) opções mais populares segundo o Google, o que corresponde às dez primeiras páginas de resultados da busca por novos feeds e gadgets, já que, como foi colocado anteriormente, são poucos os que se aventuram além da décima página de resultados de busca do Google, essa listagem apresentou apenas três resultados: · O Globo, G1 e Blog dos Blogs. Também, adicionamos os feeds e gadgets de empresas brasileiras que aparecem entre os cem (100) mais listados numa busca em todas as categorias: · iG, Charges.com.br, Frasear.com, Climatempo, Globo.com e Cotações BOVESPA. A mesma busca com o filtro BR (sites brasileiros), retorna as seguintes empresas nacionais ligadas à notícia: · SBCWeb.com.br, Macrofotografia, Tableless.com.br, Motorclube.com.br, Rasta.com.br, Just Lia, CavZodiaco.com.br, HotSurfers.com.br, iftk.com.br, eupodo.com.br, Três Minutos para o Sucesso, Inovação Tecnológica e Portal Exame. De todos esses serviços listados, existem aqueles que são oferecidos logo na página inicial do iGoogle, que pertencem às empresas diretamente parceiras da Google no Brasil. Além dos serviços da própria Google, aparecem serviços de grandes empresas noticiosas, tais como: Globo, iG, UOL e Folha Online, entre outras de dimensões menores já listadas acima[191]. Como se pode observar, as principais empresas de comunicação do país oferecem diversos serviços e feeds que podem ser acessados pelo iGoogle. As que não aparecem nas listas acima podem ser encontradas através de buscas específicas, de forma que nenhuma fica de fora. Dos oito grandes grupos comunicacionais brasileiros que listamos no primeiro capítulo, apenas o grupo Silvio Santos não retornou nenhum resultado dentro desta busca que empreendemos. O fato interessante que se pode observar nesta busca é que não há hierarquia entre os resultados, qualquer site que ofereça esse tipo de serviço pode aparecer na busca, seja ele de um grande grupo noticioso, de um grande portal, um serviço oferecido por um site qualquer ou um simples blog. De fato, podemos observar que, na web, nome e tradição são fatores de pouca relevância, o que se destaca, como esta pequena pesquisa revela, é o conteúdo dos sites, onde os mais interessantes para os usuários são aqueles que mais se destacam, não importando, inclusive, a sua relevância. Sendo assim, conclui-se que há um certo grau de veracidade na afirmação de que, na Internet, as empresas se encontram praticamente em pé de igualdade com o indivíduo e suas produções. Por fim, os outros serviços relacionados à notícia oferecidos pela Google são o Blogger, plataforma gratuita para a criação de blogs, e o Reader, um programa leitor de RSS que, assim como diversos outros similares (Bloglines, News Gator News Alloy, Bandit, Feedreader, Tristana, Active Web Reader etc.), permite a organização e leitura de feeds RSS através de um programa muito parecido com os gerenciadores de e-mail (tanto que o Yahoo mail oferece esse serviço integrado ao seu programa), de forma que, uma vez atualizados os feeds, o leitor pode lê-los off-line. A diferença básica entre o Google Reader e o iGoogle é que o segundo só pode ser lido online (além de não trabalhar com o código XML limpo como mencionamos, uma característica dos leitores RSS em geral). Como vemos, a Google através de seus mecanismos e tecnologias vem trazendo novas soluções para o mundo informativo, que incluem uma nova gama de possibilidades pela qual os usuários podem se informar através das novas mídias. Mesmo sem precisar produzir conteúdo, valendo-se dos conteúdos de outras empresas, a Google se apresenta hoje não mais apenas como uma empresa de tecnologia, mas também de mídia, e dadas as dimensões que a empresa vem ganhando, entende-se o porquê de muitos terem medo dela, ou outros que a incluem dentro de um novo cenário comunicacional sem a participação das empresas de mídia tradicionais, como preconizado no vídeo por onde iniciamos o presente tópico. Por essa análise, cremos que tal cenário não se desenha, pois como vimos, o que a Google faz é facilitar o acesso e servir de plataforma para que empresas e usuários desfrutem de suas produções, informações e conteúdos diversos. A totalidade dos conteúdos acessíveis pelos mecanismos da Google advém de grandes empresas informativas e terceiros, o que se faz por meio de diversas parcerias inclusive. Apesar de não acreditarmos em mundo comunicativo que venha a ser dominado apenas por empresas de tecnologia (além do próprio usuário), uma coisa é fato: a Google controla a informação centrada no usuário, algo que está fora do alcance das tradicionais empresas de mídia, trata-se de um novo negócio, um novo mundo informativo totalmente fora da lógica com a qual as grandes corporações de mídia tradicionais montaram os seus impérios, daí muitos entenderem que estes venham a ruir ou estejam sofrendo para se adaptar dentro desse novo contexto midiático. 2. Iniciativas Brasileiras “Despite all his imperfections, I’m a fan of men! I’m a humanist, maybe the last humanist” – Devil’s talking[192] Os Jornais Brasileiros na Internet Antes de analisarmos os dois grandes jornais paulistanos, vale traçar um pequeno histórico da inserção das empresas brasileiras de mídia na Internet. Em sua tese de doutorado (2002), o professor Gilson Vieira Monteiro analisa o posicionamento das empresas jornalísticas de Manaus na Internet. No decorrer de sua análise, ele destaca que “a ida dos jornais brasileiros para a Internet segue a trilha dos jornais norte-americanos, como tem sido prática recorrente na imprensa brasileira” (Monteiro, 2002:83). Monteiro revela que, desde a decisão de entrar na web até o modelo de negócio das empresas nacionais, segue-se os modelos adotados nos Estados Unidos, espera-se para ver o que eles fazem para depois fazer igual. Monteiro destaca quais foram os passos adotados pela mídia brasileira em sua empreitada na nova mídia, que se iniciou em 1995 seguindo a trilha do jornal San José Mercury News[193] (2002:83-86): · 1995: o Jornal do Brasil (Rio de Janeiro) disponibiliza o conteúdo do seu impresso em uma versão online, o JB Online; o O Grupo Estado entra na Internet através do site NetEstado, da Agencia Estado (que incluía o conteúdo do jornal O Estado de S. Paulo); o Revista IstoÉ (Editora Três) também entra na Internet. · 1996: o Revista Veja (Editora Abril) entra na Internet através do lançamento de um portal de serviços, o BOL (Brasil On-Line); o Grupo Folha lança o portal UOL (Universo On-Line), que passa a veicular, inclusive, conteúdos dos jornais do grupo; o Cerca de seis meses após o lançamento dos dois portais acima mencionados, o UOL absorve o BOL. O UOL transforma-se em provedor de acesso; o A RBS (Rede Brasil Sul) entra na Internet através do provedor de acesso Nuctecnet; o Diversos jornais lançam suas versões online, O Globo e O Dia (Rio de Janeiro), O Estado de S. Paulo e o Zero Hora (Rio Grande do Sul). · 1997: o A RBS lança o provedor de conteúdo ZAZ, de forma que o ZAZ/Nectecnet se transforma no maior concorrente do UOL; o Revista Veja é disponibilizada via web pelo portal UOL, assim como o conteúdo integral do jornal Folha de S.Paulo (somente para assinantes). · 1998: o O UOL torna-se o maior provedor de acesso brasileiro e o maior site mundial de língua não-inglesa, com cerca de dois milhões de páginas e beirando dez milhões de page views/dia (Monteiro citando Freitas, 1999). O estudo de Monteiro destaca o fato de a tendência mundial de sinergia midiática ser algo que, dentro do processo de inserção das empresas brasileiras na nova mídia, ocorreu de forma avassaladora no Brasil. Ele exemplifica isso com a seguinte constatação: A tendência de fusões e aquisições e parcerias, que parece ser regra no Mercado da Informação atual, foi antecipada no Brasil. Os dois concorrentes, lançados com três dias de diferença, no mês de abril de 1996, estavam fundidos em novembro do mesmo ano, com o segundo ‘engolindo’ o primeiro (...). A velocidade com que o UOL absorveu o BOL é digna dos tempos de Internet (Monteiro, 2002:84). Com essa constatação, vemos que a Internet é uma plataforma onde se pode observar a convergência dos meios, também como um movimento da sinergia midiática. Observamos que as fusões de grandes sites e portais são inúmeras e se sucedem rapidamente. Além dessas grandes fusões, existe também um movimento numa escala menor que, para um rápido entendimento, chamaremos de “microssinergia”, onde os grandes portais absorvem inúmeros sites com conteúdo e serviços diversos. Quem nunca observou um pequeno site qualquer que, de um momento para outro, passa a ser veiculado sob a barra de navegação de um grande portal? Se fossemos quantificar essa “microssinergia”, um estudo à parte seria necessário para mapeá-la. De qualquer modo, serve para ilustrar a necessidade incessante que os grandes grupos de mídia têm em dispor conteúdos diversos e atingir públicos cada vez mais segmentados. Esse histórico que apresentamos até aqui é referente ao primeiro estágio da inserção das empresas brasileiras de mídia na Internet. O estudo de Gilson Vieira Monteiro aponta que a entrada do conteúdo noticioso na Internet seguiu três etapas: A primeira delas foi aquela em que os jornais on-line ofereciam, basicamente, o mesmo conteúdo dos jornais impressos. A segunda, de acordo com PAVLIK (John V. Pavlik. The future of online journalism: a guide to who’s doing. USA: 1997), ‘caracteriza a maioria dos melhores sites de noticias’. É quando o conteúdo noticioso amplia-se através dos hiperlinks e apresenta ‘características interativas como a dos sites de busca, que procuram material em tópicos específicos; e um grau de customização (customization) – a habilidade para escolher que categorias de notícias e informações que você quer receber’. A última seria a criação, pelos jornais, de material exclusivamente para WEB (Monteiro, 2002:78). O segundo estágio tem seu marco com o estouro da bolha da Internet, quando, após quatro anos de crescentes investimentos (1996 a 2000), o retorno não veio da forma como se esperava[194]. Essa “quebra” no patamar de investimentos na nova mídia varreu do mercado ciberespacial uma série de empresas pure play, sobrevivendo somente as mais estruturadas, sendo a maioria delas com negócios estruturados fora da Internet. Foi o momento em que surgiu a Globo.com., portal das organizações Globo que passou a prover acesso à Internet aliado do conteúdo exclusivo gerado por todos os veículos do grupo. Nesse segundo momento, não foi só a Globo que mudara sua postura diante do novo meio, mas todas as grandes empresas de mídia nacionais. Os grandes jornais passaram a reformular sites e portais informativos na Internet, como aponta a professora e jornalista Pollyana Ferrari: “O mercado passou a preocupar-se mais seriamente com a integração entre conteúdo de qualidade, design acessível e viabilidade financeira – a ser obtida (...) com a obtenção de receita por publicidade” (Ferrari, 2003:28). O patamar agora não estava mais somente ligado ao fornecimento de conteúdo e/ou acesso, mas também no retorno do investimento em publicidade. De 2000 em diante, as empresas informativas vêm evoluindo constantemente, pulando do primeiro estágio, passando rapidamente pelo segundo e chegando ao terceiro estágio, quando aparecem diversas empresas produzindo conteúdo exclusivo para a Internet. Esse estágio também conta com o surgimento e a ampliação das conexões de banda larga e, nesse cenário, aparece a empresa espanhola Telefonica que, através da compra do ZAZ, lança o portal Terra, e passa a concorrer no provimento de acesso e conteúdo exclusivo ao lado do UOL e da Globo.com, como um dos maiores provedores de acesso nacional. Outras empresas também passam a produzir conteúdo exclusivo, destacam-se o iG Último Segundo, e os próprios sites de diversos grandes jornais brasileiros, como O Globo e o Estadão. Grupo Folha O Grupo Folha, de propriedade da família do patrono Octávio Frias de Oliveira, é a quarta maior empresa de mídia em faturamento do Brasil[195]. Além do jornal Folha de S.Paulo, o grupo possui outros dois: Agora São Paulo e Valor Econômico (em sociedade com a Globo). Na Internet, possui três portais, o Folha Online, BOL e UOL (em sociedade com a Portugal Telecom), sendo os dois últimos também provedores de acesso. O grupo ainda possui o instituto de pesquisa Datafolha e, completando a cadeia produtiva e distributiva de seus produtos, possui editoras, gráficas e transportadoras. O principal veículo do grupo ainda é o tradicional jornal Folha, o maior do país que, em 2006, registrava uma média de 309 mil exemplares vendidos diariamente. A entrada do grupo na Internet se fez através da parceria com o grupo Abril com o portal e provedor de acesso UOL, em 1996. Beth Saad destaca em seu estudo que “a construção de uma identidade para o UOL teve, desde o seu lançamento, uma clara ênfase no aspecto mercadológico” (Saad, 2003:179). A estratégia seguiu o modelo das empresas norte-americanas Compuserve e América Online, como aponta um estudo dissertativo de Hélio Freitas (1999), que analisa a entrada do Grupo Folha na Internet. Freitas destaca o fato do UOL basear-se no provimento de conteúdo exclusivo (somente acessível a assinantes). O diferencial do UOL foi não utilizar softwares exclusivos de acesso como o caso dessas empresas (o browser exclusivo). A entrada do jornal Folha de S.Paulo na web, segundo o estudo de Righetti e Quadros (2007), “aconteceu com a criação do FolhaWeb, em 1995. Mais tarde o FolhaWeb tornou-se Folha Online, com uma redação própria, responsável por aproximadamente 60% do conteúdo – os 40% restantes são extraídos da versão impressa” (Righetti e Quadros, 2007:8-9) A Abril deixou a sociedade com o Folha e entrou a Portugal Telecom (que detém 27% do negócio). O negócio cresceu, abriu seu capital à bolsa e hoje o site beira um milhão de assinantes. É o quarto no ranking de acesso domiciliar do país (atrás do Google, Orkut e MSN). Righetti e Quadros apontam o UOL (em 2006) como “o maior provedor de conteúdo de Internet do mundo. A atual holding Folha-UOL S.A. foi criada em 2005 com a fusão do UniversoOnline” (Righetti e Quadros, 2007:8-9). O mesmo estudo esclarece que, com esse crescimento todo, “o UOL dialoga com um público muito maior do que o do jornal Folha de S.Paulo: são aproximadamente 35 milhões de pessoas que visitam o UOL diariamente, em contrapartida a menos de 2 milhões de pessoas que têm acesso ao jornal” (Righetti e Quadros, 2007:9). Hoje, o UOL, muitos poderiam dizer, é o veículo carro-chefe do grupo, pois, além de dialogar com um público maior, traz mais receita para o grupo. Como vemos, o Grupo Folha está presente na Internet através de dois portais de acesso e o site de seu principal jornal. As parcerias e sociedades ligadas ao grupo, tanto nacionais quanto internacionais, o colocam em convergência com a plataforma binária dentro da sinergia da mídia do modo como vimos no primeiro capítulo. O seu posicionamento na web, através de um grande portal, é a chave do sucesso do grupo dentro da nova mídia. Porém, em relação ao jornal, veículo que até o surgimento da Internet sempre fora o carro-chefe dos negócios do grupo, a mesma lógica não pode ser aplicada, pois, como destaca Saad, “uma outra característica definida nessa etapa para o UOL foi a sua estruturação separada da redação do jornal Folha de S.Paulo, constituindo-se numa pessoa jurídica independente e com seus espaços físicos também separados”. Em outras palavras, o sucesso, tanto do Grupo Folha quando do portal UOL, não pode ser atribuído à inserção do jornal Folha de S.Paulo na Internet. Uma das explicações para o sucesso do Grupo Folha com seu novo “produto”, o portal UOL, pode ser entendida pois este “tinha parte de sua sustentação financeira ancorada nas assinaturas de acesso à Internet” (Saad, 2003:196). Mas existem diversos serviços de assinatura de acesso à web; assim, o fato do UOL se manter no topo como maior provedor nacional pode ser entendido pela estratégia adotada pelo grupo que “promoveu a introdução contínua de inovações tecnológicas em seus serviços (...) surgiram a TV UOL, a Rádio UOL, o UOL News (...) programação on-demand em vídeo, imagens ao vivo e música” (Saad, 2003:196). A relação desse sucesso com o jornal, o carro-chefe do grupo até então, pode ser entendida pela seguinte colocação de Saad: “A condução do negócio sempre teve à frente executivos do Grupo Folha, imprimindo a cultura Folha” (Saad, 2003:197). Righetti e Quadros enxergam a constante inovação do UOL que “continua seguindo sua definição de estratégias por meio de acompanhamento de mercado e por meio de tentativa-erro” (Righetti e Quadros, 2007:11), e também se referem à criação da TV UOL como um exemplo dessa estratégia. Como vemos, a partir do momento em que o Grupo Folha deixou a condução de seus negócios na mão de profissionais, seu negócio deslanchou, o que se refletiu inclusive na sua inserção na web através do portal UOL. A sua colocação frente ao capital aberto e internacional também pode ser entendida como um caminho que lhe conferiu larga vantagem em seu posicionamento na nova mídia. Tal fato fica evidente quando comparamos os dados atuais do grupo com o seu maior concorrente, o Grupo Estado que, com a manutenção de seu negócio sob o jugo familiar, hoje está muito aquém de seu concorrente. Porém, como enfatizamos, o sucesso do grupo não pode ser conferido ao seu principal veículo (ou pelo menos, o seu mais tradicional veículo), o jornal Folha de S.Paulo. Quando Saad analisa as ações do Grupo Folha que, partindo de uma parceria com a Abril na criação do UOL, passando ao domínio majoritário do mesmo, transformando-o numa nova pessoa jurídica e, inclusive, expandindo-o para outros países através da abertura de filiais e fusões com outras empresas (a PT Telecom através do portal ZipNet), ela revela que: (...) o conjunto de ações (...) reflete uma visão de longo prazo por parte do UOL. Uma vez consolidada a audiência e a captação de conteúdo, o foco principal esteve na organização do negócio para a expansão. Nesse sentido, verifica-se que as questões editoriais e o caráter de empresa informativa ficam cada vez mais distantes (Saad, 2003:198). Essa é a grande diferença do posicionamento do Grupo Folha para o seu concorrente que, como veremos adiante, procurou focar seu posicionamento em relação à Internet no seu know-how secular de produção informativa. Folha Online O site da Folha Online[196] tem no topo da janela um slogan que destaca a cobertura em tempo-real do site: “Primeiro jornal em tempo-real em língua-portuguesa”, uma pequena frase que remete às análises que fizemos sobre as características da Internet, a instantaneidade e suas fronteiras delimitadas pelas línguas faladas, neste caso, a língua portuguesa. Ao contrário da simplicidade que destacamos através da análise da página inicial do site da Google, o usuário que entra na página inicial da Folha Online é golpeado, quase nocauteado, por inúmeras informações e links que a página oferece. O ponto de fuga leva os olhos do leitor para um espaço onde algumas fotos se alternam com destaque para diferentes manchetes, sendo uma delas a capa do veículo impresso Folha de S.Paulo e a manchete maior do jornal daquele dia. Ao lado, encontram-se as principais manchetes do site que se alteram conforme os fatos de maior importância vão se desenrolando durante o dia; inclusive, a página se auto-recarrega em intervalos de poucos minutos para que as notícias “em tempo-real” possam ser atualizadas. Fora deste espaço, o usuário é obrigado a percorrer o olhar por um mar de opções, links, thumbnails etc., inclusive distinguindo o que é propaganda do que é notícia, já que alguns anúncios são inseridos em meio às notícias e chamadas diversas. Um menu de links para os principais espaços do site, encontrado tanto no topo quanto no rodapé da página, remete às seguintes editorias/serviços/opções: Notícias, Especial, Serviços, Erramos, Colunas, Fale Conosco, Atendimento ao Assinante, Grupo Folha e Assine Folha, além de um ícone () para a ferramenta RSS, onde lê-se: “O que é isso?”. Como nós já comentamos sobre essa ferramenta em mais de uma oportunidade neste estudo, vale a pena destacar qual é explicação da Folha para este recurso: Aquele botãozinho laranja que muitos sites exibem no canto das páginas pode se tornar um importante aliado na busca pelas notícias que lhe interessam. Ele é a porta de entrada para um sistema que envia alertas para o seu computador sobre as últimas novidades publicadas na rede – mas só aquelas novidades que você quer saber. O sistema é conhecido como RSS. Ele permite acompanhar simultaneamente as novidades de um grande número de sites sem precisar visitá-los um a um. Em seguida, um tutorial passo-a-passo ensina o usuário a utilizar tal recurso. A cada link que mencionamos existir no menu principal do site seguem-se incontáveis sub-opções de links, de modo que a usabilidade do site fica comprometida para o navegante que se aventura atrás de notícias e informações da Folha Online através de seus menus. O termo usabilidade aqui só pode ser entendido como uma maneira de diminuir a confusão generalizada deste pequeno mar de informações. É comum o usuário, de um clique para outro, acabar passando do site da Folha para o site do UOL, como se houvesse uma dupla identidade agora atrelada a Folha. A Folha fica, de certa forma, submissa a marca UOL dentro do seu espaço virtual e, quanto a este fato, parece claro que a marca UOL é muito mais forte que a da Folha no ciberespaço. A opção de busca interna que o site oferece pode ser uma saída para quem não tem paciência para peneirar as informações dispostas na home do site ou no seu confuso menu de links, porém, a eficácia desse sistema sequer chega perto da limitada semântica do Google, de modo que os resultados podem ser extremamente frustrantes, algumas informações que sabe-se terem sido veiculadas pela Folha muitas vezes não são encontradas através deste recurso. Lucia Freitas, inclusive, expõe sua crítica ao sistema afirmando que “o sistema de busca do site é medíocre, não oferece busca booleana. (...) eu não entendo por que essas empresas não fazem uma parceria com a Google”. Essa frase de Freitas, na verdade, foi dita cerca de três meses antes da presente análise e, ao que tudo indica, nesse ínterim, as preces da blogueira foram atendidas[197] e agora o site da Folha Online dispõe de um sistema de busca que segue os mesmos moldes do Google (inclusive apresentando links patrocinados da gigante americana), onde pode-se efetuar busca booleana (de notícias da Folha Online e do jornal Folha de S.Paulo) e filtrá-las pelas editorias do site e/ou data de publicação. A confusão aumenta na busca de notícias quando o usuário clica sobre uma manchete ou sub-manchete qualquer; o resultado de um clique pode ser diverso, uma matéria em forma de texto simples, um texto acompanhado de fotos, áudio/videocast ou, até mesmo, uma página com novas manchetes para diversas matérias e conteúdos relacionados à manchete da página inicial (links para coberturas completas), o que obriga o usuário a novos cliques para achar a informação que deseja. Nesse caso, o webdesigner Luli Radfahrer aponta um número máximo de cliques para que o usuário chegue à informação que procura: quatro, e o quanto menos, melhor, menor a possibilidade de ele desistir de encontrar a informação. Vale destacar que, apesar da confusão inerente à quantidade de informação que o site oferece, na maioria dos casos o usuário chega à informação com quatro ou menos cliques, a busca por notícias arquivadas é que, na maioria dos casos, extrapola esse limite. Entramos na sessão Colunas e encontramos catorze diferentes colunistas e seus respectivos espaços de publicação e temas. São eles: Eduardo Ohata (esportes), Eduardo Vieira da Costa (esportes), Eliane Cantanhéde (política interna e externa, geral e comportamento), Fabíola Reipert (fofocas), Fernando Canzian (política norte-americana), Gilberto Dimenstein (política e geral), Hélio Schwartsman (filosofia), Humberto Luiz Perón (futebol), João Pereira Coutinho (política e geral), Kennedy Alencar (Brasília), Luiz Caversan (cultura), Luiz Rivoiro (crônicas), Sérgio Malbergier (finanças) e Valdo Cruz (Brasília). Dentre essas colunas, algumas dispõem, além de texto, de podcast. As colunas oferecem o e-mail do colunista como única opção de interatividade para o leitor; além disso, há opções para se imprimir a notícia/coluna, enviá-la por e-mail para um destinatário qualquer e comunicar erros, opções que são padrão no site, disponíveis não somente nas colunas, mas em qualquer notícia veiculada. Mas existem algumas exceções. Na matéria de maior destaque da Folha Online, há um espaço para comentário dos internautas que podem ser avaliados pelos próprios, mas somente para usuários cadastrados no site; nem mesmo os usuários do UOL, ou assinantes da Folha de S.Paulo têm acesso aos comentários sem um cadastro prévio. Os comentários também são mediados segundo um conjunto de regras e termos de condições de uso disposto no site que diz respeito a violações de direitos autorais e do bom-senso. Não entendemos qual o critério para que algumas coberturas tenham espaços para comentários e outras não. Ao que foi possível se perceber, somente as notícias provenientes das coberturas em tempo real, disponíveis na sessão Em cima da Hora (sub-sessão de Notícias), possuem tal recurso. Outras opções de interatividade leitor/site oferecida pela Folha é o contato com o Ombudsman, os chats com entrevistados especiais, enquetes e um mecanismo para o leitor enviar suas notícias. Além de tudo isso, existe uma incontável gama de opções de serviços que tanto a Folha quanto o UOL oferecem e que extrapolam o simples mundo da notícia. Além das colunas e outras sessões noticiosas e informativas, um espaço ao lado do logotipo da Folha Online, que só encontramos quando efetuamos uma busca pela palavra “blog” através do recurso de “buscar nesta página” oferecido pelo nosso browser[198], dá destaque para os blogs da Folha e outros recursos interativos: vídeo, áudio, além dos próprios blogs e das já comentadas colunas, sendo possível se navegar pelos títulos dos mais recentes posts de cada blog/coluna da Folha através de um minúsculo controle. Os Blogs da Folha Basicamente a única diferença entre os blogs da Folha e as Colunas é que os primeiros oferecem um espaço para comentários dos internautas em cada post, além das opções padrões do site. Outra diferença é que, ao lado do texto dentro das colunas, há um espaço para propagandas que nos blogs é substituído por uma barra de funcionalidades e opções que comentaremos adiante. No total, a Folha possui 24 blogs[199]. São eles:
As particularidades dos blogs são os blogrolls dos colunistas/blogueiros, as sub-sessões do blog e, também, a barra de título do blog que possui um design personalizado para cada um. Enfim, as sessões comuns dos blogs são: Perfil, Sessões do Blog, Sites Relacionados (blogroll do blogueiro), Blogs da Folha (blogroll da Folha), Folha Online Em Cima da Hora (com as últimas notícias da Folha Online), Busca no Blog e Arquivo. Ao final da coluna com as opções do blog, um ícone () permite ao usuário configurar o seu receptor de feed RSS para receber atualizações do blog em seu feedburner, e apresenta a página correspondente com o código XML (nem todos os blogs ou colunas oferecem esse recurso, veja abaixo). Outro link permite ao usuário configurar a página para ser vista através de um celular, o que leva o internauta a uma página do UOL com as instruções correspondentes para o uso de tal recurso. Esses recursos, além dos blogs, são encontrados em diversas outras sessões do site, como as Colunas e as coberturas do Em Cima da Hora. Em suma, a interatividade do site da Folha Online pode ser resumida através de seis palavras-chave: RSS, podcast (vídeo e áudio), e-mail, comentários, formulário e chat. No total, o site oferece uma lista com 49 opções de feeds, além de podcast e videocast. São elas: · Editorias: Ambiente, Bichos, Brasil, Ciência e Saúde, Cotidiano, Dinheiro, Educação, Em Cima da Hora, Equilibrio, Esporte, Ilustrada, Informática, Mundo, Painel do Leitor, Publifolha e Turismo; · Blogs: Bali 40 Graus, Cacilda, Circuito Integrado, Maria Inês Dolci, Soninha, Blog do Fred, Duilio, Fábio Seixas, Josias de Souza, Marcelo Coelho, Marcelo Katsuki, Rodolfo Lucena, Ilustrada no Cinema, Novo em Folha, Ilustrada no Pop, Toda Mídia, Tangos e Tragédias, Assim Como Você e Ciência em Dia; · Colunas: Brasília Online, Futebol na Rede, Regra 10 e Zapping; · Pensatas: Eduardo Ohata, Kennedy Alencar, Eliane Cantanhêde, Fernando Canzian, Gilberto Dimenstein, Hélio Schwartsman, João Pereira Coutinho, Luiz Caversan, Sérgio Malbergier e Valdo Cruz. De um modo geral, podemos dizer que a interatividade do site da Folha Online é baixa, os recursos interativos são escassos, e o sítio tem pouca usabilidade para o usuário. Os blogs são espaços muito parecidos com as colunas tradicionais do veículo, porém acrescidos de algumas opções e recursos interativos. Apesar disso, pode-se dizer que, dentro do site da Folha, são os blogs os espaços que contam com todos os recursos interativos de que o site dispõe, de modo que pode-se afirmar que “para a Folha Online, o blog é a mensagem”, pelo menos, talvez, a mais provida de interatividade. O Site da Folha de S.Paulo Além do site analisado acima, a Folha possui outro, o da própria Folha de S.Paulo[201], que é a reprodução do jornal impresso que vai às bancas em uma versão digital. Neste site encontramos as notícias que foram veiculadas na versão impressa do jornal, que ficam dentro de um menu de opções que remetem e correspondem a todas as editorias e coberturas do jornal. Todas as sessões do site são de acesso restrito para assinantes UOL ou do jornal impresso. Como assinante UOL, tivemos acesso a tais sessões e comprovamos que nenhuma delas oferece a mínima interatividade, sequer um e-mail para contato. Apenas a sessão Painel do Leitor oferece espaço para contato via e-mail, fone/fax ou endereço para envio de cartas, mas pelo número pequeno de inserções do leitor que encontramos em tal sessão, não dá para saber se todas as cartas/e-mails são efetivamente publicadas neste espaço ou se são, de fato, poucas pessoas que interagem dessa maneira. De qualquer forma, nos parece que a interatividade desse espaço é, eufemisticamente, extremamente limitada. Entramos na sessão Tendências/Debates na busca de, por fim, encontrar um espaço de trocas de idéias entre jornalistas e internautas. Tal espaço refere-se a colunas de cidadãos notórios que expõem sua opinião sobre variados temas (uma coluna para cada edição do jornal) e, como o próprio site descreve, tem o intuito de “estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo”, porém não há espaço para comentários dos internautas, um e-mail de contato ao UOL e não à Folha de S.Paulo é máximo de interatividade que tal espaço oferece. O que transparece é que a Folha de S.Paulo, através de seu site, tem mesmo o objetivo de estreitar laços com a comunidade e fomentar o debate público, porém, parece não saber como fazê-lo através deste específico espaço. Grupo Estado Principal concorrente da Folha, embora exiba um faturamento bem inferior ao grupo dos Frias (é o 7º no G8 da mídia brasileira[202]), o Grupo Estado não se rendeu às sociedades nem à Bolsa de Valores, permanecendo como o negócio da tradicional família Mesquita. O grupo detém dois jornais, o Estadão, que é o quarto maior do país em números de exemplares/dia (cerca de 230 mil em 2006), e o Jornal da Tarde (com cerca de 55 mil exemplares/dia em 2006). O grupo ainda detém uma agência de notícias (Agência Estado), duas rádios (Eldorado AM e FM – SP), além de outras empresas de diferentes atividades, incluindo marketing direto, TV Aberta (TV Eldorado, Santa Inês – MA), gráficas e transportadoras. Na Internet detém o portal Estadao.com.br, o classificados ZAP e o site de busca (ligado à OESP Mídia pertencente ao grupo), o iLocal. O Grupo Estado se diferencia do Folha por deter todos seus negócios (com exceção de uma parceria com a Folha no setor de logística e distribuição), ausentar-se do capital estrangeiro e, mais, todos seus negócios são concentrados numa única sede na capital de São Paulo. Em compensação, a presença do grupo na Internet ainda é muito pequena em comparação ao rival, embora seja pioneiro na web através da Agência Estado, o primeiro grande site informativo nacional. Seu portal na Internet abre para os diversos sítios das empresas do grupo, é produtor de conteúdo