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Associação acolhe crianças e adolescentes de rua
FERNANDA
FERNANDES
Era uma
vez um coração que vivia só num lugar longínquo, rodeado de sonhos.
Tinha cerca de seus 13 anos de curta caminhada ainda percorrida, mas
com muitos embates já sofridos e inúmeras palpitações.
Inesperadamente, surgiu um outro coração. Amigo. Desconhecido.
Isso não é um conto, mas a realidade vivida pela Casa
Taiguara, localizada no Centro de São Paulo, que tem como objetivo
acolher crianças e adolescentes que estão pelas ruas,
oferecendo-lhes alimentação, higiene, moradia, cuidados com a saúde,
orientação, educação e carinho.
Logo que elas chegam a casa,
são acompanhadas pela psicóloga Maria Cristina, que ao longo de
várias conversas, com um trabalho a longo prazo, consegue reverter
alguns deles. Ela diz que "trabalhar com essas crianças causa uma
resistência muito grande. Elas já foram violentadas, não só
fisicamente mas psicologicamente. A desconfiança também é muito
grande. Acaba gerando um medo de serem magoadas
novamente".
Cinqüenta por cento das crianças que ali se
encontram querem voltar para casa. A outra metade não quer viver
novamente a realidade que tinham, tomadas de violência, abusos,
dentre outros fatores. Segundo a psicóloga, os motivos que levam os
meninos a saírem de casa são um pouco diferentes das meninas. "Os
meninos saem de casa por aventura. Eles em sua grande maioria não
possuem pai, e portanto, não aceitam na figura materna o símbolo da
autoridade. Buscam esse foco de poder e autoridade nos bandidos e
nos traficantes, que conseqüentemente os levam para o mau
caminho".
Ainda com essas resistências, o maior objetivo
desse projeto é reintegração da família, afirma a assistente social
Genilma White. "Lidamos com aproximadamente 90% de pais que não
querem seus filhos de volta". Quando issó ocorre, após passar por
uma reeducação, orientação suficiente, um período determinado, as
crianças são encaminhadas a abrigos.
O
projeto conta com apoio da Prefeitura de São Paulo, doadores
regulares e voluntários. As crianças e adolescentes estudam em um
período e têm como alternativa, horas de entretenimento. Para Rômulo
Castagna, educador social do Projeto, falta o apoio de voluntários
médicos, especialistas principalmente em neurologia. E afirma que "a
mídia seria o meio mais fácil de conseguirmos esse apoio. A, a
divulgação é fundamental. Sem ela, tudo se torna mais
difícil".
Já a coordenadora administrativa Lídia Moreira,
discorda de Rômulo e revelou revoltada que apesar da mídia ter
interesse em divulgar esse tipo trabalho, nunca contam realmente da
forma como ele é realizado, abordando nossas necessidades e
objetivos. Às vezes o único objetivo que eles tem é de fazer
sensacionalismo. Ela diz que "o programa do Gugu há um tempo atrás
fez uma matéria falando do movimento das mães da Sé, que buscam por
seus filhos desaparecidos. Neste dia, eles mostraram uma criança
encontrada, que fomos nós que o acolhemos e procuramos por sua mãe.
Ao final da matéria apenas citaram no nosso nome, referiu-nos a uma
casa que abriga crianças carentes e só". "Isso não é verdade, nós
somos uma casa que abriga crianças que tem família, foram para rua
por problemas particulares, de violências, abusos, drogas e crimes",
completa Genilma.
Uma pré-adolescente de 13 anos relata que
viver na Casa Taiguara é muito bom, que a comida, as atividades e as
"tias" são o ela mais gosta. Quando for adulta pretende ser médica
ou cantora. Seu sonho? "Conhecer meu pai", diz. Pensa melhor e
conclui que espera um dia fazer com que minha mãe "consiga quebrar
aquele coração ruim e me amar". Para outra garota, com 12 anos, as
únicas coisas que a diferem da amiguinha é querer ser atriz quando
crescer. Seu sonho? Com os olhos brilhando respondeu "Que um dia
minha mãe goste de mim".
Para elas, a rua não traz nada de
bom. Pelo contrário, somente coisas ruins como as drogas, que ambas
confessaram já ter usado. "A rua não é lugar de criança morar, é
lugar de carro e de gente passar" responde a garota de 12 anos. Para
encerrar esse papo aparentemente descontraído, elas cantam uma
música com cabeças baixas envergonhadas, mas com sorrisos nos
rostos.
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