exclusivo (assim como a Folha através da parceria com UOL), mas não provê acesso e sequer figura entre os mais visitados do país. Segundo o estudo de Righetti e Quadros, o Grupo Estado sempre foi pioneiro no uso de tecnologia ligada a dados financeiros, que começou num amplo processo ligado a sua agência de notícias, “que envia a seus clientes indicadores econômicos em tempo real. Tal atividade foi aprimorada em 1991 com a criação da BroadCast, um serviço de informações econômicas que oferece notícias de economia e cotações, além de outras ferramentas” (Righetti e Quadros, 2007:12). Isso explica por que as estratégias e a entrada do grupo na Internet foram sempre lideradas pela Agência Estado, pois tal empresa já implementava a tecnologia a seus serviços informativos bem antes da chegada da web. Beth Saad, que fez um estudo sobre o posicionamento do Grupo Estado em relação à Internet, destaca que a construção da identidade web do grupo “resultou na criação de sites individualizados para cada produto informativo do Grupo” (Saad, 2003:174). O que se mantém até hoje, como pode ser observado navegando-se no site do grupo. Saad destaca o pioneirismo do grupo que “no final de 1988, o carro-chefe era a página da Agência Estado, conhecida pelos internautas como ‘Agestado’ (...) e alcançava a marca de 13 milhões de page views mensais, posicionando-se no segundo lugar da audiência web brasileira” (Saad, 2003:175). Hoje, os sites do grupo sequer aparecem na lista dos “dez mais”. Saad mostra que a entrada do grupo na Internet se fez através da Agestado, com a criação de um comitê que guiaria essa nova empreitada: “O Comitê New Media, um grupo de orientação e estratégia composto por representantes de cada unidade de negócios da empresa e gerenciado pela Agência Estado” (Saad, 2003:176-177). Assim, com esse comitê, “toda a infraestrutura de captação e transmissão de dados, e de manutenção das páginas do Grupo Estado, ficou concentrada na Agência Estado” (Saad, 2003:178-179). Baseando-se em declarações de Rodrigo Mesquita, diretor da Agência Estado (na época), Saad destaca qual a estratégia adotada pelo grupo em seu posicionamento na web: “A criação da identidade digital do Grupo Estado sempre teve como critério, até os dias atuais, o reforço do conteúdo gerado por uma empresa de credibilidade jornalística centenária, e que na web manteria os padrões” (Saad, 2003:177). Tal estratégia pode ter sido funcional para a entrada do grupo na nova mídia, mas não foi suficiente para mantê-lo no topo. Ao que parece, somente a credibilidade e a marca centenária não são garantias de sucesso no novo ambiente. Esse aparente “fracasso” pode se dar em função de um fato destacado por Saad, que compara o posicionamento do Grupo Estado com o Grupo Folha, que possui o portal UOL. Ela diz que “o Grupo Estado era considerado lento nas inovações e pouco voltado para o usuário” (Saad, 2003:177). Righetti e Quadros também apontam na mesma direção: O Portal Estadão foi desenvolvido dentro da própria Agência Estado, utilizando competências internas para a sua construção, mas sem possuir um rumo estratégico e sem explorar os potenciais da internet – por exemplo no oferecimento de serviços. O Portal não possui ainda uma redação exclusiva (Righetti e Quadros, 2007:12). O sociólogo e ex-diretor do instituto de pesquisa Datafolha, Prof. Dr. Gustavo Venturi Junior (USP), também vê na questão patronal essa letargia do Grupo Estado em sua inserção na Internet. Comparando o Estadão com o seu concorrente, ele demonstra que a ingerência familiar é típica como forma de retardo às inovações, inclusive, se torna um obstáculo ao capital: O Estadão sempre foi mais familiar. Quando eu trabalhava na Folha, agente costumava dizer que, pro bem ou pro mal, a Folha só tinha dois herdeiros. O Frias só tinha dois filhos, enquanto no Estadão, que era de uma família mais antiga e tradicional, você tinha vários Mesquitas, uns 10 ou 15 que iam chegando na empresa e que sempre a mantiveram bem familiar, em todas as áreas tem um Mesquita atuando. Isso deve ter retardado essa tendência de mudança mais moderna de gestão, de abrir o capital em relação às empresas familiares, de ter menos ingerência do dono original, ser menos pessoal. Outras empresas também passaram por isso. Aliás, é muito difícil para uma empresa familiar, com esse tipo de gestão, de ela abrir o capital, ela não encontra acionistas dispostos a lidar com as vontades pessoais, com os eventuais caprichos dos donos. Enquanto que se você tem uma previdência que não é, mesmo que acionista, mas não majoritária, mais aberta ao capital, isso favorece, em tese, à uma modernização, as relações no trabalho etc[203]. Apesar de ser considerado lento e retrógrado em sua inserção na Internet, o grupo sempre se preocupou com a inovação e de como tirar proveito dela, buscando parcerias que lhe pudessem garantir alguma vantagem no novo meio. Saad destaca que “o Grupo Estado aproveitou parcerias já estabelecidas, como o patrocínio de pesquisas com o MediaLab, o laboratório de mídia do MIT[204]”. A criação do mencionado comitê foi responsável pelas inovações do grupo em seu posicionamento num segundo estágio. Conforme Saad explica, o Grupo Estado “lançou em meados de 2000 o portal Estadao.com, priorizando o aspecto conteúdo. O portal foi fruto do Comitê New Media implantado na etapa anterior” (Saad, 2003:193). Apesar de lançar um novo site mais moderno, o posicionamento continuou praticamente o mesmo, sendo “oferecer conteúdo de qualidade para um público interessado nisso. (...) seu diferencial (...) era o know-how de geração e distribuição de conteúdos (...) por produtos segmentados e de acesso pago” (Saad, 2003:192). Essa segunda etapa voltou-se para a integração produtiva dos conteúdos a serem todos dispostos através de um único endereço web. Porém, mesmo dentro dessa nova filosofia, Saad revela que “a idéia de convergência de redações, a criação do portal não concentrou verdadeiramente as operações web do Grupo. Os jornais O Estado de S. Paulo e Jornal da Tarde, além da Rádio Eldorado, mantiveram suas páginas, fornecendo parte de seu conteúdo para o portal” (Saad, 2003:194). Apesar da mudança e a centralização de informações e produção de conteúdos através de um portal, Saad discorda do formato adotado pelo grupo como um verdadeiro conceito de portal. Ela diz: “Se aplicarmos o conceito de portal, o Estadao.com não apresenta aquelas características diferenciadoras do formato, que privilegiam a interatividade e a permanência do usuário nas páginas em função disso” (Saad, 2003:195). Talvez esteja aqui o diferencial que hoje se reflete no pouco apelo do site do grupo que, em comparação com o portal UOL do Grupo Folha – seu concorrente histórico –, possui uma audiência ciberespacial bem inferior. Pior, segundo dados da AJN, o jornal O Estado de S. Paulo perde mil leitores por mês, leitores que não renovam as suas assinaturas do jornal. Como vemos, o famoso Estadão está atravessando uma forte crise e, para piorar ainda mais o cenário, se não consegue manter seus leitores da versão impressa, tampouco conseguiu criar uma audiência de relevância (ao menos em comparação com seus concorrentes), dentro do ciberespaço. Estadao.com.br Como mencionamos, o site do Estadão[205] é mais do que a “versão online do jornal O Estado de S. Paulo” como está anunciado no título da janela do site; trata-se de um pequeno portal que abre para os diversos “produtos” do Grupo Estado. Assim, uma barra de navegação logo abaixo dos banners publicitários dispostos no topo da página dá acesso para os sites do Jornal da Tarde, AE Investimentos, Rádio Eldorado, iLocal, ZAP e Limão. O site possui um layout mais clean, mais dinâmico do que o da Folha Online, possui diversos recursos multimídia, interatividade e um portal de serviços que oferece variados recursos interativos/informativos ao internauta. Os mesmos problemas que descrevemos em relação à quantidade de informação disposta na primeira página do site da Folha Online se repetem no site do Estadão, mas de maneira mais suave, enquanto o layout do site da Folha possui diversos elementos separados por barras e linhas, no site do Estadão o layout é definido pelos espaços entre manchetes, textos e elementos multimídia, daí o site ser mais limpo. Também há ausência de publicidade em meio aos conteúdos da página, o espaço para propaganda é muito bem delineado na página (no topo e na coluna à direita somente), de forma que o usuário não precisa filtrar o que é notícia do que é propaganda. São menos propagandas no “espaço nobre”[206] da página inicial do site do Estadão (4), do que em relação ao mesmo espaço do site da Folha (6). Há menos links no site do Estadão (68) do que em relação ao site do rival (86) dentro desse mesmo espaço. Assim como o site da Folha, o site do Estadão possui diversas editorias que remetem ao conteúdo noticioso da empresa. São elas: Primeira Página, Opinião, Nacional, Internacional, Cidades, Esportes, Arte & Lazer, Economia, Tecnologia, Vida &, Suplementos e Meu Estadão. Logo abaixo desse menu de opções, à direita, há links para alguns dos recursos interativos/multimiádicos do site: · Fotos: arquivo de fotos do Estadão; · TV Estadão: que traz coberturas em vídeo; · Podcasts: dá acesso aos arquivos de áudio do Estadão; · Blogs: página de acesso aos blogs do Estadão, num total de 24 blogs; · Especiais: dá acesso aos “infograficos digitais” de coberturas diversas, são esquemas, tabelas, simulações e outros tipos de gráficos informativos; · Webmail: e-mail do Estadão; · Widget[207]: é um mini-leitor de RSS exclusivo do Estadão, que explica o serviço da seguinte forma: “Widgets são pequenas janelas que ficam visíveis na área de trabalho com o intuito de trazer informações e serviços de forma rápida a internautas. (...) o aplicativo agiliza o contato com as informações de que o usuário necessita. Cada canal de notícias (...) é alimentado pelos feeds do portal e são atualizados automaticamente”; · SMS: área para assinatura do serviço que entrega notícias no aparelho celular. Há também, dentro de cada editoria, em cada página, um quadro que traz as últimas notícias ao lado da opção de se navegar por meio de uma nuvem de tags – nome mais comum atribuído a tal recurso. E, vinculado às editorias, o recurso é disposto em todas as notícias do site. Os tags são palavras-chave que remetem a assuntos específicos; se, por exemplo, o usuário clicar no tag “crise no Vasco”, será redirecionado a uma página com inúmeras notícias relacionadas ao tag clicado. O mesmo quadro possui um link que apresenta a explicação do Estadão para esse recurso: Neste campo, chamado de “nuvem de tags” (...) Além de navegar pelas listas de matérias nas editorias, o leitor pode simplesmente clicar em uma tag e ver todas as matérias relacionadas com aquele assunto. Por meio destas tags, ou palavras-chave, os jornalistas do portal classificam as matérias segundo temas específicos. E é a partir delas que o sistema do novo portal compõe a chamada nuvem de tags, fazendo com que assuntos mais freqüentes sejam destacados, aparecendo com um tamanho de texto ou mesmo com cores diferentes. É um jeito simples e intuitivo de saber quais são os assuntos quentes do dia com apenas uma passada de olhos. Além disso, é por meio das tags que o usuário pode encontrar outros materiais disponibilizados pelo portal sobre aquele assunto de seu interesse. É um recurso interessante, mas que, além de facilitar, pode tornar confusa a navegação, um tag que relacione uma matéria a temas que também se conectam a outras editorias pode fazer o usuário se perder no meio deles, tanto dos tags quanto das próprias editorias, já que os tags são organizadas de acordo com estas. De qualquer modo, esse recurso possibilita uma nova forma de interação e navegação do usuário com as notícias. Ao final de cada matéria/notícia, o usuário encontra quais são as palavras-chave a ela relacionadas, são as tags individuais de cada matéria, e remetem a outras matérias/coberturas que por meio delas se relacionam. Todas as matérias e notícias do site do Estadão funcionam como um mini-blog, pois apresentam espaço para comentários dos usuários, além de outros recursos padronizados em todo espaço informativo do veículo. Além dos comentários, da nuvem de tags e dos tags relacionados, as possibilidades interativas oferecidas são: enviar a notícia por e-mail, imprimir, falar com a redação, incluir no arquivo virtual e também a opção para se avaliar a notícia entre cinco graduações (de ruim à excelente). O usuário também dispõe de uma opção para ajustar o tamanho da fonte de texto para facilitar a leitura. Além disso, há dois quadros que oferecem links para notícias relacionadas e últimas notícias da editoria em questão. Com exceção dos recursos de navegação citados, entretanto, para usufruir os demais recursos interativos do site, é necessário um cadastro prévio com CPF válido. Feito o cadastro, o usuário pode desfrutar dos vários recursos interativos do site, como o espaço Meu Estadão que funciona como um mini-Google News, porém limitado às editorias do Estadão. Nesta página, o usuário pode escolher entre sete editorias para dispor diferentes destaques hierarquizados numa página personalizável, além de uma manchete de um dos blogs do Estadão. Neste espaço o usuário também tem acesso ao seu Arquivo Virtual, onde pode acessar as notícias do site armazenadas através do link “incluir no arquivo virtual” que mencionamos acima. Ao longo de todas as páginas do site, incluindo os blogs, um ícone () direciona o usuário para a página que contém os feeds RSS do Estadão. O site oferece os códigos XML para que o usuário configure os feeds em seu leitor RSS, ou, conforme um pequeno menu de ajuda explica, através de dois ícones, +Google e +Yahoo, onde pode-se configurar automaticamente os feeds do Estadão para serem lidos através dos mecanismos dessas duas empresas. Entretanto, seguimos as instruções do site e não encontramos tais ícones. Nem todas as editorias e blogs oferecem o recurso RSS; são dez editorias e dezenove blogs que dispõem desse recurso, somando um total de 29 feeds. Não é preciso ser um especialista em análise de sistemas para perceber que o site do Estadão é organizado em torno das editorias, e tais funcionam como uma espécie de chave-primária que conduz a navegação do site ao lado dos tags que mencionamos. É em torno desse princípio organizativo que funciona o sistema de busca interno do site, que também oferece o recurso de busca booleana e a possibilidade de se filtrar os resultados da busca pelas editorias; no entanto, não é possível se filtrar notícias por data de publicação, num abandono ao princípio fundamental organizativo do jornal, conforme vimos nos estudos de Marshall McLuhan. Os Blogs do Estadão A página index dos blogs do Estadão apresenta 24 blogs[208], dentre estes, vinte são assinados pelo jornalista/blogueiro responsável, outros quatro são ligados a coberturas específicas e/ou editorias do jornal. Veja abaixo a tabela com todos os blogs do Estadão e seus respectivos donos e temas abordados:
Os blogs do Estadão são todos idênticos, seguem um único padrão gráfico (o mesmo do restante do site) e dispõem dos mesmos recursos. O site do Estadão não possui colunas, de modo que os blogs cumprem essa função para o jornal. Os recursos e informações comuns a todos os blogs são: · Perfil do jornalista/blogueiro; · Arquivo; · Sessões do Blog: que funciona como uma espécie de filtro para os posts do blog segundo uma série de sub-temas abordados pelo mesmo; · RSS (disponível na maioria dos blogs, mas não todos); · Busca no blog; · Blogroll do Estadão: com links para todos os blogs do site. O conteúdo multimídia de cada blog varia conforme o uso dos responsáveis; em alguns, além de fotos, vídeos e áudio, há pequenas enquetes. Existe também um link que leva para uma página com códigos de ética e conduta que são adotados pelo Estadão em relação às publicações, tanto para os blogs como para outras áreas do site. Ao final da coluna à esquerda, que dispõe os recursos do blog, há uma seqüência com uma dúzia de pequenos ícones que remetem a diferentes funcionalidades, na verdade, são links para alguns sites da web relacionados a novas práticas jornalísticas e comunidades virtuais diversas: Deli.cio.us, Blinklist, Digg!, Reddit, Newsvine, Furl, Blogmarks, REC6, Linkk, Eu curti, Yahoo e Technorati. Não há nenhuma explicação para cada uma dessas ferramentas/sites (só clicando e investigando para descobrir) e nem o porquê de elas se encontram ali, o que é, aliás, uma crítica de Lucia Freitas quando defrontada com esse menu de ícones: Você observa um monte de novas ferramentas que aparecem dentro dos sites, como este aqui (Estadao.com.br), e percebe que elas estão lá só para constarem, muitas ninguém usa aqui no Brasil, umas ninguém nunca ouviu falar, outras são ruins. E mais, não há uma explicação sequer de como utilizá-las. É uma coisa bacaninha, mas que não faz nenhuma diferença dentro do contexto do jornal. Eles colocam essas ferramentas só porque está na onda. Mais do que estarem lá “apenas para constar”, ou para transparecer que o site está conectado com as novas tendências que surgem na web, não observamos o mínimo critério para a presença de tais links dentro dos blogs do Estadão, ou o porquê de aparecem somente nos blogs. Não entendemos por que, por exemplo, não há um ícone/link para o site do Limão, comunidade do próprio Grupo Estado, e há para outras comunidades no mundo afora. A única dedução possível para a presença de tais ícones da forma como eles se apresentam é tratarem-se de uma forma sutil de propaganda. O Estadão de Hoje e o Jornal Digital No período de um ano que precedeu a presente investigação no site do Estadão, o Grupo Estado retirou do ar uma antiga página que correspondia à transposição do jornal impresso O Estado de S. Paulo em uma versão digital online. Atualmente, o usuário do site do Estadão pode acessar as principais manchetes dos cadernos do veículo impresso por meio de um link intitulado O Estadão de Hoje. Com essa atualização, o usuário pode usufruir todos os recursos que mencionamos do site do Estadão, para a leitura das notícias da versão impressa do jornal. Há uma restrição para o acesso às notícias do jornal, elas só são liberadas no decorrer do dia quando ficam “velhas”, não dando oportunidade do usuário “furar” a cobertura do jornal impresso via site antes que este chegue às bancas[210]. Além da reprodução das notícias do impresso dentro do jornal online, há mais duas maneiras de se ler o jornal impresso do Estadão, via download de arquivo PDF (recurso restrito a assinantes do jornal impresso ou digital) ou através do Jornal Digital[211]. O Jornal Digital oferece o recurso de se navegar por uma reprodução digital do jornal impresso, clicando-se sobre as manchetes e matérias dentro das páginas virtuais do jornal[212]. Um controle permite ao usuário virar as páginas como se estivesse folheando o jornal em mãos; ao clicar sobre qualquer manchete ou matéria, ela é ampliada para que o usuário possa lê-la, depois, o usuário pode navegar pela página ampliada (que, evidentemente, não cabe por inteiro dentro da tela do computador), através de um recurso drag and drop[213]. O Jornal Digital não é uma simples transposição do conteúdo da versão impressa para o site, e sim a reprodução fiel do jornal através de uma simulação digital, o que proporciona uma diferente forma de se navegar pelo veículo através do computador. Como alternativa à navegação via mouse, há também um controle que oferece diferentes formas para se navegar e encontrar os conteúdos do jornal, de modo que o usuário não fica totalmente refém da simulação digital para a leitura do impresso, podendo contar com diferentes maneiras de interagir. Enfim, após essa análise e tendo como parâmetros as análises que fizemos sobre os sites da Folha Online e da Google, fica evidente que a usabilidade e os recursos do site Estadao.com.br são limitados, porém muito melhores que os do site da Folha. Neste sentido, uma colocação de Lucia Freitas se encaixa perfeitamente dentro dessas constatações: “A Folha não faz Internet, o Estadão tenta”, diz a blogueira, e nós assinamos embaixo. Embora o Grupo Folha esteja à frente de seu concorrente dentro das fronteiras ciberespaciais onde, neste novo espaço midiático, o carro-chefe do grupo é o portal UOL, o site da Folha Online está muito aquém do seu concorrente e, nesse sentido, vale a lembrança de uma frase do blogueiro Tiago Dória, onde ele afirma que, no mundo da notícia, a audiência não é o bem maior de qualquer veículo, e sim a influência. Sendo assim, no quesito qualidade, o site do Estadão está na dianteira em relação ao site da Folha. Só nós resta saber se essa qualidade se reverterá em influência do jornal sobre o público dentro do novo contexto midiático digital da atualidade. Outra constatação que se encaixa aqui está na seguinte frase de Wilson Roberto Bekesas: “A Internet flerta com um layout hierarquizado como se fosse obrigada a respeitar as limitações do papel e das tintas” (Bekesas, 2006:84). Como vimos, o site da Folha é totalmente hierarquizado dentro das estruturas informativas ali dispostas; o site do Estadão, nesse aspecto, oferece algumas possibilidades surfáveis que ao menos tentam fugir dessa lógica identificada por Bekesas. Apesar de tudo, se voltarmos mais atrás em nosso estudo, veremos que esses espaços analisados evoluíram muito, basta lembrar que, em seus primórdios, as restrições ao acesso às informações eram muitos maiores e, hoje, ambos oferecem gratuitamente praticamente todo o seu conteúdo noticioso além de uma nova gama de recursos e facilidades. Para encerrar essa pequena análise comparativa entre os sites dessas marcas historicamente rivais da notícia paulistana, longe do entendimento dos especialistas faremos uma comparação à frase que muitos técnicos de futebol de grandes times costumam dizer por ocasião de um clássico: “Em um clássico equilibrado, são os detalhes que decidem o jogo”. Com isso em mente e da mesma forma, entendemos que são uma série de pequenos detalhes que nos fazem afirmar que, ao menos esse jogo, o Estadão está vencendo. O Portal Limão O portal Limão foi lançado no final de 2007, e marca a experiência do Estadão com a plataforma de jornalismo open source (com base em ferramentas Web 2.0), onde todos usuários do portal podem interferir no conteúdo disposto no site, que funciona como um grande wiki. André Bianchi, diretor de estratégias digitais do Grupo Estado, aponta que o lançamento do Limão vem quebrar a falta de investimentos do grupo dentro da nova plataforma, em especial no desenvolvimento de canais de comunicação com o público jovem. A idéia segue o forte apelo dos grupos sociais de relacionamento virtual, tais como Facebook e Orkut, mas com um apelo maior ao conteúdo jornalístico. O surgimento do portal vem atender à forte demanda que esses serviços possuem entre os internautas brasileiros, cujas comunidades, formadas em redes sociais, estão entre as maiores do mundo, refletindo a personalidade tupiniquim, que é cheia de calor humano. A diferença do Limão para as outras redes sociais está no conteúdo trabalhado no portal, que procura estimular produções de internautas que tenham relevância, dentro do aspecto jornalístico, para os demais usuários. Para a garantia de que os conteúdos gerados deixem as banalidades de lado, o serviço é monitorado 24 horas, mediadores interagem com os usuários sempre em busca de um denominador comum entre o interesse coletivo e/ou individual no que tange aos conteúdos gerados[214]. Para manter o nível das publicações, o site estimula a produção de conteúdo baseado em temas – as editorias –, dentre as quais, destacam-se Meu Bairro[215], Bandas (de música), Esportes e Minha Causa. Um dos estímulos para a qualidade está em premiações oferecidas pelo portal às melhores matérias publicadas ou, até mesmo, à publicação em outros veículos, no caso de algum furo vir à tona. O Limão começou baseando-se no modelo do Orkut, no qual somente usuários convidados poderiam se cadastrar no site, mas, devido ao alto número de convites, essa exigência foi deixada de lado e agora o cadastro é livre para qualquer um. Para efetuá-lo, entretanto, é necessário fornecer um registro de CPF válido. Uma vez cadastrado, o usuário cria o seu perfil customizado e tem acesso à área das comunidades, formada por diversos wikisites. Na área do wiki, qualquer tipo de conteúdo pode ser trabalhado, fotos, vídeo, áudio, texto e blogs (que eles chamam de blorum, mistura de blog e fórum). A aceitação do público ao novo espaço foi muito boa, em cerca de três meses na rede o site já chegava a cinquenta mil usuários cadastrados, embora essa avalanche inicial possa ser entendida como o resultado da forte campanha publicitária, que incluiu todas as mídias e eventos promocionais com apelo ao público jovem, encampada pelo Grupo Estado para o lançamento desse novo produto digital. A idéia do Limão é manter a interatividade, sempre fornecendo novas ferramentas e recursos que favoreçam a conectividade e a iniciativa do usuário, inclusive trabalhando dentro do conceito de open source, ou seja, permitindo aos internautas mais assíduos por tecnologia desenvolverem ferramentas para o site. Bianchi enfatiza que o foco está na inovação constante e no objetivo em se levar ao limite os recursos da Web 2.0. A meta do site é apresentar, pelo menos, uma grande novidade a cada mês. Também são exploradas outras publicações do Grupo Estado através de áreas específicas dentro do Limão, incluindo os jornais do grupo, área de investimento e a rádio Eldorado. Segundo Bianchi, o Limão não é o resultado de uma boa idéia, mas sim de uma “usina de idéias” que demonstram as novas estratégias do Estadão em relação às mídias digitais na atualidade. Política na Folha Online e no Estadao.com.br Como vimos no primeiro capítulo deste estudo, os jornais nascidos opinativos hoje seguem a lógica da imprensa comercial ideológica, que sustenta a indústria cultural e, neste contexto, são veículos de entretenimento e vetores do espetáculo. A palavra de ordem dos jornais é a informação e tal imprensa, antes opinativa, hoje é informativa. Embora os jornais sejam veículos que priorizem a informação, ainda existem espaços opinativos dentro destes veículos, como coloca o jornalista Eugênio Bucci[216] ao enfatizar que, nos idos do jornalismo, os jornais eram exclusivamente opinativos e, hoje, tais espaços ficam relegados aos editoriais e algumas colunas de jornalistas. Entendemos que o novo contexto da comunicação com o advento da Internet, como já destacamos ao longo desse estudo, dá um novo espaço, uma nova força para as formas de expressão mais opinativas e, ainda dentro deste novo contexto, outros aspectos ainda permanecem intactos, tais como a relevância social da discussão política, o que, dentro do que estudamos nas questões ligadas à esfera pública, ganha nova dimensão no novo cenário midiático contemporâneo. Como a imprensa de opinião é feita através de editoriais e colunas (e atualmente através dos blogs também), focaremos a análise a seguir em cima dos espaços opinativos desses jornais online, dentro das editorias políticas dos mesmos, de forma a tentarmos entender se eles, de fato, podem ser associados a essa nova tendência comunicativa de cunho opinativo e, ao mesmo tempo, se são fomentadores do debate político, debate que entendemos ser o mais importante na esfera pública midiática que, neste caso, volta-se para a Internet. No portal da Folha Online[217] não encontramos nenhum editorial e nenhum link intitulado “política”, a política fica inserida em dois links, em duas editorias, intituladas Brasil e Mundo, sendo que este último engloba a política internacional. No link Brasil, não encontramos nenhum editorial, apenas um espaço para colunistas. No link dos colunistas encontramos cinco colunas; em tais colunas, além da palavra dos jornalistas, a máxima interatividade oferecida pelo site é um e-mail de contato. As demais colunas seguem todas esse mesmo padrão. Apesar das opções de colunistas políticos indicados dentro desta editoria, os espaços opinativos que abordam a política dentro do site da Folha são os dos colunistas Eliane Cantanhéde, Sérgio Malbergier, Fernando Canzian, Josias de Souza e Fred Vasconcelos, o que inclui também os blogs, já que colunas e blogs são os espaços que, além dos editoriais, cumprem a função opinativa deste veículo jornalístico. O portal do Estadão[218] na Internet, assim como o site da Folha, possui links que remetem às editorias de assuntos nacionais e internacionais, que por sua vez levam às páginas com as principais manchetes de tais editorias e um sublink que remete diretamente a uma página de política, entre opções de outros assuntos relacionados à esfera nacional. A editoria internacional é dividida em assuntos por regiões do planeta. Não encontramos colunas dentro das editorias, mas existem manchetes que destacam os blogs dos jornalistas que comentam a editoria em questão. Em todas as notícias da editoria, existem espaços para comentários, porém pouquíssimos foram encontrados, talvez pelo fato de ser necessário se cadastrar no site para fazer uso de tais recursos. Não encontramos sessões editoriais dentro do portal Estadao.com.br, portando, jornalismo opinativo parece ficar por conta apenas dos blogs que cumprem as funções das colunas dos jornalistas. De forma sucinta, o site do Estadao.com.br parece ser a transposição das editorias do jornal impresso, acrescida dos recursos interativos e multimidiáticos da Internet. Não podemos atribuir o resgate ao jargão opinativo ou à esfera pública tanto no site da Folha Online quanto no site do Estadao.com.br, porém fica claro que este último oferece mais recursos e facilita o acesso à informação. Em ambos os sites a ausência de debates ficou clara, além de colunas opinativas, apenas alguns blogs cumprem tal papel. E também temos o fato de ambos os sites estarem inseridos dentro do contexto atual da mídia, o qual já comentamos anteriormente neste estudo, de forma que, de maneira geral, o jargão desses sites ainda é majoritariamente informativo, frio, neutro, objetivo e sem vida, o que os opõe a um dos pilares das novas mídias que, como destacamos, é a informalidade. E nos Blogs da Folha e do Estadão No site da Folha Online[219], um pequeno espaço ao lado do logo dá acesso aos blogs. Em tal link encontram-se 24 opções de blogs, cada um remete a um tema específico, tais como cultura, tecnologia, vida cotidiana, cinema, esportes etc.. Apenas cinco blogs fazem referência à política, e apenas dois são exclusivos de política, que são os blogs dos jornalistas Josias de Sousa e Fred Vasconcelos. Nem mesmo o blog da jornalista e vereadora de São Paulo, Soninha Francine, pode ser atribuído à política, já que este é um assunto de menor destaque do espaço. Encontramos também aqueles blogs referentes às coberturas políticas de momento, que incluem as eleições municipais brasileiras e a sucessão presidencial norte-americana (ambas de 2008) que, por se tratarem de espaços temporários, deixamos de fora dessa análise. No blog do jornalista Josias de Sousa, Nos Bastidores do Poder, encontramos um espaço para o jornalismo opinativo de cunho político, coluna do próprio jornalista com diferenciados temas relativos à política, principalmente da esfera federal nacional. O blog apresenta, além de texto, imagens, vídeos, charges e qualquer tipo de multimídia como é peculiar da Internet. Cada inserção do blog é acompanhada de diversos comentários dos internautas, porém a liberdade de expressão é limitada, pois ao enviar um comentário, este só é publicado após a aprovação do proprietário do blog. Há, também, uma limitação no número de caracteres dentro dos comentários a serem publicados. Ao publicar um comentário, o internauta tem a opção de colocar seu e-mail e endereço de seu site/blog, ou até mesmo qualquer link que queira, de modo que o blog favorece a interatividade entre seus usuários. Assim como os demais blogs vinculados à Folha Online, o blog do Josias não restringe o acesso às publicações mais antigas do site. A restrição fica no fato do jornalista não responder aos comentários dos internautas, o debate jornalista/internauta é então, inexistente. Os recursos interativos e típicos dos blogs encontrados neste espaço são RSS e o blogroll de Josias de Souza, que dispõe apenas de um link para um site externo à Folha/UOL. O Blog do Fred Vasconcelos é um espaço que segue o mesmo padrão descrito do blog do Josias, nem há o que acrescentar. A única diferença é que o blogroll do Fred não apresenta nenhum link para qualquer outro site externo. O espaço também é carente de conteúdo multimídia; além do texto, a única opção oferecida que o blog oferece são fotos. No Blog da Soninha, apesar desta ser vereadora de São Paulo e recente candidata a prefeitura municipal (na sucessão municipal de 2008), raros são os posts que se referem à política, o maior enfoque do blog é o esporte, em especial o futebol; isso se deve pelo fato óbvio da vereadora ser uma jornalista esportiva e apresentadora televisiva do canal ESPN Brasil. O formato do blog, da publicação dos comentários e tudo mais, segue o padrão que descrevemos acima no blog do Josias, portanto a liberdade de expressão é também limitada. A única diferença que encontramos foi o fato da vereadora comentar algumas respostas dos usuários dentro do espaço dedicado à publicação de posts, que se transforma, assim, num espaço de réplicas e tréplicas. Apesar dos recursos da Internet, o Blog da Soninha se ressente de conteúdo multimídia. Embora seja um blog de uma vereadora, teríamos de ser muito otimistas para atribuir tal espaço a um resgate da esfera pública, pois a vereadora utiliza seu blog mais para comentários sobre futebol do que para a política. O que poderia ser um espaço de contato e troca de idéias entre a vereadora e suas bases é apenas um espaço de escassos comentários políticos, muito mais voltado para o “mundo da bola” e outros assuntos sem a menor relevância, dado o cargo público que a jornalista ocupa. No blogroll da Soninha, além dos links internos para sites da Folha/UOL, há apenas o adicional de um link: para o site da Soninha. Nos links para os colunistas relacionados à editoria Mundo encontramos três colunas: Lucas Mendes, Laura Smith-Spark e Paul Reynolds, todos ligados ao blog da sucessão presidencial norte-americana que, como já dissemos, ficam de fora dessa análise. O portal do Estado de S. Paulo[220] na Internet possui uma barra de menu no topo de onde se pode acessar os blogs. O site oferece 24 blogs, onde se destacam diversos temas. Dentre esses blogs, três deles falam sobre política, os dos jornalistas Daniel Piza, José Marcio Mendonça e Marcos Guterman. No blog do jornalista Daniel Piza, o destaque principal não é a política, e sim cultura e futebol (o subject do blog diz: “cultura, futebol e, vá lá, política”), de modo que podemos descartar tal espaço como um espaço de debate político, inclusive pelo fato de não encontrarmos nenhuma notícia política em destaque nas primeiras páginas do blog na ocasião desta análise. Usaremos tal blog apenas para analisar a estrutura dos blogs do Estadao.com.br. Os blogs do Estadão não apresentam restrições de publicações de mensagens e nem de números de caracteres, o blog apenas avisa que mensagens que infringirem a lei ou tiverem conteúdos obscenos, ofensivos ou fora do escopo do blog serão apagadas, mas isto depois de já terem sido publicadas, de forma que a liberdade de expressão não é limitada como na Folha. A própria disposição dos comentários favorece a leitura, é possível também se publicar o e-mail e uma URL junto ao comentário, facilitando a interatividade. Também não há restrições de acesso às notícias mais antigas do blog. Um adicional que os blogs do Estadão têm em relação aos blogs da Folha Online é que estes oferecem um sistema de busca dentro do blog, outro fator que facilita a navegação interna. O blog do jornalista Marcos Guterman aborda política internacional. Se pensarmos no contexto do mercado da sociedade burguesa dos séculos XVII e XVIII, e o contexto do mercado atual globalizado, este é o blog que mais se aproxima de uma esfera pública de debates nos moldes de Habermas, dentre os blogs que analisamos até aqui, pois aborda a política internacional. A restrição fica no fato de que, assim como no blog anterior, o jornalista não responder aos comentários dos internautas. Através dessa análise dos blogs até aqui, podemos concluir que os blogs no Estadão têm, potencialmente, mais possibilidades fomentadoras de debate, além de possuir mais blogs voltados à política do que os blogs da Folha Online. Existem outros blogs no Estadão que concernem aos rumos da sociedade, que abordam assuntos de maior relevância, tais como educação, desenvolvimento sustentável, política social e globalização. Aos blogs, porém, tanto no Estadao.com.br como na Folha Online, falta o debate, desconfia-se que as tais ferramentas são utilizadas apenas a título de manter o site em consonância com as novas tecnologias, de maneira que não são utilizados da forma como poderiam ser: fomentadores do debate e da criação de uma consciência crítica dentro dos assuntos a que estão vinculados, estimulando um debate maior. Como vimos através dos blogs que analisamos, eles possuem a tecnologia que permite o debate jornalista/internauta, porém isso raramente acontece. Nesse sentido, tais espaços são espaços de colocação de opiniões e de exposição à mídia, não espaços de debates. Portanto, concluímos que muito se precisa evoluir em termos de uso em tais espaços para que eles ganhem relevância e se transformem de fato numa esfera de discussão pública, pois, até onde pudemos analisar, eles não se dão ao debate como poderiam se dar e alguns oferecem uma liberdade de expressão limitada. Veremos ainda neste estudo se o mesmo ocorre em outros blogs notórios nacionais. Da mesma forma, a questão do diálogo nos blogs será alvo de novas reflexões e questionamentos até o término deste estudo. E na Blogosfera Também A mesma análise que fizemos nos sites e nos blogs da Folha e do Estadão, estendemos a outros blogs que encontramos na web, blogs que são independentes, ou seja, não possuem nenhum vínculo com grandes veículos de mídia. Para chegarmos aos blogs independentes, utilizamos o site de busca Google[221] e, através da busca avançada que o site oferece, colocamos as palavras: blogs, blog e política[222]. O resultado nos levou aos seguintes blogs e respectivas descrições: · Alto Volta: O carioca David Butter faz excelentes e ácidas análises políticas do cenário brasileiro e internacional; · FYI: Paulo Modé é brasileiro, mora na Virgínia e é liberal até a última raiz do cabelo. Sempre uma alternativa saudável ao pensamento único da imprensa brasileira; · Yabbai: Rafael Caetano comenta, com muito humor e fotos a granel, a política mundial; · O Barnabé[223]: Um funcionário público de Brasília nos brinda com sua visão única e sagaz dos círculos internos do funcionalismo público federal; · Política Pura[224]: Blog de debate político; · Blog do José Dirceu[225]: Um espaço para a discussão do Brasil. Uma navegação prévia em tal lista nos fez escolher os seguintes blogs para análise: O Barnabé, Política Pura e o Blog do José Dirceu. O critério de tal escolha foi o cunho político de tais blogs. Os blogs que abordam assuntos genéricos, onde a política não é o único destaque, foram descartados. Descartamos nesta busca também os blogs que estavam vinculados a qualquer veículo de mídia, sendo alguns deles, aqueles que analisamos nos tópicos anteriores. O blog O Barnabé apresenta um cunho de crítica política, possui espaços para comentários e feedbacks, porém não encontramos sequer um único comentário em qualquer uma das notícias do blog, o que já o descarta como um blog onde o debate político estaria acontecendo. O blog Política Pura também apresenta um cunho de crítica política, mantido por um português, as críticas do site giram em torno de questões relativas ao cenário europeu e à política de Portugal. Assim como no blog anterior, não encontramos comentários sobre as notícias publicadas, demonstrando ausência de debate no site. O blog do petista José Dirceu, na verdade, é apenas mais uma área específica dentro do website do político. O blog apresenta várias matérias colocadas pelo político e diversos comentários dos internautas. Com a opção de se publicar e-mails e enviar as notícias a outros internautas, o blog facilita o contato entre os seus usuários. Não encontramos réplicas do político em relação aos comentários, mas, se o blog não se dá ao debate, pelo menos serve de contato entre o político e suas bases. Não podemos colocar esse blog como um exemplo do diálogo que existe nesta esfera, mas fica claro que esse tipo de iniciativa – um canal de comunicação entre um político e o público – é muito importante dentro de um país democrático. Ao analisar todos esses blogs, incluindo os da Folha e do Estadão, em nenhum dos casos pudemos bater o martelo na mesa e afirmar com todas as letras que qualquer um deles seja um exemplo claro do debate que estaria acontecendo na esfera dos blogs. Mesmo que encontrássemos um blog com notícias opinativas e fervorosos debates políticos, não poderíamos atribuir a apenas um, ou mesmo a uma dúzia deles, o surgimento de uma grande e nova esfera dialogal e de debate, ou até mesmo ao resgate da esfera pública vinculado à Internet em que viemos refletindo ao longo desse estudo. Embora os blogs que acessamos não demonstrem essa “força” política, o conjunto da totalidade dos blogs pode ter – tal conjunto, hoje, possui nome próprio: blogosfera – como mencionamos inúmeras vezes. Com essa análise, observa-se que os blogs independentes mostram ausência de debates e os blogs vinculados a grandes veículos de mídia impressos, que são de suma relevância como meios informativos e que poderiam concentrar mais as atenções dos internautas focando-a em direção ao debate político, não o fazem, mais se parecem com uma coluna jornalística inserida dentro de um jornal que, mesmo com os recursos interativos da Internet, mais se assemelham com seus irmãos impressos. Exceto pelos comentários dos usuários, nada de especial a que poderíamos atribuir o resgate da esfera pública foi encontrado. Apesar de serem espaços basicamente de opinião, também não nos foi possível perceber que eles estejam formando uma nova esfera de jornalismo de cunho opinativo. Em relação a esses blogs mencionados, eles não se assemelham, numa primeira vista, aos espaços de debates típicos das esferas públicas européias nos idos do jornalismo da Idade Moderna. Vale dizer que esse tipo de leitura que fizemos nos blogs acima foram realizadas em todos os blogs que são citados no decorrer deste trabalho. Podemos dizer que, com exceção de alguns pontos que ainda serão discutidos, não há nenhum blog que fuja muito das características descritas aqui. Por mais notório e navegado que seja qualquer um dos blogs que acessamos durante este trabalho, em nenhum deles pudemos atribuir aquilo que corresponderia a um possível “resgate da esfera pública”. Nos parece que tal resgate só pode ser atribuído, caso ele esteja de fato acontecendo, à Internet como um todo, não a uma única de suas “instâncias”, um de seus virtual settlements[226], como o blog e muito menos em um blog individualmente analisado. Outras Iniciativas Globo.com Uma notícia que impacta no cenário brasileiro das mídias digitais e que ganhou destaque em 12/04/2007[227], foi o prêmio recebido pelo Globo Online por sua aposta na Web 2.0 – o título de “case do ano” ofertado ao portal InfoGlobo. O destaque do portal, e que lhe valeu tal premiação, é o fato de permitir ao usuário interagir com todas as matérias publicadas, enviando comentários, vídeos e fotos através de uma ferramenta chamada Eu-Repórter. O site também utiliza funcionalidades tais como alerta de notícias, RSS e podcast. Vale citar que tal portal coincide com a teoria do “I-centric” que vimos nos estudos de Rosental Calmon, inclusive pela similaridade do nome da ferramenta (Eu-Repórter[228]), e por suas funcionalidades que vêm ao encontro das idéias do mesmo, idéias essas que vieram a público em agosto de 2005, exatamente um ano antes do lançamento do portal InfoGlobo (agosto de 2006), que registrou um crescimento de 60%, da sua abertura até abril de 2007, nove meses após seu lançamento. Esta notícia mostra como a Globo, maior empresa comunicacional do Brasil, está alinhada com as novas tendências dos meios digitais, sobretudo a Internet. As ferramentas utilizadas pelo site (alerta de notícias, RSS e podcast) também esbarram nas teorias de Nicholas Negroponte em sua obra A vida digital. Essas ferramentas são, até aqui, as únicas tecnologias disponíveis em massa na atualidade que poderíamos comparar com o conceito de agentes inteligentes de Negroponte. Neste caso, entretanto, a inteligência, ou melhor, o agente inteligente é o usuário, e o seu próprio grau de inteligência no uso desses e diversos recursos e que avalizará os benefícios, ou as dores de cabeça, que obterá delas. Além do Infoglobo, a Globo possui o portal G1 que, segundo Lucia Freitas, é o grande exemplo de como fazer Internet por parte das grandes e tradicionais corporações de mídia. Quando perguntada se os jornais brasileiros, na forma dessas grandes marcas nacionais, estão preparados para uma completa e total transição para o mundo digital, ela expõe: “Somente a Globo, pelo seu portal G1, é que realmente está fazendo algo bacana na Internet. Ela tem feito muito e com toda a sua cadeia produtiva, na TV, na rádio, na editora, nos jornais e no portal. A Globo está fazendo Internet”. Ela também expõe qual é a grande chave para o sucesso da Globo dentro de sua empreitada pela grande rede: “A Globo.com, o portal G1, é um portal bacana, usa tudo, da melhor forma possível, eles realmente estão na ponta, eles, inclusive, não estão ligados ao jornal O Globo e nem à TV Globo, esses sim estão fazendo Internet”. E mais, segundo Freitas, um dos sucessos do Globo.com está no fato da empresa ser a mais antenada com as novas tendências digitais: “A Globo é a única empresa a, por exemplo, ouvir os blogueiros, que faz estudo de usabilidade, que sabe olhar para as novas tendências e incorporá-las de alguma forma”, expõe a blogueira. Para Freitas, dentre as grandes empresas comunicativas brasileiras, a Globo é a mais “volátil” às mudanças, ou melhor, não tem medo de mudar, de ousar, e isso resulta na liderança que se estende das velhas mídias para as novas. Quem achava que a “revolução da Internet” iria pôr fim ao império da Globo no Brasil terá de encontrar outra saída para esta situação. A inserção da Globo na web demonstra o porquê da empresa ser a número um do Brasil. É o novo “default Globo de qualidade”. ESPN Brasil Durante a elaboração deste trabalho, sentado ao microcomputador e com a televisão ligada ao fundo no canal a cabo ESPN Brasil, em meio a devaneios dissertativos, ouvíamos os apresentadores e comentaristas desta rede televisiva bradando incessantemente: “Entre no novo site da ESPN Brasil, confira o novo sistema de navegação que traz uma revolucionária maneira de se interagir com o site. Entre nos blogs de nossos jornalistas, dê sua opinião, participe dos blogs de nossos programas, escreva para nós, participe também do nosso mural”. De tanto ouvir chamadas iguais a estas, nos rendemos a tal publicização e entramos no site da emissora[229]. Quando falávamos da questão da usabilidade relacionada ao sistema de busca da Google, ou mesmo à nuvem de tags do site do Estadão, a ESPN adotou uma solução que incorpora esses dois mecanismos. No topo da página do site, com destaque maior que o próprio logotipo da empresa, encontra-se um largo campo de busca onde lê-se em letras garrafais: /digite aqui o que procura. É um sistema de busca que incorpora o conceito de palavras-chave (como a nuvem de tags), busca e navegação. Quando o usuário digita algo nesse campo como, por exemplo, “futebol”, uma cortina se abre abaixo dele com links para as áreas relacionadas. Se o usuário não selecionar nenhuma das opções dispostas e clicar no botão para efetuar a busca, o site retorna com resultados e tags relacionadas (de uma forma muito semelhante ao sistema de busca Quintura). Os tags que o sistema retorna são as sessões do site, de modo que o usuário, à medida que se familiariza com esse sistema e seus tags, pode navegar pelo site somente através desse recurso. Mais do que facilitar o acesso às informações, o sistema facilita a navegação, pois, além dos resultados típicos de uma busca na web, dispõe a estrutura do site. Com certeza, esse é um grande exemplo de como a busca, aliada a outros elementos, compõe um fator-chave na criação de uma interface informativa baseada no conceito de usabilidade. Sem dúvida, o site da ESPN Brasil é um grande exemplo de usabilidade para o acesso à notícia e à informação. Sendo o slogan do canal “informação é o nosso esporte”, em relação ao próprio site, ele poderia ser: “usabilidade é o nosso esporte”. 3. Um Chat com Especialistas “I want you to be yourself” – Devil’s talking[230] Blogs, Blogueiros, Blogosfera e Mídia No decorrer desta pesquisa, navegamos por inúmeros blogs, mantivemos contato com diversos blogueiros e fizemos muitas perguntas relacionadas às questões que levantamos desde o início deste estudo. A análise a seguir leva em conta as respostas de dois pequenos questionários, enviados em duas diferentes oportunidades, num contato com um total de 32 blogueiros, dentro os quais dezoito acenaram positivamente para responder uma pesquisa via e-mail com cinco ou seis questões abertas sobre blogs, jornalismo e Internet. Desses dezoito que se disponibilizaram a nos atender, apenas oito responderam de fato a pesquisa, dentre os quais, dois, ou melhor, duas, as blogueiras Lucia Freitas (www.ladybugbrasil.com) e Carolina Terra (rpalavreando.blogspot.com) nos concederam a honra de responder questões com mais profundidade. Além disso, algumas questões que fizemos aos blogueiros concernem a outras questões que fizemos ao sociólogo e ex-diretor do instituto de pesquisa Datafolha, Prof. Dr. Gustavo Venturi Junior (USP)[231], que gentilmente nos elucidou questões ligadas às grandes empresas jornalísticas que observamos neste estudo, o Estadão e, com mais propriedade, a Folha, além do próprio contexto atual geral da mídia no Brasil. O primeiro contato que mantivemos com os blogueiros foi durante a Campus Party Brasil[232], realizada de 11 a 17 de fevereiro de 2008 no museu da Bienal de Artes de São Paulo. Na ocasião, abordamos pessoalmente treze blogueiros, explicamos o escopo de nossa pesquisa e pedimos um e-mail para o envio posterior de cinco questões abertas[233]. A nossa idéia era enviar poucas questões e, conforme as respostas que obtivéssemos, iríamos mantendo o diálogo com novos questionamentos até que as respostas nos satisfizessem. Apesar de todos os blogueiros terem se prontificado a responder nosso questionário, apenas cinco de fato o fizeram e, dentre estes, conseguimos manter um diálogo apenas com a blogueira Lucia Freitas que era, inclusive, a responsável pelo espaço Campus Blog dentro da Campus Party. Após uma série de trocas de e-mails, Freitas se dispôs a gravar uma entrevista em profundidade para nós[234], e assim o fez. O segundo contato que mantivemos foi por ocasião da banca qualificatória deste estudo, realizada em 08/09/2008 na Faculdade Cásper Líbero, quando os membros da banca nos indicaram uma matéria da revista Imprensa[235] que passava pela questão dos blogs, inclusive, nos pedindo para tentar um contato com os blogueiros mencionados na matéria. Foi o que fizemos, tentamos estabelecer contato com os dezessete blogueiros citados na matéria através de seus blogs. Desses dezessete, não conseguimos contatar quatro, aos demais enviamos mensagens[236] via e-mail ou, quando não encontramos um, via comentário no blog, e obtivemos o retorno de apenas três blogueiros, dentre os quais, estava Carolina Terra que, além de blogueira e profissional de Relações Públicas, é mestra em Interfaces Sociais da Comunicação (ECA/USP). Terra foi a única dentre os blogueiros citados na matéria com quem conseguimos manter um diálogo; assim, além das questões prévias[237] que havíamos enviado, tanto para ela quanto para os demais, conseguimos obter mais informações com esta atenciosa professora. Além desses, tentamos contato com mais alguns blogueiros que nos interessava questionar, dentre os quais, o único que nos atendeu, o blogueiro Tiago Dória, é formado em jornalismo (Universidade Católica de Santos) e especialista em tecnologia. O contato com Dória se deu em função de algumas informações que já havíamos obtido através de uma matéria em que ele fala ao caderno Link do Jornal da Tarde[238], e pelo fato de termos nos encontrado em um seminário sobre tecnologia e cidadania ocorrido na Faculdade Cásper Líbero em setembro de 2008[239]. Dória respondeu ao mesmo questionário enviado aos demais blogueiros citados na matéria da revista Imprensa e mais algumas questões que enviamos em réplica às primeiras. Veja abaixo o quadro completo com os blogueiros, blogs, tipo de contato e a receptividade que obtivemos nessa pequena empreitada investigativa:
Antes de analisarmos com mais profundidade os blogs que contatamos e as informações que obtivemos, algo precisa ser esclarecido. Na ocasião em que estivemos na Campus Party, os nossos estudos ainda não tinham apontado para a questão dos blogs como algo que merecesse a mais meticulosa atenção, como ficou evidenciado no seu decorrer. Sendo assim, o proveito que poderíamos obter, as informações e uma série de outros fatos ligados às atividades dos blogueiros durante a Campus Party não recebeu a devida atenção de nossa parte na ocasião. Se soubéssemos que o nosso estudo iria mirar para os blogs como o foi, teríamos feito mais entrevistas e participado de mais eventos ligados ao Campus Blog durante a Campus Party, tanto que nós estabelecemos contato pessoal com diversos blogueiros mas optamos por fazer apenas algumas perguntas via e-mail, desperdiçando uma preciosa oportunidade de manter um contato em maior profundidade e com mais riqueza, embora tenhamos obtido algumas informações significantes mesmo neste do caminho optado. Os questionários que enviamos a treze blogueiros que conhecemos durante a Campus Party não surtiram todo o efeito desejado. Embora todos os blogueiros, quando abordados face-a-face por este entrevistador, tenham se prontificado a responder, apenas cinco o fizeram. Entretanto, dentre os contatos que deram a devida resposta ao nosso pedido, destaca-se Lucia Freitas, que nos cedeu diversas informações, entrevistas e nos foram muito úteis, cujas informações enriqueceram de forma imensurável a nossa pesquisa. Assim, como pontificação final, a seqüência de entrevistas e contatos que fizemos para essa pesquisa foi: · Entrevista via e-mail com cinco blogueiros da Campus Party (fevereiro de 2008); · Entrevista em profundidade com a blogueira Lucia Freitas (12/06/2008); · Entrevista em profundidade com o sociólogo Gustavo Venturi Junior (29/07/2008); · Entrevista com três blogueiros contatados por meio de matéria da revista Imprensa (de 26/09/2008 a 24/10/2008); Como expusemos no quadro anterior, do total de contatos que fizemos, a receptividade foi baixa, apenas um quarto dos blogueiros que contatamos responderam a nossa pesquisa. Assim, o primeiro item que questionamos a respeito dos blogueiros é a receptividade, a reciprocidade, ela não nos pareceu ser grande coisa. Essa reciprocidade que obtivemos pode ser explicada pela dinâmica comum das relações entre blogueiros, segundo Lucia Freitas – talvez a blogueira mais experiente entre todos os que entrevistamos. Falando sobre a relação do trabalho dos seus pares com a peer production, a produção entre blogueiros, ela esclarece: Aliás, essa é uma característica dos blogueiros, a capacidade de compartilhar conhecimentos, todos se ajudam. Por exemplo, se você precisa de plug-in para uma determinada função que você precisa para o seu blog/site, você consegue rapidinho com os seus peers. Porém, os blogueiros têm muitas dificuldades de compartilhar conhecimentos que não sejam técnicos. Se você precisar de um blogueiro para te ajudar a pensar numa temática para o seu blog, aí você terá dificuldades em obter qualquer tipo de ajuda, nesse sentido, a produção do blog ainda é muito individualizada. Segundo Freitas, a produção do blog está em algum grau ligada à questão da rede como meio midiático que reflete o individualismo, o egocentrismo ou eu-centrismo que campeia a sociedade contemporânea (ou, ao menos, o mundo ocidental). Os outros fatos descritos se encaixam perfeitamente no resultado dos contatos que obtivemos. Dentre as perguntas que fizemos aos blogueiros, algumas se ligavam a questões mais ideológicas, como as ligadas à questão da esfera pública, outras foram mais de cunho técnico, quando buscamos informações sobre alguns mecanismos, softwares etc., esclarecimentos de foro tecnológico. E, seguindo a lógica apontada por Freitas, o resultado demonstrou que o segundo escopo de questões nos trouxe informações muito mais importantes e relevantes para esta pesquisa do que o primeiro. Apesar da pouca reciprocidade obtida através dos contatos através da Campus Party, como dissemos, não era essa a nossa expectativa; porém, na ocasião em que contatamos os dezessete blogueiros citados na matéria da revista Imprensa, desta feita, de fato, nós nos decepcionamos com o retorno obtido. Nós partimos do pressuposto que, se tais blogueiros atenderam à reportagem da revista, atenderiam a nós que estamos fazendo um estudo científico sobre blogs, cujo contato parte da matéria de qual participaram. O exemplo maior dessa “decepção” fica por conta do blog da Folha Online, Ilustrada no Cinema, que contatamos via comentário no blog. O jornalista que atendeu a matéria da revista Imprensa respondeu ao nosso contato alegando não poder responder por “não ser o responsável pelo blog”, e nos encaminhou a mensagem para um terceiro. Ficamos desapontados com o pouco interesse e descartamos a possibilidade de enviar as questões para este blog, assim como desistimos dos blogs que apresentavam algum obstáculo ao contato, como o requerimento de um cadastro para a liberação de comentários ou envio de mensagens, entendendo que isto é uma solução que não atende ao princípio da usabilidade, e sim ao da “espionagem”, o cadastro é primeiro dos mecanismos de serventia àqueles que querem monitorar os gostos e hábitos do seu público. Também os blogs que não possuíam espaços para contato foram igualmente descartados. Após essa frustração com a reciprocidade obtida, optamos por seguir essa trilha de estreitar os laços mais firmes, na busca de mais calor humano. Para isto, a mesma pesquisa que enviáramos aos blogueiros, enviamos para alguns contatos (aqueles que possuíam blog) dentro do nosso espaço na rede social Orkut[240]. A reciprocidade no Orkut foi menor ainda, nem sequer deveria ser mencionada aqui, somente a nossa frustração é que foi maior, pois mesmo entre quem contávamos como certa a participação em nossa pesquisa, não obtivemos praticamente nenhum retorno, à excessão do blogueiro André “Dedo” Salles, que não fazia parte de nossos contatos e, por livre iniciativa, encontrou a comunidade e respondeu uma das questões[241]. Vale dizer que nós não publicizamos tal fórum além dos nossos contatos dentro da comunidade. A reciprocidade nula do Orkut nos fez questionar, até mesmo, se o problema ocorrido em tais contatos não esteja no carisma do pesquisador, ou melhor, na falta de carisma do pesquisador, hipótese que não pode ser descartada. A tentativa do Orkut, nesse sentido, foi duplamente frustrante. Enfim, como diria Manuel Castells, o importante é olhar para o que há de positivo dentro dessa nova miscelânea digital, o que vale também para os nossos contatos. Vamos, então, relacionar os blogs e blogueiros que atenderam aos nossos pedidos:
Apesar de pequena, essa amostra reflete um pouco da pluralidade de temáticas que existe na blogosfera. Enquanto os blogs dos grandes veículos jornalísticos que analisamos através da Folha e do Estadão giram em torno de temáticas que esbarram com as próprias editorias dos veículos[242], fora do âmbito dessas grandes empresas o horizonte é mais amplo, intangível. Apesar disso, algumas temáticas são comuns e, como decorrência, aparecem nesta amostra: tecnologia, cotidiano/comportamento, meio ambiente e fofoca. Dentre esses assuntos, temos um de extrema relevância social, que é o meio ambiente. Lucia Freitas chama a atenção para esse fato, inclusive atrelando-o a um dos fatores de maior importância dentro dessa nova esfera digital, o poder atribuído à grande rede como vetora de um pensamento mais crítico: A discussão sobre a questão ambiental, do aquecimento global, é algo que tem sido amplamente debatido dentro da blogosfera, é um assunto que tem encontrado mais espaço nas novas mídias do que no jornal. Existem diversas ONGs atuando na Internet, utilizando-a como meio não só para o debate, mas no engajamento de ações e a blogosfera se mostra também atuante nesses casos. Ecologia e Internet têm tudo haver uma com a outra, a começar pelo próprio impacto ambiental dessa mídia que é muito menor do que a impressa, apesar da sucata que gera e do consumo de energia. O fluxo de informações da web também se mostra positivo para disseminar esse tipo de debate, onde as audiências se somam. A Internet, tanto para qualquer assunto ligado à mudança de comportamento, quanto para a educação, é fabulosa. O simples fato de você ter as pessoas na rede escrevendo, ainda que sejam aqueles scraps horrorosos do Orkut, já representa um imenso ganho. Porém, quanto inquirida diretamente se, em sua visão, a Internet tem de fato esse poder “conscientizador”, Freitas expõe: Em relação ao fato da Internet aumentar o pensamento crítico, eu acho que sim e não. Acho que quem é crítico é crítico, não porque passou a usar a web. Eu acho que a maioria dos blogueiros não tem capacidade crítica. Essa é também uma das críticas dos empresários a blogosfera. Existem alguns pontos, alguns blogs onde aparece a crítica, mas não é essa a regra geral. O Brasil, como país, não é um país crítico. Você não pode desconsiderar essa bagagem histórica e psico-social do nosso povo. Aqui as pessoas só têm o costume de criticar pelas costas, são incapazes de sustentar uma crítica olho-no-olho. As pessoas aqui não são capazes de cobrar seus políticos, seus deputados. Inclusive, eu acho que o brasileiro tem razão de não reclamar, afinal, ele nunca é ouvido. Mesmo no serviço de telemarketing de qualquer empresa, você liga para reclamar e eles fingem que te escutam. E quem está de fora dessa lógica, acaba com os nervos a flor da pele, vendo-se incapaz de fazer qualquer coisa. Isso também gera uma aversão à política que se torna algo natural. Talvez essa seja a grande característica da Internet: pela sua fisiologia acêntrica, se torna praticamente impossível encontrar uma única explicação ou um único ponto de vista para quaisquer que sejam as suas características e potencialidades. O meio não muda por si só as pessoas a sua volta, mas ele muda e molda a mensagem e, se, a nova mídia é mais positiva para gerar ações como as descritas por Freitas na primeira manifestação acima, podemos dizer que sim, que a nova mídia favorece um diálogo mais crítico, mesmo que seja no meio de toda uma dispersão advinda da pluralidade informativa do novo meio. Já a segunda manifestação de Freitas nos parece denunciar uma certa frustração comum entre as pessoas que entendem as novas potencialidades das novas mídias, que inclui alguns dos filósofos que usamos para embasar este estudo, e não as vê tomando forma dentro dessas mesmas potencialidades na atualidade social. Assim, afirmações como as de Pierre Lévy e Manuel Castells se encaixam aqui para descrever a Internet, tanto como novo meio capaz de discutir assuntos vitais à sociedade, quanto como vetora de novos comportamentos, da mesma forma que as ponderações de Jean Baudrillard nos alertam para os possíveis resultados, frustrantes, que essas mesmas novas mídias podem oferecer: a manutenção do status quo. Essa questão realmente suscita uma certa polêmica entre blogueiros e estudiosos diversos, por um lado muitos enxergam esse potencial libertário das novas mídias, por outro, poucos acham que isto de fato irá acontecer. Quando inquirimos diversos blogueiros sobre essa questão da consciência crítica, foi praticamente unânime a negativa de que os blogs favorecem esse tipo de despertar. “Acho que isso é atribuir um poder grande demais aos blogs”, diz Flávia Pegorin; ela crê que os blogs não têm esse objetivo, e sim o de informar imparcialmente, objetivamente, dentro dos mesmos moldes do jornalismo em geral: “E o papel do jornalista é, na verdade, informar com precisão a verdade plena, não despertar nada. Isso, quem decide, é o leitor”, diz a jornalista. Outros blogueiros seguem a esteira de Lucia Freitas, e não enxergam essa possibilidade nos meios, como Carolina Terra, que entende que “não são os meios que despertam a consciência crítica nos cidadãos”. Tiago Dória também concorda com essa afirmação, mas vislumbra algum potencial dentro da nova amplitude informativa da grande rede: “O que acontece é que, potencialmente e teoricamente, os blogs abrem espaço para que outras pessoas fora do mainstream possam publicar sua visão de mundo”. Mas em relação ao próprio jornalismo na web, incluindo os blogs, ele crê que “ele é o mesmo praticado no mainstream, só mudam os meios”. O detalhe dentro desta questão pode não estar no fato de a Internet e a blogosfera despertarem, ou não, uma consciência crítica na população de um modo geral, pois isto não depende só dos meios, mas de outros fatores: “Isso demora (...) passa por inclusão digital e muita, muita educação”, diz Lucia Freitas. E ela aponta qual é o grande ganho da web em relação a este ponto: Hoje o leitor não é mais tão passivo como antigamente, ele mudou. Hoje ele tem uma nova e ampla gama de informações que não vem mais apenas do jornal, têm novas leis de defesa do consumidor, institutos etc. No novo milênio, além dos meios tradicionais de comunicação, você tem a Internet como novo meio informativo. E através da web, as pessoas que lêem inglês e têm consciência crítica, puderam começar a exercer uma influência dentro de uma instância privada, ele pode construir uma rede própria de contatos, como no próprio MSN (que hoje tem cerca de 30 milhões de usuários no Brasil – dados da Microsoft), e exercer uma influência sobre essas pessoas que estão na sua rede, e sobre o que for, desde qual é o chaveiro mais confiável até questões políticas/ambientais, isto é, se você tem credibilidade com as pessoas que se relaciona. Se você usa a rede só para bagunçar, aí não funciona. Se a rede não é o meio que desperta a consciência crítica, ao menos é o meio onde se pode exercer essa consciência, mesmo que ela esteja mais conectada a uma instância privada. Se entendermos que a Internet ou qualquer outro meio seja vetor para o despertar de uma consciência crítica, subentende-se que tal consciência esteja adormecida, ou não exista. Tal adormecimento passa pelas questões que discutimos a respeito da indústria cultural e da sociedade do espetáculo, de modo que qualquer nova iniciativa que venha contrariar essa lógica, pode ser entendida como uma forma de contrapoder ao que se tem instituído. Seriam os blogs uma forma de contra-poder? Freitas expõe a sua opinião sobre este fato: Eu não sei o que é contrapoder. Na verdade, eu acho que a Internet pulveriza o poder, o diálogo. Os blogs podem servir aos dois lados, ele pode ser uma forma de protesto e também uma forma de conversão ao estabelecido. Tem muito blogueiro que de uma postura de militância política passa a defender posturas puramente comerciais. Mas, no meu entender, o blog é o espaço da crítica, da militância, do protesto, mas isso ainda é uma opinião minha e muito em função do feedback que eu recebo dos leitores do meu blog que, na grande maioria, acredita nesse tipo de postura. Mais uma vez, o grande poder atribuído à grande rede está na pulverização do diálogo e do discurso. Nesse sentido, podemos entender o poder democratizador da web em torno de suas características inclusivas, que são abertas a todas as formas de expressão, incluindo aquelas que não tinham espaço dentro dos tradicionais veículos de mídia (e ainda não têm). É lógico que tais portas não se abrem somente para o novo ou para os excluídos, mas para os tradicionais também. Influência e Credibilidade As ponderações expostas nos parágrafos anteriores podem ser relacionadas com outro fator-chave abordado durante este estudo, a questão da influência dos jornais e dos blogs sobre o seu público. Os blogueiros foram unânimes em creditar o seu poder de influência sobre os seus públicos, mesmo que essa influência seja a replicagem daquela que pertencia aos grandes veículos, onde os blogs seriam novas bocas que ampliam a voz do mainstream media sob um novo tom. “A blogosfera jornalística raramente cria sua própria pauta, simplesmente replica e opina a de outros meios”, diz o empresário Pedro Villalobos. Tal afirmação vai ao encontro dos estudos de Mariana Della Dea Tavernari[243], que percebe a blogosfera como um espaço de discussão e replicagem dos conteúdos do mass media. Fato de concordância de Lucia Freitas, ela credita o poder influente da blogosfera no âmbito da discussão, e não da produção: “Sim, no sentido em que se produzem ondas de reação a determinados fatos, como o bloqueio do Youtube. Não no sentido em que se produzem ondas de conteúdo próprio...”. Inclusive, a maioria dos blogueiros crê que o blog, hoje, é mais um dos instrumentos que compõem o mainstream media, independentemente de gerar conteúdo ou não. Tiago Dória entende que os blogs representam um novo caminho para os indivíduos “construírem a sua marca na rede”, a Internet representa o meio onde se “pode construir a sua reputação e credibilidade fora do ambiente de uma redação”. Ele próprio é o grande exemplo disso, nunca trabalhou em um grande veículo e construiu sua influência através da rede até chegar a ponto de possuir cerca de seis mil unique visitors em seu blog por dia. Sendo assim, ele também é o grande exemplo do quão inclusiva a Internet pode ser para aquele que tem algo a compartilhar. Como dissemos, a grande rede representa um palco aberto para as novas gerações de jornalistas que se formam a cada ano. Essa massa de profissionais que é abraçada ano a ano pela Internet poderá deslocar o centro da influência para fora dos grandes veículos com o passar do tempo. Dória, inclusive, afirma que, em breve, “a Internet vai passar a sustentar os impressos”. Ele acredita que a pluralidade da web representa o fim das formas autoritárias de distribuição da informação: “as pessoas não estão cansadas do jornal, mas de ler a mesma notícia duas vezes”, e isso pode ser um fator que venha a deslocar o centro maior da influência dos meios para longe das “totalitariedades” que, como vimos, são vetores do sensacionalismo e do consumismo no que tange ao mundo da notícia. Segundo Freitas: A questão da credibilidade é muito importante e tem vários níveis na Internet, que se somam e são contribuintes ao mesmo tempo, não é linear. A questão da tradição não entra aqui, um site que tem cinco anos aparece na frente do site do O Globo que tem quase cem anos. Na Internet a credibilidade se faz pelo círculo de relações, pelo conteúdo, pela apuração bem feita, por link que você vai ganhando, pelas suas ações. A credibilidade na web é construída dia a dia. (...) na web uma informação se replica por caminhos que são imprevisíveis, que não podem ser mapeados, que é por onde a credibilidade se constrói. Um post num blog pode gerar milhões de cópias e comentários, uma matéria no site de um grande jornal pode ficar lá para os poucos usuários que acessam determinadas áreas do site. Este último fator, apesar da crítica de Freitas, representa, na verdade, um ganho para o jornalismo, o fato de o jornal poder manter, na rede, um espaço para poucos usuários que não seria viável nos meios analógicos. Por outro lado, Freitas reafirma aquilo que já desconfiávamos, na Internet a tradição é algo muito relativo. Não adianta possuir uma grande marca se as ações dessa marca não forem ao encontro dos anseios dos internautas, afinal, a rede é a mídia dele. Ela exemplifica isso através de uma marca que não é centenária, uma marca que surgiu com o advento dos computadores, a Microsoft: Como que a Microsoft – a grande inovadora da web – passou a ser a grande vilã da Internet? Destruindo as ações positivas que tivera num primeiro momento através de suas ações negativas, quando passou a impor o seu sistema operacional, destruindo o Netscape, acusando seus usuários de pirataria. Em pequenas ações, devagarzinho, eles foram construindo uma péssima imagem. Hoje, apesar da Microsoft ter uma série de ferramentas muito legais, ela tem uma péssima imagem global. Mas dá para reverter, como eles estão fazendo através de suas efetivas campanhas de inclusão digital, aderindo ao OpenSource e outras ações. Em relação aos grandes jornais, Freitas entende que eles “estão perdendo uma excelente oportunidade de se reinventarem na Internet. Você tem hoje, cerca de 50 milhões de pessoas acessando a Internet diariamente, e essas empresas estão perdendo esse público”. Ela aponta o exemplo do jornal The New York Times, que perdeu milhares de leitores do dia para noite quando passou a cobrar pelo acesso das notícias em seu site. Enquanto isso, algumas iniciativas advindas dos usuários vão ganhando dimensões superiores a essas grandes marcas, onde temos os blogs[244]. Na mesma esteira de Dória, Freitas percebe o potencial dos blogueiros em exercer influência sobre seu público, pelo simples fato de estarem mais próximos de suas audiências. “O usuário que se informa através de blogs confia mais na informação que obtém dessa rede do que em qualquer veículo tradicional”. Tal afirmação reflete o conceito de rede social, o usuário é mais propenso a acreditar nas informações advindas de seus pares, e não de terceiros; isso reflete o próprio conceito da peer production[245]. Este fator também pode explicar a súbita adesão dessas grandes marcas, tanto dentro da esfera dos blogs, quanto nas redes sociais da Internet (como o portal Limão do Grupo Estado), como uma maneira de competir e incutir a sua influência no ciberespaço junto ao internauta. Mas não basta se inserir, é preciso interagir. Esse hiato pode explicar em parte o sucesso maior dos blogs independentes em relação aos blogs de grandes veículos: “Uma diferença significante do jornalista [de grandes veículos] e do blogueiro neste sentido é que o primeiro não responde a seu público; o blogueiro, através dos feeds, do e-mail, sim, e o tempo todo, muitas vezes tendo que lidar com os disparates de seus leitores – existe uma conversa nos blogs – e o jornalista, na maioria dos casos, sequer sabe o que os seus leitores estão pensando”. Esse fator apontado por Freitas é questionável, pois, como vimos, nós tivemos dificuldades de estabelecer um diálogo com os blogueiros[246] e, mais adiante, iremos nos aprofundar sobre essa questão no tópico “O Diálogo nos Blogs”. Apesar disso, cremos que o diálogo nos blogs é mais receptivo em relação aos grandes veículos devido ao fato do blog ser uma instância mais próxima do indivíduo, como já foi exaustivamente enfatizado. O sociólogo Gustavo Venturi Junior analisa a questão da credibilidade dos meios pelo prisma das grandes empresas; ele a relaciona com o conteúdo jornalístico: Quando você tinha somente o jornal impresso, as regras eram baseadas no fato da informação ir “ao ar” uma vez por dia, o jornal diário. Ou uma vez por semana se fosse uma revista semanal. Supõe-se que você tinha um tempo muito maior para a apuração das notícias e de preparo delas. Hoje, o noticiário da Internet fica em meio a uma disputa dentre os diferentes veículos, em que o que vale é você dar a notícia o mais rápido possível, até porque a possibilidade de correção depois é muito rápida. Isso acaba tornando o veículo menos confiável, pois volta e meia você vê saindo muita bobagem, que depois de uma hora ou duas vem o desmentido dizendo que não era bem aquilo. Venturi Junior reafirma as palavras de Pollyana Ferrari[247], demonstrando o erro típico das coberturas “em tempo real” online de grandes veículos, e entendendo como isto pode minar a credibilidade dos meios. “Ninguém quer levar furo” e, “isso é algo que tira um pouco da confiabilidade das notícias”. Philip Meyer aponta em seus estudos que, se, um determinado veículo chega a um certo grau de baixa confiabilidade, automaticamente se abre a porta para que um outro veículo ocupe este espaço (e ele fala disso em termos de viabilidade econômica para se criar um novo jornal). Na web, um meio muito mais inclusivo, esse é outro fator que pode deslocar a credibilidade de certos veículos para outras novas iniciativas e instâncias, mas não sabemos se os blogs serão capazes de absorver esse espaço caso ele venha a se abrir, ou, até mesmo, como se daria essa dinâmica identificada por Meyer dentro das características do ciberespaço. De qualquer modo, é mais barato se abrir um novo jornal na web, isto é fato. Outro fator relacionado à credibilidade/influência que Venturi Junior aponta como um vetor que poderá deslocar a influência dos meios impressos para a esfera digital jaz na baixa penetração desses veículos no Brasil. Ele expõe: Você tem que levar em conta que a leitura dos jornais no Brasil nunca foi muito ampla. Na Argentina os jornais têm uma tiragem muito maior em um país com uma população muito menor, isso por conta de perfil de escolaridade, perfil cultural da população. (...) Eu tenho a impressão que pode crescer a base de leitores e consumidores de notícias no país, mas que isso não passe mais pelo impresso. Como em lugares que o celular chegou e o telefone fixo não, e não vai chegar nunca mais. Com o deslocamento da base maior de leitores do terreno impresso para o digital e, relacionando isso com as posturas autoritárias dos grandes veículos, inclusive no ciberespaço, temos mais um fator que, potencialmente, poderá levar a um segundo plano a influência desses veículos com o desenvolver da grande rede. Mas este é um problema cujo cenário ainda não se desenha por aqui. Citando um exemplo ocorrido dentro da Folha de S.Paulo, quando após um acordo comercial com uma grande empreiteira, ela, subitamente, parou de ser referenciada pelo jornal como empreiteira passando a ser chamada de construtora, Venturi Junior vê neste tipo de atitude uma falta de bom senso por parte dos veículos: Então esse é um problema que está ligado com a perda, vamos dizer, do risco de perda da capacidade crítica dos jornais em se manterem independentes quando de fato eles dependem do poder econômico. Ao mesmo tempo eu acho que ainda está longe [a perda da credibilidade], a credibilidade dos meios de comunicação ainda é muito alta, inclusive da televisão. Embora tenha essas crises pontuais, eu vejo que a população de forma geral ainda não tem uma formação critica, uma educação critica suficiente para questionar os meios, e tende a achar que se saiu na televisão ou deu no jornal é verdade. Esse é um problema que, embora Venturi Junior enfatize não afetar os meios devido à falta de capacidade crítica do público, uma vez a mídia deslocada para o terreno cibernético, poderá afetá-la. Porém, na atualidade, nada indica que isso irá ocorrer. Ademais a credibilidade pode ser reconstruída, inclusive no âmbito das novas mídias como já refletimos. Venturi Junior, que além de ex-diretor do Datafolha é diretor do instituto de pesquisa Criterium, é cético nesse ponto: “eu acho mais fácil os jornais perderem público pela questão da mudança dos meios do que pela perda de credibilidade”. O que Venturi Junior nos diz é que esta falta de capacidade auto-critíca não chegar a recair sobre a opinião pública de forma a abalar a credibilidade do meio, mas se isso não atrapalha a empresa publicamente pode atrapalhar privadamente, ou seja, minar a credibilidade dos próprios jornalistas do veículo. Aqui cabe, mais uma vez, o exemplo de Luis Nassif que saiu da Veja contando histórias constrangedoras a respeito desse seu antigo veículo empregador. Ainda sobre essa mudança dos meios mencionada por Venturi Junior, o que entendemos como a convergência midiática em torno do bit, é assunto que abordaremos no tópico “O Fim dos Jornais Impressos”, adiante neste capítulo. O Jargão dos Blogs Como vimos no capítulo anterior através de pesquisas acadêmicas, a linguagem associada aos blogs é majoritariamente opinativa, narrativa, literária, informal e pessoalizada. Lucia Freitas entende a expressão dos blogs como um espaço opinativo, mas acha que não se pode taxar a linguagem dos blogs de uma maneira qualquer, pois diz que ela ainda está se consolidando: A linguagem dos blogs é mais opinativa, é mais pessoal. Nos blogs existe um espaço de argumentação que antes só era possível através dos livros, ou num zine. Mesmo os editoriais dos grandes jornais não são pessoalizados, sempre tem uma questão política em relevância. Mas a própria linguagem dos blogs ainda é algo que está se consolidando, esse fenômeno ainda é muito novo. Apesar de possuir um cunho opinativo, o blog nada tem a ver com as colunas ou os editoriais, espaços onde aparece a opinião dentro dos jornais, pois tais espaços carecem da pessoalidade que é uma das características da web, de modo que não há como comparar essas duas instâncias. Freitas acredita ainda que a linguagem dos blogs e da web já está influenciando o jornal[248], mas não crê que a liberdade de expressão atribuída aos blogs é algo que seja muito diferente do que acontece dentro dos jornais, a tal coerção que os jornalistas sofrem dentro de uma redação é algo muito relativo: “Em relação aos blogs serem mais livres de coerção do que os jornalistas de grandes jornais, eu não acredito nisso. Todo jornalista que trabalha para um grande veículo tem as restrições naturais de trabalhar numa grande redação e os limites das linhas editoriais”, diz a blogueira. Se se questiona a liberdade de expressão dentro dos grandes jornais, ela também pode ser questionada nos blogs, sobretudo naqueles que possuem contratos publicitários, patrocinadores ou estão inseridos em grandes veículos através de seus portais na web. De forma que não é somente o gatekeeper que se desloca para o usuário, mas sim todos aqueles fatores que são entendidos como coercitivos ou inibidores da liberdade de expressão. O questionamento que fizemos sobre uma propaganda de passagens aéreas disposta no Blog do Noblat[249] na ocasião do último grande acidente aéreo paulistano serve para ilustrar esse fato. Freitas, que hoje trabalha com consultoria e implementação de blogs, também fala de outro fator que está se deslocando dos jornais para a web, o sentido de coletividade, apesar de todas as características eu-cêntricas da nova mídia: Hoje, o jornalista trabalha sozinho na redação, não existe mais grupo de trabalho, hoje muitos veículos sequer fazem reuniões de pauta com o seu corpo jornalístico o que, quando eu trabalhei no Jornal da Tarde e outras revistas, era algo de praxe e fundamental para o exercício do trabalho da redação. Não existe mais equipe, time. Mas existem exceções, como a revista Veja e a Época. No trabalho que exerço em consultoria e montagem de blogs para diversos clientes, a gente sempre faz reunião de pauta. A reunião de pauta é um exemplo de peer production, de inteligência coletiva, que é realidade nos blogs, mas está desaparecendo das redações, um conceito básico de qualquer produção em grupo. Estas palavras corroboram as denúncias do Prof. Dr. Sebastião Squirra[250], quando ele nos disse que o jornalista nada mais faz na redação do que ficar à frente do micro, o que inclui, segundo Freitas, a exclusão da pauta. Ao que parece, o eu-centrismo não é uma exclusividade do internauta ou do blogueiro, ele também contagia o jornalista que trabalha conectado à web dentro das redações. Dessa forma, não seria somente o jornalismo que está se transformando em uma conversa, o jornalista também está se tornando um internauta. Inovação Já discutimos longamente neste estudo a questão da inovação advinda das novas tecnologias binárias interconectivas, incluindo o advento dos blogs[251]. Mas, e na opinião dos próprios blogueiros, qual seria a grande inovação para a prática comunicacional jornalística relacionada aos blogs e ao próprio webjornalismo? A blogueira Carolina Terra entende que o ganho obtido pelo jornalismo da era pós-Internet esteja no seu aspecto inclusivo e pelo avanço tecnológico obtido, que permite uma amplitude maior e mais rápida no acesso à informação: “as novas mídias agregam em muito ao jornalismo, pelo caráter de imediatismo, facilidade de publicação, de compartilhamento e de difusão”, diz a blogueira. Tal característica da web é também o que destaca Tiago Dória, que não só defende essa idéia, mas a representa em carne e osso: “o principal efeito do uso da plataforma blog para o jornalismo foi trazer para o mercado novos nomes e atores sociais”, expõe – sendo ele próprio um desses novos atores sociais. Ao caráter inclusivo das novas mídias, conecta-se a opinião da jornalista Flávia Pegorin, do blog Garotas que Dizem Ni, que percebe o surgimento de uma nova camada informativa jornalística através dos blogs, mas que, em relação ao jornalismo como um todo, agrega muito pouco. “À prática do jornalismo, em si, acho que agrega pouca coisa (...) acredito que a maioria dos blogs ditos ‘jornalísticos’ acabam se tornando mais sites de crônicas e de opinião, onde o autor dá sua idéia sobre os fatos”, afirma a garota “ni”. O imediatismo mencionado por Terra é descrito por Marcelo e Lyanne, do blog Viajante Consciente, da seguinte forma: “A notícia agora é como ‘fofoca’, espalha rápido porque não precisa passar pelo ‘editor chefe’ para ver se ‘a imagem do jornal’ ou ‘linha editorial da revista’ pode ser ‘prejudicada’ com a tal notícia. Aconteceu, postou. Simples assim”. O casal percebe o deslocamento do gatekeeper para o usuário web como a grande inovação dos blogs e da Internet. Em relação ao aspecto tecnológico, o blogueiro Pedro Villalobos crê que, hoje, a inovação esteja no uso racional das ferramentas e tecnologias por parte dos blogueiros (RSS, vídeo/podcast, microblog); já as grandes empresas e portais não sabem inovar com o uso dessas ferramentas, beneficiam-se apenas parcialmente com elas. O uso disseminado de vários devices, como câmeras digitais e telefones celulares, é outra inovação que permitiu ao cidadão comum ser incluído como repórter na grande mídia, o que aumentou icomensuravelmente o alcance comunicativo dessas empresas e da sociedade em geral. A cobertura do povo nas ruas sobre os eventos ocorridos em Nova York em 11 de setembro de 2001 foi o marco para essa “revolução”, segundo Villalobos. Willians de Abreu é outro blogueiro que faz coro a Villalobos no que tange ao uso ideal das ferramentas e gadgets por parte dos blogueiros, inclusive enfatiza que muitos são vistos “com maus olhos” pelos jornalistas ligados ao mainstream media pelo uso que fazem de tais recursos. Por isso, adverte: “use a coisa a seu favor” e, ainda, manda um recado para os grandes da mídia: “Ou respeitam os blogs os vendo de maneira sadia e utilizando-os a seu favor, ou continuarão sofrendo, como já estão, com a sua influência na rede”. O blogueiro André Salles, detentor de um blog de poesias, entende a nova prática jornalística da web e dos blogs como uma evolução que relaciona-se com a própria origem da grande rede, uma plataforma de compartilhamento de conhecimento: Acho que são a nova prática do jornalismo na atualidade. Agregam conhecimento de forma quantitativa e, por consequência, qualitativa. A fronteira entre o profissional e o amador torna-se cada vez mais tênue, de forma que a produção de conhecimento está agora na mão da população média. Temos com isso o surgimento de muito conhecimento não verificado/referenciado e de baixa qualidade, mas temos também muito mais conhecimento específico e embasado sendo produzido. Lucia Freitas, um dos grandes nomes da blogosfera brasileira, não acredita que o blog seja uma inovação para o jornalismo, ela entende o fenômeno dos blogs como o resultado da convergência do usuário sobre essa nova plataforma, o que, de fato, seria a grande inovação. Isto no âmbito da blogosfera, já no âmbito das grandes empresas jornalísticas, ela crê que o blog em nada inovou: “O blog só pode ser enxergado como uma inovação no uso que os blogueiros passaram a fazer dele, dentro dos jornais ele continua sendo utilizado de uma forma extremamente burocrática”. Inclusive, ela lembra que o tempo para se falar em inovação do blog já passou, afinal a ferramenta já tem mais de dez anos de existência. Apesar de não perceber muitos avanços, Freitas vê a inclusão de novas vozes na mídia como uma inovação dentro deste cenário: “a Internet se apresenta como uma ameaça ao status quo, pois esses meios [mass media] perderam o poder de dizer o que é que vale” – é o adeus ao gatekeeper. Freitas critica ainda o uso das ferramentas comuns dos blogueiros por parte das grandes empresas de mídia, pois entende que o uso maior e inovativo delas advindo está no usuário – e, vale frisar, especialmente nos blogueiros, que são usuários consumidores de tecnologia, são nerds, hackers, possuem facilidade de implementação e uso criativo das novidades que surgem – já o usuário dos grandes portais, majoritariamente, não possui esse perfil. Sendo assim, Freitas questiona o seu uso por essas empresas: “Tem um monte de jeito e um monte de ferramentas para você inovar dentro do jornalismo, mas, a questão é: elas são utilizadas? Como elas são utilizadas? Na Internet são muitas as inovações. Para mim, a grande inovação é que o ponto central delas está na mão dos usuários”. Com essas declarações, fica evidente que, apesar de existir uma série de tecnologias e ferramentas que vêm sendo utilizadas pelos blogs e pelos portais noticiosos, ainda é difícil se saber até que ponto elas têm efetivamente beneficiado os usuários consumidores de informação/conteúdo, e não somente os blogueiros ou jornalistas. Por outro lado, o número de novidades que surgem, confrontado com o pouco ânimo dos blogueiros em relação ao ganho obtido, em relação ao que foi agregado à prática jornalística com tantas inovações, nos mostra que ainda existe um largo potencial para evolução do jornalismo dentro da esfera virtual – a “revolução” está apenas começando. Para este potencial ser revertido em cinética, entende-se que outras inovações devem tomar lugar ao lado da inovação tecnológica, ou seja, ela passa por educação, programas de inclusão digital (e social) e o firmamento de novos hábitos ligados ao uso da grande rede e da mídia de um modo geral e massivo. Além dessas colocações diversas, pedimos a alguns blogueiros abordados pela pesquisa que nos dissessem quais são as palavras-chave que eles associam ao sucesso do blog. As palavras destacadas pelos blogueiros foram: espontaneidade, instantaneidade, simplicidade, abrangência, colaboração, produção coletiva de conteúdo, participação, democratização e “faça você mesmo”. Sem delongas, vemos que são palavras que nos remetem às características da própria Internet, não somente dos blogs. Vale dizer apenas que tais palavras expressam o novo patamar comunicativo delineado pela web, da mesma forma como descrevem a nova dimensão inclusiva da grande rede e dos blogs. Também expressam, na mesma medida, tanto a característica eu-cêntrica quanto a colaborativa da rede das redes. O Fim dos Jornais Impressos “Essa questão gera ainda uma incógnita extremamente absurda”, diz o blogueiro Willians de Abreu. Apesar da incógnita, a opinião entre todos que entrevistamos para este estudo é quase unânime em acreditar na manutenção do jornal impresso. Abreu acredita que “existe espaço para todas elas [mídias]”, porém, outros blogueiros entendem que, em algum momento, a Internet será a principal plataforma de mídia e jornalismo: “eu desejaria (...) que as revistas e jornais impressos passassem a ser a alternativa, sendo o produto original uma página virtual”, expressa Flávia Pegorin. A mesma opinião é compartilhada por Tiago Dória, quanto ao desaparecimento do jornal impresso, ele é contundente em afirmar que “não vai acabar”. Outros blogueiros preferem observar a lógica do mercado onde o jornal e a Internet teriam os seus nichos específicos: “os jornais perderão um pouco da fatia de mercado e muitos se restringirão à Internet (...) vão se complementar e encontrar os seus nichos de atuação”, prevê Carolina Terra. Terra expressa a opinião mais comum dos blogueiros, eles acreditam na co-existência das mídias impressas e digitais, remetendo essa questão às teorias de Roger Fidler, que fala da mídiamorfose, com os meios se fundindo, se complementando e criando um novo contexto midiático, mas sem que alguma mídia específica tenha que de fato desaparecer. Lucia Freitas é uma das partidárias dessa idéia. “Está provado historicamente que os meios anteriores não desaparecem (...) a Internet e as novas tecnologias aumentam as possibilidades de acesso a conteúdos; criam novos usos, mas não invalidam os demais”, diz a blogueira. Praticamente com as mesmas palavras, o blogueiro Marcelo Andrade faz coro a Freitas: “o surgimento de novas tecnologias não significa, necessariamente, o fim de outras”, afirma com veemência. Freitas acredita que o jornal impresso não desaparecerá, e sim que a concorrência da Internet acarretará mudanças no formato do jornal: O que eu acho que vai acontecer com o jornal é isso, uma mudança de formato, chegando quase ao formato de uma revista. O jornal standart é bom de ler na mesa do café da manhã, onde você pode apoiá-lo, dobrá-lo etc.. Novos formatos e tipos de diagramação são o futuro do jornal impresso, se esse formato vai ser tablóide, eu não sei, mas acho que o formato tende a mudar. A usabilidade (termo que usamos muito na Internet) do tablóide e dos formatos menores é muito maior que a do standart. Eu acho que no impresso, o grande caminho é a mudança de formato, entretanto duvido que os jornais brasileiros mudem de formato antes de qualquer outro país, porque aqui todo mundo é muito temeroso com qualquer tipo de mudança. Aqui tem-se muito medo de se bancar uma mudança dessas, que implica em investimento na mudança do parque gráfico, mesmo que no longo prazo isso signifique uma economia e um ganho para o jornal. Eles não sabem observar uma tendência, testá-la e aplicá-la. Essa é uma das características típica das empresas brasileiras que são empresas de família, mesmo que elas estejam hoje profissionalizadas. Com exceção da Globo, que é mais volátil às mudanças, afinal não é a toa que eles têm esse domínio todo. A usabilidade mencionada por Freitas é um fator também considerado por Pedro Villalobos dentro dessa “polêmica”, ele acredita na substituição do jornal impresso por uma página eletrônica, o e-paper: “O papel nunca vai deixar de existir, mas o jornal mesmo de papel talvez possa dar lugar a uma versão eletrônica que se atualize no decorrer do dia. Acessibilidade é tudo”. Já o casal Marcelo e Lyanne entende a questão da acessibilidade às avessas, eles consideram a usabilidade do papel: “o jornal físico (papel): não acho que vai acabar por causa da Internet. Você não leva seu note ou palm pra praia pra ler as noticias que gosta. Leva o jornal”. Depende, há quem prefira levar uma prancha de surfe para a praia ao invés de qualquer tipo de leitura. Como esclarecemos no início deste tópico, as nossas entrevistas com os blogueiros foram realizadas em dois rounds, o primeiro deles na Campus Party em fevereiro de 2008, e o segundo por intermédio da revista Imprensa de setembro de 2008. Apesar de nada mencionarmos nas questões que fizemos aos blogueiros no primeiro round, nós esperávamos que eles, de livre e espontânea vontade, atrelassem a questão do fim do jornal impresso (ou, ao menos, o fim da plataforma impressa), com o problema ambiental da atualidade. Achávamos que os blogueiros iriam ser os primeiros a defender a idéia de que a Internet é uma mídia mais ecológica do que o jornal impresso, porém, nenhum deles sequer chegou próximo a este entendimento. Sendo assim, no segundo round de entrevistas, nós induzimos os blogueiros a vincularem suas opiniões sobre o fim do impresso com a questão do aquecimento global. Entretanto, dos blogueiros entrevistados, apenas um manifestou a sua opinião levando em conta este problema, os demais simplesmente ignoraram a questão. Carolina Terra foi a única a relacionar a problemática ambiental em relação ao fim dos impressos, porém, em contrapartida, ela questionou o problema da sucata eletrônica gerada pelos dispositivos eletro-binários, considerando que além do “famigerado lixo cibernético”, como expôs, há muitos pontos que devem ser debatidos em todo esse imbróglio. Entretanto, dentre as vozes a que demos ouvidos para esta pesquisa, está naquela que possui mais peso a percepção de que o jornal impresso desaparecerá, sendo gradualmente substituído pela Internet e os novos dispositivos eletrônicos móveis: a voz do sociólogo e ex-diretor do Datafolha Gustavo Venturi Junior. Além de, por livre e espontâneo manifesto, acreditar que o fim dos impressos seja algo positivo para o meio ambiente, Venturi Junior crê que o jornal está conseguindo sobreviver mais do que se esperava: Não está muito claro o quanto que os veículos impressos vão sobreviver. Eu acho que seja uma questão de tempo, talvez a sobrevida deles seja maior do que se imaginou num primeiro momento, mas eu acho que dentro de duas décadas exista muito pouco em termos de jornal e outros materiais impressos, o que vale para os livros também. A tendência é essa, você agride menos o ambiente, você não precisa de uma produção tão grande de papel. Além do problema ambiental, Venturi Junior enxerga nos hábitos das novas gerações um indicativo para o fim da plataforma impressa: E, mais do que isso, estão surgindo gerações para as quais o meio digital é muito familiar, que não vão ter as dificuldades de adaptação que as gerações anteriores ainda têm. Eu lembro que teve uma época em que lançaram um software que você lia o jornal no micro e quando você virava a página ele fazia um barulhinho de página virando, para que as pessoas tivessem a sensação de que estavam manuseando o jornal impresso. Mas isso é uma necessidade de quem cresceu lendo o jornal no papel. Apesar dessas declarações, Venturi Junior entende que, mesmo relegado a um segundo plano, o impresso continuará existindo, pois é um produto que possui muito apelo para as velhas gerações: “É claro que existem setores da população, principalmente setores mais velhos, em que o jornal impresso continue sendo uma referência importante e cultural por muito tempo, pelo menos até que as novas gerações cresçam e se tornem os principais consumidores”. O medo de mudanças mencionado por Freitas como um obstáculo ao fim do impresso não é uma questão que, no entendimento de Venturi Junior, irá alterar esse cenário. Ele se apóia no exemplo de grandes marcas do jornalismo mundial para elucidar esse ponto de vista: Você tinha o New York Times nos Estados Unidos que resistiu muito para fazer mudanças, para ter uma edição online, mas agora já tem, torna-se inevitável. Acho que vai ser uma mudança gradual, vai chegar um momento que, talvez por tradição, ainda se mantenha, em respeito a alguns consumidores mais antigos, a versão papel. Mas isso vai diminuir ao longo do tempo e a outra vai crescer. Vai chegar um momento que, operacionalmente, não vai mais compensar ter uma gráfica e manter todo aquele operacional que o jornal impresso demanda. É uma produção industrial que era a única alternativa, na medida que surge a Internet que é mais barata, ela tende a se tornar a opção. Mencionando o cenário norte-americano, onde atribuímos a maior penetração da web no país como um dos principais vetores para a queda das tiragens dos jornais que se vê por lá, Venturi Junior acredita que o mesmo poderá acontecer por aqui, na medida em que a Internet for se desenvolvendo e alcançando públicos mais amplos. Isso é curioso, de fato a crise lá foi maior, talvez por causa disso. A penetração da Internet lá é muito maior e o crescimento foi mais rápido. Aqui no Brasil está crescendo muito, na América Latina é o primeiro ou está entre os primeiros, mas comparado com os Estados Unidos creio que isso fez diminuir a queda de vendas dos jornais por aqui. Acho que houve até um ganho, se recuperou um pouco das tiragens que vinham despencando. Mas creio que isso foi um soluço no meio de uma tendência que é de queda, vai ser difícil os jornais se manterem como estão. No médio prazo a tendência é cair. Outra mudança significativa apontada por Venturi Junior, e que deve alterar o cenário da mídia brasileira como um todo, inclusive podendo se reverter num fator de extrema influência dentro da questão do desenvolvimento e crescimento da web e, por conseqüência, levar ao fim da plataforma impressa é a convergência. Venturi Junior comenta a legislação brasileira do setor, e entende que ela tende a mudar de forma a abraçar o capital estrangeiro: Você tem dois movimentos muitos fortes, recentes. Um é a fusão de empresas de um modo geral, a gente tem assistido a grandes fusões nos últimos tempos, e isso vai desde siderúrgicas até empresas aéreas, de cerveja, do que você quiser, de qualquer área, todos os ramos estão passando por isso. O Brasil tem uma legislação restritiva ainda, que diz que empresas de comunicação se limitam a cerca de 20% de capital estrangeiro. Isso vem sido discutido, é um limitador que vem segurando muito as companhias desse setor. Aparentemente é um movimento que é difícil de segurar, vai ter muita pressão para se mudar essa legislação no curto prazo, abrindo portas para o capital estrangeiro. O capital circula livremente e vai a busca das melhores alternativas em qualquer parte do mundo, o Brasil é um mercado atraente, e esse capital vai querer entrar aqui. Tem conseqüências evidentemente, essa legislação, não tenho certeza se ela é de origem ainda da época da ditadura militar, mas ela é nacionalista, ela refere-se um pouco aos conteúdos, que vai fazer a cabeça das pessoas e coisa e tal, de certa forma é uma defesa aos valores culturais, da nacionalidade. Mas o mundo está cada vez mais globalizado, a Internet tem muito a ver com tudo isso. (...) Dessa forma, creio que essa legislação dentro em breve deve ser considerada obsoleta e vai se abrir o capital para outras coisas, isso em termos gerais. E, por fim, Venturi Junior percebe que a convergência não é um fator ligado somente ao capital. A questão do capital está, também, atrelada com a própria mídia em si, que hoje gravita em torno do bit. Ele expõe: Outro detalhe, que se relaciona com os meios de comunicação e a produção de conteúdo, é aquela questão da fusão, da convergência dos meios, aquela idéia de que em muito pouco tempo a gente não vai ter uma televisão aqui e um computador ali, vai ser tudo um aparelho só. O celular que vai ser ao mesmo tempo computador e TV, isso gera, para os meios de comunicação, uma disputa muito grande. Quem está na área de telefonia quer entrar na produção de conteúdo, e quem está na produção de conteúdo, quer entrar dentro dessa área dos meios diversos. É uma aposta que muita gente está fazendo, e vai ter muita mudança nesse sentido, com fusões, e o capital vai buscar essas oportunidades, quanto a isso eu não tenho a menor dúvida. A fusão do capital aliada à fusão dos meios é um indicativo de que novas formas de acesso à informação e à notícia comecem a tomar o palco geral da mídia. Dessas fusões, surge o ramo das Comunicações, sendo tal ramo o resultado da fusão dos setores da mídia, das teles e das empresas de tecnologia. Pode-se entender que tal movimento favoreça novas formas de interação com o mundo da comunicação que, majoritariamente, tenham como base as redes computacionais e as novas tecnologias binárias. Tal movimento também é um indicativo de que o jornal impresso, embora ainda não tenha desaparecido, está na berlinda – sem cadeira para sentar –, à mercê das Comunicações, aquela que deliberará o seu veredicto final. A Grande “Sacanagem” do Mainstream Media Além de blogueira, Lucia Freitas possui uma extensa folha corrida de serviços prestados para empresas jornalísticas ligadas aos maiores conglomerados comunicacionais nacionais[252], dentre eles, um que é objeto deste estudo, o jornal O Estado de S. Paulo pertencente ao Grupo Estado. Ela explica, sem meias palavras, qual é o grande absurdo praticado por essas empresas que lidam com a informação como uma simples mercadoria: o laço contratual com seus funcionários que produzem o seu conteúdo jornalístico/informativo: Para mim, a grande “sacanagem” da grande mídia é o laço contratual, onde tudo que você produz não é seu, é deles, queiram eles publicar ou não. Eles podem fazer o que quiser com o seu material, vender para qualquer outra instância sem te dar um centavo a mais por isso além do que está expresso em seu contrato, que é um mísero salário. E ai de você se você publica um texto “deles” no seu blog, eles te matam. O problema nem é você tomar um processo nas costas, é que “eles” vão te perseguir pela web, te difamar em toda blogosfera, te atolar de e-mails, vão te amolar até você tirar o texto da rede. Mas tem os casos em que você pode mesmo acabar recebendo uma notificação judicial por determinado post. Ou seja, a grande “sacanagem” do mainstream media está na apropriação intelectual desses veículos sobre a produção de seus funcionários, sobre aqueles que produzem o conteúdo dessas corporações. Basicamente, funciona como uma grande chantagem, ou o autor aceita ceder a sua produção sob as condições impostas pelos publishers ou fica sem espaço para produzi-la, algo que só é possível dentro de meios estanques e monopolizados por poucos. Este é um ponto no qual a Internet, como plataforma midiática, se apresenta como desmoronalizadora. A based-common peer production é a nova forma de produção de conteúdo intelectual que se apresenta como um parâmetro revolucionário dentro desse totalitarismo descrito por Freitas. Baseado na interconectividade da grande rede, trata-se de um conceito diretamente relacionado à inteligência coletiva[253]. Ao jornalismo, já expusemos que ele, entre diversas novas facetas e mídias, se apresenta na atualidade de uma nova maneira através da web: o jornalismo de autor, seja ele um único indivíduo ou vários. Alguns dos blogueiros que entrevistamos para esta pesquisa são exemplos de como a autoria ganha força dentro deste novo contexto comunicacional, dentre os quais, Flávia Pegorin, Clarissa Passos e Viviana Agostinho, as autoras do blog Garotas que Dizem Ni. Elas trabalham com conteúdo jornalístico em seus blogs e são patrocinadas pelo iG, um grande portal brasileiro, ou seja, possuem uma compensação financeira sobre o conteúdo que geram sem precisar abdicar de seus direitos autorais. Enfim, o blog também serve de exemplo de como a Internet é um meio de produção que apresenta diversas alternativas à maneira totalitária pela qual os tradicionais meios de comunicação de massa se apoderaram da produção intelectual até então, não só para os usuários que buscam conteúdo, mas também para aqueles que querem produzir. Porém, nem tudo são flores, o mesmo portal mantém com o blogueiro Tiago Dória um contrato de licenciamento de conteúdo pagando-lhe uma taxa mensal por sua produção, ou seja, se apropria de sua produção intelectual – um mesmo portal oferece novas formas mais justas de incentivo à produção, bem como pratica as mesmas velhas “sacanagens” de sempre. Sobre a apropriação intelectual da produção, Freitas continua o seu desabafo, inclusive se apoiando nas teorias de Karl Marx: Um dos grandes problemas dos portais e dos grandes jornais na rede é que eles ainda continuam funcionando dentro de uma lógica que se baseia no copyright, eles não pagam pela produção de seus funcionários, ao mesmo tempo em que se apropriam dela, vendendo-a e lucrando com ela. Eles pagam um salário mísero por uma produção que vai para diversos veículos, incluindo a Internet, a mais-valia virou tri-valia, poli-valia. Até um leitor que manda uma foto pro jornal, eles pagam uma miséria e depois usam e abusam dela do jeito que quiser (...) Enquanto não se modificar esse cenário relativo ao copyright, nada mudará na lógica dessas empresas, e eles não querem discutir isso, nem qualquer sindicato do setor. A ANJ sequer sabe o que é Internet, eles nem querer ouvir falar no assunto. Como vemos nessas palavras de Freitas, muito se fala da “revolução” que a Internet impõe ao mundo da comunicação, entretanto percebemos que tal revolução está diretamente atrelada a essa questão. Enquanto os grandes conglomerados de mídia continuarem cercando a mídia através do exercício do copyright, não poderemos atribuir grandes mudanças a Internet dentro do novo contexto midiático. Na mesma medida em que empresas fecham o cerco sobre a mídia com base na lei do copyright, elas correm o risco de, talvez um dia, ficarem de fora do negócio, quando, como observamos, o centro da esfera comunicacional não estiver mais no alcance delas, e sim, com o usuário. No Brasil, onde a mídia se apresenta como um grande oligopólio, o problema não pára por aí, Lucia ainda comenta sobre outras questões, outros tentáculos da mídia que cerceiam a própria mídia de diferentes formas, sobretudo, tentáculos daquela velha mídia enraizada nos negócios oriundos de uma época onde os meios eram ainda analógicos, a questão da distribuição[254]. A Pequena Roda Apesar de toda liberdade creditada à blogosfera brasileira, um porém pode ser citado. Lucia Freitas afirma que, sempre que existe qualquer debate sobre blogs, ou no lançamento de um novo produto tecnológico qualquer, muitos patrocinados por grandes empresas, como o Terra, por exemplo, ou mesmo como se viu na Campus Party no início de 2008, são chamados sempre os mesmos blogueiros para participar (sendo a própria um desses membros assíduos). Na Campus Party, como organizadora do Campus Blog, Freitas procurou mudar esse cenário chamando pessoas que estão fora dessa pequena roda, numa tentativa de abrir esse círculo. Foi uma maneira de ampliar e aumentar a diversidade da blogosfera nacional. Tal iniciativa de Freitas é fundamental, pois, se a blogosfera se fecha em poucos nomes, ela acaba fechando esse novo espaço comunicacional interconectado, o que não seria saudável quando se entende a Internet como um novo canal, de ampla capacidade comunicacional em duas vias, que é como ela se apresenta. Uma blogosfera fechada seria o mesmo que o fechado grupo midiático brasileiro que, hoje, além de poucas empresas (são oito grandes conglomerados de mídia nacionais), se constituem como um grande oligopólio. Uma blogosfera fechada também representaria um grande obstáculo ao diálogo, instância que é diretamente associada a esta ferramenta. Mas o que adianta existir diálogo se ele toma lugar apenas entre poucos nomes da blogosfera? Ademais, existe mesmo esse “diálogo” nos blogs? O blog é uma ferramenta de diálogo? É sobre isso que refletiremos a seguir. O Diálogo nos Blogs O blog, como ferramenta de publicação de itens datados com recurso que permite aos usuários comentar tais itens, não se apresenta como um recurso de diálogo. Neste quesito, podemos dizer que, no máximo, o blog favorece o diálogo, favorece a repercussão de fatos, mas não é uma ferramenta pela qual se possa dialogar. Quanto aos comentários, trata-se de comentários, e comentário não é sinônimo de diálogo. Dentre os inúmeros blogs que navegamos durante as análises do presente estudo, sempre procuramos observar onde estaria o tão proferido diálogo que os blogueiros atrelam a esta instância. Excluindo-se algumas raras exceções, não encontramos respostas por parte do blogueiros aos comentários de seus respectivos públicos, muito menos réplicas e tréplicas. A nossa busca encontrou blogs que apresentaram posts altamente comentados e outros com posts sem um único comentário. De qualquer modo, não encontramos diálogo na maioria dos blogs, dessa forma, podemos reafirmar aquilo que já havíamos detectado: os blogs são espaços de exposição à mídia, de publicização de fatos e pontos de vista, de colocação de opiniões, não são espaços de diálogo. Não é preciso citar o filósofo grego Sócrates para darmos a exata dimensão da importância que o diálogo possui, inclusive como meio para o despertar de uma consciência crítica, algo que buscávamos encontrar na web, sobretudo nos blogs. Porém, ficou claro que o blog por si só não favorece esse despertar, inclusive, por não favorecer o diálogo. Dessa forma, a tal conversa entre jornalista e leitor à qual o jornalismo estaria se convertendo é inexistente em tais espaços. Vale lembrar o quão difícil foi para nós estabelecermos um diálogo com os blogueiros que contatamos para este estudo, e quando conseguimos estabelecer o diálogo, ele se deu por outros caminhos que não passaram pelo blog. O diálogo se deu via e-mail, via instant messenger que são ferramentas de diálogo, assim como outras que foram designadas para este fim, como os fóruns e os chats, por exemplo. O máximo de diálogo que encontramos nos blogs foi entre blogs. Blogueiro comentando (via post) os posts de outros blogs, blogueiros que comentam e são comentados por outros blogueiros numa dinâmica que pode ser entendida como uma forma de diálogo. Uma notícia ou post qualquer que ganha repercussão em diversos sites/blogs que, no seu conjunto, formam uma espécie de malha dialogal sobre determinadas notícias/fatos. Mas se o diálogo se restringe aos blogueiros, o ganho para a sociedade, ou para os internautas, não representa um grande avanço, o avanço fica restrito à “pequena roda” que comentamos anteriormente. Mas também não podemos cobrar dos blogueiros, especialmente aqueles mais notórios que contatamos, por eles não dialogarem com o seu público (ou conosco), e nem a totalidade do público está interessada em interagir com o blogueiro. Como vimos, a audiência ativa dos blogs não chega a 10% e, dependendo do total de audiência do blog, 10% pode representar uma pequena massa de internautas à qual um blogueiro ou uma dúzia deles seria incapaz de dar conta, de dialogar ou interagir, por uma simples questão numérica. Basta pensarmos no blogueiro Tiago Dória, que possui seis mil visitantes diários: se 1% desses visitantes quiser estabelecer um diálogo com Dória, ele teria sessenta pessoas para dialogar por dia, haja fôlego – é algo inviável, teríamos, em apenas um blog, uma “mini-Torre de Babel”, o que dizer da blogosfera por completo? Talvez, se exista um diálogo nos blogs, ele exista mais fortemente nos blogs sem repercussão, nos blogs de baixa audiência, ou de audiência desprezível, pois nestes, a possibilidade do blogueiro interagir com seus “fãs” é maior, ao menos ele pode dar conta do diálogo. Tentar interagir com um blog notório, de alta audiência é tão difícil quanto interagir com um jornal nos tempos quando o único meio de contato eram as cartas postais. Para o usuário comum, como nós, o ganho que os blogs trouxeram neste sentido é praticamente nulo. Não existe nada mais comum ao usuário dos blogs do que comentar e ser completamente ignorado. Aqui, vale citar os estudos de Jürgen Habermas, ele revela que as esferas públicas políticas fomentadas pela imprensa nos idos do modernismo europeu eram espaços onde, dos nobres aos comensais, todos possuíam voz, mas para algumas vozes os demais ouvidos se abriam mais, possuíam mais peso, maior poder de persuasão que outras. O mesmo pode se dizer desse novo palco midiático que engloba blogs, blogueiros e internautas, mas com um detalhe que se amolda dentro das características duais da nova mídia: nos blogs o espaço para as vozes é maior e menor ao mesmo tempo. É maior porque o espaço para os argumentadores e para a argumentação é praticamente infinito, e é menor, pois no terreno virtual é mais fácil ignorar qualquer um, é mais fácil uma voz se perder no meio de tantas outras. Existe nos blogs também algo que podemos dizer estar mais próximo do diálogo, algo que encontramos mais comumentemente em grandes sites informativos, sobretudo na Folha e no Estadão[255], aqueles que analisamos anteriormente: os comentários sobre comentários inseridos, tanto nos blogs como em qualquer espaço noticioso que permite comentários dos internautas. São internautas que não se contentam em comentar o que está sendo noticiado, comentam também os comentários dos outros internautas, as vezes, com direito a réplicas e tréplicas tanto em discussões saudáveis, como em calorosas disputas retóricas e, as vezes, chegando a trocas de ofensas (dentro dos limites que as políticas desses sites permitem, geralmente sem o uso de palavras de baixo calão). Embora não pudemos atribuir esse tipo de debate ao resgate do diálogo em si, muitas vezes, eles formam, de fato, um pequeno diálogo que ajuda a multiplicar os pontos-de-vista sobre uma publicização qualquer, o que engandrece o uso desse tipo de recurso. Enfim, fica claro que apesar de existir um diálogo limitado nos blogs, ele é mais comum entre blogs e entre usuários, o diálogo entre blogueiros/jornalistas e internautas é que parece ser o mais carente dentro dessa nova esfera. Outro detalhe: esse limitado diálogo que encontramos nos blogs se dá de forma assíncrona, o diálogo síncrono, por sua vez, é completamente inexistente, o que limita ainda mais o blog como uma ferramenta dialogal. Como expomos, o blog é uma ferramenta que favorece o diálogo, mas as suas características intrínsecas não foram designadas para se dialogar. Estabelecer um diálogo unicamente com os recursos que são comuns aos blogs não está em congruência com a usabilidade de tais recursos/ferramentas, o blog não foi designado para este fim. Mas existe um diálogo que caminha ao lado dos blogs, que pode ser observado, inclusive, através de outros meios que utilizam a plataforma blog para estabelecer diálogo entre jornalistas/blogueiros e seu público; entretanto, o diálogo em si ocorre através de outras instâncias. Para exemplificarmos isso, vamos voltar ao site da emissora de TV a cabo ESPN Brasil. Como mostramos, o site da ESPN Brasil possui diversas ferramentas que os jornalistas, comentaristas e/ou apresentadores da emissora se apóiam no intuito de dialogar com o “fã do esporte” [256] onde, entre outros recursos, aparecem os blogs. Alguns jornalistas vinculados ao canal (e a outros grandes veículos impressos também), utilizam o blog como meio de diálogo, mas o diálogo se dá nos programas televisivos, quando o jornalista responde as opiniões de seus leitores. Nesse sentido, o uso dos blogs é positivo para o jornalista monitorar o seu público, sentir a sua repercussão e dialogar com ela. E o diálogo ganha mais força quando se estende pela televisão, de forma que o próprio canal estimula essa via interativa através dos blogs de seus jornalistas. Mas existe uma consideração dentro dessa característica de diálogo, que não é exclusiva da ESPN Brasil e sim de vários blogs, mesmo aqueles que não contam com o apoio de em canal televisivo. Entre aquele jornalista/blogueiro que faz esse uso dialogal do blog para aquele que monitora a sua repercussão com outros fins que, entre outros, poderia ser o de vender um produto qualquer e, em função disso, molda o seu discurso centrado na objetividade de “agradar gregos e troianos” (público e anunciantes/patrocinadores), existe uma fronteira tênue e de difícil percepção para o usuário desses meios. Basta dizer que, entre os blogs que visitamos para esta pesquisa, existem alguns que nós questionamos tratarem-se mesmo de um blog, alguns mais se parecem com uma página de classificados, a usabilidade advinda da simplicidade dos blogs no acesso à informação fica submissa e perdida no meio de tantos anúncios. Um blog sobre política mais se parecia com um diretório político virtual (pró MCcain). Alguns dos blogs mais notórios são os que mais possuem publicidade, de forma que é difícil saber até que ponto não é a publicidade que molda o discurso desses espaços e não a informação, a opinião e o próprio diálogo. Voltando ao site da ESPN Brasil, temos lá também o mural e os blogs dos programas e das transmissões, como partidas de futebol, por exemplo. Nesse caso, as pautas, os assuntos do dia ou os lances do jogo são postados e comentados pelos internautas. Em tempo real, os apresentadores/narradores/comentaristas vão destacando e respondendo aos comentários dos fãs num diálogo entre emissora e público. É claro que aqui, também, os comentários que são destacados ou respondidos representam uma pequena parcela do total, pois esse número extrapola qualquer possibilidade de se responder a todos[257]. Este exemplo, como inúmeros outros, inclusive fora da esfera dos blogs, demonstra que o diálogo na web depende de outras ferramentas ou da integração de várias delas. Sendo assim, um instrumento único de publicação por si só não estabelece diálogo ou, ao menos, não se apresenta como uma interface cuja usabilidade favoreça o diálogo. Este depende de outros mecanismos, seja um canal televisivo, seja um chatroom ou um programa de mensagens instantâneas e, até mesmo, o e-mail entre algumas possibilidades. Embora a ferramenta blog não seja a mais adequada ao diálogo, existem alguns recursos associados aos blogs que vêm sendo utilizados pelos blogueiros como uma forma de se manter um diálogo, ou de se estender o diálogo, dentre os quais um que vem ganhando destaque na blogosfera, o microblogging. Microblogging Existem várias ferramentas que vêm sendo associadas aos blogs e que analisamos através de outras iniciativas, como o site do Google, a Folha Online, o Estadao.com.br e o site ESPN Brasil. Dentre elas, destacam-se: nuvem de tags, blogroll, RSS e outros feeds e a busca. Entretanto, essas são ferramentas de navegação, de acesso à informação e de organização da mesma, portanto, são ferramentas que estão ligadas ao conceito de usabilidade, que possuem um intuito facilitador e não dialogal. Já o microblog é uma ferramenta de diálogo cujo uso vem ganhando força entre os blogueiros, embora não seja uma ferramenta de uso exclusivo dos blogs. Qualquer adolescente de classe média sabe como é ser convidado para uma festa de um amigo que faz aniversário e, chegando lá, excluindo o seu anfitrião, não conhece mais ninguém. Deslocado, acanhado, o adolescente passa a seguir o seu amigo durante toda festa até começar a interagir com outros que igualmente o estão fazendo e, então, consegue se socializar com os demais. A experiência que o usuário iniciante dos sistemas de microblogging tem é semelhante a esta, a diferença é que ela ocorre dentro do mundo virtual. O que você está fazendo agora? Pergunta o sistema Twitter[258], o mais popular entre os blogueiros brasileiros, logo abaixo da pergunta, um campo para o usuário responder a essa simples questão com, no máximo, 140 caracteres. Na partilha dessa informação, os usuários desse sistema ou de outros semelhantes, tais como Pownce, Plurk, Jaiku, FriendFeed[259] e Hello.txt, se dá o diálogo entre os usuários. Estes ficam conectados uns aos outros através do recurso de se seguir alguém e, com uns seguindo outros, se monta uma rede de relacionamento. O microblog é mais que uma ferramenta de diálogo, é também uma nova forma de se montar uma rede social através da web. Vale dizer que essas ferramentas não se apresentam como microblog, e sim como uma nova maneira de se formar redes sociais. O microblog pode também ser entendido como uma espécie de chat sem chatroom, com a diferença que, neste caso, é o usuário que monta o seu chatroom, através da escolha de quem seguir. O pequeno campo de texto das ferramentas de microblogging permite mais do que simplesmente compartilhar informações, permite compartilhar arquivos e links. E, no que tange aos blogs, podem ser associados a ele como um recurso de publicação cuja usabilidade está na mobilidade, como nos explica Tiago Dória, um dos primeiros blogueiros a fazer uso dessa ferramenta no Brasil: “Utilizo o Twitter (...) porque é uma ferramenta mobile que me permite comunicar e publicar conteúdo de qualquer lugar. Acredito que essas ferramentas [microblog, RSS e outros feeds] criam camadas a mais de informação. Nenhuma substitui a outra. Cada uma tem suas vantagens e desvantagens”. Uma das desvantagens do Twitter é a instabilidade do sistema que, volta e meia, fica fora da rede. Mas este é um problema comum a qualquer plataforma que esteja em desenvolvimento, que esteja crescendo[260]. Lucia Freitas é outra blogueira que vem se beneficiando com o uso do Twitter. Ela explica qual a chave para o sucesso dessa ferramenta dentre os blogueiros brasileiros[261]: O Twitter, na verdade, é um jeito de criar conversas em rede (...) em outro formato. Estamos no Twitter, no Pownce, no Plurk, no Jaiku, no Hello.txt e no que mais aparecer. O Twitter sai na frente pela facilidade de uso: a gente pode se comunicar por múltiplas ferramentas, literalmente em qualquer lugar. Tudo pode ser taggeado (com #) o que facilita as buscas – e há MUITOS mecanismos de busca para a ferramenta. Mais que isso: ele permite que a gente use também como um IM (Instant Messenger). (...) O Twitter é uma mega-fonte de informação para blogs, é onde a gente compartilha links, notícias, idéias, é onde buscamos ajuda para determinados problemas que podem ser expressos em 140 caracteres. O Twitter e outras ferramentas semelhantes são centralizadoras de informações, funcionam de forma síncrona e assíncrona baseadas em tags. Permitem partilhar os comentários de posts dos blogs (que estejam formando uma rede dentro de um serviço de indexação de blogs), daí dizer que tal mecanismo virou um microblog, o que era inicialmente uma ferramenta apenas para o usuário dizer o que estava fazendo acabou sendo apropriada pelos blogueiros dessa maneira, utilizada para marcar encontro, trocar links, criar tags. Funciona em qualquer tecnologia, desde o celular[262] até o MSN, o que lhe confere um alto grau de usabilidade e mobilidade. Freitas é contundente em afirmar que tal recurso, microblogging, é resultado da apropriação dos blogueiros sobre essa ferramenta: “Entenda: a ferramenta serve ao USO que a gente faz dela. Não é a única, não é nem mesmo central. É mais um lugar onde a gente se encontra todo dia – como grupos de discussão, IM’s[263], bares etc.”. Ou seja, da mesma forma como se pode dizer que o blog jornalístico é resultado da apropriação que os usuários fizeram dessa plataforma[264], o microblog é, igualmente, fruto desse mesmo tipo de apropriação, é resultado da convergência midiática do usuário sobre as novas tecnologias a ele disponíveis. BBB – Big Brother Blog “Eu percebo que a grande mídia está de olho nos blogs”, diz Lucia Freitas. Já os blogueiros, estão de olho em você. Independentemente de com qual intuito, uma prática comum aos blogueiros é monitorar o seu público. Para fazê-lo, são utilizadas várias táticas, a primeira delas, como já mencionamos, é o cadastro. Alguns blogs, sobretudo aqueles vinculados a grandes portais, exigem um cadastro prévio para que o usuário possa interagir. O cadastro vai permitir ao dono do blog, do portal ou qualquer que seja o site, medir o perfil de seus usuários. Essa medida vai variar de acordo com as informações requisitadas, mas, normalmente, vão elucidar as dúvidas mais básicas sobre o usuário: quem é, onde vive, de onde veio e como chegou até aqui. O cadastro é feito através de um formulário eletrônico; os formulários, na verdade, podem ser utilizados para vários fins além do cadastro, podem ser utilizados como espaço de contato para envio de mensagens, envio de arquivos e imagens, confirmar um termo de uso, enviar um comentário ou para se montar uma enquete, entre inúmeros outros usos. Porém, quando o usuário de um blog ou outro site qualquer envia um formulário, as informações que são enviadas nem sempre se restringem àquelas que foram explicitamente solicitadas. Dentre as informações não requisitadas que podem ser enviadas está o número de I.P., o número que identifica a conexão do usuário. De forma que, enquanto uns clamam pelo direito ao anonimato na rede, outros se colocam acima dessa questão, pois possuem os mecanismos para identificar exatamente quem é o seu usuário. Um exemplo: se você fez um comentário anônimo em um blog da plataforma Blogger, a CIA tem condições de saber exatamente quem você é caso ela se interesse. Mas a Google (dona da Blogger), vale esclarecer, não é a única empresa a manter esse tipo de “negócio” com a CIA. Segundo palavras do diretor de um outro serviço de inteligência, o Ibope Inteligência, o Dr. Marcelo Oliveira Coutinho Lima[265] expõe que há tempos Bill Gates, dono da Microsoft, possui uma “parceria” com a CIA que permite à agência acessar qualquer computador conectado à rede que esteja rodando sob o sistema operacional Windows. Sendo assim, da mesma forma que dissemos, por exemplo, que a Internet possui características tecnológicas que resgatam o debate e o diálogo através da mídia, não há dúvidas de que ela tem embutida em si, também, todo um ferramental que pode ser utilizado para a espionagem. As questões levantadas por George Orwell na lendária obra 1984 são inerentes ao novo meio. É preciso que a idéia do Big Brother não seja exclusividade de um ou de outro, é preciso que ela seja utilizada em prol da coletividade, pois tal característica jamais poderá ser desvinculada da Internet. E não é preciso ir tão longe na imaginação, Yochai Benkler já ponderava sobre esse fato dentro de suas objeções ao resgate da esfera pública na Internet[266]. Outra prática dos blogueiros é medir a sua repercussão dentro da blogosfera e perante o seu público; para isso, utilizam-se de variados sistemas de métrica. O mais básico de todos é o sistema de métricas de audiência internacional de sites Alexa, que exibe o tráfego dos sites. Como existem muitos sites, esse sistema não serve para destacar o peso do blog na blogosfera, para isto existem os sistemas de indexação de blogs, que medem a audiência entre os blogs cadastrados. Internacionalmente, o mais utilizado é o Technorati, mas existe um brasileiro, o Blogblogs. Vale destacar que no Technorati encontra-se a central do Blogger, maior plataforma de blogs mundial. O site também publica um estudo sobre blogs, “O Estado da Blogosfera 2008”, que, entre outras informações, registra 133 milhões de blogs cadastrados no sistema. Porém, até onde pudemos perceber, tal estudo não serve de referência para o público e os blogueiros brasileiros, um quadro que apresenta a demografia dos blogueiros simplesmente ignora a existência do Brasil e outras partes do mundo, por exemplo. Para o blogueiro brasileiro, a maior referência é o Blogblogs, site que dá a medida da blogosfera nacional. O site rankeia os blogs pelo “sistema Google de métrica”, ou seja, baseado no link. O site mede a quantidade de blogs que linkam outros blogs, o que corresponde à quantidade de referências que um determinado blog possui nos blogrolls de outros blogs, e também o número de links que apontam para um determinado blog. Existe também o Netrattings do instituto Ibope (em parceria com o instituto Nielsen), que apresenta métricas baseadas em tráfego. Com essas diferentes formas de medida, há controvérsias quando se quer apontar o blog mais popular. Por exemplo, enquanto o Blogblogs coloca o Interney no topo do ranking da blogosfera nacional, o Ibope diz que o blog do Josias de Sousa da Folha Online é o maior do país. Enfim, o que vale mais? Ter mais links e repercussão na blogosfera ou possuir uma média de tráfego maior? O preço da propaganda talvez seja a única maneira de se responder a esta questão. Outro serviço utilizado pelos blogueiros para monitorar o seu público e buscar novas soluções que visem melhorar o seu desempenho e a sua audiência, inclusive com o objetivo de aumentar os benefícios obtidos com marketing, é o Google Analytics[267]. É um serviço que apresenta uma ampla gama de sistemas de monitoramento e soluções para “testar e aumentar o número de conversações” dos blogs, como está descrito na página inicial do site. Nada mais interessante para a Google – a maior plataforma de webmarketing do mundo – do que incentivar e ensinar os seus usuários a aumentarem os seus benefícios que, a tira-colo, aumentam os benefícios dela mesma, em algo que pode ser entendido como uma espécie de novo “Baú da Felicidade” da era digital. Carolina Terra expõe quais são as informações que os blogueiros costumam monitorar em seu blog: “Para você obter análises do blog, basta criar um blog no Wordpress e extrair relatórios de pageviews, hits, comentários, posts mais visitados, ping backs etc.”. Vale dizer que tais relatórios são fornecidos por outros provedores e plataforma de blogs também. Terra esclarece o que significam estes itens do relatório que descreve. Ping backs são todos os links que direcionam ao site/blog, e hits são os textos ou posts mais acessados, mais visitados. Em outras palavras, o ping back dá a medida do blog em meio à blogosfera, e os hits indicam a repercussão dos conteúdos veiculados pelos blogs. Vemos que os blogueiros, no fundo, não são muito diferentes dos jornalistas, eles se preocupam, de um modo geral, tanto com sua imagem perante o público quanto perante os seus pares, da mesma forma que os jornalistas. Quando se critica os jornalistas por eles escreverem ou se preocuparem com questões que concernem somente a eles, o mesmo pode se dizer dos blogueiros, pelo menos dentre aqueles blogueiros de maior renome. Futurologia “É muito difícil fazer previsões de futuro em se tratando de tecnologia no mundo atual, por isso eu prefiro me abster de falar sobre os rumos do jornalismo dentro dessa nova era da informação”, afirmam reticentemente os blogueiros Marcelo e Lyanne. “No mestrado não se faz jogo de adivinhações. Aqui não se estuda futurologia”, diz o Dr. Laan Mendes de Barros, coordenador da pós-graduação da Faculdade Cásper Líbero. Nós concordamos com todos, mas o que custa perguntar? Depois de tanto refletir sobre a contemporaneidade, não é demais tentar estender o pensamento para um pouco além: o futuro. Dessa forma, para encerrarmos o presente estudo, vamos ouvir o que os blogueiros nos disseram sobre o futuro – afinal, como cantaria um filósofo da música, ele está “alí logo em frente a esperar pela gente”. Algumas pessoas, quando falam do futuro, não falam do que acham que irá acontecer, e sim do que esperam que aconteça ou, talvez, do que deveria acontecer. É dessa maneira que se manifesta Pedro Villalobos: “A apuração jornalística tem que permanecer, mas a forma de lidar com essa informação vai ter que mudar drasticamente ou as pessoas simplesmente vão abandonar esses meios. Ninguém aguenta mais pautas de jornal baseadas em miséria e crimes”. Apesar de achar que “isso é um exercício de adivinhação” em função de o cenário atual estar em processo de constante mutação, Lucia Freitas espera que o jornalismo possa “abrir espaço para o leitorado e novos canais de comunicação com o seu público. E seguir apurando notícias, criando conteúdo e informação relevante”, o que, em outras palavras, é dizer que o jornalismo continue o seu curso atual, ganhando novos públicos com o surgimento de novos canais midiáticos, sobretudo neste mundo que “cada vez mais, flui através de linhas conectivas de banda larga, linguagem digital-binária e dispositivos computadorizados miscelâneos”, como dissemos num passado não muito distante. ÚLTIMAS CONSIDERAÇÕES “You can choose a ready guide
in some celestial voice Blogs e Webjornalismo Os blogs são novos vasos oxigenadores que disseminam a mensagem numa amplitude maior através da ramificação do acesso à informação, podemos dizer numa associação a uma frase de Eugênio Bucci citada neste estudo. Os blogs, somados a inúmeros recursos de navegação e interação, são como novos alvéolos que pulmificam o jornalismo, responsáveis por dar um novo e maior fôlego ao mundo da informação. Esse novo fôlego do jornalismo engloba e é também resultado da atuação das grandes e tradicionais marcas da notícia/informação no âmbito das novas mídias. Continuando nessa associação com o sistema cardio-respiratório humano, poderíamos dizer que os grandes portais de notícia são como novos e mais potentes corações que bombeiam intensos fluxos de conteúdo para o complexo corpo social. Sendo assim, dizer que tal instância esteja em crise só pode ser resultado de uma observação parcial do cenário total. A melhor descrição para o cenário atual está em uma frase de Gustavo Venturi Junior, “Como [grandes] empresas que trabalham com informação, todas estão passando por uma crise de adaptação”, diz o sociólogo. Uma crise de adaptação de um contexto midiático que também está se adaptando a este novo e imprevisivel mundo comunicativo digital interconectado. A crise possui várias facetas, muitas das quais refletimos durante este estudo. Todas possuem algum grau de ligação com a mudança do paradigma comunicacional que analisamos no primeiro capítulo desta dissertação. Algumas instâncias sofrem mais do que outras nessa fase de transição. O jornal impresso, berço das maiores marcas mundiais, é o primeiro da fila a pleitear a transição total ao novo meio. E, também, o que mais se beneficiará e já vem se beneficiando com essa transição, desde que saiba tirar o devido proveito que as novas mídias proporcionam. De modo que culpar a Internet pelas diminuídas tiragens dos jornais é um grande erro. A grande rede só tem à somar a comunicação de um modo geral, é o objetivo e o resultado da busca do Homem em se comunicar melhor, é a evolução comunicacional ainda em curso. Uma grande empresa de comunicação que porventura não consiga sobreviver dentro desse novo cenário comunicacional evoluído, só poderá ser em função da manutenção de práticas que fogem desse novo contexto. As empresas que focarem os seus objetivos em informar irão sobreviver, as que já o fazem estão sobrevivendo e crescendo. Infotenimento O acesso à tecnologia subitamente erigido pelo advento dos computadores e da Internet passa pela liderança daquela que é maior de todas as indústrias da mídia, os games. Da mesma forma como destacamos a importância da figura de Tim Berners-Lee dentro da história da Internet, a história da animação gráfica computadorizada, principalmente a tri-dimensional, passa pelo nome de John Carmack, programador e co-fundador da iD Software, uma das maiores empresas produtoras de [tecnologia de] games da história dos computadores. Alguns dos conceitos que mencionamos durante este trabalho, tais como open source e software livre, ganharam força através do mundo dos computadores e da Internet graças às iniciativas, oriundas do mundo dos games, deste cidadão norte-americano. Na Campus Party, feira que exibe as últimas novidades do mundo high tech, e que também reúne centenas de aficionados por computador, Internet e tecnologia de um modo geral: nerds, hackers, tecnólogos, empresários, estudiosos etc., todos contando com uma grande lan para compartilhamento de informações e acesso à web. No meio de tudo isso, de toda essa gente, dentre as diversas áreas temáticas da feira, Blog, Robótica, Inclusão Digital, Software Livre, Games e Modding entre outras, sem dúvida, percebemos que a área de Games foi a mais ativa e que mais movimentou a feira. O que nós queremos dizer é simples: a indústria carro-chefe do mundo cibernético é representada pelos games, de forma que a vocação maior da rede está no entretenimento. O jornalismo inserido numa plataforma de entretenimento tende a seguir essa vocação, de modo que, se fora da web o infotenimento é uma lógica que vem ganhando força na atualidade, na Internet isto é lei. O conceito de infotenimento associado às mídias digitais precisa ser revisto e muito bem estudado, para que se identifiquem os seus benefícios. Não se pode mais enxergar a lógica do entretenimento apenas como algo negativo; hoje, ela se apresenta como uma fórmula não mais descartável. É preciso encontrar soluções para o jornalismo na atualidade, para que ele possa exercer o seu papel de suma importância para a sociedade, ao lado da diversão e do entretenimento. O infotenimento também tem o seu lado positivo e construtivo, é preciso entendê-lo melhor. O jeito informal e divertido pelo qual os blogs interagem com a informação é um grande exemplo de como o infotenimento pode compor um excelente caminho para o jornalismo. As Redes Sociais Dizer que a Internet é só uma grande plataforma de jogos e diversão seria ignorar uma outra característica intrínseca sua de vital importância. Seria ignorar o próprio conceito de rede. Essa característica é aquela de onde a própria rede nasceu, uma plataforma que foi sendo construída com base no compartilhamento do conhecimento. O que antes compunha uma rede que conectava estudiosos e universidades, hoje se replica através de redes sociais, como o Orkut, MySpace e Facebook, entre diversas outras. Na atualidade, o conceito de rede social abraça o jornalismo na web de uma forma totalmente inovadora. Quando olhamos para o blog como uma nova inovação ao jornalismo, nós olhamos para, não o alvo errado, mas sim, para uma parte periférica dele, o centro desse alvo, talvez, seja composto pelas redes sociais, o alvo por completo é, como não poderia deixar de ser, a web como um todo. O blog é, como vimos, uma ferramenta que replica, que repercute o jornalismo na Internet, talvez seja um dos meios mais dinâmicos para se disseminar a mensagem jornalística na rede, mas não representa uma inovação para o jornalismo dentro da web; já esta, sim, é quem representa a grande inovação, o seu caráter inclusivo, descentralizado e coletivo. O blog também se apresenta como uma plataforma na qual, tanto os cidadãos como os jornalistas, podem exercer o seu narcisismo no palco multimidiático, ele permite o exercício individual do jornalista, o que, apesar disso, o torna um meio inclusivo e democrático. Mas hoje a sociedade busca e precisa de alternativas para o individualismo, opções que nos levem além do eu-centrismo e, nesse sentido, as redes sociais é que se apresentam, da mesma forma que a web dentro de sua característica primária, como o meio de socialização cujas características são muito mais inovadoras e propensas ao diálogo e a novas formas de disseminação e interação com a notícia e a informação do que os blogs ou os portais noticiosos, ou até mesmo, qualquer outra instância de forma isolada. Se, como ferramenta o blog é de uso do indivíduo, em conjunto com outros blogs, e/ou outros recursos, ele pode ser muito útil também como veículo de socialização, tanto a blogosfera quanto as redes de microblog também se compõem como redes sociais. A linguagem RSS e os diversos mecanismos de feedback utilizados pelas diversas plataformas de blog, pelas redes sociais, portais e sites diversos, favorecem a integração dessas ferramentas, permitindo variadas formas de sociabilização virtual. Mais uma vez, a convergência dos indivíduos sobre a mídia é que resulta na criação dessas redes. No Brasil, nos lembra Lucia Freitas, a rede que “pegou” foi o Orkut: O diferencial da web não está, muitas vezes, nas ferramentas criadas para fins jornalísticos, mas em outras que foram criadas para outros fins e vão sendo utilizadas para disseminar informação, por exemplo, tem uma comunidade do Orkut que é utilizada para fazer entrevistas, e ao vivo. São estas ações que interferem no jornalismo como um todo. (...) O Orkut é um grande exemplo, ele tem de longe mais usuários que a totalidade dos blogs, e é utilizado para os mais inimagináveis fins. (...) O Orkut é uma inovação muito maior que os blogs. O blog é uma página na Internet como outra qualquer. Cremos que, dentre alguns dos assuntos que discutimos ao longo deste estudo: o resgate da esfera pública e o despertar de uma consciência crítica maior estejam mais próximos das redes sociais do que do blog ou outras instâncias. Não é à toa que o jornalismo-cidadão e open source esteja mais atrelado a essas redes e ao próprio conceito de inteligência coletiva do que aos blogs; neste caso, os blogs colaboram da mesma forma que na web como um todo, onde a inovação fica por conta das novas formas de relação que permitem aos usuários criarem os seus vínculos, as suas redes, compartilharem seus conteúdos e seus conhecimentos, desenvolver a sua própria interatividade e criatividade. Google Dominando o Brasil Como vimos na análise sobre a Google, ela não está dominando o mundo, mas o Brasil, sim. Uma consulta ao site de métrica Alexa[269] mostra o site da Google em segundo lugar logo atrás do Yahoo! na liderança da web-audiência global. Mais dois sites pertencentes a Google também figuram entre os top 10 mundiais, o Youtube (3º) e a plataforma de blogs Blogger (9º)[270]. O Google Brasil também é líder em audiência entre os sites de língua portuguesa, seguido pelo UOL (2º), Globo.com (3º), Terra (4º) e iG (5º); o Google Portugal ainda figura entre os top 10, na sétima posição[271]. Já entre os top 10 brasileiros, a Google possui quatro sites, com direito a dobradinha no topo do ranking com o Google Brasil (1º) e o Orkut (2º), e, os demais, Youtube (5º) e Google.com (8º)[272]. A plataforma Blogger aparece em 11º lugar do ranking. A empresa brasileira mais bem rankeada é o UOL, em 4º lugar (61ª mundial) – o Brasil, nessa disputa, não vai ao podium e fica sem medalha. Os outros sites brasileiros que figuram entre os top 10 são: Globo.com (6º) e Terra (9º), num total de apenas três entre dez sites, as demais sete posições são todas ocupadas por empresas norte-americanas. Dentre os demais sites brasileiros que analisamos, o Estadão figura na 112ª posição[273], o Limão na 622ª e o Overmundo na 896ª. Vale lembrar que a audiência do site da ESPN Brasil é contabilizada para o portal Terra[274] e a Folha Online para portal UOL. Outros sites ligados à informação e ao jornalismo que figuram entre os top 100 brasileiros são: iG (12º), a plataforma de blogs Wordpress (20º), Abril (24º), Fotolog (27º), Kboing (51º), ClickRBS (53º) e Gazeta Esportiva (78º). A nossa análise da Google advertiu o fato de as grandes inovações para o jornalismo estarem surgindo fora do âmbito dessas empresas, sendo a própria Google, uma das que vem criando soluções para o mundo da notícia através de variados sistemas e tecnologias. Para o Brasil, o cenário é ainda mais “perigoso”, pois as novidades não só estão surgindo fora do âmbito das empresas de comunicação, mas também de fora do País. E, ao contrário de outros países que, como vimos, apresentam empresas ou mesmo iniciativas governamentais que visam fazer frente à Google, por aqui não se vislumbra nada capaz de frear o seu avanço. Inclusive, os dois portais noticiosos que analisamos, da Folha e do Estadão, são usuários de sistemas Google e, também, clientes, ou seja, utilizam tecnologia licenciada frente à líder do ciberespaço. Nesse sentido, a web expressa aquilo que o país sempre foi: submisso aos seus conquistadores, um prestativo e gentil servo – pela rede, os Estados Unidos estendem, através da tecnologia, a sua supremacia sobre o Brasil. Como se isto não bastasse, em um evento voltado para webmasters brasileiros, o evangelizador dos sistemas de busca da Google Adam Lasnik afirmou estar insatisfeito com a web brasileira, pois “encontrou muitos sites feitos em Flash e sem integração com as ferramentas Google”[275]. Talvez a Google possa comprar a Adobe[276] para resolver esse problema. A fome da Google por mais audiência tupiniquim, pelo visto, parece não estar saciada. Em relação aos blogs nacionais, o sistema de indexação, busca e rankeamento BlogBlogs[277] apresenta quais são os blogs de maior destaque do País ou, ao menos, os mais linkados entre aqueles que estão cadastrados neste sistema, que é o mais popular entre os blogueiros brasileiros. O sistema classifica os blogs através do número de ping-back, ou seja, pelos blogs que são mais linkados. Abaixo a tabela com os blogs top 10 do Brasil:
A posição de liderança entre os blogs brasileiros do Interney corresponde, no sistema de web-audiência Alexa, à 343ª do ranking brasileiro. Dessa forma, aquela suposta liderança que os blogs possuem frente aos grandes portais noticiosos nacionais só pode ser creditada a algumas coberturas ou repercussões específicas; na média de acessos, os portais estão muito a frente dos blogs. É claro que esses portais largam na frente, pois oferecem muito mais do que notícias, englobam variados serviços e sub-sites cujas audiências lhe garantem essa liderança frente aos blogs, dentre eles os chats que, segundo o especialista em webmarketing Paulo Kendzerski (WBI Brasil[278]), são as ferramentas que garantem a liderança desses portais. Se, no decorrer deste estudo, nós enfatizamos que os blogs levam vantagem nos sistemas de busca baseados em links, da mesma forma os portais que possuem salas de chat levam vantagem na audiência cuja métrica é embasada no tráfego de usuários[279]. De forma que este número não é absoluto para afirmarmos de forma pontual que os portais brasileiros são os líderes da audiência jornalística na web, porém demonstra a sua liderança como grandes plataformas de conteúdo para a web-audiência nacional. Nesse sentido, dentre as empresas que detém os maiores jornais brasileiros (Folha de S.Paulo, O Globo, Extra e O Estado de S. Paulo[280]), duas são líderes de audiência por aqui, o Grupo Folha através do portal UOL e a Globo através do seu portal, embora, neste caso, o alicerce da empresa seja a TV e não seus jornais impressos (O Globo e Extra). Isto demonstra a grande vantagem que esses conglomerados possuem na sua aventura de inserção no mundo da World Wide Web. Mas é preciso destacar que existem diversos blogs e plataformas de blogs dentro desses portais que lhes conferem um aumento de tráfego. Também não podemos nos esquecer que a plataforma Blogger da Google figura na 9ª posição da audiência mundial e 11ª brasileira, de modo que esses números delatam que “o weblog é a mensagem” ou, ao menos, uma das mais fortes mensagens vistas no “cyberspace”. Talvez, se um dia tais sistemas alcançarem as primeiras posições de liderança de tráfego, próximos aos sistemas de busca – líderes da audiência na atualidade –, a gente possa, sim, de forma contundente, declarar que o “weblog é a mensagem”, não somente ao jornalismo como revelamos neste estudo, mas à web como um todo. Existe também uma outra forma de olhar para os números revelados acima que apontam para a veracidade da frase “o weblog é a mensagem”, mesmo que esta seja uma mensagem “fabricada”, manipulada pela própria dinâmica dos sistemas de métrica. Enquanto o sistema BlogBlogs se baseia no número de links que apontam para os blogs, o Alexa baseia-se no tráfego[281]. Aqui se revela a vantagem que os blogs possuem no meio de tantas formas de mensura: o site de maior tráfego no Brasil (e segundo do mundo) é aquele que busca páginas com base no número de links. Ao lado deste fato, existe outro que mostra o sucesso dos blogs atrelado a uma grande plataforma pertencente à mesma empresa, de modo que, dentro da frase citada acima, questiona-se até que ponto não poderia se dizer que “o Google é a mensagem”, tanto dos blogs como da completa atualidade ciberespacial. As análises que fizemos nos sites da Google, Folha e Estadão também demonstram o porquê do sucesso da Google. É uma empresa totalmente centrada no usuário, entre estes, indivíduos, empresas e sites de um modo geral. De certo modo, ela dá a medida do nível, muito próximo, em que tanto indivíduos quanto empresas e instituições compartilham o cyberspace. A grande vantagem da Google sobre os webjornais citados é que ela não precisa produzir conteúdo para obter audiência/valor publicitário[282], ela simplesmente oferece uma bandeja para que seus clientes possam compartilhar e usufruir qualquer que seja o conteúdo. A Google, como dizia o slogan de um produto masculino: “não precisa fazer força para agradar”. O grande sucesso da empresa talvez seja esse, algo que vai além da tecnologia de seu algoritmo, ela sempre se posiciona de maneira a facilitar o uso da web em diversos sentidos para os seus “clientes”. A Google, por exemplo, não precisa se preocupar com questões de copyright; ao mesmo tempo em que cria mecanismos para aqueles que querem reivindicar esse direito, cria outros para que os usuários possam compartilhar conteúdo, inclusive, burlando o copyright. Na atualidade, pode-se mesmo afirmar que a Google está fazendo algo que históricamente ninguém conseguiu fazer, agradar gregos e troianos. As Objeções de Yochai Benkler A Google também se mostra como o perfeito exemplo para o entendimento das objeções levantadas por Yochai Benkler[283]. A empresa se apresenta na atualidade como a grande centralizadora de atenções no espaço ciberal. O seu sistema de busca e a plataforma de blogs Blogger são dois grandes exemplos dessa centralização, sem mencionar a tecnologia. Aliás, alguns dos top sites que listamos acima e, em especial aqueles que analisamos ao longo deste estudo, sobretudo o portal UOL, a Globo.com e o Terra, os maiores portais brasileiros (e que figuram entre os top 100 mundiais), são grandes concentradores de atenção. A sua disputa pela liderança da audiência no ciberespaço nada mais é que uma disputa pela concentração das atenções, e quem concentra mais, lidera mais. A Google lidera dentro dessa lógica, sendo que ela concentra em suas mãos algo que pode ser considerado como “ouro puro” na nova era digital, ela concentra a propaganda. Enquanto muitos se perguntam como ganhar dinheiro na Internet, ela responde como: ganhando dinheiro fazendo os outros ganharem dinheiro. A Google também pode ser considerada uma grande Torre de Babel, ela possui diversos mecanismos que ajudam a incluir o cidadão na nova mídia. Ao mesmo tempo que ela inclui diversas novas vozes na mídia, ela provê os mecanismos para a filtragem do diálogo, começando pelo seu sistema de busca e englobando diversos outros. A empresa em si apresenta e usa a seu favor essas duas características antagônicas, possíveis obstáculos a “democratização” da web: ela é uma Torre de Babel que concentra as atenções no âmbito das novas mídias. Outras duas objeções apontadas por Benkler que podemos observar na Google referem-se à questão da espionagem, que destacamos através da “parceria” que a empresa detém com a CIA, e a questão da exclusão digital. Essas característicam remetem a outra característica antagônica da empresa. Ao passo que ela trabalha com a CIA, ela cria tecnologias e mecanismos para vencer a barreira da exclusão, como os seus mecanismos de tradução instantânea de sites e outros que visam vencer a fronteira das línguas na Internet. Se, no decorrer deste estudo, nós dissemos que a Internet é uma mídia que possui características dualísticas, o mesmo pode se dizer da Google, e ela sabe como usar muitas dessas características a seu favor. Favorecendo os usuários ela favore a si mesma. Se Gordon Moore referenciou o Google como o que existe de mais impressionante no ciberespaço, para nós brasileiros o UOL é o que existe de mais impressionante na Internet tupiniquim e, para os mais otimistas, para a audiência global de língua portuguesa. O UOL consegue a façanha de bater a Globo no ciberespaço, prova de que o grupo de Frias aprendeu a fazer Internet – aprendeu a centralizar atenções –, se não pelo site da Folha Online, como analisamos, mas através do portal que lidera a audiência nacional, e, teoricamente, como menos dinheiro. Embora esse tipo de liderança em geral se deva à maior capacidade de investimento dessas megacorporações, neste caso, a disputa pela audiência ciberespacial, o Grupo Folha está a frente da Globo, uma empresa com faturamento bruto cerca de quatro vezes maior que o da Folha – o pioneirismo do UOL ainda se reflete nessa liderança. Mas há que se destacar o trunfo que as empresas brasileiras líderes de audiência na web possuem: são provedoras de acesso que se beneficiam de uma lei que obriga os usuários de serviços pagos de acesso à web, o que inclui a banda-larga, a assinarem um provedor de conteúdo. Não seria este um dos exemplos de Benkler de como algumas empresas podem exercer o seu monopólio sobre a rede? A Internet e a Esfera Pública Anos atrás, o turista que passeasse por uma região badalada da cidade do Guarujá, litoral paulista, notaria um novo bar instalado em uma esquina movimentada. O bar era grande, com amplos espaços que ocupavam dois andares, contando com um imenso terraço na parte superior. De fora seria possível observar várias mesas, um grande palco para shows, com pista de dança, um vasto balcão e um batalhão de garçons prontos para servir os clientes. No entanto, o bar estava vazio, poucas mesas estavam ocupadas. Nos dias que se seguiram, toda vez que se passava pelo bar, a cena se repetia, o bar estava, a todo o momento, praticamente vazio, a banda que tocava para poucos clientes, com o passar dos dias, sequer se apresentava mais. No verão do ano seguinte, aquele que, porventura, passou novamente pela mesma esquina, notou que o bar já não existia mais. A Internet como resgate da esfera pública se apresenta da mesma forma que o bar descrito, tem todas as condições, como meio comunicacional, para resgatar a esfera pública e ser o palco de debates onde os cidadãos conectados poderão discutir os rumos da sociedade, assim como o bar descrito possuía perfeitas condições de atender aos seus clientes. Como vimos nos exemplos da esfera pública conectada e outros, alguns fatos já demonstram esse potencial. Mas para que essa esfera pública cresça e se torne de fato uma instituição (como, num dos mais perfeitos exemplos da história moderna, a esfera pública inglesa e a sua atuação sobre o Parlamento britânico), muita coisa ainda precisa ser feita. Não basta apenas termos o espaço se as pessoas não o utilizarem para fins diferentes do que muitos o utilizam, é preciso que as pessoas explorem o potencial comunicacional da Internet de forma que ela, de fato, se torne uma esfera pública permanente em nossa sociedade. Sobre o exemplo descrito acima, poderíamos dizer que é preciso que as pessoas entrem no bar, sentem-se à mesa e desfrutem do ambiente. Além disso, é preciso que a sociedade não permita que os abutres da mídia, as hienas das telecomunicações, os tubarões da tecnologia ou mesmo os chacais do governo exerçam monopólio sobre a rede, inclusive, alterando os protocolos comunicacionais que hoje beneficiam a comunicação desintermediada e as iniciativas de diversas pessoas que utilizam a grande rede. É preciso também que a Internet cresça mais e inclua o máximo de pessoas possível, quiçá todos os cidadãos do planeta possam ter acesso a ela, de modo que a exclusão digital seja algo que não faça mais parte das sociedades. Feito isso, temos certeza, a Internet, que hoje já apresenta essa potencialidade, é o meio comunicacional que resgatará e trará novas dimensões, de foro global até, para a esfera pública. A Internet é um meio que, como vimos neste estudo, apresenta diferentes possibilidades além daquelas que levam ao espetáculo que tomou o grande palco da mídia na atualidade. A Eleição de Barak Obama Esse estudo foi desenvolvido em paralelo ao processo de sucessão presidencial ocorrido nos Estados Unidos, já havíamos feito uma menção ao sucesso da campanha do candidato Barak Obama[284] durante as primárias. Por coincidência, chegamos ao final desse estudo na mesma ocasião em que os Estados Unidos chegaram ao final do seu processo eletivo com a vitória de Obama, o primeiro presidente negro da história dos Estados Unidos. A eleição de Obama recai fortemente sobre os estudos que fizemos a respeito da esfera pública e permite-nos afirmar que existe de fato uma nova esfera publica, estrutural e de alcance global, através da Internet. Dessa forma, a frase que colocamos no final do último parágrafo se mostra verdadeira na contemporaneidade: a Internet resgata a esfera pública. O fenômeno Obama, chamado popularmente de obamização, ganhou o mundo através da Internet, pode-se afirmar que houve uma opinião pública mundial favorável ao democrata, embora esse público globalizado não vote, portanto, não pode ser responsabilizado pelo sucesso do novo presidente. Enquanto o mundo enxerga no democrata as soluções para problemas como a guerra do Iraque, as tropas no Afeganistão e o aquecimento global, internamente nos Estados Unidos, os eleitores se preocupavam mais com a crise econômica vivida pelo país após oito anos de conservacionismo, sendo este, talvez, o factóide que tenha levado o povo americano a votar no seu opositor, ou seja, Obama. Esse é um dos fatores que pode ser atribuído ao recorde de eleitores registrado nesta eleição e na estrondosa vitória de Obama nas urnas. Quanto à pergunta que fizemos a respeito de Obama ser um novo “príncipe binário”, a resposta mais correta seria, ele é um príncipe “eletro-binário”, ou seja, ele conseguiu construir a sua imagem através dos meios eletrônicos e digitais. Não se trata de dizer que o Obama fez melhor uso das ferramentas da web que o seu rival (John McCain), o fato é que sua imagem “pegou” na Internet, a obamização é a chave que explica este fato. O número de jovens que participaram da votação também indica a importância que a web teve nesse processo eleitoral, pois sabemos que a Internet tem um grande apelo sobre esse público, especialmente em uma série de ferramentas e sites por onde a obamização se espalhou, tais como blogs, redes sociais e o Youtube, entre outros. Sem dúvida, a eleição de Obama indica a força da opinião pública que se formou através da Internet, mesmo que essa esfera se dissipe logo após, inclusive pelas peculiaridades do processo eletivo norte-americano (voto facultativo), como mencionamos. Entretanto, nos parece evidente que uma esfera pública “digital” temporária se formou durante esse processo. Se um dia ela irá se tornar conjuntural, só o tempo dirá. Outro fator que mencionamos durante este estudo, que parece se relacionar com essa nova esfera, foi quando mencionamos nos parecer que a Internet – que se apresenta, antes de tudo, como uma nova esfera da vida privada e cultural –, da mesma forma que a vida privada dos burgueses nos séculos XVII e XVIII acabou influenciando a esfera pública, acabou, de alguma forma, contaminando a esfera pública de modo decisivo na vitória de Obama. Por fim, os estudos atuais que citamos de Jürgen Habermas e Mark Poster[285], assim se mostram, parecem não contemplar a nova dimensão da Internet e a mudança estrutural na esfera pública que surge inerente aos novos meios e todas suas peculiaridades que analisamos neste estudo – alguns estudiosos parecem estar subestimando o poder da opinião pública que toma as novas mídias. Quem sabe não seja esse o início da revolução da Internet que tanto se fala? A pergunta para o sucesso do fenômeno Obama talvez não seja mais aquela que fizemos anteriormente, a questão agora talvez seja: seria possível a eleição de Obama, um afro-descendente, para a Casa Branca sem o advento da Internet? Ética No que concerne à ética no jornalismo de um modo geral, após as diversas questões e exemplos analisados neste estudo, a melhor maneira de definir esta relação talvez esteja na seguinte frase da analista junguiana e de filosofia Adriana Nogueira (PUC-SP), quando ela nos fala da ética no mundo atual, que incluí também o jornalismo e as corporações de mídia: “Talvez sejamos ainda platônicos: contemplamos e mobiliamos o nosso mundo ideal enquanto o real não tem quem o compreenda” (Nogueira, 2000:44). Pelo que vimos na análise da crise ética do jornalismo, podemos afirmar que existe uma distância platônica entre os ideais éticos mais fundamentais e a prática real da “arte de fazer jornal”. Um fator que se evidencia neste estudo é que, na Internet e, principalmente, nos blogs, e aqui falamos da totalidade destes, objeto que refletimos com profundidade durante este estudo, é que o usuário torna-se o seu próprio gatekeeper; sendo assim, pouco valem os códigos de ética, as regras de conduta, sejam elas as seguidas por profissionais e pessoas ligadas às velhas mídias, ou o usuário do ciberespaço e seus manifestos. A questão ética fica atrelada, praticamente ou quase que somente, ao indivíduo e, assim, à mercê do seu eu-centrismo (o que, aquém do trocadilho, pode mesmo até se manifestar de uma forma excêntrica, o que engloba a pluralidade de significados desta palavra). Em uma referência ao estudo de Zygmunt Bauman, poderíamos dizer que a ética está em completo processo de ebulição/liquefação no âmbito das novas mídias, inclusive em função desta ser uma esfera comunicacional que ainda está se desenvolvendo. Outra questão ética atual está ligada a um dos problemas mais contemporâneos: o esgotamento natural do planeta, que traz junto de sua problemática, uma nova idéia: o direito das gerações futuras herdarem um mundo em que possam viver. Esse problema global coloca em cheque o sistema capitalista em que vivemos e atinge toda a humanidade. Mais do que nunca, os ideais éticos fundamentais terão de ser praticados em ordem da sobrevivência da espécie humana. Neste caminho, o jornalismo e os meios de comunicação terão um precioso papel a cumprir, conscientizando, informando, discutindo e trazendo soluções que concernem aos rumos da sociedade, ao destino do Homem. O direito fundamental ao acesso à informação também é outro ideal cuja prática se clama necessária. Será que a Comunicação e o Jornalismo estão preparados? Independentemente de a Comunicação e o Jornalismo estarem ou não preparados, e nós acreditamos que não estão, a própria sociedade como um todo não nos parece preparada para encarar a sua sina. Não podemos afirmar, apesar das amplas discussões que concernem à ética e à própria epistemologia dessas áreas do conhecimento, que elas estejam completamente erradas. Não, pelo contrário, cremos que todas as discussões são importantes e devem engrandecer essas áreas da atividade humana, de modo que elas cumpram o papel que delas esperamos e necessitamos. Mas, com o advento das novas mídias e do “fim do mundo”, muita coisa precisa mudar, e rápido. Será que os catedráticos estão preparados e conscientes dessa urgente necessidade? De Volta para o Futuro Á guisa de conclusão, as reflexões a seguir partem do pressuposto de que a sociedade realmente lutará para resolver os problemas ambientais que hoje colocam em cheque o destino da humanidade, o aquecimento e o escurecimento global. Também partimos do pressuposto que as novas mídias continuem embasadas nos alicerces fundamentais sobre os quais foram criadas, ou seja, a liberdade, a reciprocidade, a cooperação e a informalidade. Vários estudiosos apontam para o aumento incessante do consumo de informação online, de forma que, com o tempo, a Internet deve se tornar a principal plataforma de consumo de informações e notícias. A ascensão da web semântica e o aumento da mobilidade, inclusive com o surgimento de novas plataformas, dentre as quais o e-paper e, adicionando-se o custo ambiental que deverá recair sobre a produção do papel, nos faz crer que o jornal impresso desaparecerá, sendo totalmente absorvido pelas novas formas de mídia. Inclusive, as novas gerações, não habituadas a pagar para consumir informação, também ratificam o desaparecimento dos impressos de um modo geral, que tenderão a ser um objeto de luxo devido ao seu alto custo, principalmente quando aquela tida como geração nativa[286] da Internet crescer e se tornar majoritária dentre a população economicamente ativa. Outro fator que também indica o desaparecimento dos impressos está no alto custo de sua cadeia produtiva e distributiva, de modo que a convergência das empresas de mídia, tecnologia e infraestrutura comunicacional em torno do bit, as Comunicações, deverão optar pelos meios digitais como forma de valorização do negócio advinda da economia de custos que as redes informativas proporcionam. Assim, pode-se vislumbrar que o problema de hoje (aquecimento global) será o slogan de amanhã, quando as empresas transformarão a crise do ecossistema terrestre em valor de negócio no que tange à produção e distribuição de informação (algo que já pode ser observado em outras áreas da atividade humana). Com essas novas possibilidades de consumo de informação através da plataforma binária, assistiremos a um aumento dos conteúdos on demand e da possibilidade crescente do usuário se esquivar da publicidade. A própria publicidade deverá se deslocar em direção aos navegantes, de forma que o público terá uma participação cada vez maior dentro do bolo publicitário geral da mídia. A segmentação da publicidade via mala-direta, que já é fato nos dias atuais, tende a ser uma lógica que cada vez mais se institucionalizará em função das possibilidades que o mundo digital oferece em termos de personalização da informação e da propaganda, inclusive utilizando as mais revolucionárias tecnologias de ponta, quando teremos os agentes inteligentes, que serão atrelados não só ao acesso à informação, mas também à publicidade. Essa é uma lógica cujos pilares agora estão sendo construídos e cujas palavras-chave nós já mencionamos: segmentação e fragmentação. O mecanismo AdSense da Google representa, na atualidade, a primeira inovação dentro dessa lógica que tende a se tornar majoritária dentro do ciberespaço e da mídia em geral. Ainda sobre a morte dos jornais impressos que, na verdade, não ocorrerá, pois ele apenas mudará de suporte (do impresso para o chip), nós descartamos complemente o argumento em que muitos se apóiam para justificar a sua sobrevivência. Muitos dizem que o jornal sobreviveu ao rádio e à TV, por isso sobreviverá também à Internet. Tal argumento não possui nenhuma base científica, seria o mesmo que dizer que um sujeito que não morreu após ser baleado duas vezes sobreviveria se baleado uma terceira vez – depende de onde o terceiro tiro venha a atingir – nesse sentido, a Internet é um headshot. Cremos que outros fatores, como os mencionados acima, se sobrepujarão a esta crença e o jornal impresso desaparecerá completamente, passando aos meios digitais onde, aí sim, continuará existindo. Em suma, o impresso morrerá, o jornalismo não, assim como qualquer outra forma de comunicação que se valha dos suportes impressos na atualidade. E, vamos além, a questão não é se os impressos devem ou não ser extintos, o destino do planeta Terra urge que eles desapareçam, e o quanto antes, melhor. Enquanto os jornais impressos não morrem, verificaremos uma série de mudanças que visarão à manutenção desse negócio que foi extremamente rentável durante séculos (numa menção ao estudo de Philip Meyer, poderíamos dizer que o jornal impresso não desaparecerá sem que antes a laranja seja espremida até soltar a última gota de suco). Aqui vale apontar apenas aquelas tendências que identificamos durante este estudo. A primeira delas é que, em função do deslocamento da mídia para o usuário, os grandes veículos foquem suas energias no que eles tem de melhor; como filosofava McLuhan, eles tenderão a refletir o suprassumo da “arte de fazer jornal”. Assim, as editorias mais fortes, em especial as investigativas, deverão se tornar o filet mignon do jornal; estes tenderão a tornarem-se cada vez mais analíticos do que puramente informativos. Mas, se a tendência do jornal é buscar o seu “estado da arte”, também poderemos assistir à disseminação dos pequenos tablóides gratuitos, cujo alicerce fundamental está nas parcerias com a publicidade e as agências de notícias, já que o jornal, como vimos, está no ramo de expor o leitor aos anunciantes. Fato que já está acontecendo nas ruas de São Paulo, inclusive. A busca de novos formatos para o jornal, inclusive o tablóide, também poderá ser uma opção das empresas jornalísticas no intuito de manter o público leitor, procurando servir-lhe com um produto melhor, inclusive se valendo da segmentação com novas publicações especializadas e diversos novos conceitos de design aplicados em reformas editorias gráficas. Para o cenário brasileiro, entretanto, não se espera nenhuma mudança pioneira, qualquer mudança que venha a acontecer aqui deverá seguir os novos modelos que surjam nos Estados Unidos e na Europa, pois este tipo de estratégia (copiar os modelos do primeiro mundo) vem sendo uma praxe das empresas jornalísticas nacionais ao longo da história. Por fim, antes do desaparecimento completo dos impressos, algo tem que acontecer: a Internet ser acessível ao maior número de pessoas possível, o que passa pela introdução de uma gigantesca massa da população mundial dentro do ambiente cibernético. O caminho para essa introdução massiva ao novo meio poderá, em princípio, fomentar novos hábitos de leitura que venham trazer um incremento no consumo de jornais, revistas e outras plataformas tradicionais de mídia. Dessa forma, antes de seu desaparecimento, é bem possível que se veja um “boom” no consumo de materiais impressos que precederá o próprio fim das mídias impressas, num grande suspiro “pré-mortis”. Ousando um pouco mais dentro desse exercício de futurologia, poderíamos dizer que já estamos vivendo esse “boom”, pois enquanto o jornal perde leitores, outras formas de mídia impressa vivem um momento de esplendor. Enquanto vivemos uma explosão no consumo de impressos, o mais antigo desse representante (excluindo-se o livro), já agoniza em seus estágios finais de vida, ao mesmo tempo em que se prepara para uma nova vida: a vida após a morte, a Internet. Notas: [1] Pierre Lévy é nativo da Tunísia (1956) e cidadão franco-canadense. Como completou seus estudos na França, é referido no meio acadêmico como filósofo francês da informação e/ou ciberespaço. [2] Entendemos como novas mídias aquelas que se conectam em rede utilizando como base a linguagem binária dos computadores e permitem uma comunicação em duas vias, permitem ouvir e ser ouvido, o que inclui a Internet e uma série de dispositivos móveis, sendo o telefone celular um deles. Basicamente, são todas as formas de comunicação que têm como base o microchip. [3] Conforme noticiado pela WBI Brasil, em http://www.wbibrasil.com.br/boletim.php?id_boletim=324, 10/04/2007. [4] Matéria de Lucas Pretti, “O segredo do Second Life em uma palavra”, publicada no Jornal da Tarde, Caderno Link em 10/01/2008. [5] Realidade virtual em cenário tridimensional com conexão multiusuária de massa, que conecta em tempo-real pessoas de qualquer parte do planeta através de um software dedicado. Site oficial: http://www.secondlife.com. [7] Em The Devil’s Advocate (1997). “Eu vou retirar o peso de seus ombros. Eu vou lhe dar prazer” (T.A.). [8] Para saber o significado dos termos técnicos, siglas, jargões, estrangeirismos e neologismos mencionados neste estudo, consulte glossário em anexo. [9] Termo originado do romance Neuromancer do escritor norte-americano Willian Gibson (1984). [10] “Do vapor à eletricidade” (in BURKE & BRIGGS, 2002:111-126). [11] Como ratificaremos através das explanações de Manuel Castells e Nicholas Negroponte no tópico “A Galáxia da Internet”, adiante neste capítulo. [12] Como pretendemos analisar mais adiante no capítulo “A Crise Ética do Jornalismo”. [13] Notícias recentes têm destacado não só o crescimento da rede mundial de computadores, mas vêm demonstrando que a Internet caminha rumo ao topo dos meios midiáticos, devendo se tornar a principal mídia global em um futuro não tão distante assim. Numa entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo (www.adnews.com, 03/03/2008), Marc Andreessen, referência mundial no assunto digital, um dos criadores do antigo navegador Netscape, declarou: “A internet está se tornando real agora de uma forma que nunca foi antes. Está se transformando na mídia principal na qual os consumidores se conectam para obterem informações e se comunicarem”. Alguns dados publicados ratificam a afirmação de Andressen: a Associação de Jornais da América divulgou em janeiro de 2008 (Portal Imprensa, 28/01/2008) que os portais noticiosos norte-americanos atingiram a marca de 60 milhões de visitas por mês, o que corresponde a 39% dos usuários estadunidenses. Outros dados nacionais demonstram que a banda larga está em ampla expansão no território brasileiro e já atinge 8,1 milhões de usuários, o que corresponde a um aumento de 30,5% em relação ao ano anterior (www.adgnews.com, 05/03/2008). Segundo o Interactive Advertising Bureau, (www.adgnews.com, 05/03/2008) também a classe C tem participação ativa na web, correspondendo a 37% dos usuários nacionais. A expectativa é que até o final de 2008, essa massa corresponda a aproximadamente 18 milhões de usuários. [14] Aqui Saad faz referência aos estudos de Roger Fidler que são parte da obra Mediamorphosis: understanding new media (EUA: Pine Forge Press, 1997), ainda sem tradução no Brasil. [15] Entendemos hackers como uma comunidade ou cultura de programadores e desenvolvedores tecnológicos, em oposição ao que é normalmente associado a esta classe, que são os crackers, estes sim, aqueles que utilizam seu conhecimento tecnológico com o objetivo de derrubar sistemas, criar vírus etc.. [16] No contexto da obra de Nicholas Negroponte, bit é uma referência a informações e conteúdos digitais. [17] Em Omen III – The Final Conflict (1981). “Pela liberdade muitos ele emprisionará” (T.A.). [18] Vale colocar que os termos “esfera pública” e “espaço público” referem-se à mesma coisa. Habermas trabalhava com o termo espaço público, o termo “esfera pública” é mais utilizado por estudiosos norte-americanos. [19] Habermas utilizava a palavra Öffentlichkeit ao referir-se à esfera pública, cuja tradução literal do alemão seria “publicidade”. [20] Sobre isto Habermas escreve: “Enquanto a burguesia, por assim dizer excluída dos postos de comando no Estado e na Igreja, assumia pouco a pouco todas as posições-chave na economia, enquanto a aristocracia compensava esta superioridade material por meio de privilégios da realeza e uma ênfase proporcionalmente rigorosa dos banqueiros e dos burocratas que assimilava a ela e se encontravam com a ‘intelectualidade’ como que em pé de igualdade” (Habermas, 1984:49). [21] Ver Briggs e Burke, 2006:107. [22] Ver Briggs e Burke, 2006:91. [23] Ver Briggs e Burke, 2006:93. [24] Ver Briggs e Burke, 2006:94. [25] Tais como Peter Burke e Asa Briggs que abordam com profundidade a questão da Esfera Pública no livro Uma história social da mídia, citando diversos outros estudiosos do tema, além do próprio Habermas. [26] Em “Jornalismo Sitiado”; Módulo: “Dos meios de comunicação de massa às gerações públicas generalizadas”. [27] Este é o teor do famoso livro de Theodor Adorno e Max Horkheimmer intitulado Dialética do esclarecimento (Rio de Janeiro: Zahar, 1985). [28] Nada pode expressar melhor essa afirmação do que a música do carnaval da rede Globo, cujo refrão diz: “Na tela da TV no meio desse povo, a gente vai se ver na Globo”. [29] Como, por exemplo, no Tsunami gerado no Oceano Índico que atingiu as costas da Indonésia, Tailândia, Índia, Mianmá e Malásia em 26 de Dezembro de 2004. [30] Em “Jornalismo Sitiado”; Módulo: “O papel da mídia na sociedade digital”. [31] Em http://www.dhnet.org.br/direitos/brasil/textos/textosbrasil/esferapublica.html, 07/07/2008. [32] Em The Devil’s Advocate (1997). “Não tem problema, nós temos alguns jornalistas na mão, eles vão plantar uma estória e destruir sua credibilidade” (T.A.). [33] Publicado na Revista da USP nº 66 (de setembro de 2005), também disponível em http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=351IPB012, 24/05/2008. [34] Referindo-se ao estudo do trio Burch, Leon e Tamayo do Centro Internacional de Investigações para o Desenvolvimento (Canadá). [35] Ou “liquefação”, conforme o conceito de “Modernidade Líquida” cunhado pelo sociólogo polonês, Zygmunt Bauman, onde a “sociedade moderna, como os líquidos, se caracteriza por uma incapacidade de manter a forma” (http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=351IPB012, 24/05/2008). [36] O próprio Murdoch já posiciona suas peças para “invadir” a grande rede. Segundo a Revista Veja de 7 de maio de 2008, em uma matéria sobre o magnata intitulada “Ele quer dominar a rede”, a News Corp entrou na concorrência que envolve Microsoft e Google pela compra do Yahoo! A mesma notícia diz que: “Em sua mesa, Murdoch tem planilhas nas quais a circulação dos maiores jornais americanos só cai – 3,6%, apenas nos últimos seis meses – e a publicidade na Internet aumenta. Trata-se de um mercado de 20 bilhões de dólares por ano”. [37] http://blog.estadao.com.br/blog/cruz/?title=a_morte_do_jornal_impresso&more=1&c=1&tb=1&pb=1, 20/03/2007. [38] No Brasil, um artigo de Pedro Celso Campos (2002) publicado no Observatório da Imprensa, trouxe à tona os seguintes dados referentes ao público nacional: “A pesquisa Datafolha divulgada no 3º Congresso de Jornais (2001), no Rio, mostrou que 80% dos consumidores de notícias via Internet têm menos de 40 anos de idade e 33% não passam dos 24 anos. Enquanto isto, 43% dos leitores de jornais de papel têm mais de 41 anos. Em média, são mais velhos que a população brasileira (...). Por que o público jovem prefere a internet para se informar? A pesquisa Datafolha também responde a essa questão: em média 65% dos internautas lêem notícias na rede. Talvez porque 33% dos que se converteram ao jornalismo virtual e mesmo 30% dos que não largam o papel de cada dia acham que na Internet o noticiário é mais confiável. Ao mesmo tempo, 77% dos internautas e 68% dos leitores de jornais afirmam, na pesquisa, que encontram mais rapidamente na internet as notícias que procuram”. Isso demonstra que essa tendência observada no público inglês também se verifica por aqui. [39] Matéria intitulada “Jornal passa por transformação ‘histórica’”, que aborda o estudo “Estado da Mídia” (The State of New Media 2007, Project of Excellence in Journalism, USA), publicada em 8 de abril de 2007. Em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2503200711.htm, 09/11/2008. [40] Uma outra notícia, veiculada pelo Portal Imprensa em 28/01/2008, diz que “Acesso aos sites de jornais nos EUA atinge recorde”, e aponta que cerca de 40% dos internautas acessam sites noticiosos, com isso, a matéria aponta para a viabilidade da extinção dos jornais impressos, absorvidos totalmente pelas plataformas digitais. [41] Conforme dados publicados em: http://www.fcsh.unl.pt/cadeiras/plataforma/foralinha/cyber/www/view.asp?edicao=00&artigo=1068, 24/05/2008. [42] Do original em Português de Portugal. [43] Em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2503200711.htm, 25/03/2007. [44] Existem ainda outros tipos de suportes digitais semelhantes ao papel eletrônico que podem também alavancar essa mudança, como exemplifica o jornalista Fernando Villela, os Tablet PCs (Pranchas): “Os Tablet PCs são pranchas eletrônicas para, através de acesso sem fio, serem utilizadas principalmente para navegação na Internet (...) têm o objetivo de trazer conforto no dia-a-dia para utilização da tecnologia, simplificando o uso da Internet como mídia – o que irá viabilizar, também, o velho sonho de se ler o jornal on-line no banheiro de casa” (em Caldas, 2002:175). [45] Como no jornal dos blogueiros de Boston, o BostonNow, veja capítulo III. [46] Em http://www.wbibrasil.com.br/boletim.php?id_boletim=325, 10/04/2007. [47] Revista Latinoamericana de Comunicación del Centro Internacional de Estudios Superiores de Comunicación para América Latina (Ciespal) nº 27, com sede em Quito, Ecuador. Em: http://chasqui.comunica.org/, 25/02/2008. [48] Tradução: “a mudança mais importante de sua história em que – afirma o professor Ramón Salaverria – não está em jogo sua sobrevivência mas sim sua hegemonia”. [49] Tradução: “as dificuldades que enfrentam os diários sustenta que, se querem manter-se vivos, eles não podem continuar sendo órgãos puramente noticiosos sem optar – por exemplo – pela interatividade, sendo esta a possibilidade que têm os cidadãos de escrever em diários por iniciativa própria, manifestando opiniões que não necessariamente coincidem com as páginas editorias do meio”. [50] Publicado no jornal Folha de S.Paulo, 05/03/2006. Em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ombudsma/om0503200602.htm, 09/11/2008. [51] Nessa parceria, um fato precisa ser bem explicitado: “Lembremos de quem comprou quem: a AOL comprou a Time Warner”, pois expõe como a Internet está mudando o valor da informação e aponta, no nosso entender, para o mesmo lado onde as verbas publicitárias passam a convergir à medida que a rede se expande. Também não custa lembrar que tal fusão não foi bem sucedida e “a AOL declarou prejuízos de mais de um bilhão de dólares para 2000” (Castells, 2003:160). [52] E, esse fato, também é um vetor que faz a publicidade se voltar para o indíviduo, ou seja, o indivíduo passa a ser o melhor “garoto propaganda” na Internet. [53] Em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2611200603.htm, 09/11/2008. [54] Richard Meisel, The decline of mass media. Massachusetts: Public Opinion Quaterly, 1973. [55] Além de um estudo sobre credibilidade ser muito amplo, como este de Meyer, trata-se de um objeto muito complexo e com múltiplos pontos de difícil análise. Já mencionamos anteriormente que no Brasil só existe um estudo de credibilidade feito pelo Ibope e alguns poucos outros que analisam a questão sobre diferentes focos, o que dificulta a compreensão maior desse objeto dentro do cenário midiático nacional. Uma das facetas subjetivas desse objeto aparece num estudo do economista norte-americano Matthew Gentzkow intitulado What Drives Media Slant (O que leva a imprensa a ser tendenciosa). O estudo mostra que os interesses econômicos pesam mais nas distorções do noticiário que a ideologia, e vai além, afirma que tais distorções seguem o gosto do público, como uma forma de manter a credibilidade do veículo. Duas matérias veiculadas no Observatório da Imprensa abordam essa questão. Este fato também demonstra como é possível se trabalhar a credibilidade. [56] Em palestra na Faculdade Cásper Líbero em 23/05/2008. [57] Cenários apresentados pelo estrategista empresarial Michael E. Porter (em Meyer, 2007:49-50). [58] Uma notícia veiculada no jornal Folha de S.Paulo em 19/07/2006, intitulada “New York Times corta 250 empregos e diminui tamanho”, exemplifica bem esse cenário descrito por Meyer (Em http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1907200629.htm, 09/11/2008). Já um estudo dissertativo de Ruth Penha Alves Vianna (1992), doutora em Ciências da Comunicação pela Universidade Autônoma de Barcelona (Espanha), constata que a prática de “espremer a laranja” é algo não só praticado em função da perda de receita de um determinado veículo. Antes mesmo da chegada da Internet, a própria Folha de S.Paulo, em seu processo de automatização (implantação de computadores na redação), demitiu toda a sua equipe de revisores (Monteiro, 2002:139 citando Vianna, R. P. Alves. Informatização da imprensa brasileira. São Paulo: Loyola, 1992). Pode-se constatar que as duas estratégias apontadas por Meyer, inserir-se na nova mídia e “espremer a laranja”, podem ser adotadas em conjunto. [59] Se caió el Systema – enredos de la sociedad de la informacion. Quito: Agencia Latino Americana de Información, 2003. [60] Nickname (apelido virtual) do jovem universitário norte-americano Shawn Fanning que deu nome ao software que revolucionou a distribuição de música digital compartilhada pela Internet. Alguns chegam a dizer que a criação de Fanning deu origem ao conceito de rede social aplicado a web, pois, mais do que compartilhar músicas, com o Napster, os usuários passaram a partilhar seus gostos e a criar suas comunidades virtuais de compartilhamento para diversos fins. [61] “Durante décadas a nossa compreensão de como os indivíduos organizam suas atividades produtivas tem sido realizada em uma de duas formas: quer como empregados em empresas, seguindo as instruções dos gerentes, ou, como indivíduos nos mercados, acompanhando os sinais dos preços. (...) Nos últimos três ou quatro anos, a atenção do público tem se concentrado em um recente fenômeno econômico-social de desenvolvimento mundial de software que ocorre há quinze anos. (...) Sugiro que estamos assistindo a emergência de um novo, amplo e profundo terceiro modo de produção no ambiente das redes digitais. Eu chamo este novo modo de ‘produção coletiva e comum entre pares’ [esta expressão não tem tradução literal em português, por isso sugiro seu uso em inglês ‘commons-based peer-production’], para distingui-la dos modelos de empresas e mercados baseados em contratos e em propriedade. Sua característica central é que grupos de indivíduos colaboram com sucesso em projetos de grande escala seguindo um conjunto de diversas motivações e sinais sociais, ao invés dos preços do mercado ou dos comandos gerenciais”. (Tradução de Sérgio Amadeu da Silveira). [62] No tópico “O Fim da Esfera Pública”. [63] Termo que, conforme o que diz a seguinte chamada do Observatório da Imprensa de 20/03/2006: “Existe também o conceito de infotenimento em português. O conceito foi defendido em tese de doutorado junto à Escola de Comunicação e Artes da Universidade (...)”, é oficialmente reconhecido. Em: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=373SAI001, 12/01/2008. [64] “Uma reflexão sobre a espetacularização da imprensa” in Coelho e Castro, 2006. [65] Em Ciro Marcondes Filho. O Capital da Notícia. São Paulo: Ática, 1989 (pp. 15). Ver também: Roland Barthes. Mitologias. Rio de Janeiro: Bertrand, 1989; Jean Baudrillard. Para uma Crítica da Economia Política do Signo. São Paulo: Martins Fontes, s.d (pp. 99) e D. Prokop. Sociologia. São Paulo: Ática, 1986 (pp. 75). [66] Nesta passagem, fazemos uma alusão à tese defendida por diversos historiadores e estudiosos da mídia. Alguns afirmam que a atuação da imprensa de opinião durante a Revolução Francesa não teve nada de democrática, foi apenas um instrumento ideológico capaz de “induzir mentes” e de influenciar multidões. O jornalismo de tribuna é uma forma conhecida do jornalismo de opinião que tem como base a perversão da informação em opinião, segundo os estudos e as classificações de gêneros jornalísticos do catedrático José Marques de Melo na sua obra Jornalismo opinativo (Campos do Jordão-SP: Mantiqueira, 2003). [67] “A informação mercadoria do jornalismo e as novas formas de trocas culturais” in Coelho e Castro, 2006. [68] “O espetáculo no telejornal sensacionalista” in Coelho e Castro, 2006. [69] Desterritorializado e desintermedializado. [70] THE Economist (2001) “Television takes a tumble”, 20 de janeiro. [71] Dados revelados pelo Ibobe em janeiro de 2008 mostram que a TV perde espaço para a Internet entre as classes A e B (as que têm mais acesso a web). A pesquisa revela que os telespectadores entre 25 a 49 anos foram os que assistiram menos à TV durante o ano passado (2007). Respectivamente, os índices caíram 5min09s e 5min31s (em relação a 2006). Entretanto, a pesquisa vai à contramão dos dados de Castells, aponta que o número cresceu bastante em análise entre jovens com idade entre 18 a 24 anos: mais 17min35s. [72] O que poderia explicar, também, a necessidade maior da entrada da publicidade no noticiário, a fim de financiá-lo. [73] Em relação as demais mídias, Castells demonstra em sua obra que muitas estão se beneficiando com a chegada da Internet, o jornalismo impresso, como analisamos, é que parece ser a primeira das velhas mídias que está em declínio frente ao novo meio. [74] Para Venício Lima, Comunicações é o setor que resulta da fusão entre as empresas de mídia, telecomunicações e tecnologia. . [75] Ver tópico “A questão da convergência”. [76] Saad, 2003:90. Em citação a Juan Antonio Ginder, citando Júlio Moreno, A mensagem multimídia: rumo à civilização massificada (São Paulo: Agência Estado, 1991). [77] Base do modelo informativo conhecido como “turbina” (em Saad, 2003:91). Nesse modelo, “a informação produzida deve ser distribuída por qualquer meio disponível na empresa, desde que seja o mais conveniente, o mais rápido e o mais barato para o público focado” (Saad, 2003:92). [78] Artigo “Terra de Gigantes”, publicado na Revista Adusp nº 42 de janeiro de 2008. [79] Grifo nosso. [80] Em The Devil’s Advocate (1997). “Você estava certo sobre um detalhe: eu estive observando. Eu não pude me comportar; espionando, esperando... Conter a respiração...” (T.A.). [81] Em The Devil’s Advocate (1997). “É a sua vez agora. Nossa vez” (T.A.). [82] Grifos nossos. [83] Este estudo mostra que o olho humano pisca menos durante a leitura na tela de um micro. A posição fixa do monitor também prejudica o ajuste da distância leitor/texto correta para a leitura. Esses fatores geram um aumento da fadiga visual. (em Pinho, 2003:51). [84] São Paulo: Berkeley Brasil, 2000. [85] Afinal, o custo de distribuição da informação pela web é zero. É o usuário quem vai até o servidor e requisita o download de uma informação lá armazenada para o seu computador através de um link. [86] Uma matéria de Marcelo Gripa veiculada pela Adnews em 05/03/2008, traz dados do Interactive Advertising Bureau que revelam a composição de classes no acesso à Internet: Classes A e B (50%), C (37% e D e E (13%). Embora as classes baixas tenham crescido em números no acesso à grande rede, vemos que ela ainda é elitizada, pois a metade dela é composta por indivíduos das classes mais altas. [87] http://www.blogdonoblat.com.br, 15/07/2008. Ricardo Noblat ficou famoso na época do escândalo político nacional noticiado pela imprensa sob o título de “Mensalão” por furar o muro do jornalismo impresso com seu site através de uma cobertura em tempo-real de fatos que aconteciam no palco do poder legislativo nacional na cidade de Brasília. [88] Connecting online: creating a succesfull image
on the internet. Oregon ( [89] Interesse, interação e envolvimento. [90] Designing web usability. Los Angeles: New Riders, 1999. [91] Mike Ward explica essa característica do mecanismo do Google da seguinte forma: “O Google classifica os resultados de pesquisa calculando quantas vezes as páginas apresentam links que levam a outros sites de grande visitação, em vez de apenas apresentar quantas vezes aparece a palavra ou expressão-chave nas páginas em questão” (Ward, 2007:78). [92] Na atualidade, além desse conceito, a Google também trabalha com a venda de espaço publicitário ou “links patrocinados”, que aparecem em destaque nos resultados das buscas em suas páginas. [93] “The Internet and Newspapers: a Dilema in Response” in The Edge Unplugged, Vol. 4. Cambridge, 2001, p.1-6. [94] Em: http://pt.wikipedia.org/wiki/Weblog, 24/07/2008. [95] Especialista em desenvolvimento de softwares ligados à inteligência artificial. Vivia em Chicago nessa época em que criou o blog (Araújo, 2006:40-41). [96] http://robotwisdom.com/, 24/07/2008. [97] No jargão dos profissionais de Tecnologia da Informação, log “é o nome que se dá ao arquivo digital que contém o registro da quantidade e do tipo de acessos feitos a um determinado servidor” (Araújo, 2006:39). [98] Um estudo aponta que o primeiro blog brasileiro surgiu nessa época, o Blue Bues, em janeiro de 1997 (Araújo, 2006:37-38). O mesmo estudo aponta que o primeiro blog de um veículo de imprensa foi do jornal Florida Today (EUA), surgido em 2003, quando fez cobertura da missão da nave espacial Columbia. [99] Sébastien Paquet. Personal knowledge publishing and its uses in research. 2002. Em http://radio.weblogs.com/0110772/stories/2002/10/03/personalKnowledgePublishingAndItsUsesInResearch.html, 29/07/2008. [100] Um estudo de Pedro Dória (Blog, blog, blog. 2001, ver Barbosa, 2005:63), aponta que a primeira comunidade de blogs, ou seja, o primeiro grupo de blogs conectados, o que também é conhecido como webring, se deu a partir de páginas pessoais de um grupo de pesquisadores do Vale do Silício nos Estados Unidos. [101] Publicação de conhecimento pessoal. [102] Dentre estes estavam: Pitas, LiveJournal, Pyra Labs'Blogger, Groksoup e Userland's Editthispage (em Escobar, 2007:10). O Blogger foi posteriormente comprado pela Google em 2003. [103] Saiba maiores detalhes em: http://www.commoncraft.com/archives/000427.html, 24/07/2008. [104] Maria Clara Aquino. Um resgate histórico do hipertexto. Em: http://www.compos.com.br/e-compos, 21/02/2007. [105] Alex Fernando Teixeira Primo. A terceira geração da hipertextualidade: cooperação e conflito na escrita coletiva de hipertextos com links multidirecionais, Revista Líbero. Ano IX, Nº.17, junho 2006, pp. 83-93. [106] O termo foi cunhado por um jornalista do The New York Times. Em 2008, a empresa IBM veicula uma propaganda mundial referenciando a Web 3.0, mas sem explicar o significado do mesmo. [107] Base de dados. [108] Que depois da criação do protocolo HTTP, fundou, o qual ainda preside, W3C – World Wide Web Consortium (em 1994), comitê internacional que discute padrões de comunicação para a Internet. [109] James Hendler e Ora Lassila. Publicaram, em 2001, um artigo na revista Scientifc American: a web Semântica seria um novo formato de aplicações para web que visam categorizar informação e aumentar a qualidade do resultado das ferramentas de busca através de resolução de ambigüidade e contextualização da informação. Em http://pt.wikipedia.org/wiki/Web_sem%C3%A2ntica, 06/08/2008. [110] Palestra que integrou o seminário “Cidadania digital latino-americana”, realizada em 12/09/2008. [111] Em “Jornalismo Sitiado”; Módulo: “O papel da mídia na sociedade digital”. [112] Este “empacotamento”, Ferrari define como: “(...) receber um material produzido, na maioria das vezes, por uma agência de notícias, e mudar o título (...) transformar alguns parágrafos (...) para ser usada como link correlato, adicionar foto ou vídeo, e por aí afora” (Ferrari, 2003:44). [113] Lúcia Leão. O labirinto da hipermídia. São Paulo: Ática, 1999, p. 42. [114] O terceiro estágio da produção jornalística em sua evolução no novo meio: a produção de conteúdo exclusivo para a Internet e os diversos meios digitais (em Monteiro, 2002:78). [115] Publicado no Observatório da Imprensa, em http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos/da311020014.htm, 05/08/2008. [116] Em The Devil’s Advocate (1997). “Você cria egos do tamanho de catedrais, conecta cada impulso egomaníaco através de fibra-óptica pelo mundo inteiro, até que cada indivíduo aspire o seu próprio império, tornando-se o seu próprio Deus” (T.A.). [117] Cidadão. [118] Jornalista formada pela PUC-SP, em entrevista exclusiva. Veja anexo “Entrevista: Lucia Freitas”. [119] Sistemas de métrica e indexação de páginas web e blogs. [120] Em www.observatoriodaimprensa.com.br, 25/07/2008. [121] Na matéria do caderno Link do Jornal da Tarde, “Acabou o monólogo jornalístico” de 18/09/2008. [122] Um estudo que explora muito bem esse problema é a obra Bowling Alone: America’s declining social capital de Robert Putnam (New York: Simon & Schuster, 2000). [123] O conceito de capital social pode ser uma das maneiras de se medir essa tendência, inclusive, hoje, alguns estudos demonstram como a Internet vem sendo uma plataforma de grande valia para a valoração do capital social. Um dos estudos que serve de referência para esse entendimento é a pesquisa “Capital social, engajamento cívico e Tecnologias da Informação e Comunicação”, da Drª. Heloísa Matos (pesquisadora associada ao Gresec, Université Stendhal – França). [124] Em análise a esta dissertação por ocasião da banca de qualificação realizada na Faculdade Cásper Líbero (São Paulo), em 08/09/2008. [125] Em The Devil’s Advocate (1997). “Não fique muito convencido, não importa quão bom tenha sido o seu trabalho. Mantenha-se pequeno, inócuo: seja um carinha qualquer, o CDF, o leproso, surfistinha barato” (T.A.). [126] Entre os quais destacam-se o site sul-coreano OhMyNews, o Wikinews.org e a própria blogosfera. [127] Estabelecimento/ assentamento/ engajamento/ criação de lacres, acordo. [128] Para nós, jornalista-cidadão é um jornalista que pratica jornalismo-cidadão, prática reconhecida pelo jornalismo e que independe do meio. Prática em que o cidadão tem papel ativo na construção da notícia junto ao jornalista. É evidente que a Internet e o blog são ferramentas que também vêm sendo usadas para a prática do jornalismo-cidadão, tanto por jornalistas como pelo “cidadão-repórter” (conforme a definição de Caio Túlio Costa que abordamos no tópico anterior). O cidadão-repórter, no nosso entendimento, pode ser um jornalista, engenheiro, médico, estudante, ou qualquer um que utilize os novos meios em prol da cidadania. Também para nós, parece inútil a discussão do fato do blogueiro ser considerado ou não jornalista. Jornalista é aquele portador de carteira profissional de jornalista, reconhecida pelos órgãos responsáveis, o que não impede o indivíduo não portador da carteira profissional de jornalista atuar da mesma forma que aquele que detém tal carteira. Segundo a jornalista e blogueira Lucia Freitas, ex-funcionária do Estadão, esses grandes veículos atrelam essa questão justamente a este registro, o Mtb: “Os grandes jornais ainda enxergam a questão do jornalista como sendo este o portador do Mtb, como se o blogueiro não checasse as suas informações, eles ainda não aprenderam a dinâmica da Internet, mesmo com seus grandes jornalistas usando os blogs, incluindo muitos que fazem blogs há mais de 10 anos” (veja anexo “Entrevista Lucia Freitas”). [129] The Weblog Handbook: Practical Advice on Creating and Maintaining Your Blog. Perseus Publishing: 2002. [130] Para quantificar essa “marginalidade” do blog, Tavernari aponta um “estudo publicado no jornal The Guardian, em julho de 2006, segundo o qual de cada cem usuários, apenas um quer produzir algo, dez irão interagir com este conteúdo, comentando-o e outros 89 irão apenas visualizá-lo (tradução da autora). Esses dados provam a importância da audiência na Internet e ilustram a dinâmica da produção noticiosa em diários virtuais: poucos são os que realmente se propõem a desenvolver mecanismos jornalísticos de criação da notícia” (Tavernari, 2007:14). Só resta saber o que esse “um” produzia antes do advento da web e com quem os outros dez interagiam. [131] Aqui vale mencionar um estudo de Noam Chomsky e Edward S. Herman sobre “os filtros da mídia”, onde eles demonstram que a mídia só crítica a própria mídia até um certo limite, o que inclui veículos que são concorrentes entre si. Inclusive, tal crítica da mídia sobre a própria mídia obedece a mecanismos que visam manter a credibilidade e a imagem de imparcialidade dos meios. Veja: “The Propaganda Model”, em http://en.wikipedia.org/wiki/Propaganda_model, 16/09/2008. As denúncias de Luis Nassif demonstram que tais limites e filtros vistos nos veículos do mainstream media são inexistentes ou extremamente tênues no ciberespaço. [132] Reinventando a cultura: a comunicação e seus produtos. Petrópolis-RJ: Vozes, 1996. [133] Barbosa exemplifica isso através do intelectual bahiano e seu blog. Na grande mídia o bahiano só tem espaço se o assunto for “as relações etno-musicais” ou o “clima excessivamente festivo da Bahia” (Barbosa, 2005:24-25). [134] No Mínimo Weblog e Bloi - o blog do Observatório da Imprensa. [135] Como, por exemplo, o blog Garotas que Dizem Ni (http://garotasquedizemni.ig.com.br, 29/09/2008) que, segundo uma das três autoras (que se apresentam através dos codinomes Clara McFly, Flá Wonka e Vivi Griswold), não tem “a pretensão de fazer um site noticioso”. Porém, o sucesso de audiência do blog valeu um contrato de ganho fixo com o portal iG, conforme noticiado pela revista Imprensa nº 238 na matéria “Igual, mas diferente” de setembro de 2008. A matéria indica que os blogs são, hoje, uma excelente ferramenta de marketing não mais ignorada pelas relações públicas e assessorias de imprensa, tanto das empresas de mídia quanto de qualquer corporação, é o “post institucionalizado”, conhecido como Blog Corporativo. É um novo canal que se mostra eficiente em detrimento dos canais mais tradicionais de comunicação entre as empresas e seus clientes e a mídia e seus interlocutores. [136] http://smellycat.com.br, 27/09/2008. Conforme noticiado pela revista Imprensa nº 238 na matéria “Igual, mas diferente” de setembro de 2008. [137] Em http://query.nytimes.com/gst/fullpage.html?res=9F04E1D91138F934A25752C1A9659C8B63, 09/10/2008. [138] Dois exemplos relacionados a códigos de ética e aos ideais, não só de blogueiros, mas de hackers e internautas de um modo geral, está no Manifesto Cluertrain (http://www.cluetrain.com/portuguese/, 20/09/2008), que é assinado por diversos autores, incluindo vários membros da, assim chamada, “elite tecnocrática” das novas mídias, e propõe 95 teses sobre as novas relações, inclusive comerciais, dentro do ciberespaço. Outro exemplo é destaque na matéria “Igual, mas diferente” da revista Imprensa nº 238 (Agosto de 2008), que indica um outro manifesto, Freelando pro Diabo (http://freelandoprodiabo.com, 24/09/2008), onde blogueiros brasileiros discutem códigos de ética e condutas para o exercício da arte de blogar, o texto expõe o slogan do site, “Não sou blogueiro de aluguel” e afirma que os ideais do manifesto giram em torno da idéia que: “antes de ser mídia ou veículo, blog é opinião registrada de quem tem voz ativa e diz o que pensa”. [139] http://oglobo.globo.com/pais/noblat/, 24/07/2007. [140] Veja anexo 1. [141] Em matéria publicada no caderno Link do Jornal da Tarde, intitulada “Os blogs já estão saturados”, de 10/07/2008. [142] Mark Deuze. The web and its journalisms: considering the consequences of different types of newsmedia online. New media & society. Vol 5(2). London: Sage, 2003, p. 203-230. [143] Aqui se encaixariam os sites da Folha Online e Estadão.com.br por exemplo. [144] Aqui poderiam figurar o portal UOL ou mesmo mecanismos como o Google News e iGoogle. [145] Para este tipo de classificação de site noticioso, poderíamos citar os blogs e o site Observatório da Imprensa. [146] Aqui poderíamos exemplificar com o site Limão do Grupo Estado e o site sul-coreano OhMyNews. [147] Die Zeitung. V. I. Berlin: J. Bensheimer, 1928. [148] Em análise a este estudo durante banca qualificatória realizada em 08/09/2008. [149] Segundo palavras do tecnocrata e sociólogo Sérgio Amadeu da Silveira em palestra na Faculdade Cásper Líbero realizada em 03/05/2007. [150] Em “Jornalismo Sitiado”; Módulo: “Blogs e jornalismo on-line”. [151] Esta questão é, ainda, abordada no Capítulo III em diversos tópicos, onde questionamos com mais profundidade a existência do debate/diálogo nos blogs. [152] Em “Jornalismo Sitiado”; Módulo: “A lógica do espetáculo sobre a lógica de imprensa”. [153] Monopólio horizontal refere-se à concentração de veículos de mídia dentro de um mesmo setor (ver LIMA, 2004:96). [154] Monopólio vertical refere-se à integração de diferentes etapas da cadeia de produção e distribuição (ver LIMA, 2004:99). [155] Monopólio cruzado refere-se à concentração de diferentes tipos de mídia do setor de comunicações (ver LIMA, 2004:101). [156] Em “Jornalismo Sitiado”; Módulo: “A lógica do espetáculo sobre a lógica de imprensa”. [157] Em “Jornalismo Sitiado”; Módulo: “O papel da mídia na sociedade digital”. [158] Palestra que fez parte do I Seminário do grupo de pesquisa “Comunicação, Tecnologia e Cultura de Rede”, cujo tema era: “Benkler e Lessig: Esfera pública conectada e a produção dos Commons”, ocorrida em 14/06/2007. [159] Em http://boycottsinclair.blogspot.com/, 24/06/2008. [160] O site oficial da Diebold está hospedado no endereço http://www.diebold.com/, 24/06/2008. [161] “Veja você mesmo”, conceito oposto ao dos mass media que é “trust me”, ou seja, acredite em mim. [162] Ver tópico “A Esfera Pública na Internet”. [163] Em palestra que fez parte do “I Seminário de Comunicação na Contemporaneidade” realizada na Faculdade Cásper Líbero em 21/05/2008. [164] Ver “Jornalismo Sitiado”; Módulo: “O papel da mídia na sociedade digital”. [165] Ver “Jornalismo Sitiado”; Módulo: “A lógica do espetáculo sobre a lógica de imprensa”. [166] “O fim da esfera pública”, 4ª Idade da Imprensa: As gerações públicas generalizadas. [167] “Ciberdemocracy: The Internet and The Public Sphere” in Mark Poster (Ed), Internet Cultura. 1997 (pp. 201-218). New York and London: Routledge, 1997. Disponível em http://members.fortunecity.com/cibercultura/vol13/vol13_markposter.htm, 05/08/2008. [168] A Internet, quando surgiu, era uma entre outras redes computacionais que existiam, e acabou prevalecendo justamente pelo fato de ser a que acabou crescendo mais, ou seja, quanto mais pessoas ela tinha, mais pessoas ela atraía. [169] Lawrence Lessig é defensor da “cultura livre”, é fundador da Creative Commons, uma licença de produção cultural e intelectual que se baseia no livre compartilhamento do conhecimento. [170] Em matéria do encarte Tecnomundo da revista Veja de Setembro de 2008, matéria intitulada “10 novas idéias que mudarão o mundo”. Veja também o blog de Nichollas Carr: Rough Type: http://www.roughtype.com/, 25/09/2008. [171] Apocalipse, 17:3. “E levou-me em espírito a um deserto, e vi uma mulher assentada sobre uma besta de cor de escarlata, que estava cheia de nomes de blasfêmia, e tinha sete cabeças e dez chifres”. [172] Veja maiores detalhes no site “Save the Internet”, http://www.savetheinternet.com/, 24/06/2008. [173] Para maiores detalhes sobre esses projetos de lei veja o blog do Prof. Sérgio Amadeu da Silveira. http://samadeu.blogspot.com, 30/06/2008, e matéria de Carlos Castilho publicada no Observatório da Imprensa, “Senador insiste no controle da Web indo na contramão do processo de inovação tecnológica”. [174] Em The Devil’s Advocate (1997). “Compra-se futuro, vendê-se futuro; quando não existe futuro” (T.A.). [175] Ver Martino, 2001 e Ruellan, 2006. [176] Veja Capítulo I: “McLuhan e a Imprensa”. [177] Veja Capítulo I: “A Galáxia da Internet”. [178] Em The Devil’s Advocate (1997). “Livre-arbítrio, isto é uma merda” (T.A.). [179] Em The Devil’s Advocate (1997). “Eu sou a mão embaixo da saia da Mona Lisa. Eu sou uma surpresa, eles não me vêm chegar” (T.A.). [180] http://br.youtube.com/watch?v=U2LcBmoE6Ws, 29/09/2008. Vídeo produzido por Robin Sloan e Matt Thompson para o museu de História da Mídia de São Francisco (Ferrari, 2007:54). [181] http://www.adnewstv.com.br/internet.php?id=69959, 26/05/2008. [182] Gordon Moore foi o autor da conhecida “Lei de Moore” que diz que a capacidade de processamento dos chips dobraria a cada ano enquanto o preço se manteria (em 1975). Hoje, Moore afirma que “em dez anos, os computadores atingirão a sua capacidade máxima, (...) pois estamos nos aproximando das dimensões atômicas de processamento”, em entrevista ao especial Tecnologia da revista Veja de setembro de 2008, “A lenda chamada Moore”. [183] “Serching for the Best Engine”, de 05/11/2007. [184] Queda. [185] O mecanismo da Google é entendido como sendo a segunda-geração da busca na Internet. A primeira-geração foi marcada pelos sistemas de busca que encontravam páginas que continham as palavras-chaves que os usuários procuravam, como os mecanismos AltaVista e Yahoo. Hoje, a Yahoo virou um joguete na mão de corporações como a Microsoft, News Corp e a própria Google, que entraram numa disputa pelo controle da mesma. A matéria aponta que os sistemas da Yahoo e da Microsoft são os que mais satisfazem os usuários, porém o Google é o sistema de busca mais utilizado da atualidade: “The biggest hurdle for Yahoo and Microsoft is that people don’t try their engines as often as Google’s”, diz a matéria (“O maior obstáculo para a Yahoo e a Microsoft é que as pessoas não tentam os seus sistemas de busca tão freqüentemente quanto o da Google”). Uma matéria veiculada pela WBI Brasil aponta que a Google detém 61% do mercado de busca norte-americano, supremacia tal que nem a fusão Microsoft com a Yahoo poderia fazer frente (Veja: http://www.wbibrasil.com.br/boletim.php?id_boletim=479, 14/08/2008). [186] http://www.google.com.br, 03/10/2008. [187] Segundo estimativas publicadas pela revista Newsweek de Novembro de 2007. [188] A busca orgânica refere-se à busca nornal do Google. Tal mecanismo, incluindo a busca normal, possui uma ferramenta que “limpa” as palavras-chaves mais usadas, pois são todas ligadas à pornografia. Assim, quem anuncia no Google ao menos não corre o risco de associar seu produto a itens pornográficos, entretanto, outros tipos inescrúpulos de associação podem acontecer, como analisamos. [189] Web / Design / Web. São Paulo: Market Press, s/d. [190] Segundo informações expostas no site IDG Now!, a Google detém cerca de 75% do mercado de busca paga mundial. Veja: http://idgnow.uol.com.br/mercado/2008/02/04/google-ataca-compra-do-yahoo-pela-microsoft-ballmer-defende-negocio/, 28/10/2008. [191] Veja anexo 2. [192] Em The Devil’s Advocate (1997). “Apesar de todas suas imperfeições, eu sou fã do Homem! Eu sou um humanista, talvez o último humanista” (T.A.). [193] Segundo o professor de jornalismo Walter Teixeira Lima Junior, em análise a este estudo por ocasião da banca qualificatória realizada em 08/09/2008, os primeiros jornais brasileiros a se aventurarem na web foram A Tribuna (de Santos) e o Diário do Grande ABC (da Grande São Paulo), a análise a seguir, contudo, leva em consideração apenas os maiores veículos do país. [194] Muitos estudiosos, dentre eles Manuel Castells e Pollyana Ferrari, esclarecem que o “estouro da bolha” se deu em função de uma aposta feita, na forma de investimentos em bolsas de futuro, na distribuição e venda de conteúdo pela Internet, o que não aconteceu da forma e com a rapidez que se esperava na época. A compra da Time Warner pela AOL talvez seja o maior exemplo nessa aposta feita e que depois não se confirmou, entretanto, a AOL Time Warner sobreviveu, apesar dos prejuízos. [195] Dados publicados na Revista Adusp nº 42, de janeiro de 2008. [196] http://www.folha.uol.com.br/, 24/09/2008. [197] E, podemos acrescentar, foram literalmente atendidas, pois, sobre tais críticas ao sistema de busca, tanto no site da Folha como no site do Estadão, ela expõe que “as fiz para o pessoal do portal também... Acho muito injusto encontrar um defeito e não comunicar, rsrsrs... Que bom que melhorou!”. [198] Microsoft Internet Explorer 6.0. [199] Numa análise prévia que fizemos sobre os blogs da Folha em 24/07/2007, tal espaço contava com um total de onze blogs. [200] Em http://www1.folha.uol.com.br/folha/blogs/, 15/10/2008. [201] http://www1.folha.uol.com.br/fsp/, 25/09/2008. [202] Dados publicados na Revista Adusp nº 42, de janeiro de 2008. [203] Em entrevista exclusiva, veja anexo “Entrevista Gustavo Venturi Junior”. [204] Dirigido por Nicholas Negroponte, que foi um dos cofundadores do Media Lab em 1980. Atualmente ele está deixando o MIT. [205] http://www.estadao.com.br/, 25/09/2008. [206] Espaço que ocupa a janela maximizada por completo, descontando-se as barras do navegador (no caso, o Windows Explorer 6.0) em um computador com resolução de tela de 1024x768 pixels per inch. [207] Segundo a enciclopédia Wikipedia, a definição de Widget para esse tipo de aplicação seria a de “pequenos aplicativos que flutuam pela área de trabalho e fornecem funcionalidades específicas ao utilizador” (http://pt.wikipedia.org/wiki/Widgets, 25/09/2008. [208] Numa pré-análise que fizemos sobre os blogs do Estadão em 24/07/2007, o site contava com quinze blogs na ocasião. [209] Em http://www.estadao.com.br/blogs/, 15/10/2008. [210] Não foi possível entender qual é a dinâmica ou quais os critérios que norteiam a publicação das notícias do Estadão de Hoje. As tentativas de contato com o portal não foram retornadas e uma atendente do SAC da empresa não soube explicar os detalhes de funcionamento desta área do site. [211] http://www.estado.com.br, 25/10/2008. [212] Um modelo semelhante ao adotado pelo jornal norte-americano San Jose Mercury News. Em http://sanjosemercurynews.ca.newsmemory.com/demo.php, 04/11/2008. [213] Arrastar e soltar. [214] Este é outro exemplo, assim como o jornal BostonNow que citamos anteriormente, da importância da existência de uma editoria ou de editor(es) quando se objetiva organizar algum fluxo informativo jornalístico na web. É mais um exemplo do relevante papel do editor nesse novo contexto midiático, mas de uma nova maneira, fomentando a produção e o acesso à informação e a notícia, coproduzindo com o internauta, inserido em um ambiente colaborativo. Dentro dessa lógica de produção o trabalho jornalístico não está ameaçado de extinsão no ciberespaço, pelo contrário, ele é extremamente importante para que a web não vire uma “Torre de Babel”, conforme o entendimento do termo dentro da percepção de Yochai Benkler (veja Capitulo II: “Os Blogs como Novo Meio de Expressão Jornalística: Objeções”). Podemos dizer que na web, o gatekeeper desaparece, mas o editor não. [215] Esta editoria pode ser apontada como a sobrevivência, ou o ressurgimento do suplemento Seu Bairro que acompanhava o Estadão (versão impressa), agora inserido dentro de uma rede social e sendo produzido pelo internauta. [216] Ver “Jornalismo Sitiado”; Módulo: “Dos meios de comunicação de massa às gerações públicas generalizadas”. [217] www.folhaonline.com.br, 25/07/2007. [218] http://www.estadao.com.br, 25/10/2008. [219] http://www.folha.uol.com.br/, 24/10/2008. [220] http://www.estadao.com.br/, 25/10/2008. [221] Vale destacar que utilizamos tal sistema de busca, pois imaginamos ser este o caminho mais comum utilizado pelos internautas, afinal, é o principal sistema de busca da atualidade e o site de maior tráfego do Brasil. [222] Utilizamos a busca “blogs OR política”, “blogs política” e “blogs AND política”, o mesmo para as palavras “blog” e “política”. Os resultados que mais apareceram na primeira página de resultados na ocasião são os que estão da dispostos na lista abaixo. [223] http://obarnabe.blogspot.com, 24/07/2007. [224] http://politicapura.blogspot.com, 24/07/2007. [225] http://www.zedirceu.com.br/index.php?option=com_content&task=blogsection&id=11&Itemid=37, 24/07/2007. [226] Ver Capítulo II: “Os Blogs como Novo Meio de Expressão Jornalística”, ou em Escobar, 2007:11. [227] Em http://www.wbibrasil.com.br/boletim.php?id_boletim=331, 12/04/2007. [228] Assim como o mecanismo iGoogle que vimos anteriormente. São marcas que rementem às características eu-centricas da nova mídia. [229] http://espnbrasil.terra.com.br/agora, 26/10/2008. [230] Em The Devil’s Advocate (1997). “Eu quero você para ser você mesmo” (T.A.). [231] Veja anexo “Entrevista Gustavo Venturi”. [232] Saiba mais em http://www.campus-party.com.br/index.php/cp-brasil-2008.html, 27/10/2008. [233] Veja anexo “Entrevistas Campus Party”. [234] Veja anexo “Entrevista Lucia Freitas”. [235] “Igual, mas diferente”, revista Imprensa nº 238, setembro de 2008. Matéria de Igor Ribeiro e Fabrício Teixeira. [236] Veja anexo 3. [237] Veja anexo “Entrevistas Revista Imprensa”. [238] Vida Digital: “Os blogs já estão saturados”, caderno Link, Jornal da Tarde, 10/07/2008. [239] “Cidadania digital latino-americana”, realizada em 12/09/2008. [240] Através de contato via scrap, e entrevistas acessíveis em comunidade criada para este fim, veja: http://www.orkut.com.br/Main?cmm=71468785#Community.aspx?cmm=71468785, 04/10/2008. [241] Veja anexo “Entrevistas Revista Imprensa” ou acesse o fórum da comunidade através do link disposto na nota anterior. [242] O que, além da nossa análise, é a opinião de Lucia Freitas: “Apesar de qualquer jornalista também estar inserido dentro de enormes fluxos de informações, eles são mais direcionados, sempre mais focados dentro de determinados assuntos e/ou editorias”, diz a blogueira. [243] Capítulo II: “Os Blogs como Novo Meio de Espressão Jornalística”. [244] Lúcia Freitas exemplifica isso comparando a audiência de alguns blogs com o site do Estadão: “(...) blogs mais influentes que, por exemplo, têm muito mais acesso que o próprio Estadao.com.br. Não que um determinado blog seja mais influente que o Estadão, mas tem mais audiência. A diferença é que o Estadão é conhecido por uma certa fatia de pessoas, já determinados blogs atingem outras pessoas que não são leitoras do Estadão”. [245] Lucia Freitas enxerga essa relação (blog/peer production) da seguinte forma: “Ela relaciona-se com a própria genética e o ambiente onde o ser humano está inserido. O ser humano não é um individuo fechado em si mesmo, ele é conectado. Ele é resultado da interação de sua genética com seu ambiente. Para mim, este conceito é a própria inteligência coletiva, é a construção do ambiente, é um lugar biológico”. [246] Vale colocar que durante as análises que fizemos nos sites da Folha Online e do Estadao.com.br, nós tentamos estabelecer contato com essas empresas via e-mail e não obtivemos resposta. [247] Capítulo II: “As Novidades do Jornalismo na Internet”. [248] Opinião compartilhada por Marcelo e Lyanne, do blog Viajante Consciente, que acreditam que a linguagem mais pessoal e coloquial do blog e da própria web contagiará a mídia como um todo, eles expõem: “Acho que os jornais, enquanto linguagens, vão se adaptar aos novos tempos (...) mas ainda vão manter a característica de instituição”. [249] Capítulo II: “Os Blogs como Novo Meio de Expressão Jornalística”. [250] Capítulo I: “O Jornalismo é uma ‘Bobagem’”. [251] Capítulo II: “As Novidades do Jornalismo na Internet”. [252] Veja o perfil completo de Lucia Freitas no anexo “Entrevista Lucia Freitas”. [253] E temos a Creative Commons, uma nova forma de licenciamento de produção intelecto-cultural baseada no livre compartilhamento da informação e da cultura, uma nova alternativa a esta “sacanagem”. [254] Veja em anexo “Entrevista Lucia Freitas”. [255] E principalmente, nas noticias mais “sensacionais”, tais como tragédias e assassinatos. [256] Expressão utilizada pela emissora para se referir aos seus telespectadores. [257] Os posts nos blogs dos programas da ESPN Brasil apresentam uma média que supera trezentos (300) comentários (26/10/2008). E, segundo palavras de José Trajano, jornalista e diretor executivo da emissora, o recorde de comentários por post da ESPN Brasil chega a quase 2000. Para administrar tantos contatos, existem moderadores que ajudam os jornalistas filtrar as mensagens mais relevantes e manter o nível do debate saudável. O moderador é, neste exemplo e em diversos outros, uma espécie de editor virtual, demonstrando assim, mais uma vez, a sua importância dentro do contexto cibernético. Esse exemplo também corrobora a tese de Yochai Benkler que diz que quem tem mais capital, como uma emissora de TV, tem mais capacidade de ser ouvido, de forma que tanto os blogs da ESPN Brasil e de seus jornalistas quanto os blogs que são atrelados a grandes veículos informativos e/ou portais, possuem uma grande vantagem dentro da disputa pela audiência ciberespacial (veja Capítulo II: “Os Blogs como Novo Meio de Expressão Jornalísica: Objeções”. [258] http://twitter.com, 27/10/2008. [259] Sistema evangelizado por Steven Reubel, http://friendfeed.com/steverubel, 27/10/2008. [260] Assim como a famosa mensagem de erro do Orkut no seu início: “no donuts for you”. Ou o novo site do Estadão que apresenta bugs diversos durante a navegação. [261] De acordo com o blog da empresa Vivo (http://www.vivoblog.com.br/as-tres-bombas-atomicas.html, 27/10/2008), o Twitter possui mais de três milhões de usuários no Brasil. Dentre esses milhões de usuários, destacam-se empresas tais como Rede Globo através do programa Big Brother Brasil, a Funerária Leito de Morte e, fora do país, o presidenciável norte-americano Barak Obama. Além de facilitar o diálogo nos blogs, tal ferramenta também vem sendo utilizada como uma forma de comunicação viral, inclusive, com fins comerciais. [262] A prática de se enviar mensagens para posts de blogs via celular é também conhecida como mobileblogging. [263] Instant Messenger. “Mensageiros instantâneos”, tais como ICQ, AIM e MSN. [264] Neste ponto, há controvérsias, o entendimento pode ser exatamente o oposto: o uso não-jornalístico dos blogs é que resulta da apropriação desta ferramenta para outros fins, dado que, quando surgiram as grandes plataformas gratuitas de blogs, tal movimento foi publicizado como uma nova maneira de se fazer jornalismo, inclusive, uma das plataformas que surgiram nessa época, se chama LiveJournal (jornal ao vivo). [265] Em sala de aula, 22/03/2007, na disciplina Mídia, Opinião Pública e Processo Político que ministra para as turmas de Mestrado da Faculdade Cásper Líbero. [266] Capítulo I: “Os Blogs como Novo Meio de Expressão Jornalística: Objeções”. [267] http://www.google.com/analytics/pt-BR/, 29/10/2008. [268] “Free will” (canção) em Permanent waves (álbum) – 1980. “Você pode escolher um guia de prontidão em uma voz celestial qualquer. Se você preferir não escolher, é porque já fez a sua escolha. Você pode escolher entre temores assombrosos e gentilezas assassinas. Eu vou escolher o caminho mais livre – eu vou escolher o livre-arbítrio” (T.A.). [269] http://www.alexa.com, 28/10/2008. [270] Sites top 10 mundiais: 1º: Yahoo!; 2º: Google; 3º: Youtube; 4º:Windows Live Search; 5º: Facebook; 6º: MSN; 7º: MySpace; 8º: Wikipedia; 9º: Blogger; 10º: Yahoo! Japão. [271] Sites top 10 em língua portuguesa: 1º: Google Brasil; 2º: UOL; 3º: Globo.com; 4º:Terra; 5º: iG; 6º: Mercado Livre; 7º: Google Portugal; 8º: Sapo; 9º: Lojas Americanas; 10º: MSN. [272] Sites top 10 brasileiros: 1º: Google Brasil; 2º: Orkut; 3º: Windows Live Search; 4º:UOL; 5º: Youtube; 6º: Globo.com; 7º: Yahoo!; 8º: Google.com; 9º: Terra; 10º: BuscaPé. [273] O site do outro jornal do Grupo Estado, o Jornal da Tarde, figura na posição número 6.797 (do Brasil). Em relação ao posicionamento global, o site do Estadão está na posição número 4.306, em termos de tráfego (média trimestral), detém 0,0222% da audiência mundial, enquanto o site da Folha Online (que tem uma média de tráfego equivalente a 3% da média do UOL), possui uma média aproximada de 0,0315%. A sessão de blogs do Estadão detém 7% do tráfego do portal (terceira sessão mais acessada). Não foi possível verificar qual é a média de tráfego dos blogs da Folha Online e/ou do UOL. [274] Este é um exemplo da importância da desenfreada “microsinergia” da web que mencionamos no tópico “A Sinergia da Mídia” (Capítulo I). [275] Segundo matéria publicada no site UnderGoogle (http://www.undergoogle.com, 28/10/2008). Veja: http://www.undergoogle.com/blog/2008/09/sobre-o-google-search-masters-2008.html. [276] Empresa produtora de fontes de texto e softwares gráficos que é dona do Flash. [277] http://blogblogs.com.br, 28/10/2008. [278] Aliás, a WBI Brasil é uma empresa de marketing digital que possui certificado de qualificação Google Adwords, ou seja, é uma “evangelizadora” dos sistemas de marketing da Google no Brasil. [279] Este é o caso do UOL, o chat UOL é a página de maior tráfego dentro do portal, o que corresponde a 11% do total. [280] Segundo dados publicados na revista Adusp nº 42, de janeiro de 2008. [281] Média trimestral de pageviews por número total de usuários da Internet. [282] E ela possui valor publicitário pelo grande trafego que possui e pela tecnologia única de marketing contextual que detém e a coloca na posição de maior plataforma publicitária da grande rede na atualidade. [283] Capítulo II: “Os Blogs como Resgate da Esfera Pública: Objeções”. [284] Capítulo II: “As Novidades do Jornalismo através da Internet: Qualificação”. [285] Capítulo II: “Os Blogs e o Resgate da Esfera Pública: Objeções”. [286] Geração que já nasceu em meio ao mundo digital. |
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